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Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva

versão impressa ISSN 1517-5545

Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.16 no.1 São Paulo abr. 2014

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

Comportamento alimentar e transtorno alimentar: uma discussão de variáveis determinantes da anorexia e da bulimia

 

Eating behavior and eating disorders: a discussion of determinants variables of anorexia and bulimia

 

 

Paola E. M. AlmeidaI; Maria Luisa GuedesI; Ana Carolina RossiII; Barbara TolosaII; Barbara RodriguesII; Bruna TchalekianII; Gabriella AbudII; Isabel ResendeII; Jessica EstevesII; Julia ArnoldiII; Luisa AgostiII; Luis Felipe CruzII; Luisa CapucciII; Maria Fernanda CastroII; Mariane TroyanoII; Paola PitonII; Rafael SantosII; Renata SiqueiraII; Zoe Barossi

IPontifícia Universidade Católica de São Paulo
IIAlunos da Disciplina Eletiva de Pesquisa "Investigação de variáveis responsáveis pela origem e manutenção de comportamentos de anorexia e bulimia", ministrada na PUC-SP, ano de 2011, pelas professoras Paola Almeida e Maria Luisa Guedes.

 

 


RESUMO

O presente trabalho apresenta uma revisão crítica dos critérios diagnósticos e modelos de determinação da anorexia e bulimia, a partir de publicações veiculadas no International Journal of Eating Disorders. Questiona, particularmente, a noção de determinação interna destes transtornos, enfatizando a questão da fobia de peso (fat phobia) como um exemplo deste modo de interpretação. A recuperação do modelo biocomportamental de anorexia induzida por atividade física (activicty anorexia), e do conjunto de experimentos que o embasam, pretende incitar a consideração de explicações alternativas aos transtornos alimentares, sem a necessidade de apelo para variáveis cognitivas ou emocionais como determinantes destes transtornos.

Palavras-chave: transtornos alimentares; fobia de peso; anorexia induzida por atividade.


ABSTRACT

This paper presents a critical review of diagnostic criteria and determination models of anorexia and bulimia, used in the International Journal of Eating Disorders. It is particularly questioning the notion of internal determination of these disorders, emphasizing this mode of interpretation with an analysis of the weight phobia (fat phobia). The recovery of this biobehavioral model of anorexia induced by physical activity, and the set of experiments that underlie it, aims to bring the consideration of alternative explanations for eating disorders without the need to appeal to emotional or cognitive variables as determinants of these disorders.

Keywords: eating disorders; weight phobia; activity anorexia.


 

 

O presente trabalho pretende discutir a determinação dos chamados transtornos alimentares, a partir de uma revisão crítica da literatura. A revisão concentra-se, particularmente, na análise de trabalhos publicados no International Journal of Eating Disorders, periódico que reúne artigos de diferentes abordagens da psicologia, e representa a publicação oficial da Academia para Transtornos Alimentares (Academy for Eating Disorders [AED]) - associação profissional comprometida com a pesquisa, educação, tratamento e prevenção dos transtornos alimentares no mundo. A busca por artigos se deu a partir da inclusão dos descritores "fatphobia" e "estudos transculturais", sendo avaliados artigos de livre acesso ao público, publicados nos últimos 20 anos. Após a leitura inicial do resumo, optou-se por incluir na análise estudos que permitissem traçar o panorama acerca das características dos problemas alimentares em diferentes grupos, excluindo aqueles interessados na validação ou generalidade dos instrumentos para diagnóstico clínico.

Nos artigos selecionados buscou-se identificar variações na apresentação da recusa alimentar em diferentes culturas, levando ao questionamento da fobia de peso como critério diagnóstico para os transtornos alimentares. Modelos animais que investigam a determinação de alterações alimentares foram apresentados, a fim de validar interpretações alternativas para o entendimento destes transtornos.

