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Psicologia: teoria e prática
versión impresa ISSN 1516-3687
Psicol. teor. prat. vol.15 no.1 São Paulo abr. 2013
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA
Avaliação psicológica no exercício físico: proposta de entrevistas para praticantes e instrutores
Psychological assessment in exercise: an interview guide for exercisers and instructors
Evaluación psicológica en el ejercicio: propuesta de entrevistas para practicantes e instructores
A. Rui Gomes
Escola de Psicologia - Universidade do Minho, Portugal
RESUMO
Praticar exercício físico está associado a vantagens ao nível psicológico, físico e social. No entanto, a prática desportiva na população é ainda reduzida e, adicionalmente, os níveis de abandono são muito significativos (Dishman, 1994; "Global strategy on diet, physical activity and health", 2004). Assim, torna-se importante compreender os fatores que estarão na origem destes problemas. Este trabalho propõe dois guiões de entrevista dirigidos a praticantes e instrutores de exercício, procurando facilitar uma análise mais aprofundada deste tema. Os domínios avaliados foram: 1. motivação, barreiras e benefícios (ambos os guiões); 2. atitudes, normas subjetivas, perceção de controle e intenção, experiência emocional, local de prática (guião para os praticantes); 3. fatores influenciadores do exercício, treino dos fatores psicológicos, condições de trabalho (guião para os instrutores). Os domínios avaliados permitem uma análise abrangente dos fatores psicológicos envolvidos na prática de exercício, sendo também possível efetuar um confronto dos dados obtidos com modelos conceptuais existentes na literatura sobre este tema.
Palavras-chave: exercício; prática profissional; entrevista psicológica; avaliação; estilo de vida sedentário.
ABSTRACT
The practice of physical activity is associated to psychological, physical and social benefits. However, in the general population sport practice is still very low and the levels of dropout are very significant (Dishman, 1994; "Global strategy on diet, physical activity and health", 2004). So it becomes important to understand the factors that can cause these problems. This paper proposes two interview guides for exercisers and instructors that facilitate a deeper analysis of the psychological factors involved in exercise. The assessed domains were: 1. motivation, barriers and benefits (both interview guides), 2. attitudes, subjective norms, perceived control and intention, emotional experience, setting of practice (interview guide for practitioners), 3. factors influencing exercise, training of psychological factors, work conditions (interview guide for instructors). The areas evaluated allow a comprehensive analysis of the psychological factors involved in exercise practice, being also possible to make a comparison of data obtained with conceptual models in the literature on this topic.
Keywords: exercise; professional practice; psychological interview; evaluation; sedentary lifestyle.
RESUMEN
El ejercicio físico tiene ventajas a nivel psicológico, físico y social pero la práctica deportiva es todavía reducida y los niveles de abandono son significativos (Dishman, 1994; "Global strategy on diet, physical activity and health", 2004). Por ello, la exploración de los factores que originan estos problemas es crucial. Este trabajo propone dos guías de entrevistas dirigidas a los practicantes e instructores de ejercicio, buscando contribuir a un análisis más profundo de este tema. Los dominios evaluados fueron los siguientes: 1. motivación, barreras y beneficios (ambos guiones); 2. actitudes, normas subjetivas, percepción de control e intención, experiencia emocional, lugar de práctica (guión para los practicantes); 3. factores que influyen en el ejercicio, entrenamiento de factores psicológicos, condiciones de trabajo (guión para los instructores). Las áreas evaluadas permiten un análisis completo de los factores psicológicos implicados en el ejercicio, siendo también posible hacer una comparación de los datos obtenidos con los modelos conceptuales en la literatura sobre este tema.
Palabras clave: ejercicio; práctica profesional; entrevista psicológica; evaluación; estilo de vida sedentario.
A prática de exercício físico regular tem sido associada a benefícios nos estados físicos e de saúde, passando pelo bem-estar psicológico e culminando na melhoria do funcionamento social do indivíduo (Willis & Campbell, 1992). Neste sentido, tanto os governos como as diferentes organizações de promoção da saúde têm vindo a apostar na divulgação das vantagens da adoção de estilos de vida saudáveis junto da população em geral, surgindo a prática do exercício físico como um dos fatores positivos implicados neste processo. A este nível, pode-se apontar a recomendação efetuada pela Organização Mundial de Saúde, apelando aos estados para adotarem uma estratégia global e concertada em torno da promoção de hábitos alimentares saudáveis, da atividade física e da saúde (Dishman, 1994; World Health Organization, 2004).
