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Psicologia: teoria e prática

versão impressa ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. v.9 n.2 São Paulo dez. 2007

 

RELATO DE EXPERIÊNCIA

 

Relato sobre o XVII Congresso Latino-Americano da Flapag/VI Congresso do Nesme e VIII Jornada da Spagesp

 

 

Solange Aparecida Emílio

Universidade Presbiteriana Mackenzie

Endereço para correspondência

 

 

O congresso intitulado “Saúde, Cultura e Diversidade” foi um evento promovido por instituições que se dedicam ao estudo dos fenômenos grupais: Federação Latina de Psicanálise de Grupo (Flapag); Núcleo de Estudos em Saúde Mental (Nesme) e Psicanálise das Configurações Vinculares; e Sociedade de Psicoterapias Grupais do Estado de São Paulo (Spagesp).

A apresentação contida no programa oficial já remetia ao que se poderia encontrar nos quatro dias do evento. Uma epígrafe de Raul Seixas iniciou o programa científico: “Eu prefiro ser/ essa metamorfose ambulante/ do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”, e esta afirmava que o congresso pretendia ser, “mais do que tudo, uma oportunidade de encontro entre pensadores”. Ato que foi confirmado durante a experiência.

No primeiro dia, ainda antes da abertura oficial, houve apresentações de pôsteres e temas livres. Tais atividades, que não costumam ser muito valorizadas em eventos científicos, já apresentavam aos participantes uma idéia do que estava por vir: salas lotadas e a participação interessada dos presentes. O clima de respeito aos autores dos trabalhos e às experiências de quem estava lá para aprender e também ensinar estava instalado desde o início.

Todas as atividades privilegiavam de alguma forma a discussão de idéias, e não raro as trocas continuavam durante os intervalos e migravam entre as salas, permitindo que um assunto iniciado a partir de um determinado tema fosse retomado em um outro, aparentemente distinto, mas com o qual percebiase, ao final, que havia significativa conexão.

O formato do evento proporcionou oportunidades de aprofundamento e estudo de assuntos de grande interesse tanto aos estudantes universitários, de pós-graduação e de especialização em grupos que ali estavam quanto aos profissionais e especialistas que buscavam novas respostas e reflexões sobre a realidade e a prática cotidianas. Foram explorados em minicursos com temas como: cultura, família e subjetividades; vínculos amorosos; psicossomática psicanalítica; como trabalhar com grupos. As oficinas abordaram técnicas diversas e aplicáveis aos campos da saúde, educação, das comunidades e empresas. As mesas-redondas, compostas por convidados de referência nacional e internacional, abordaram temas relacionados: às questões teóricas e práticas que envolvem os fenômenos grupais; ao corpo, seus usos e abusos; às abordagens grupais e vinculares nos diferentes contextos e voltadas a diferentes populações (crianças, adolescentes, jovens, adultos, famílias, casais – incluindo os homoafetivos); ao diálogo entre as diferentes abordagens, concepções e formas de intervenção grupal, e às influências da grupalidade pela e na cultura.

Ocorreram conferências e seminários clínicos conduzidos por pessoas que são referência para quem estuda e trabalha com grupos e famílias: David Zimerman, Luiz Carlos Osório, Janine Puget, Ceneide Ceverny. Cabe destacar a participação de Júlio de Mello Filho, reconhecido autor de textos sobre psicossomática e sobre as contribuições de D. W. Winnicott para o trabalho com grupos, que não se limitou a freqüentar somente as salas para as quais apresentaria trabalhos, mas participou ativamente do evento, prestigiando colegas muito menos experientes e demonstrando disponibilidade em escutar e aprender com os demais. Também vale mencionar a presença de Waldemar José Fernandes e Luiz Miller de Paiva, ambos conhecidos por terem prestado importante papel na história da psicoterapia analítica de grupo de São Paulo e responsáveis pela formação de muitos dos especialistas da atualidade.

Aconteceram duas sessões especiais, com três horas de duração cada: uma sobre a formação profissional do psicólogo, reunindo coordenadores de curso de graduação e especialização em Psicologia, representantes da Associação Brasileira de Ensino de Psicologia e do Conselho Regional de Psicologia; e outra sobre políticas em saúde mental, com representantes do Ministério da Saúde, do CFP e de instituições da Argentina e do Uruguai. Evidenciou-se que apesar de parecer que as instituições de formação do psicólogo têm se empenhado em prepará-los atendendo às determinações legais, o que se percebe é que o aluno sai da graduação muitas vezes sem se sentir seguro para exercer as atividades profissionais, principalmente quando estas exigem dele o conhecimento e o manejo dos fenômenos grupais. Em ambos os momentos, apesar de se saber que um longo tempo dedicado a um mesmo assunto pode cansar e provocar desinteresse nos participantes, pareceu, ao final, que havia muito ainda a ser discutido. Isso dá a dimensão de que tais assuntos merecem ser mais explorados.

Um aspecto que chamou bastante a atenção foi a participação de representantes de diferentes países da América Latina em uma mesma atividade, o que proporcionou o contato com a diversidade de conceitos, práticas e manifestações culturais. As dificuldades de comunicação muitas vezes se fizeram presentes; no entanto, o desejo de estabelecer trocas e compartilhar idéias pareceu ter ficado mais forte, o que garantiu inúmeros encontros e importantes parcerias. Houve, inclusive, um momento reservado especialmente para a abordagem da questão da diferença de línguas: o “Fórum de Idiomas”. Em uma sala organizada com cadeiras em semicírculos concêntricos – de forma a caberem cerca de cem pessoas – e coordenada por uma dupla, um brasileiro e uma argentina, os participantes foram convidados a conversar no idioma que desejassem e pudessem, tendo como tema justamente a questão da diversidade idiomática. Foi proporcionada, nessa atividade, uma experiência muito interessante, na qual os participantes compartilharam as vivências neste e em outros eventos multilíngües. Ficou evidenciado que a intolerância pode vir de pessoas provenientes da mesma cultura e origem idiomática, e a diferença de línguas parece muito mais uma desculpa para a dificuldade que as pessoas têm de se fazer compreender e de compreender os demais.

Enfim, parece que o congresso, além de possibilitar a discussão e o aprofundamento de seu tema – “Saúde, Cultura e Diversidade” –, cumpriu a proposta de proporcionar um encontro entre pensadores e foi além, possibilitando uma verdadeira metamorfose em todos os presentes, os quais, certamente, tiveram oportunidade de repensar velhas opiniões formadas sobre muitas coisas, inclusive sobre os eventos científicos.

 

 

Endereço para correspondência
Solange Aparecida Emílio
Rua da Consolação, 896 – Prédio 38
São Paulo – SP – Brasil
CEP 01302-907
E-mail: solange.emilio@mackenzie.br

Tramitação
Recebido em setembro de 2007
Aceito em novembro de 2007

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