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Cadernos de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento
Print version ISSN 1519-0307On-line version ISSN 1809-4139
Cad. Pós-Grad. Distúrb. Desenvolv. vol.16 no.2 São Paulo Dec. 2016
https://doi.org/10.5935/1809-4139.20160010
ARTIGOS
Transtono do espectro autista: qualidade de vida e estresse em cuidadores e/ou familiares - revisão de literatura
Autism spectrum disorder: quality of life and caregivers stress - literture review
Transtorno del espectro autista: calidad de vida y el estrés en cuidadores - revisión de la literatura
Fernanda Gonçalves Miele; Cibelle Albuquerque de la Higuera Amato
Universidade Presbiteriana Mackenzie
RESUMO
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno do neurodesenvolvimento caracterizado por prejuízos na comunicação, interação social e comportamental. De maneira geral, a família e os cuidadores são os primeiros a identificar alterações comportamentais na criança. As famílias que possuem crianças com o transtorno do espectro autista apresentam um elevado nível de preocupação em relação ao bem-estar de seus filhos, ao período e as condições sob as quais permanecerão assistidos. Dessa forma, a família é considerada um agente importante no tratamento e suporte, sendo parte integrante do tratamento. O presente estudo tem como objetivo analisar artigos relacionados ao estresse e qualidade de vida de familiares e/ou cuidadores de crianças com TEA. Os artigos analisados destacam a importância do acompanhamento de pais e cuidadores de crianças com TEA, indicando possíveis fatores que podem interferir no estresse e qualidade de vida destes. A partir da análise dos artigos apresentada concluiu-se pela necessidade de que sejam realizadas mais pesquisas sobre os impactos do TEA na qualidade de vida e estresse de cuidadores e familiares no Brasil, de forma a contemplar a realidade social e as características socioeconômicas do país.
Palavras-chaves: Transtorno do Espectro Autista, qualidade de vida, estresse, família, cuidadores.
ABSTRACT
Autism Spectrum Disorder (ASD) is a neurodevelopmental disorder characterized by impairment in communication, social and behavioral interaction. In general, the family and caregivers are the first to identify behavioral changes in the child. Families who have children with autism spectrum disorder have a high level of concern about their children's well-being, the period and the conditions under which they will remain assisted. In this way, the family is considered an important agent in the treatment and support, being an integral part of the treatment. The present study aims to analyze articles related to stress and quality of life of relatives and / or caregivers of children with ASD. The articles analyzed highlight the importance of monitoring parents and caregivers of children with ASD, indicating possible factors that may interfere with their stress and quality of life. Based on the analysis of the presented articles, it was concluded that there is a need for more research on the impact of ASD on the quality of life and stress of caregivers and family members in Brazil, in order to contemplate the social reality and socioeconomic characteristics of the country.
Keywords: Autistic Spectrum Disorder, quality of life, stress, family, caregivers.
RESUMEN
Trastorno del espectro autista (TEA) es un trastorno neurológico caracterizado por alteraciones en la comunicación, la interacción social y el comportamiento. En general, la familia y los cuidadores son los primeros en identificar los cambios de comportamiento en los niños. Las familias que tienen niños con TEA tienen un alto nivel de preocupación por el bienestar de sus hijos, el período y las condiciones bajo las cuales permanecerán asistida. Por lo tanto, la familia se considera un agente importante en el tratamiento y el apoyo, siendo una parte integral del tratamiento. Este estudio tiene como objetivo analizar los artículos relacionados con el estrés y la calidad de vida de la familia y / los cuidadores de niños con TEA. Los estudios analizados ponen de relieve la importancia de acompañar a los padres y cuidadores de niños con TEA, lo que indica posibles factores que pueden influir en el estrés y la calidad de vida de estos. A partir del análisis de los artículos presentados se concluye por la necesidad de realizar más investigaciones sobre los efectos de té en la calidad de vida y el estrés de los cuidadores y familiares en Brasil, con el fin de contemplar la realidad social y las características socio-económicas del país
Palabras claves: trastorno del espectro autista, calidad de vida, el estrés, la familia, los cuidadores.
1 - INTRODUÇÃO
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno do neurodesenvolvimento, caracterizado por alterações qualitativas e quantitativas na comunicação, interação social e no comportamento, em diferentes graus de severidade (SCHWARTZMAN, 2003, 2011; SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2013; APA, 2013).
Encontra-se no TEA uma grande variabilidade, intensidade e forma de expressão sintomatológica. A classificação dentro do espectro do TEA considera o impacto do transtorno diante do grau de interação social e comunicação do paciente (RUTTER, 2011).