Os transtornos alimentares aqui considerados foram aqueles descritos como anorexia e bulimia nervosa, previstos pelos manuais CID 10 (Organização Mundial de Saúde [OMS], 1992) e DSM-IV (American Psychiatric Association [APA], 1994) a partir de critérios que incluem: alterações de peso e padrão alimentar, distorção da percepção corporal, medo de engordar (fat phobia) e, no caso da anorexia, amenorreia. No DSM-IV (APA), a anorexia foi subdividida em tipo purgativo (vômitos autoinduzidos, uso de laxantes e diuréticos) ou restritivo (exercícios excessivos e jejum); e a bulimia em tipo purgativo (métodos purgativos) e não purgativo (exercícios em excesso). Dado que tal categorização não foi assumida pelo CID 10 (OMS), críticas acerca de uma possível sobreposição entre os diagnósticos têm sido apontadas (Claudino & Borges, 2002), indicando a possibilidade de classificações distintas, a depender do uso dos diferentes manuais.

A falta de objetividade de outros critérios assumidos nos manuais também tem sido motivo de críticas entre os pesquisadores. Na anorexia, os critérios de distorção de imagem corporal, presença de amenorreia e o medo de engordar (fat phobia) vêm sendo questionados, por não estarem necessariamente presentes em todos os casos (Becker, Thomas & Pike, 2009; Hsu, Lee & Psych, 1993). Na bulimia, a concepção de compulsão alimentar vem sendo discutida, dada a arbitrariedade de sua classificação em termos de frequência, duração e quantidade de alimento necessário para caracterizar um episódio de excesso alimentar, critérios que divergem conforme o avaliador ou entrevistado (Claudino & Borges, 2002).

A crítica ao critério de fat phobia tem recebido, talvez, o maior destaque na literatura, devido à descrição de diversos casos em que os indivíduos apresentam características tipicamente descritas na anorexia, mas não recebem o diagnóstico clínico por não referirem "medo de engordar" como motivo principal para recusa de alimentos. Tais resultados parecem sugerir que embora fat phobia possa estar presente em grande parte dos casos, este não seria um aspecto necessário ou determinante para o diagnóstico (Becker et al., 2009; Hsu et al., 1993), devendo ser revista sua inclusão dentre os critérios de classificação em próximas versões dos referidos manuais.

A observação de que anorexia nervosa pode ser reconhecida tanto na presença quanto na ausência de fat phobia foi inicialmente divulgada entre pacientes de culturas orientais (Hsu et al., 1993), e posteriormente confirmada nas culturas do Ocidente em cerca de 20% dos casos estudados (Becker et al., 2009; Carter & Bewell-Weiss, 2011).

Uma vez que fat phobia seria mais frequente na cultura ocidental, ou entre indivíduos que receberam influência desta cultura, diferentes estudos passaram a discutir o impacto de variáveis sociais na determinação de características distintas da anorexia. Os resultados de tais estudos geraram críticas ao modelo de classificação atual, considerado generalista e etnocêntrico (Hsu & Lee, 1991).

Em um destes estudos, adolescentes nascidas no sul da Ásia (e posteriormente moradoras no Reino Unido), foram comparadas com adolescentes britânicas em relação ao seu histórico de peso, hábitos alimentares e relacionamento familiar (Tareen, Hodes & Rangel, 2005). Como critério de seleção das participantes, foi exigido apenas observação de peso corporal abaixo do esperado (IMC < 18), e uma história de perda de peso autoinduzida, sem a necessidade de adequação aos demais critérios diagnósticos exigidos para identificação da anorexia. A comparação dos resultados revelou não apenas que fat phobia foi menos referida no grupo de adolescentes asiáticas, como também que uma menor preocupação com comida e menor adesão a exercícios físicos foram relatadas por estas participantes, quando comparadas ao grupo de adolescentes britânicas. Resultados semelhantes foram descritos por Lee e Lock (2007) em um estudo que avaliou as características clínicas de pacientes americanas e asiáticas internadas com diagnóstico de anorexia. De modo geral, as asiáticas referiram menor preocupação com peso, alimentação, e ausência de fat phobia, embora os autores tenham discutido a possibilidade de que o relato das participantes possa ter omitido ou minimizado informações importantes.

Diferentes artigos apontam, por outro lado, o crescimento de referências à fat phobia em pessoas de culturas orientais. No artigo de Abou-Saleh, Younis e Karim (1998), por exemplo, foram relatados cinco casos de integrantes da cultura árabe que apresentavam características típicas dos casos de transtornos alimentares. Entrevistas clínicas iniciais foram conduzidas sem o apoio de qualquer instrumento padronizado, sendo posteriormente comparadas aos critérios para o diagnóstico clínico. Constatou-se que fat phobia foi relatada por quatro dos cinco pacientes entrevistados, sendo que o único a não apresentar tal característica foi um participante nômade, que vivia no deserto e que era, portanto, o menos provável de ter entrado em contato com outra cultura que não a árabe.

