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Psicologia: teoria e prática

Print version ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.15 no.1 São Paulo Apr. 2013

 

PSICOLOGIA CLÍNICA

 

Grupo de apoio para acompanhantes de crianças internadas em uma unidade pediátrica

 

Support group for caregivers of children admitted to a pediatric unit

 

Grupo de apoyo para cuidadores de niños ingresados en una unidad pediátrica

 

 

Fernanda Piske; Larissa Antonella Azevedo; Claudete Marcon; Lecila Duarte Barbosa Oliveira

Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis - SC - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este artigo relata um trabalho de intervenção psicológica em grupo, cujo objetivo é proporcionar uma reflexão acerca da reação das famílias diante do adoecimento, entender como lidam com a angústia e o medo, e identificar fatores terapêuticos em grupos de apoio. O estudo teve caráter qualitativo e natureza exploratória, e os fatores terapêuticos foram identificados e analisados com base no relato dos sujeitos. Os grupos eram constituídos pelos acompanhantes das crianças internadas. As reuniões ocorreram durante sete meses, durando aproximadamente 70 minutos. No total, 78 pessoas participaram dos grupos elaborados e coordenados pelas estagiárias de psicologia. Verificou-se que os grupos proporcionaram um enfrentamento das dificuldades, fortaleceram a identidade do acompanhante como cuidador, mostraram-se efetivos em solucionar problemas relacionados à hospitalização, constituindo assim uma possibilidade de atuação do psicólogo no contexto hospitalar e representando um recurso terapêutico importante na diminuição do sofrimento das famílias e das crianças hospitalizadas.

Palavras-chave: processos grupais; grupos de apoio; criança hospitalizada; acompanhantes de pacientes; psicologia hospitalar.


ABSTRACT

This article reports the work of a psychological intervention group. This group is focused in dealing with families during child hospitalization time in order to provide a reflection on their behavior. Also, a better understanding how to cope with anguish and fear during child illness. The therapeutic factors related to support groups were identified. This qualitative study was exploratory nature. All the therapeutic factors were identified and analyzed from the subjects' report. These groups were composed by caregivers of admitted children and psychology interns. The meetings occurred during seven months, lasting about 70 minutes. In total, 78 people were engaged within the groups developed and coordinated by psychology interns. It was verified that the groups provided a better coping, empowering the caregiver to support and be effective as children companion. The groups also showed to be effective in solving problems related to hospitalization. Furthermore, this procedure may represent a possibility for psychologists to work at the hospital, representing an important therapeutic resource aiming at the reduction of suffering from families and the hospitalized children.

Keywords: group processes; support groups; hospitalized child; patient companions; hospital psychology.


RESUMEN

Este trabajo presenta un estudio de intervención psicológica en grupo, cuyo objetivo es ofrecer una reflexión sobre la reacción de las familias que enfrentan la enfermedad, comprender mejor cómo gestionan la ansiedad y el miedo, e identificar los factores terapéuticos en los grupos de apoyo. Se trata de un estudio cualitativo y exploratorio y los factores terapéuticos fueron identificados y analizados a partir de relatos de los participantes. Los grupos fueron constituidos por los cuidadores de los niños ingresados. Las reuniones ocurrieron durante siete meses, con una duración de aproximadamente 70 minutos. En total, 78 personas pasaron por los grupos desarrollado y coordinado por internos de psicología. Se verificó que los grupos proporcionaron un afrontamiento a dificultades, el fortalecimiento de la identidad del acompañante como un proveedor de cuidados, fueron eficaces en la solución de problemas relacionados con la hospitalización, por lo tanto, constituyendo una posibilidad de actuación del psicólogo en el ámbito hospitalario y representa un recurso terapéutico importante para reducir el sufrimiento de las familias de los niños hospitalizados.

Palabras clave: procesos de grupo; grupos de apoyo; niños hospitalizados; acompañante del paciente; psicología hospitalaria.


 

 

A situação de adoecimento e hospitalização é considerada um momento de importante sofrimento emocional. Quando o sujeito doente é uma criança, outros fatores associam-se ao contexto, e os principais estressores presentes na hospitalização infantil são o tipo de enfermidade, a dor, o ambiente não familiar, os procedimentos médicos, a separação dos familiares e amigos, o estresse dos pais, a ruptura e a adaptação a uma rotina de vida imposta e desconhecida, a perda da autonomia e do controle, a sensação de incompetência pessoal, a incerteza quanto à conduta apropriada e o medo da morte (Campos, 2004; Mota, Martins, & Véras, 2006; Soares, 2003).