Entre doze e vinte e quatro meses de vida da criança é possível observar os primeiros sintomas relacionados ao TEA. O desenvolvimento inicial da fala é tardio ou pouco desenvolvido e, em alguns casos, pode apresentar regressões (CHAKRABART, 2009; CHAWARKA et. al 2007; NOTERDAEME & HUTZELMEYER - NICKELES, 2010; MINISTERIO DA SAÚDE, 2014).
Comportamentos atípicos, repetitivos e estereotipados podem ser observados e devem ser analisados por parte de familiares e especialistas pois, apesar de estarem presentes também em outros quadros clínicos, podem indicar a presença do TEA. (SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2013, MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014).
Observa-se em alguns casos a existência de comorbidades relacionadas ao TEA. Como exemplo, destaca-se a Deficiência Intelectual, caracterizada pela presença de déficit na área social, cognitiva e adaptativa, que pode incluir alterações comportamentais e estereotipias (MINISTERIO DA SAÚDE, 2014).
A detecção precoce dos sinais e sintomas é fundamental pois, quando mais cedo for iniciado o tratamento, melhores serão os resultados alcançados no desenvolvimento cognitivo, habilidades sociais e linguagem (LAMPREIA, 2007; REICHOW, 2012).
De maneira geral, são os pais e familiares que identificam os primeiros sinais e sintomas do transtorno. Dessa forma, caso o familiar identifique algum comportamento atípico este deverá ser investigado (COONROD E STONE, 2004).
Devido a sua determinação multifatorial (fatores genéticos e ambientais), o diagnóstico ocorre por meio da observação dos comportamentos apresentados e do histórico do desenvolvimento da criança, por meio da anamnese (BARBARO, 2009; DALEY, 2004; HOWLING, MAGEATI & CHARMAN, 2009; REICHOW, 2011).
A Organização Mundial da Saúde (OMS) orienta a utilização dos manuais CID-10 ou DSM-V como critério classificatório para o TEA e demais doenças. (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1997).
A Classificação Estatística Internacional de Doenças e de Problemas Relacionados à Saúde, (CID-10), é a versão Brasileira da Internacional Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems, décima revisão, da Organização Mundial da Saúde. É utilizada para classificar doenças e outros tipos de problemas de saúde, incluindo o óbito, servindo de registro para a compilação dos dados estatísticos de mortalidade e morbidade populacional (ORGANIZACAO MUNDIAL DA SAUDE, 1997).
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Americana (DSM) foi criado pela Associação Americana de Psiquiatria com o objetivo de orientar os profissionais da área da saúde acerca dos transtornos mentais e auxiliar na elaboração de diagnósticos. Desde a sua primeira publicação, o DSM passou por cinco revisões. Em 2013, o DSM foi reformulado (DSM-5), tornando-se mais seguro para aplicação em pesquisas e em atendimentos clínicos. (ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA, ARAUJO & NETO, 2014).
No Brasil, os sistemas de classificação adotados pelo Ministério da Saúde para o TEA são o manual da CID e o Manual da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) ( MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). Segundo Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, o DSM pode ser utilizado como uma ferramenta alternativa para a classificação de doenças (SECRETARIA DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2013).
A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, desenvolvida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), é uma classificação internacional desenvolvida para a aplicação em vários aspectos da saúde, através da unificação e padronização da linguagem, permitindo uma melhor comunicação entre todas as disciplinas (ORGANIZACAO MUNDIAL DA SAUDE, 1997)
Particularmente, a CIF proporciona ao profissional da saúde uma ampla visão a respeito da funcionalidade do indivíduo, qualificando o desempenho e capacidade, podendo ser uma ferramenta complementar que pode ser utilizada no diagnóstico do TEA (MINISTERIO DA SAÚDE, 2014).
A demanda de cuidados os quais uma criança com TEA necessita e as mudanças na rotina dos familiares tais como, hábitos, gastos financeiros, relações sociais e profissionais, podem ser percebidas como um evento estressor para os membros da família, cuidadores e pessoas mais próximas, podendo acarretar em uma sobrecarga física e mental. (BOSA, 2001; FAVERO, 2005; MARTINS et al., 2003).
Segundo KOEGEL e cols., famílias que possuem crianças com o transtorno do espectro autista apresentam um elevado nível de preocupação em relação ao bem-estar de seus filhos, principalmente quando não puderem mais suprir suas necessidades. (KOEGEL et al., 1996).
Segundo CADMAN e col., familiares e cuidadores de crianças com TEA apresentam níveis elevados de estresse se comparados às famílias de crianças com o desenvolvimento típico e, dessa forma, influenciando a qualidade de vida familiar (CADMAN et al., 2012).