No entanto, apesar dos esforços efetuados neste sentido, a verdade é que nem os níveis de prática de exercício são satisfatórios e, ainda mais preocupante, também os níveis de manutenção nessa prática não são os desejáveis e esperados (Dishman, 1994; Willis & Campbell, 1992). A título de exemplo, no caso de Portugal perto de 30% da população afirma não realizar qualquer atividade física, estando estes valores em consonância com os 31% de sedentarismo observados para o conjunto dos países da União Europeia (Sjöström, Oja, & Hagströmer, 2006). No que se refere à manutenção da prática de exercício, os dados são também pouco animadores, pois o número de pessoas que fazem exercício de modo esporádico ou que chegam mesmo a desistir desta atividade pode ultrapassar os 50% (Dishman, 1994).
Assim sendo, uma das questões mais recentes e pertinentes da investigação no domínio do exercício físico prende-se com a análise dos fatores que podem explicar o início, manutenção e abandono desta atividade. A este nível, a investigação tem salientado que as facetas implicadas na explicação da prática de exercício são variadas, incluindo aspetos fisiológicos (por exemplo, índice de massa corporal), sociológicos (por exemplo, estatuto socioeconómico), psicológicos (por exemplo, motivação, atitudes) e situacionais (por exemplo, facilidade de acesso ao local de prática) (Dishman, 1994).
Este trabalho centra-se fundamentalmente nos fatores psicológicos e situacionais associados à prática de exercício físico, procurando fornecer dois instrumentos de recolha de dados dirigidos a praticantes de exercício físico e a instrutores desta atividade. De facto, um dos aspetos mais salientes no estudo das dimensões envolvidas no exercício físico prende-se com a escassez de instrumentos qualitativos de análise deste fenómeno. Esta situação é tão mais desconcertante pois, como referem Kimiecik e Blissmer (1998), as metodologias qualitativas podem possibilitar-nos uma avaliação alargada das facetas psicológicas envolvidas no comportamento de exercício, a que se junta o facto das pessoas tenderem a ser mais capazes de descrever oralmente o que pensam e sentem sobre a prática de exercício físico do que a preencher questionários sobre este tema.
Além disso, um outro constrangimento sugerido pelos autores prende-se com a escassez de investigação que analisa e integra diferentes modelos conceptuais, sendo este aspeto tão mais evidente pelo facto de existirem mais semelhanças do que diferenças entre eles (Kimiecik & Blissmer, 1998). Neste sentido, torna-se pertinente propor metodologias qualitativas dirigidas à compreensão dos fatores psicológicos influenciadores da prática de exercício físico, tanto da perspetiva dos praticantes como dos instrutores. No que se refere aos praticantes, o guião de entrevista proposto neste trabalho teve em consideração diferentes contributos teóricos que têm vindo a salientar a importância de variáveis pessoais, interpessoais e relacionais na prática desportiva (Fishbein & Ajzen, 2010; Hagger, 2010; Prochaska, Redding, Harlow, Rossi, & Velicer, 1994). Quanto aos instrutores, a proposta de guião de entrevista visa analisar a influência destes profissionais na promoção de estilos de vida ativos nos praticantes de exercício. Este aspeto é tão mais importante pois a investigação tem vindo a realçar que as ações assumidas por estes agentes desportivos são particularmente relevantes se quisermos compreender as razões que levam os praticantes a manterem-se nos programas de exercício físico (Loughead & Carron, 2004).
Objetivos do estudo
Tendo em consideração a informação exposta, os guiões de entrevistas incluídos neste trabalho propõem o estudo de alguns dos principais fatores psicológicos envolvidos na prática de exercício físico e visam possibilitar aos investigadores uma análise conceptual integrada das dimensões associadas a este comportamento de exercício. Mais concretamente, ambos os guiões de entrevista procuram:
• contribuir para a melhoria do conhecimento acerca dos fatores psicológicos associados à prática de exercício físico;
• contribuir para o desenvolvimento de estratégias de intervenção que visem promover a prática de exercício físico; e
• facilitar o desenvolvimento da investigação centrada na compreensão dos fatores psicológicos associados à prática de exercício físico por meio do recurso a metodologias qualitativas.