Nesse sentido, assim como a criança internada, a família também pode sofrer em função de muitos desses aspectos. O aparecimento inesperado de uma doença evoca frequentemente, nos pais, o sentimento de culpa e fracasso nos cuidados com a criança.

O hospital, geralmente, não está preparado para acolher as famílias, apresentando dificuldades em adequá-las ao ambiente hospitalar, sendo elas, muitas vezes, consideradas pela equipe como elemento secundário, sem função específica, preferindo que elas se mantenham afastadas. Esse tipo de visão não condiz com o processo de humanização do atendimento. Elas devem ser consideradas parte integrante do processo de hospitalização e participar ativamente de todo o período de hospitalização (Scremin, Ávila, & Branco, 2009).

Para oferecer suporte emocional e psicológico que contribua para a recuperação da criança enferma, o acompanhante deve estar em condições de fazê-lo, o que pressupõe sua própria segurança e estabilidade (Andraus, Oliveira, Minamisava, Munari, & Borges, 2004). Portanto, a presença de uma equipe que os auxilie nesse momento é importante para que esses acompanhantes sejam capazes de dar a assistência de que a criança necessita ou para que assimilem as orientações dos profissionais quanto aos cuidados com a criança, melhorando diversos aspectos envolvidos no processo de adoecimento (Finkel, 2009).

Considerando a fragilidade da família da criança enferma, a intervenção do psicólogo é essencial no processo de internação. Essa atuação deve ter como objetivos: a continência das angústias deflagradas pela doença e o esclarecimento dessas emoções e a elaboração dessas angústias, com a finalidade de tornar mais eficaz o suporte que a família dará ao paciente (Campos, 2004).

Nesse contexto específico, as intervenções dos profissionais psicólogos ainda estão em construção, e terapêuticas com foco grupal têm crescido dentro de instituições hospitalares, contudo permanecem escassas quando comparadas com o total de atuações que esses profissionais realizam (Cachapuz, 2006).

A socialização, a relação interpessoal e a busca por suporte social fazem parte da vida humana e propiciam os sentimentos de proteção, apoio, acolhimento e proximidade entre os indivíduos. De acordo com Jang e Kim (2012), o grupo terapêutico proporciona a troca de experiências entre os membros e afeta as relações dos indivíduos integrantes, propiciando oportunidades que facilitam a autoexpressão e a confiança, bem como a melhoria da autoimagem e o senso de pertencer a um grupo.

As relações interpessoais que ocorrem nas relações grupais dão subsídios para o enfrentamento da realidade, agindo como fator moderador do estresse. De fato, Nolbris, Abrahamsson, Hellström, Olofsson, & Enskär (2010), em um estudo realizado com irmãos de crianças diagnosticadas com câncer, constataram que aquelas que participaram de grupo de apoio reduziram os níveis de estresse e ansiedade e se apresentaram mais preparadas para lidar com suas reações emocionais.

Verificam-se a importância que os grupos de suporte apresentam no contexto hospitalar e a pouca exploração do tema relacionado à enfermaria pediátrica. Dessa forma, este artigo relata um trabalho de intervenção psicológica em grupo, cujo objetivo foi proporcionar uma reflexão acerca da reação das famílias diante do adoecimento, entender melhor como lidam com a angústia e o medo, e identificar fatores terapêuticos em grupos de apoio. Outro objetivo deste artigo é promover subsídios para a formação e prática profissional nessa temática, pois, segundo Bernard et al. (2008), o trabalho com grupos exige preparação e educação do terapeuta, pois quanto mais informado sobre os objetivos e processos do grupo, maiores as chances de que os encaminhamentos sejam apropriados e que o grupo atinja os objetivos propostos.

 

Método

O estudo teve caráter qualitativo, sendo de natureza exploratória. Os relatos dos participantes dos grupos eram transcritos logo após a atividade, por uma das coordenadoras (visando garantir o anonimato dos participantes, na transcrição dos relatos utilizaram-se letras para identificá-los). Posteriormente, as transcrições eram analisadas para se obter o tema central do conteúdo verbal e identificar os fatores terapêuticos, baseados em Yalom (2006).

Os grupos ocorreram no período de março a setembro de 2009 e tiveram duração aproximada de 70 minutos. Foram considerados critérios de inclusão para participar do grupo: ser acompanhante de criança internada e concordar em participar do grupo.

O convite para a participação nos grupos de apoio foi feito por meio de cartazes dispostos na enfermaria e convites das estagiárias de psicologia, durante contatos e atendimentos individuais, ao longo da semana.