A qualidade dos serviços prestados, a existência de redes de apoio, a disponibilidade de recursos financeiros e a gravidade sintomatológica da criança são outros fatores que podem influenciar na qualidade de vida familiar. (KOEGEL et al., 1996, JONES, et al., 2016, KONSTANTAREAS, 1991).
Segundo ASSUMPCAO E SPROVIERI (2001), a forma como a família lida com a doença será influenciada pela aceitação, interpretação e pela maneira com a qual os indivíduos lidam com os desafios aos quais são submetidos. Um bom funcionamento psicossocial representa um bom quadro de equilíbrio na coesão e adaptabilidade. Ou seja, uma boa capacidade de adequação da família frente as situações potencialmente estressantes.
ZAIDMAN-ZAIT e cols. destacaram a importância do suporte social a ser oferecido à família da criança com TEA indicando que o nível de estresse está relacionado a qualidade do suporte social disponibilizado aos envolvidos (ZAIDMAN-ZAIT et al., 2016). As mulheres, em sua grande maioria, são responsáveis pelos cuidados familiares da criança com TEA (THIENGO et. al., 2015; SANTOS, 2010; CAMPOS E SOARES, 2005).
Programas educacionais que proporcionem um conforto emocional com foco no manejo do estresse e das emoções são de grande importância para o bem-estar e saúde materno e familiar. Grupos de orientação que possam oferecer o suporte necessário a essas mães e familiares são importantes porque a disponibilidade de informações relacionadas ao TEA ajuda a promover e conscientizar os familiares acerca da necessidade de oferecimento de suporte social. (SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2013; MOXOTÓ E MALAGRIS, 2015).
O apoio psicológico aos pais e cuidadores, a promoção e o desenvolvimento de técnicas de abordagem e o esclarecimento sobre os limites da criança com o transtorno do espectro autista, são necessários para se obter uma melhor instrumentalização do dia a dia e diminuição no nível de estresse. (KULOGLU-AKSAZ 1994, SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2013).
Dessa forma, o presente estudo teve como objetivo realizar uma pesquisa bibliográfica acerca de artigos relacionados ao Transtorno do Espectro Autista, estresse e qualidade de vida, identificar as variáveis que influenciam a qualidade de vida e estresse de familiares e cuidadores e avaliar o impacto que o acesso à informação exerce sobre o suporte social oferecido a família da criança com TEA.
2 - MÉTODO
O presente estudo compreende-se como estudo exploratório, descritivo. Trata-se de revisão da literatura sobre o estresse e a qualidade de vida de cuidadores e/ou familiares de indivíduos com TEA.
A pesquisa foi realizada em outubro de 2016 em duas bases de dados - SCIELO e PUBMED.
Para a busca foram considerados os seguintes descritores de acordo com os descritores em Ciências da Saúde (DeCS): "transtorno do espectro autista" e "estresse psicológico", "transtorno do espectro autista" e "qualidade de vida", "transtorno autista" e "estresse psicológico", "transtorno autista" e "qualidade de vida". Os descritores também foram em inglês, na mesma ordem: "autism spectrum disorder" and "stress phychological", "autism spectrum disorder" and "quality of life", "autistic disorder" and "stress psychological" e "autistic disorder" and "quality of life". Os descritores autismo (autismo) e estresse (stress) também foram incluídos embora não façam parte do DeCS.
Os critérios de inclusão para seleção dos artigos foram: Artigos que possuíam os descritores acima citados em seus títulos, período de publicação a partir de 2011, ter a publicação na íntegra, ser de acesso livre.
Foram excluídos os artigos duplicados, depois foi realizada a leitura do título e resumo de acordo com os critérios de inclusão, e excluídos os que não atendiam a estes critérios. Todos os artigos apresentados nos resultados foram lidos na íntegra e foi realizada a análise crítica dos mesmos.
3 - RESULTADOS E DISCUSSÃO
Um total de 16 artigos foram selecionados a partir dos critérios mencionados, que contemplavam o objetivo da pesquisa. Esta verificação ocorreu por meio da busca por título, autor e data.
O quadro a seguir faz uma síntese de todos os 16 artigos selecionados para este estudo (Quadro 1).
Considerando as bases de dados pesquisadas (SCIELO e PUBMED) e os descritores utilizados, foi possível encontrar apenas 03 trabalhos nacionais relacionados a qualidade de vida e estresse de familiares e cuidadores de crianças com TEA. Apesar de não contemplar todas as bases de dados disponíveis, os resultados da pesquisa indicam a existência de poucos estudos relacionados ao tema apontando para a importância do desenvolvimento de novas pesquisas.