Método
Desenvolvimento dos instrumentos
O desenvolvimento dos guiões de entrevista iniciou-se com uma análise dos contributos teóricos que, por um lado, salientam a importância de variáveis pessoais, interpessoais e relacionais na prática desportiva e, por outro lado, auxiliam na formulação de questões específicas pertinentes para avaliar cada domínio em causa. Como refere Hagger (2010), um dos maiores desafios que se coloca hoje em dia na análise dos fatores psicológicos associados ao exercício físico prende-se com a necessidade de adotar perspetivas de estudo que conciliem as dimensões centrais dos diferentes modelos teóricos. Esta integração tem a vantagem de reduzir a redundância nas dimensões psicológi-cas estudadas e aumentar complementaridade na explicação dos processos psicológicos inerentes à prática de exercício. Assim sendo, o maior dilema colocado ao desenvolvimento dos guiões de entrevista prendeu-se com a necessidade destes serem suficientemente abrangentes nos domínios avaliados sem, no entanto, avançar com duas propostas de avaliação demasiado extensas e pouco funcionais do ponto de vista prático.
Procedimento de utilização dos instrumentos
Em termos da aplicação dos guiões, alguns aspetos devem merecer a atenção dos utilizadores. Começando pela idade de aplicação, no caso do guião dos praticantes propõe-se a fase da adolescência e o início da idade adulta como critérios mínimos de idade para utilização do mesmo. Para o guião dos instrutores, é apenas importante assegurar que o profissional tenha as qualificações devidas para o exercício da atividade.
No que se refere ao entrevistador, é necessário que este explique aos entrevistados quais os objetivos da utilização da entrevista, a confidencialidade no tratamento das informações recolhidas e o modo como os dados serão tratados e utilizados (por exemplo, para efeitos de investigação e/ou intervenção).
Em ambos os instrumentos existe uma sequência estabelecida na formulação das questões e dos domínios a explorar nas entrevistas, sugerindo-se assim uma natureza estruturada na recolha das informações. No entanto, esta definição dos domínios não limita a possibilidade do entrevistador explorar mais aprofundadamente cada uma das temáticas, recolhendo indicadores que complementem as questões sugeridas. Deste ponto de vista, os guiões aproximam-se das entrevistas semiestruturadas (Flick, 1998). Além disso, e em função dos interesses do entrevistador, pode-se utilizar separadamente cada uma das secções das entrevistas.
Já na colocação das questões sugeridas, o entrevistador deve começar por efetuar perguntas de natureza geral (por exemplo, "Que opinião têm [as pessoas que são importantes para si] sobre a prática de exercício físico?") evoluindo depois para níveis mais concretos, onde se pede ao entrevistado para clarificar uma determinada ideia (por exemplo, "As outras pessoas influenciam-no(a) a praticar exercício físico?"), até um nível mais específico, onde se solicita a enumeração de situações reais que elucidem a opinião transmitida (por exemplo, "Por favor, dê-me exemplos [do modo como os outros o/a influenciam na prática de exercício físico]"). Este procedimento de execução tem três vantagens: 1. centrar o guião de entrevista nas opiniões, sentimentos e desejos do próprio praticante; 2. evitar que o quadro de referência do entrevistador se sobreponha ao do entrevistado; e 2. obter um aprofundamento das temáticas em causa em cada secção da entrevista, tentando-se assim ultrapassar o ordenamento simplista das questões propostas.
Resultados
Domínios de avaliação propostos
O guião de entrevista para os praticantes procura recolher informações num número significativo de domínios, ajudando o entrevistador a compreender qual a experiência pessoal do praticante relativamente à atividade desportiva e quais os fatores que podem estar a promover (ou a debilitar) a vontade de fazer exercício. Assim sendo, propõem-se nove secções de recolha de informações no guião de entrevista para os praticantes: 1. informação pessoal e desportiva; 2. motivação para a prática desportiva; 3. atitudes face ao exercício físico; 4. normas subjetivas influenciadoras do comportamento de exercício; 5. perceção de controle e intenção de prática de exercício; 6. barreiras e benefícios na atividade desportiva; 7. experiência emocional decorrente da prática desportiva; 8. perceção sobre o local de prática de exercício; e 9. finalização.