Na data de realização do grupo, antes dos encontros, as estagiárias retomavam o contato com os acompanhantes e refaziam o convite. Nessa oportunidade, os participantes eram esclarecidos sobre o caráter e objetivo do grupo, orientados quanto à liberdade para participar ou não da atividade e informados que, mesmo aceitando participar, poderiam recusar a continuar participando em qualquer momento, sem qualquer prejuízo na sua relação com a equipe ou com a instituição, bem como na continuidade de seu seguimento e tratamento de saúde. Foi garantido que a participação no grupo não traria complicações legais e que os procedimentos utilizados não ofereceriam riscos à saúde física e psicológica ou à dignidade do participante ou de sua família.

Para cada grupo, era feito um planejamento flexível, que poderia ser modificado a partir da demanda de seus integrantes. De maneira geral, os encontros previam três momentos: apresentação, desenvolvimento da dinâmica e momento de avaliação/ fechamento.

Apresentação: apresentação das coordenadoras, elucidação dos objetivos do grupo (oferecer um espaço de escuta, acolhimento, orientação e compartilhamento de sentimentos e vivências relacionados à hospitalização ou outras questões relativas ao momento de vida atual dos participantes) e apresentação dos participantes.

Dinâmica propriamente dita: atividades mobilizadoras propostas pelas coordenadoras (exemplificadas a seguir), como forma de facilitar a expressão dos sentimentos, a comunicação e a interação entre os participantes.

Avaliação e fechamento: momento de síntese do encontro, com promoção de reflexões sobre as percepções dos participantes acerca do que foi discutido e compartilhado, bem como levantamento de críticas e sugestões para os próximos encontros.

Exemplos de dinâmicas realizadas

As coordenadoras procuraram desenvolver dinâmicas de grupo adaptadas ao contexto, às características dos participantes e aos objetivos do grupo.

Palavras mobilizadoras: palavras escritas em cartelas (saúde, cansaço, esperança, tristeza, ansiedade, medo, apoio...) cujo objetivo era auxiliar os participantes a identificar e nomear o que sentiam, estimulando-os a falar sobre seu estado emocional. Em alguns encontros, os integrantes escolhiam uma palavra que traduzisse melhor o que estavam sentindo e eram convidados a partilhar com o grupo. Em outros encontros, os participantes sorteavam uma palavra e alguém, voluntariamente, falava o que ela suscitava. Os demais participantes eram convidados a falar sobre a mesma palavra/sentimento, com o objetivo de estimular a identificação e a coesão grupal entre os membros.

Polaridade dos sentimentos: cartelas com palavras que evocassem sentimentos duais (como ansiedade, tranquilidade, medo, coragem, fraqueza, força, tristeza, alegria, solidão, apoio, preocupação, alívio, dúvida, certeza...). Os participantes eram convidados a escolher uma palavra entre as dispostas e compartilhar com o grupo os sentimentos relacionados a ela. Posteriormente, eram auxiliados (pelas coordenadoras ou pelo grupo) a buscar de que forma a outra polaridade do sentimento esteve ou poderia estar presente na situação vivenciada, tendo como proposta a noção de que as mudanças e transformações são constantes em todos os aspectos da vida, ajudando-os a contemporizar suas angústias e relativizar suas vivências.

Pedido de ajuda: frase motivadora apresentada aos participantes - "Se eu pudesse fazer um pedido nesse momento, eu gostaria que..." - com o intuito de auxiliar as pessoas a expressar as suas necessidades e trabalhar as possibilidades e estratégias concretas de alcançar o que desejavam.

Individualidade/identificação com o outro: trata-se de uma dinâmica de caráter projetivo em que se utilizam gravuras diversas. Nessa dinâmica, os integrantes escolhiam uma figura entre várias que as coordenadoras dispunham sobre uma mesa e falavam sobre o que a gravura suscitava. A dinâmica teve como finalidade auxiliar na elaboração das vivências de cada um, bem como propiciar uma reflexão sobre o processo de escolha e de atribuição de significados às experiências de acordo com os próprios valores.

 

Discussão de resultados e análise dos dados

Foram realizados 15 encontros, com participação de dois a 13 membros a cada evento, perfazendo um total de 78 acompanhantes, com variação de idade entre 21 e 55 anos. Desse total, um acompanhante participou de quatro encontros em três internações distintas, dois participaram de dois encontros, e o restante, apenas de um encontro.