Todos os artigos estudados apontaram para a existência de alguns aspectos que influenciam na qualidade de vida e estresse percebido por familiares e cuidadores de crianças com TEA. Aspectos como a severidade do caso, depressão, ansiedade, otimismo, aceitação e estratégias de enfrentamento influenciaram sistematicamente nesses dois constructos.
O questionário de qualidade de vida desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) foi utilizado em 5 estudos, sendo os autores DARDAS et.al. (2014), responsável por dois deles, WISSESSATHORN et.al. (2013), TEKINARSLAN et.al. (2013) e o estudo nacional de VIEIRA e FERNANDES (2013). O questionário de qualidade de vida da OMS foi desenvolvido para mensurar em diferentes culturas a qualidade de vida com o objetivo de avaliar o impacto da doença e dos sintomas na qualidade de vida (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1997).
Verificou-se variações e validações de instrumentos voltados à análise dos cuidadores que tinham por objetivo tornar o instrumento de pesquisa mais específico à população estudada.
O questionário de qualidade de vida (WHOQL-BREF), mais utilizado nos estudos pesquisados para a análise da qualidade de vida de familiares e cuidadores de crianças com TEA, é um instrumento desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde que visa avaliar a qualidade de vida sobe uma perspectiva universalizada.
O estudo de HOEFMAN e cols. teve como objetivo descrever os impactos vivenciados pelos pais devido aos cuidados voltados aos filhos com TEA por meio da aplicação do questionário CarerQoL (care-related quality of life - questionário de qualidade de vida adaptados aos cuidadores), investigando também o impacto sentido por parte dos cuidadores frente aos cuidados oferecido a criança com TEA. Segundo LUTOMSKI e cols., o questionário CarerQoL combina a avaliação da sobrecarga em sete dimensões (LUTOMSKI et. al., 2015). Os resultados indicaram que, quanto maior for a sobrecarga sentida pelos familiares menor será a qualidade de vida grupo.
CADMAN e col. apontaram para um elevado nível de estresse apresentado pelas famílias e cuidadores de crianças com TEA se comparados às famílias de crianças com o desenvolvimento típico. Desta forma, a qualidade de vida destas famílias apresenta-se prejudicadas (CADMAN et al., 2012).
OIEN E EISEMAN investigaram, por meio do relato de experiências de mães de crianças com TEA, que os problemas de comunicação, comportamentos e interesses apresentados pela criança impactaram na qualidade de vida materna. Dessa forma, a disponibilidade de informações relacionadas ao TEA ajuda a promover e conscientizar os familiares acerca do suporte social que deve ser oferecido, de forma a proporcionar um conforto emocional com foco no manejo do estresse e das emoções. Tais ações são de grande importância para o bem-estar e saúde materno e familiar (OIEN E EISEMAN, 2016)
No estudo realizado entre 2014 e 2015 DARDAS E AHMAD pesquisaram quais preditores influenciaram na qualidade de vida de mães e pais de crianças com TEA e quais estratégias de enfrentamento (coping) mediaram ou moderaram o estresse e a qualidade de vida neste estudo. Ressaltou-se que a angústia paterna foi um preditor presente em ambos os sexos e a aceitação paterna, o suporte social e anulação paterna influenciaram na qualidade de vida e no estresse (DARDAS E AHMAD, 2014, 2015).
Estudos realizados anteriormente por KOEGEL e cols., corroboram para os resultados apresentados por DARDAS E AHMAD. Em seu estudo, concluíram que famílias que possuem crianças com o transtorno do espectro autista apresentaram um elevado nível de preocupação em relação ao bem-estar de seus filhos, principalmente quando não puderem mais suprir suas necessidades. (KOEGEL et al., 1996). Fatores como a disponibilidade de recursos financeiros e a gravidade sintomatológica da criança com TEA também influenciam na qualidade de vida e estresse familiar (KOEGEL et al., 1996, JONES, et al., 2016, KONSTANTAREAS, 1991).
Outros pesquisadores como MCSTAY e cols. e WISESSATHORN e cols., ressaltaram o impacto negativo que os comportamentos não adaptativos externalizados pela criança com TEA causam no contexto familiar e destacaram a promoção do desenvolvimento de medidas de enfrentamento como mediadoras entre a severidade do quadro apresentado pela criança e qualidade de vida experimentada pelos pais.