No que se refere aos instrutores, é igualmente proposto um conjunto significativo de domínios que permitem ajudar o entrevistador a compreender qual a experiência pessoal do instrutor relativamente à atividade profissional e qual a importância dos fatores psicológicos na promoção da prática de exercício. Assim sendo, propõem-se oito secções de recolha de informações no guião de entrevista para os instrutores: 1. informação pessoal e desportiva; 2. motivação para a atividade de instrutor; 3. fatores influenciadores da prática de exercício físico; 4. treino dos fatores psicológicos na atividade profissional; 5. barreiras e benefícios na atividade desportiva dos praticantes; 6. motivação dos praticantes para o exercício físico; 7. avaliação das condições de trabalho; e 8. finalização.
Questões propostas por domínios de avaliação
Tendo por base os domínios de avaliação descritos anteriormente, foram elaboradas questões específicas direcionadas para a obtenção de informação relevante que permita ao avaliador compreender de que modo cada uma das dimensões avaliadas está relacionada com a prática de exercício físico. Assim sendo, analisamos de seguida as questões colocadas em cada secção em causa das entrevistas, podendo estas ser consultadas nos anexos 1 (guião de entrevista para os praticantes) e 2 (guião de entrevista para os instrutores).
Informação pessoal e desportiva
Ambas as entrevistas são iniciadas com a recolha de informações pessoais e desportivas dos praticantes e instrutores (ver secções 1 de ambos os guiões nos anexos 1 e 2). Ao nível pessoal, propõe-se uma avaliação de algumas características dos entrevistados (por exemplo, sexo, idade, estado civil, habilitações literárias e profissão). Do ponto de vista desportivo, no caso dos praticantes é importante compreender o tipo de modalidade(s) praticada(s), a frequência de exercício, o tempo de prática e o nível de esforço na atividade desportiva. Quanto aos instrutores, pretende-se compreender qual a qualificação profissional, o nível de envolvimento na atividade de instrutor, o tempo de experiência profissional, as modalidades ensinadas e o número de alunos/praticantes que dirige nos grupos de exercício. Todos estes dados ajudarão a caracterizar os entrevistados, sendo muito importantes para ajudar a compreender as informações recolhidas nas secções seguintes.
Motivação para a prática desportiva
A avaliação dos aspetos motivacionais representa um domínio central em ambos os guiões de entrevista. Assim, no caso dos instrutores procura-se não só compreender as razões e motivação para o exercício dessa atividade (Secção 2, Anexo 2), mas também avaliar a perceção que estes têm acerca da motivação para o exercício por parte dos praticantes (Secção 6, Anexo 2). No caso do guião dos praticantes, a Secção 1 procura igualmente recolher este tipo de informações (ver Anexo 1).
Atitudes, normas subjetivas, perceção de controle e intenção de prática de exercício físico
Estes domínios de avaliação são recolhidos de modo mais evidente no guião de entrevista dos praticantes (ver secções 3, 4 e 5, Anexo 1), efetuando-se uma avaliação individual de cada um destes domínios, clarificando-se o significado pessoal que o exercício possui para a pessoa (por exemplo, atitudes), o papel e a influência que as pessoas significativas para o praticante exercem sobre a sua atividade de exercício (por exemplo, normas subjetivas) e o sentimento de controle e de certeza que a pessoa julga possuir sobre a possibilidade de fazer efetivamente exercício (por exemplo, perceção de controle e intenção).
Barreiras e benefícios da prática de exercício físico
Este domínio de avaliação corresponde à Secção 6 no caso do guião para os praticantes (ver Anexo 1) e à Secção 5 no caso do guião dos instrutores (ver Anexo 2). O objetivo principal desta análise prende-se com a compreensão dos fatores que podem facilitar ou dificultar a prática de exercício físico, antes e depois de seu início. Além disso, também se procura clarificar aquilo que os praticantes e instrutores tentam fazer para diminuir as barreiras à atividade desportiva e assim incorporar o comportamento de exercício nos estilos de vida dos praticantes.
Experiência emocional na prática de exercício físico
Dada a importância dos fatores emocionais na prática de exercício físico, o guião de entrevista dos praticantes incluiu uma avaliação da experiência emocional em diferentes momentos da prática desportiva (por exemplo, antes, durante e após) e uma avaliação comparativa dos estados emocionais decorrentes dessa prática (ver Secção 7, Anexo 1).