Cerca de 90% dos participantes eram constituídos por mães das crianças, e 10% eram pai, tia, avó, madrinha e amigo da família. Constituiu-se como um grupo aberto, por seus participantes serem diferentes a cada encontro, em decorrência do curto período de internação da maioria das crianças.

Na análise qualitativa dos relatos, procurou-se, primeiramente, catalogar algumas categorias temáticas que emergiram de forma espontânea em cada encontro, para, posteriormente, serem analisadas em conjunto, com objetivo de identificar padrões e singularidades com relação aos fatores terapêuticos trabalhados por Yalom (2006). Durante a análise, perceberam-se algumas categorias temáticas que indicaram fatores terapêuticos para a promoção da saúde mental ante o adoecimento, como: instilação da esperança, universalidade, empatia, compartilhamento de informações, altruísmo, catarse, comportamento imitativo positivo, fatores existenciais, coesão grupal, desenvolvimento da capacidade de expressão, identificação e apoio. Dessa forma, mostrou-se importante abordar separadamente esses tópicos/temas, embora se entrelacem e se complementem na prática.

Instilação da esperança

Em qualquer grupo, a instilação e a manutenção da esperança são fundamentais para incentivar a pessoa a permanecer no grupo para receber ajuda. É importante reforçar expectativas positivas, corrigir preconceitos, dar explicações sobre o poder do grupo para ajudar as pessoas (Oliveira, Medeiros, Brasil, Oliveira, & Munari, 2008).

No que diz respeito à reação da família ante o adoecimento, os resultados encontrados neste trabalho corroboram a noção de que o atendimento em grupo pode ser eficaz para o enfrentamento das dificuldades geradas pelo adoecimento da criança e também para o fortalecimento da resiliência pessoal e familiar, além da identidade de seus familiares como cuidadores, uma vez que é bastante frequente surgirem sentimentos de culpa, impotência e incompetência por causa da doença (Campos, 2004). Isso fica mais explícito com a fala da mãe D.:

Eu já passei pela mesma situação e te digo que tu tens que acreditar. Hoje meu filho tá bem, mas ele já passou por uma cirurgia cardíaca, correndo risco de vida. Eu tava sozinha, perdida dentro daquele hospital [...] mas as outras mães que já tinham passado pela mesma coisa me diziam que o meu filho ia se recuperar rápido como o delas. E foi.

Além das palavras de esperança, o relato de superação e a postura confiante dessa mãe eram acolhedores, fator fundamental naquele grupo para aplacar a ansiedade das outras mães e redimensionar a gravidade da doença de seus filhos. Segundo Yalom (2006, p. 28), "os membros de grupos homogêneos podem falar uns aos outros com uma autenticidade poderosa que vem de sua experiência em primeira mão, de maneira que os terapeutas talvez não consigam fazer". Mas também o terapeuta tem uma função importante na instilação da esperança, quando reforça expectativas positivas e corrige preconceitos negativos. Nesse sentido, observou-se que a dinâmica das polaridades mostrou-se bastante útil, pois permitiu que os participantes se percebessem num curso em movimento, desfazendo cristalizações, incitando-os a reconhecer que já passaram por situações difíceis antes e que, em algum momento, sairão da situação em que estão, pois a vida é mudança constante.

Universalidade

Muitas pessoas relatam que desejam participar de um grupo de apoio em virtude da oportunidade de compartilhar com outros semelhantes suas angústias; esse processo tem sido referido como universalidade. Algumas pessoas podem sentir vergonha e muitas vezes não revelam essas questões aos membros da família, muito menos a outros que não conhecem os seus problemas. Potenciais membros de um grupo são frequentemente atraídos para o tratamento em parte em razão do desejo de conhecer outras pessoas com dificuldades semelhantes às suas (Schmalischs, Bratiotis, & Muroff, 2010).

O fator da universalidade é muito presente nos grupos de apoio. Muitas pessoas carregam o pensamento de que são singulares em seus problemas e suas dores, e, a partir das falas dos participantes, a invalidação desses sentimentos de singularidade proporciona um grande alívio (Yalom, 2006). Foi comum surgirem durante os grupos, a partir de relatos semelhantes, as expressões: "estamos todos no mesmo barco" (mãe E.) e "eu passando por isso também" (mãe C.).

Nesse contexto, o psicólogo também oferece ajuda quando elenca, sem julgamentos, uma série de sentimentos e pensamentos comuns às pessoas nas situações vivenciadas pelos participantes, contextualizando e neutralizando, na medida do possível, sentimentos de culpa, raiva, desesperança, vingança, paranoia etc.