Diferentes estudos discutiram, também, a importância da exposição às práticas da cultura ocidental na determinação dos problemas alimentares no oriente. No estudo de Davis e Katzman (1998) foram comparados dados referentes ao funcionamento psicológico (depressão/autoestima/busca pela magreza/insatisfação corporal) e hábitos de dieta e exercícios entre estudantes chineses moradores de Hong Kong e dos Estados Unidos. Os dados foram coletados a partir de questionários autoaplicáveis, e os resultados indicaram que, indiferente da região estudada, tanto homens quanto mulheres relataram intensa insatisfação corporal. Entre os estudantes de Hong Kong, maior adesão a dietas foi relatada por mulheres, enquanto homens moradores dos EUA descreveram dedicar-se mais aos exercícios físicos, quando as duas populações foram comparadas. Em um estudo posterior, Davis e Katzman (1999) continuaram a avaliar o efeito do contato com a cultura americana sobre o comportamento de estudantes chineses moradores dos EUA. Neste estudo, 197 participantes foram avaliados, a partir de uma metodologia similar àquela acima descrita. Entre os instrumentos utilizados, foi incluída uma escala que avaliava a chamada aculturação (influência de uma cultura sobre a outra, e seus prováveis efeitos), sendo as respostas dos participantes categorizadas como sugerindo alta ou baixa aculturação, conforme indicassem maior ou menor adesão aos hábitos de vida americanos. Os resultados descritos indicaram que, entre mulheres, maior grau de aculturação esteve correlacionado a uma pontuação indicativa de problemas alimentares no Inventário de Transtornos Alimentares (Eating Disorders Inventory [EDI]), e a um maior senso de ineficácia pessoal.

Em acordo com este conjunto de dados, o estudo de Greenberg, Cwikel e Mirsky (2007) identificou uma correlação positiva entre maior pontuação no Teste de Atitudes Alimentares (Eating Atitudes Test [EAT]) e maior tempo de imigração de mulheres provenientes da antiga União Soviética, que passaram a estudar em Israel. Estudos que apontam maior preocupação com peso e alimentação entre mulheres de países asiáticos, quando comparadas com mulheres australianas (Mond, Chen & Kumar, 2010), e a descrição de fat phobia também entre homens na China (Tong et al., 2005), parecem confirmar a mudança no perfil dos transtornos alimentares no oriente.

Os estudos descritos, e outros cujos resultados apontam para mesma direção (Humphry e Ricciardelli, 2003), vêm sendo discutidos na literatura como evidência de que os problemas alimentares seriam decorrentes do choque cultural ("culture-reactive syndrome") provocado pela valorização de diferentes padrões físicos em uma sociedade. Programas de televisão e de música, frequente contato com estrangeiros nas cidades de maior potencial econômico, entre outras variáveis, foram discutidos como situações que possivelmente facilitariam a aceitação dos padrões estéticos ocidentais, favorecendo mudanças no padrão de alimentação e de práticas de exercícios no oriente, acompanhadas (ou não) pelo referido "medo de engordar".

Na meta-análise conduzida por Becker et al. (2009), estudos que investigaram diferenças entre grupo de pacientes com ou sem fat phobia foram avaliados, e os resultados apontaram que maior peso pré-mórbido foi relatado por participantes que referiram fat phobia, o que parece condizente com a interpretação de que a recusa alimentar seria, em alguns casos, uma resposta de fuga/esquiva às críticas recebidas em um ambiente social que valoriza o baixo peso (especificando, talvez, o chamado "choque cultural"). Ausência de fat phobia, por outro lado, foi correlacionada a menores índices de psicopatologia em alguns estudos (e.g. Carter & Bewell-Weiss, 2011), enquanto outros apontam resultados contrários (e.g. Santonastaso et al., 2009).