Treino dos fatores psicológicos
O treino dos fatores psicológicos representa um domínio que importa avaliar do ponto de vista dos instrutores, seja em termos da opinião que estes têm sobre a influência dos aspetos mentais no exercício físico, seja em termos da sua tendência para incluírem os fatores psicológicos nas suas atividades de treino. Neste sentido, e apenas para o guião de entrevista dos instrutores (ver Anexo 2), propõem-se duas secções de recolha de informações. No primeiro caso, efetua-se uma análise dos aspetos gerais que podem influenciar a prática de exercício físico (Secção 3) para, de seguida, se centrar a análise na influência dos fatores psicológicos sobre essa mesma prática (Secção 3, questão 8). No domínio seguinte (Secção 4), exploram-se as estratégias psicológicas específicas usadas pelo instrutor no sentido de fortalecer a adesão ao exercício nos praticantes. Repare-se que neste caso a formulação das questões evolui de um nível geral (questão 9: importância dos fatores psicológicos no dia-a-dia de trabalho) para um nível mais específico de recolha de informações (questões 10 a 12). Estas últimas questões só serão colocadas caso o instrutor indique que trabalha os fatores psicológicos na sua prática profissional. Caso não o faça, não fará sentido analisar o tipo de estratégias que utiliza, sob pena das respostas não terem uma relação efetiva com a sua atividade de instrutor. Seja como for, ao colocarem-se estas duas secções no guião de entrevista procura-se aumentar o conhecimento acerca da importância dos fatores psicológicos na prática de exercício físico e, talvez mais importante, averiguar quais as estratégias utilizadas pelos instrutores para promoverem a manutenção e o empenhamento desportivo dos praticantes.
Condições de trabalho e do local de prática desportiva
No que se refere às condições de trabalho, procura-se saber no caso dos instrutores quais as circunstâncias em que exercem a sua atividade profissional, observando-se os fatores facilitadores e prejudicais desta prática (Secção 7, Anexo 2). Quanto aos praticantes, a Secção 8 (ver Anexo 2) analisa as condições do local de prática desportiva. Neste caso, analisam-se dois aspetos distintos, um mais relacionado com as características do local de atividade física (questões 20 e 21) e outro mais dirigido aos relacionamentos mantidos nesse mesmo local (questões 22 e 23).
Finalização das entrevistas
As questões relativas à finalização das entrevistas (Secção 9 no guião de entrevista para os praticantes e Secção 8 para os instrutores) estão formuladas do mesmo modo, ou seja, analisam a possibilidade do entrevistado poder colocar alguma dúvida acerca da entrevista efetuada ou acrescentar alguma informação que considere relevante. A última questão só deve ser colocada caso o investigador opte por esta estratégia de validação das informações recolhidas, solicitando a análise e eventual correção da transcrição da entrevista realizada pelo entrevistado (por exemplo, praticante ou instrutor) (ver anexos 1 e 2).
Discussão
O desenvolvimento dos dois guiões de entrevista visou possibilitar a disponibilização de ferramentas úteis no sentido de se melhorar a compreensão dos fatores psicológicos envolvidos nas atividades de exercício físico.
Assim sendo, e começando pelos aspetos motivacionais, procurou-se avaliar no guião dos praticantes as razões específicas para a prática de exercício físico e no caso do guião dos instrutores procurou-se igualmente avaliar as razões e competências para o exercício desta atividade profissional. A inclusão destes domínios em ambos os guiões justifica-se pelo facto de se saber que as pessoas podem ter razões distintas para se envolverem numa dada atividade e daí resultarem experiências psicológicas distintas. Por exemplo, de acordo com a teoria da autodeterminação (Ryan & Deci, 2000), a vantagem de avaliarmos os motivos que as pessoas dão para efetuarem uma tarefa é o facto de podermos observar até que ponto elas usam estilos mais autorregulados ou intrínsecos de motivação ou estilos mais externos ou extrínsecos de motivação, fazendo com isto variar o seu nível de autodeterminação.
Além disso, também devemos referir a preocupação em compreender estes fatores do ponto de vista temporal (por exemplo, possibilidade dos fatores motivacionais se alterarem ao longo do tempo) e qual estatuto do praticante face ao exercício físico (por exemplo, razões para iniciar e para se manter na atividade desportiva e possíveis razões para o abandono da mesma). Neste caso, devemos ter em consideração que a mudança de um comportamento pode evoluir por etapas que implicam processos psicológicos distintos (cf. Prochaska et al., 1994). Assim sendo, em ambos os guiões propõe-se uma análise dos fatores motivacionais implicados na fase prévia ao comportamento de exercício, durante a fase de prática de exercício, e, no caso do guião dos instrutores, ainda se incluem questões relacionadas com as razões que podem levar ao abandono desportivo. Convém referir que, no caso da entrevista dos praticantes, existe a possibilidade de avaliarmos os objetivos que a pessoa formula para a sua prática desportiva. A este nível, e seguindo novamente as indicações da literatura, existem dados sobre a relação entre os estilos motivacionais dos praticantes, os objetivos formulados e a experiência psicológica na prática de exercício físico (cf. Sebire, Standage, & Vansteenkiste, 2009).