Empatia e compartilhamento de informações

Empatia é uma capacidade humana básica que, supostamente, serve para regular relações e apoiar a colaboração e coesão grupal. A empatia é a habilidade para responder afetivamente às emoções nos outros, ajudando a agir adaptativamente. É suposto que a empatia pode ser um importante fator para muitos comportamentos pró-sociais ou que fortalecem a coesão do grupo (Rieffe, Ketelaar, & Wiefferink, 2010). Num contexto de grupo, a fala de uma pessoa pode e deve ser aproveitada pelo coordenador do grupo de forma que sirva para todos, auxiliando as pessoas a se enxergar umas nas outras, diminuindo diferenças e aumentando a empatia (Finkel, 2009).

O compartilhamento de informações possui um papel importante nos grupos de apoio. Os acompanhantes relataram a diminuição da ansiedade ao ouvirem histórias semelhantes e receberem explicações e esclarecimentos quanto às questões que trouxeram para o grupo. Explicações e esclarecimentos funcionam como agentes terapêuticos, uma vez que ajudam as pessoas a retomar o controle sobre a situação, trazem estrutura e reduzem a incerteza e consequentemente a ansiedade (Yalom, 2006).

Uma das mães, G., relatou no momento de fechamento de um grupo: "Faz muito tempo que eu queria perguntar isso pra alguém e não podia imaginar que no hospital isso ia acontecer. [...] Há males que vem pra bem. [...] Só quando a gente pergunta é que alguém pode ajudar, né?". Segundo Rodrigues e Ribeiro (2011), a empatia parece ser aprimorada com o desenvolvimento de fatores sociocognitivos, o que é fundamental para o desenvolvimento social competente.

Altruísmo

Um elemento importante para essa modalidade de grupos é ter participantes vivenciando fases distintas do adoecimento de um filho, pois o processo de dar e receber apoio ocorre naturalmente, fortalecendo a esperança, o sentimento de universalidade e o altruísmo. Segundo Yalom (2006, p. 32), "os membros ganham por darem, não apenas por receberem ajuda como parte da sequência recíproca de dar e receber, mas também por se beneficiarem com algo que é intrínseco ao ato de dar". O altruísmo é um fator terapêutico, pois as pessoas precisam sentir que são necessárias e úteis e desfrutam de uma satisfação ao oferecerem ajuda aos outros. Uma mãe (L.) ilustra isso ao relatar, após um grupo, em um atendimento individual que "Também é bom poder contar para os outros a minha experiência e ver que isso ajuda". Percebeu-se que os acompanhantes assumem uma postura mais fortalecida quando se unem aos outros pais e proporcionam algum tipo de doação, seja uma informação, apoio emocional ou uma escuta receptiva. De fato, o altruísmo constitui um dos meios mais efetivos de superar sentimentos de inferioridade e promover autoconfiança entre os membros do grupo (Falcone et al., 2008).

Catarse

A catarse, como experiência e expressão de sentimentos, é importante e muitas vezes necessária nos processos terapêuticos, mas não o suficiente, sendo a capacidade de refletir sobre a própria experiência emocional essencial para o processo de mudança (Yalom, 2006). Foi bastante comum a experiência catártica nos grupos de apoio e normalmente relatada como positiva pelo participante, tal como a fala de uma mãe (H.) dirigida ao grupo: "Desculpa por ter falado tanto, mas foi muito bom pra mim. Tava trancado aqui" - levando a mão à garganta. No entanto, essa catarse requer cuidado e atenção, pois a experiência pode ser seguida de um sentimento de vergonha e de excesso de exposição perante pessoas desconhecidas, sendo esse sentimento expresso verbalmente ou não. Esse sentimento pode ser observado na fala de uma mãe em atendimento individual, após a participação no grupo: "Eu nunca falo isso pra ninguém. Eu guardo pra mim. Não sei se eu falei demais..." (mãe J.).

Para Ponciano, Cavalcanti e Carneiro (2010), a catarse, o relato dos conflitos e o compartilhamento de informações produzem um efeito terapêutico, psicoeducativo e de rede. Os autores, ao trabalharem com grupos multifamiliares em uma instituição psiquiátrica, identificaram que, quando as famílias se engajam em uma conversação que ajuda a construir uma comunidade de trocas de informação e apoio, isso contribui para a formação de uma rede social que diminui a sobrecarga e alivia o estresse.