Um fato curioso, no entanto, põe em dúvida a suposição de que anorexia sem fat phobia seria menos severa ou debilitadora do que sua variante típica: em um estudo que avaliou índices de mortalidade entre pacientes com anorexia, bulimia ou transtornos alimentares não especificadas, maiores riscos de morte, especialmente por suicídio, foram descritos para o último grupo - aquele em que fat phobia seria menos frequentemente relatada (Crow, Peterson, Swanson, Raymond, Specker, Eckert, & Mitchell, 2009). Dados contraditórios foram descritos posteriormente, após a meta-análise que avaliou 36 estudos sobre o tema, e resultou na indicação de que anorexia típica seria potencialmente mais perigosa (Carter & Bewell-Weiss, 2011). Ainda que em discussão, os dados parecem alertar para dois importantes aspectos acerca do diagnóstico e tratamento destes transtornos: 1) O possível viés produzido pelo uso de instrumentos padronizados (EAT, EDI) na avaliação da severidade dos casos, já que maior pontuação e severidade seria obtida por aqueles que respondem afirmativamente às questões acerca de preocupações com peso, alimentação e medo de engordar, e 2 ) O fato de que pouco sabemos sobre as causas que determinam a recusa alimentar na ausência de fat phobia, o que poderia resultar em altos índices de mortalidade, dada a ineficiência dos tratamentos planejados.

 

O MODELO BIOCOMPORTAMENTAL DE ANOREXIA INDUZIDA POR ATIVIDADE FÍSICA

Em oposição aos modelos que invocam a fat phobia como aspecto determinante dos transtornos alimentares, o modelo biocomportamental de anorexia induzida por atividade física, apresentado nos estudos de Pierce e Epling (1984) e Pierce, Epling e Boer (1986), entende que a anorexia seria determinada pela combinação de atividade física e restrição alimentar. Este modelo resulta da interpretação dos resultados de diferentes estudos, que apontam que maiores taxas de atividade física foram seguidas pela redução de consumo alimentar em ratos, o que ficou conhecido como anorexia induzida por atividade física, ou activicty anorexia.

Segundo Pierce e Epling (1984), a evolução dos transtornos alimentares seria, assim, resultante da combinação de fatores biológicos e ambientais. A imposição de ideais estéticos emagrecidos, valorizados principalmente em culturas do Ocidente, incentivaria a adesão a dietas e exercícios, favorecendo alterações biológicas que desencadeariam e perpetuariam o ciclo de anorexia.

No estudo de Pierce e Epling (1984), ratos em regime de duas horas diárias de alimentação tiveram acesso à roda de atividades por períodos de tempo variados, de 2h, 6h, 12h, 18h e 22h. Os resultados demostraram que, quanto maior o tempo de acesso à roda, maior a taxa de exercícios dos animais, e menor o peso e a quantidade de comida ingerida quando havia oportunidade. Em outro estudo, Pierce, Epling e Boer (1986) avaliaram também a possibilidade de que atividade física e privação/saciação alimentar pudessem alterar o valor reforçador um do outro. Neste estudo, foi avaliado o valor reforçador da atividade física para os ratos, quando estavam submetidos ou não à restrição alimentar. Os resultados revelaram que sete dos nove sujeitos da pesquisa responderam mais vezes em uma barra que dava acesso à roda, e passaram mais tempo em atividade, na condição em que houve restrição do que na de oferta livre de alimentos. Quando os autores avaliaram se, por outro lado, a saciação na roda de atividades poderia alterar o valor reforçador do alimento, os resultados confirmaram a relação esperada: foram alcançadas menores taxas de resposta de pressão à barra que liberava o alimento após exercício espontâneo ou forçado na roda de atividades.

Para interpretar tais resultados, os pesquisadores apresentaram uma hipótese evolucionista, sugerindo que a anorexia seria o resultado de um modo de funcionamento dos organismos, selecionado por garantir a sobrevivência daqueles que, em situações de escassez alimentar, aumentassem a atividade física para locomoção a regiões de alimentação mais fértil.

O modelo propõe, assim, que qualquer condição que leve à combinação de exercícios e dieta seria, então, potencialmente perigosa ao desenvolvimento da anorexia. Contingências sociais poderiam, então, incentivar tal combinação, possivelmente acompanhada por reações emocionais produzidas pela punição ao ganho de peso, e descritas como fat phobia. O modelo sugere, no entanto, que condições pessoais distintas que promovam tal combinação poderiam, também, desencadear o ciclo de anorexia induzida por atividade física. Em alguns destes casos, ausência de fat phobia poderia ser não apenas esperada, como explicada.