No que se refere a atitudes, normas subjetivas, perceção de controle e intenção de prática de exercício físico, estes domínios de avaliação foram incluídos devido ao papel central que lhes tem sido concedido pela literatura. A este nível, a teoria do comportamento planeado tem sido uma das propostas mais referidas para explicar a forma como efetuámos uma mudança comportamental (Fishbein & Ajzen, 2010). De acordo com esta teoria, a intenção em assumir uma dada ação representa o preditor fundamental do comportamento subsequente, sendo esta última influenciada por três facetas: as crenças acerca das consequências do comportamento (que originam as atitudes face a esse comportamento), as crenças sobre as expectativas normativas dos outros (que originam as normas subjetivas) e as crenças acerca dos fatores que podem facilitar ou impedir o comportamento em causa (que originam a perceção de controle) (Fishbein & Ajzen, 2010). Assim sendo, as crenças sobre os resultados do comportamento produzem uma atitude negativa ou positiva face a esse comportamento, as crenças normativas indicarão a perceção do indivíduo acerca da pressão social face ao comportamento a assumir, e as crenças sobre os fatores facilitadores ou debilitadores do comportamento representarão a medida de perceção de controle do indivíduo sobre esse mesmo comportamento. Quando se incluem todos estes domínios no guião de entrevista dos participantes, torna-se possível para o entrevistador confrontar as informações com as indicações conceptuais da literatura.
No que se refere às barreiras e aos benefícios da prática de exercício físico, uma das propostas que pode ajudar a integrar e compreender a informação recolhida nos guiões refere-se ao modelo transteórico dos estádios de mudança (Prochaska et al., 1994). Neste caso, são sugeridas diferentes fases na mudança nos comportamentos de saúde, existindo evidência para o facto dos fatores positivos associados à nova ação a assumir (benefícios) se imporem face aos fatores negativos da mudança (barreiras) durante a mudança comportamental. Neste sentido, com os guiões propostos pode-se efetuar uma análise dos processos de mudança subjacentes ao comportamento de exercício físico, desde a sua preparação até à sua implementação.
Um outro domínio importante avaliado no guião dos participantes prende-se com a experiência emocional na prática de exercício físico. O estudo dos fatores emocionais envolvidos no exercício físico não tem sido um tema muito abordado na literatura. Este aspeto pode ser explicado pelo facto dos modelos conceptuais nem sempre atribuírem aos processos emocionais um papel relevante. Tal como assinalam Conner e Armitage (1998), uma das limitações da teoria do comportamento planeado refere-se precisamente à exclusão dos processos afetivos, sendo estes cruciais se quisermos perceber as intenções das pessoas face a um dado comportamento. Apesar destas limitações, existem indicações sobre a influência das emoções nas atitudes e intenções de mudança comportamental (Bagozzi, Moore, & Leone, 2004). Aplicando esta ideia ao caso do exercício, Mohiyeddini, Pauli e Bauer (2009) afirmam que a antecipação de emoções positivas face à atividade física pode facilitar a transformação das intenções de prática em ações nesse sentido e, talvez mais importante, pode aumentar a frequência e duração do comportamento de exercício naqueles indivíduos que já iniciaram esta atividade.