Beneficiam-se em especial de trabalhos terapêuticos em grupo as pessoas que sofrem com algum isolamento social, apresentando dificuldades de comunicação interpessoal (Yalom, 2006). Ao se posicionarem perante o grupo, ficou evidente o fortalecimento da autoestima de alguns participantes. Uma mãe, F., por exemplo, depois de uma catarse num atendimento individual (em que revelou segredos e sua dificuldade em expressar seus sentimentos), participou ativamente de um grupo, sem nunca ter tido anteriormente a coragem de fazê-lo: "Eu não sou mais a mesma pessoa".

A possibilidade dada a cada um de expressar livremente suas ideias e seus sentimentos tem excelente efeito catártico e organizador do pensamento, permitindo compreensões que muitas vezes a pessoa não tivera até então. A livre discussão também tem efeito pedagógico, no sentido de educar o participante a ouvir o que os outros têm a dizer e de buscar uma forma, por meio da fala, de expressar e defender suas ideias (Klein & Guedes, 2008). Liu et al. (2008) destacam que os pacientes, comumente, verbalizam que para eles é difícil encontrar alguém para falar sobre suas emoções porque têm medo de fazer os membros da família se preocuparem com eles ou acham difícil que os membros da família compreendam suas emoções.

Comportamento imitativo

No entendimento de Yalom (2006), a imitação é um componente terapêutico efetivo. Mesmo que esse fator não tenha sido observado diretamente nesses grupos de apoio, acredita-se que ele possa ter seu efeito quando os membros observam a maneira como os outros lidam com seus problemas, seja de forma positiva e passível de um comportamento imitativo ou de forma negativa, percebendo os efeitos indesejáveis desse comportamento. A aprendizagem por imitação depende de um alto nível de identificação entre os participantes e de um clima de sustentação mútua, sendo possível encontrar esse tipo de aprendizagem em diversos contextos (Souza, Santos, Moura, Campos-Brustelo, & Saviolli, 2010). O estudo de Cade et al. (2009) evidencia que alguns comportamentos podem ser alterados por meio da aprendizagem vicária, citam relatos de participantes que demonstraram ter aprendido algo com os membros do grupo, mesmo não tendo discutido esse tema específico.

Fatores existenciais

Situações-limites, como a doença de um filho, podem levar as pessoas a refletir sobre questões da existência humana e a se confrontar com a sua própria condição limitada, de impotência ante a morte e de se perceberem sozinhas no enfrentamento da própria vida, por exemplo, apesar da proximidade de outras pessoas (Finkel, 2009). Os participantes do grupo de apoio, em momentos de vulnerabilidade, traziam questionamentos, buscavam e ofereciam conforto quanto a questões existenciais: "Mas por que é assim? Por que Deus faz isso com uma criança?" (mãe R.); "Apesar de eu não querer passar por nada disso, eu sei que Deus não dá uma cruz mais pesada do que a gente pode carregar" (mãe Q.).

De acordo com Campos (2004), as características dos grupos de suporte são constância, carinho, cuidado e comunicação. Cabe a esses grupos promover coesão e apoio, reforçar o self do indivíduo e elevar a autoestima e autoconfiança. A experiência com os grupos comprovou esses elementos. Como pano de fundo da repercussão terapêutica observada, identificou-se a capacidade de criar e manter um ambiente acolhedor e de sustentação àquilo que surge no grupo. Para Yalom (2006), nenhuma consideração técnica tem precedência sobre a atitude de interesse, aceitação e genuína empatia do terapeuta.

Coesão grupal

Constatações de vivências similares propiciam também um sentimento de coesão grupal, em que seus membros se sentirão conectados uns com os outros de alguma forma, ampliando a capacidade de aceitação e valorização dos outros e de si mesmos. A frequência e a permanência dos integrantes em um grupo propiciam sua coesão. Dependendo das características de um grupo, pode ocorrer de algum integrante não se sentir integrado no mesmo grau que os demais participantes, isso pode acontecer quando um determinado membro não partilha das mesmas características (por exemplo, idade, cultura, perspectiva e disponibilidade para mudança). Essa experiência pode ser contraproducente, de modo a prejudicar a fruição dos membros do grupo e levá-los possivelmente a deixar de participar (Schmalischs, Bratiotis, & Muroff, 2010). Embora o grupo de apoio exemplificado neste artigo tivesse como característica encontros com participantes diferentes a cada semana, constatou-se que os membros se conectavam muito rapidamente, facilitando a troca e identificação entre eles.