Recentemente, Brown, Avena e Hoebel (2008) demonstram a possibilidade de reversão da anorexia induzida por atividade física, a partir da ingestão de alimentos altamente gordurosos. Os autores tinham por hipótese que tais alimentos aumentariam a motivação para a obtenção de alimento, favorecendo a ingestão, mesmo quando uma rotina de atividade física fosse mantida. Em um conjunto de quatro experimentos, os autores avaliaram o efeito da introdução de diferentes dietas (ricas em gordura, açúcar ou apenas de gosto açucarado), sobre o padrão alimentar de ratos ativos ou sedentários. Como resultado, a recuperação do peso dos ratos ativos foi observada apenas quando gordura animal foi apresentada, indicando que a anorexia induzida por atividade física poderia ser evitada ou ter seu desenvolvimento retardado por meio deste tipo de dieta. O dado parece particularmente interessante para o entendimento de casos em que se observa a combinação de restrição alimentar e exercícios, sem que se note o desenvolvimento da anorexia, devido, talvez, à qualidade dos alimentos ingeridos (como entre esportistas, por exemplo).

Uma dieta rica em alimentos palatáveis parece, também, envolvida com a determinação de um padrão alimentar considerado exagerado, sendo uma das variáveis manipuladas nos estudos experimentais que investigam a compulsão alimentar. O estudo realizado por Hagan e Moss (1996) investigou os efeitos de uma história de privação alimentar e de realimentação com alimentos de diferentes qualidades sobre o comportamento alimentar de sujeitos experimentais. Trinta e dois ratos participaram do estudo, divididos em quatro grupos: um que passava por períodos alternados de quatro dias de restrição alimentar, seguidos por dois dias de realimentação com alimento palatável (bolacha doce); outro que passava por períodos de restrição alimentar, mas recebia ração regular durante os dias de realimentação; e um terceiro e quarto grupo que não passavam por períodos de restrição, recebendo comida doce ou regular, respectivamente, durante os dias destinados à realimentação dos demais grupos. Após doze ciclos de restrição-realimentação, 30 dias de normalização da dieta foram programados, e testes foram conduzidos a fim de avaliar a influência da história alimentar de cada grupo sobre o padrão de ingestão alimentar. Os resultados indicaram que uma história de restrição alimentar promoveu o aumento no consumo alimentar dos sujeitos, quando comparados aos grupos sem restrição. O acesso à comida palatável determinou, por sua vez, o maior consumo de alimento doce durante os testes e, particularmente, para o grupo submetido também à restrição alimentar, promoveu o consumo exagerado de alimentos, mesmo após um período de 24 horas de oferta livre de ração, ou seja, mesmo na ausência de privação. Em conjunto, os testes indicam um efeito duradouro da história de restrição alimentar e realimentação com alimento palatável, dado considerado importante para a determinação de um padrão alimentar compulsivo, análogo àquele observado nos casos de bulimia.

Os dados resultantes das pesquisas com animais parecem, então, indicar variáveis favorecedoras do desenvolvimento dos transtornos alimentares. Pesquisas com humanos têm confirmado a relação existente entre o desenvolvimento de problemas alimentares e um histórico de restrição alimentar e excesso de atividade física (Davis, Kennedy, Ravelski & Dionne, 1994; Schebendach et al., 2007), indicando que intervenções diretamente focadas na regularização destes padrões seriam desejáveis e prioritárias.

Espera-se, por fim, que as colocações assumidas no presente artigo permitam questionar a necessidade de parte dos critérios internalistas atualmente assumidos para classificação da anorexia e bulimia, ao mesmo tempo em que indiquem a necessidade de planejamento de práticas terapêuticas e culturais concentradas no manejo das variáveis ambientais relevantes.

Pesquisas que permitam a revisão de resultados obtidos em intervenções que respeitem tais características, e a extensão da presente análise para outras fontes bibliográficas seriam, então, particularmente interessantes.

 

REFERÊNCIAS

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Submissão em 20 de outubro de 2012
Modificado em 31 de março de 2013
Aceito em 9 de abril de 2013