A perceção dos instrutores acerca dos fatores que promovem uma maior adesão das pessoas ao exercício físico, bem como o modo como estes trabalham os fatores psicológicos junto dos praticantes de exercício, também foi objeto de análise no respetivo guião de entrevista. A razão para incluir estes aspetos prende-se com a evidência de que os fatores psicológicos assumem um papel importante nos contextos desportivos, sendo de admitir igualmente a sua influência em contextos de exercício físico. Por exemplo, ao nível do desporto de competição, têm vindo a ser propostos programas de treino de competências psicológicas, que se referem à prática sistemática e consistente de fatores mentais, com o propósito de aumentar o rendimento dos atletas, os seus níveis de diversão e prazer e promover uma maior satisfação com a atividade desportiva (Weinberg & Gould, 2011). As vantagens em implementar este tipo de intervenção justifica-se pelo facto da investigação indicar que os atletas com maior sucesso desportivo evidenciam uma melhor preparação psicológica, demonstrando um uso variado de estratégias mentais, como sejam, a formulação de objetivos, a visualização mental, o controle da ativação física e dos pensamentos, o uso sistemático de rotinas mentais, etc. (Williams & Krane, 2001). No que se refere ao contexto de exercício físico, existem indicações da literatura que sugerem o papel importante do instrutor na manutenção dos seus alunos nas classes de exercício físico (Rinne & Toropainen, 1998), podendo este funcionar como um agente promotor dos fatores psicológicos associados à prática de exercício. Os resultados destes estudos permitiram concluir que a demonstração de preocupação pessoal e o apoio por parte do instrutor face aos praticantes representam elementos cruciais na satisfação e adesão aos programas de exercício. Tendo em consideração estes aspetos, a utilização do guião de entrevista permite então avaliar o modo como as competências psicológicas são encaradas e trabalhadas pelos instrutores junto dos praticantes de exercício.
Finalmente, os guiões terminam com uma avaliação do local de prática de exercício (praticantes) e das condições de trabalho (instrutores). Neste último caso, o objetivo é perceber até que ponto o instrutor possui condições que facilitam ou debilitam a sua ação, de modo a poder fazer face ao que é esperado pelos outros relativamente à sua atividade. A este nível, existem indicações da literatura sobre a necessidade de quem gere equipas desportivas procurar obter uma congruência entre, por um lado, o seu estilo habitual de ação e, por outro lado, aquilo que é esperado pela organização onde trabalha e o que é preferido pelos membros da equipa (Chelladurai, 2012). Como não abundam indicações sobre estes aspetos no caso dos instrutores de exercício, as questões colocadas podem facilitar um entendimento daquilo que pode promover ou prejudicar a sua eficácia profissional. No que se refere aos praticantes, propõe-se uma avaliação das condições do local de prática desportiva, seja ao nível das características existentes, seja ao nível do relacionamento mantido com as outras pessoas. Neste caso, existem indicações da literatura sobre a tendência para se fazer exercício físico e a existência de locais de treino aprazíveis, bem como de condições materiais apropriadas (Willis & Campbell, 1992). Quanto aos relacionamentos mantidos com os outros, existem igualmente dados da investigação acerca da influência do apoio social na promoção da manutenção no exercício físico (Raglin, 2001).
O principal objetivo do desenvolvimento dos dois guiões de entrevista prendeu-se com a necessidade de existirem metodologias de avaliação qualitativas centradas nos domínios psicológicos propostos pelos modelos conceptuais explicativos do comportamento de exercício físico. Tal como apontam Kimiecik e Blissmer (1998), o desenvolvimento de entrevistas constitui um método a ter em consideração na avaliação dos diferentes domínios psicológicos envolvidos nos processos de mudança do comportamento de exercício. Como limitações deste estudo, devemos apontar os aspetos práticos envolvidos na utilização de guiões de entrevista, nomeadamente a necessidade do entrevistador dominar as competências verbais e não-verbais do relacionamento interpessoal de modo a explorar de modo eficaz o ponto de vista de cada entrevistado, a necessidade do entrevistador dominar teoricamente os conceitos abordados ao longo das entrevistas de modo a conseguir confrontar os dados obtidos com a literatura existente, e a necessidade do entrevistador ter competências de análise de dados qualitativos de modo a conseguir extrapolar dos dados obtidos as conclusões mais adequadas.
Em síntese, e apesar destes aspetos limitadores do uso de entrevistas, os guiões propostos procuram facilitar a investigação e intervenção na área do exercício físico, esperando-se que possam representar ferramentas úteis para os investigadores interessados em compreender os fatores psicológicos envolvidos na prática de exercício, tanto da perspetiva dos praticantes como dos instrutores.
Referências
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Endereço para correspondência:
A. Rui Gomes
Universidade do Minho
Escola de Psicologia
Campus de Gualtar
Braga - Portugal. CEP: 4710-057
E-mail: rgomes@psi.uminho.pt
Submissão: 18/12/2010
Aceitação: 04/12/2012