No que diz respeito ao fortalecimento dos elos entre os participantes do grupo, Mello (2000) relata que, por estarem juntos e discutindo problemas em comum, acabam desenvolvendo um laço afetivo que promove acolhimento. Esse fortalecimento é de extrema importância, na medida em que o hospital é quase sempre um lugar de sofrimento e dor, de espera e angústia, quando não de desolação e desesperança (Mota et al., 2006). Essa característica do grupo fica evidenciada na fala de uma das mães (N.) para outra mãe no fechamento do grupo: "Agora já me sinto à vontade de ir até teu quarto, mesmo que seja 22h, pra conversar e falar como estão as coisas. Antes do grupo eu não ia lá puxar papo contigo porque não te conhecia".

Desenvolvimento da capacidade de expressão

Pôde-se observar que, nos grupos, ocorria com frequência uma evolução da capacidade de se expressar e de organizar as ideias, e, para alguns participantes, o espaço para poder falar, pensar e ser ouvido se configurava como uma experiência impactante, na medida em que nunca haviam participado de nenhuma reunião formal e com pessoas desconhecidas em sua vida. O relato de uma mãe (V.), que frequentava o grupo pela terceira vez, serve como exemplo dessa capacidade de evolução:

Se vocês soubessem como foi o primeiro grupo que participei quando minha filha internou pela primeira vez, vocês não diriam que é a mesma pessoa. Eu morria de vergonha, não falei uma palavra, só o meu nome, e hoje, estou aqui, contando tudo isso pra vocês e com tranquilidade.

O desenvolvimento de competências de comunicação é essencial para o fortalecimento da autoeficácia, visto que permite a socialização e possibilita substituir pensamentos e comportamentos inadequados por outros mais eficazes (Erdman, 2009).

Mello (2000) observou que os participantes, ao final dos grupos, desenvolviam maior conscientização de seus direitos, como consequência natural da troca de informações e dos questionamentos surgidos, como direito de acesso a prontuários e decisão quanto aos assuntos que envolvem suas próprias vidas. Esse mesmo resultado foi encontrado nos grupos realizados na pediatria, em que se percebeu também que, além de maior conscientização, o grupo servia como um espaço de autorização e resgate de potencialidades.

A obtenção de mais informações sobre a doença e a apropriação delas corroboraram os resultados de Mello (2000). Percebeu-se que os participantes sentiam-se mais à vontade para falar o quanto desconheciam sobre a doença do filho, quando se davam conta que o outro também não sabia. Portanto, naquele espaço, eles tinham o direito de não saber e sentiam um alívio por não serem os únicos e, ao mesmo tempo, por encontrarem recursos de como saber mais a respeito da doença do filho. Exemplos disso são as seguintes falas: "Estou desesperada, meu marido diz que minha filha está com câncer, e os médicos disseram que ela está com celulite. Vocês sabem o que é celulite? É um câncer? Pode virar um câncer?" (O.); "Minha filha já teve celulite, mas não é grave se for tratada, mas eu sei como é, dá um desespero porque a gente não sabe o que é mesmo" (outra participante, P., comentando sobre a pergunta formulada pela mãe O.) e "Eles [equipe médica] não me falaram se a doença do meu filho era grave ou não, mas agora me sinto mais à vontade pra perguntar. Isso estava me fazendo mal" (B.).

Identificação e apoio

Com a identificação e o apoio que recebem no grupo, os participantes sentem-se mais apropriados e seguros para conversar com a equipe. Esse foi um aspecto que se destacou nos grupos realizados na pediatria, na medida em que esse setor passou a ser um espaço institucional de "autorização à expressão" dos acompanhantes. As coordenadoras do grupo representavam a instituição e, naquele espaço, estimulavam a verbalização dos acompanhantes, o que fazia com que eles se sentissem seguros, em vez de envergonhados, pela sua condição de não saber. As próprias coordenadoras, em algumas situações, não possuíam informação suficiente para responder a questões referentes a uma doença, mas utilizavam isso para mostrar como é natural não saber tudo, e, por isso, existe a necessidade de perguntar. Nessas oportunidades, os participantes eram incentivados a conversar com a equipe médica.

Nos grupos, verificaram-se diferentes níveis de ansiedade decorrentes do impacto da hospitalização e do tempo de internação. Em todo grupo, havia participantes que estavam familiarizados com a rotina hospitalar e outros que, por terem chegado recentemente, demonstravam um nível elevado de estresse. Esse aspecto também foi percebido por Mello (2000), que frisou que o grupo tem a capacidade de absorver novos membros e apoiá-los nessa nova situação, propiciando acolhimento. Essa constatação pode ser observada na fala de um participante (S.) para outro que estava internando seu filho no dia do grupo:

Pode acreditar, vai ficar tudo bem, eu entrei aqui na semana passada achando que meu mundo ia desabar, mas amanhã estou indo embora com minha filha curada. Sei que é difícil aceitar, eu também não acreditava, mas, só agora que já passei por isso, vejo que é possível dar tudo certo.

Assim, identificou-se que o trabalho de intervenção psicológica em grupo com os acompanhantes da pediatria serviu como um dispositivo de suporte social, em que houve trocas afetivas, cuidados mútuos e comunicação franca entre as pessoas, sempre com o objetivo de promover a coesão e o apoio entre todos os participantes. Tais elementos propiciam ao indivíduo um sentimento de acolhimento e apoio que lhe dá força para enfrentar o estresse ambiental, o qual está intimamente ligado com a maior ou menor presença de suportes sociais (Campos, 2000).

Da mesma forma que grupos com populações e objetivos terapêuticos distintos podem enfatizar diferentes conjuntos de fatores terapêuticos, dentro de um mesmo grupo os participantes podem beneficiar-se com diferentes fatores, dependendo de quais são suas necessidades e suas características individuais. O processo terapêutico envolvido nos grupos é complexo e estimula mudanças por meio da experiência, de modo que nenhum sistema ou conjunto de fatores pode explicar todo o processo (Yalom, 2006). Entretanto, a identificação de fatores benéficos que estão envolvidos na mudança dos membros do grupo auxilia na escolha de estratégias para promover experiências grupais mais efetivas. Uma vez identificados os fatores terapêuticos mais expressivos em determinado grupo, a escolha das dinâmicas passa a ser uma parte importante no direcionamento dado por quem coordena o grupo, visando ao melhor aproveitamento para os participantes no contexto.

Por meio dos grupos de apoio, mais pessoas têm a oportunidade de receber ajuda, fortalecer-se, como também conhecer o trabalho do psicólogo por meio de uma modalidade terapêutica em grupo, capaz de atingir um número maior de pessoas e de proporcionar condições terapêuticas possíveis somente nesse contexto, como a identificação entre os membros.

O psicólogo tem um papel importante no processo de humanização do atendimento nos hospitais. Como o adoecimento e a hospitalização de uma criança afetam diretamente o sistema familiar, mobilizam medos e angústias, alteram a rotina dela e comprometem o orçamento familiar, a família como um todo deve receber atenção e cuidado. Portanto, o atendimento à criança deve ser global, incluindo a participação de seus familiares que também são afetados e são importantes coadjuvantes na recuperação de sua saúde (Finkel, 2009). Suporte e apoio psicológico podem auxiliar para que a doença e a internação não sejam vivenciadas como fatores traumáticos pelas crianças e por suas famílias.

O grupo de apoio para acompanhantes de crianças internadas, como técnica de intervenção psicológica, é mais uma possibilidade de atuação do psicólogo no contexto hospitalar, que representa um recurso terapêutico importante na diminuição do sofrimento das famílias e, por consequência, das próprias crianças hospitalizadas. Constatou-se que os grupos de apoio podem oferecer suporte emocional, ser um espaço continente e de acolhimento das angústias, de esclarecimentos a respeito de intervenções médicas e procedimentos, bem como de dirimir dúvidas sobre a educação dos filhos e o desenvolvimento infantil, além de estimular os recursos internos de cada participante. Também pode constituir-se em um meio facilitador para a ocorrência de reflexão e tomada de consciência de aspectos importantes envolvidos no processo do adoecimento e da hospitalização das crianças.

Em todo contexto que envolva a saúde psíquica e emocional de sujeitos, deve-se ampliar o atendimento psicológico a grupos. No ambiente hospitalar, esse recurso é de extrema valia, pois, além de ser uma instância de suporte psicossocial (por incrementar o nível de informação dos envolvidos), é também um espaço de reflexão e descontração, apesar da rotina desgastante e, por vezes, angustiante. Avalia-se, portanto, que grupos de apoio em enfermarias podem ser explorados nos hospitais, com o intuito de oferecer uma melhor qualidade de assistência, com maior integralidade à saúde dos envolvidos.

 

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Endereço para correspondência:
Lecila Duarte Barbosa Oliveira
Departamento de Psicologia
Universidade Federal Santa Catarina
Campus Universitário, Trindade
Florianópolis - SC - Brasil. CEP: 88040-900
E-mail: lecila@cfd.ufsc.br

Submissão: 26/4/2011
Aceitação: 8/01/2013