Os 3 estudos nacionais (VIEIRA e FERNANDES 2013, MOXOTÓ e MALAGRIS 2015 e SEGEREN e FERNANDES 2016) abordam avaliação da qualidade de vida e estresse não só de pais, mas também de irmãos além de propor uma intervenção para minimizar os efeitos do estresse nas mães. Este é um dado a ser destacado já que na grande maioria as pesquisas avaliam, quantificam o stress e a qualidade de vida, mas, quase nunca trazem propostas, estratégias de como lidar, reduzir com os danos do estresse e melhora da qualidade de vida.
Desta forma, destaca-se a importância do estabelecimento de redes de apoio competentes que possam oferecer aos pais e cuidadores apoio psicológico promovendo o desenvolvimento de técnicas de instrumentalização diária e esclarecendo metas e objetivos para a criança com TEA. (KULOGLU-AKSAZ 1994, SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2013).
A importância do desenvolvimento de estratégias de enfrentamento também foi demonstrada nos estudos realizados por RAYAN E AHMAD. Investigou-se os efeitos da intervenção realizada em relação ao nível de atenção paterno. A melhora nos domínios psicológicos, saúde e qualidade de vida apontados pelo estudo corroboram com as proposições de KULOGLU-AKSAZ anteriormente destacadas.
KOUSHA e cols. investigaram os índices de qualidade de vida, depressão e ansiedade em mães iranianas de crianças com o transtorno do espectro autista. Destacou-se elevados índices de ansiedade e depressão bem como baixos índices de qualidade de vida. A severidade do quadro e a idade da criança foram outros fatores que influenciaram nos índices de qualidade de vida, depressão e estresse materno (KOUSHA et. al. 2016).
JOHNSON e cols., avaliaram a relação entre o estresse, suporte familiar e a saúde física e mental dos pais de crianças com o transtorno de espectro autista. Em seus resultados, as mulheres apresentaram maiores níveis de estresse. Destaca-se também a diferença entre a percepção materna e paterna sobre o funcionamento familiar (JOHNSON et al., 2011).
THIENGO e cols., SANTOS e CAMPOS E SOARES, revelaram que as mulheres, em sua maioria, são as responsáveis pelos cuidados familiares também pelo encaminhamento dos tratamentos realizados pela criança com TEA (THIENGO et. al., 2015; SANTOS, 2010; CAMPOS E SOARES, 2005).
Esses apontamentos corroboram com a importância do estabelecimento de redes de apoio sociais e psicológicas que ofereçam a essas mães um suporte necessário para o enfrentamento e desenvolvimento de estratégias, visando uma melhor adaptação, qualidade de vida e redução do estresse.
O estudo EAPEN e cols., desenvolveu e contextualizou a escala de qualidade de vida adaptada para pais e cuidadores de crianças com TEA. O resultado da pesquisa confirmou a validade da adaptação do questionário de qualidade de vida, objetivando uma melhor avaliação do perfil pesquisado (EAPEN et. al., 2014).
O desenvolvimento ou a adaptação mostram-se fundamentais para uma melhor forma de mensuração dos índices de qualidade e vida, tornando mais assertiva a averiguação do objeto de pesquisa. Novas técnicas podem ser aplicadas com maior eficiência visando-se o bem-estar dos pais e cuidadores de crianças com TEA.
HOEFMAN e cols., por meio da aplicação do questionário específico desenvolvido para cuidadores, descreveram o impacto vivenciado pelos pais devido aos cuidados prestados ao filho com TEA. Os resultados apontaram para a relação existente entre a sobrecarga e a qualidade de vida, inferindo que quanto maior for a sobrecarga experimentada menor será a qualidade de vida experimentada pelos pais.
Os apontamentos de BOSA, 2001, FAVERO, 2005 e MARTINS et al., 2003 corroboram com estudo desenvolvido por HOEFMAN e cols., pois afirmam que os cuidados voltados à uma criança com TEA são constantes e exigem de pais e cuidadores uma adaptação em seus contextos diários. Ocorrem mudanças nas rotinas familiares, hábitos, relações sociais que podem ser percebidas como estressoras de forma a acarretar em uma sobrecarga física e mental.
4 - CONCLUSÃO
Praticamente todos os artigos encontrados referem-se a estudos com o objetivo de desenvolver ou adaptar novos instrumentos de pesquisa e mensuração voltados à qualidade de vida, estresse e sobrecarga e reforçar as conclusões de estudos a anteriormente realizados.
Otimismo, estratégias de enfrentamento (coping), depressão, ansiedade, grau de severidade apresenta pela criança com TEA, aceitação por parte dos pais e familiares e a condição socioeconômica foram apontadas pelos estudos analisados, como variáveis que interferem na qualidade de vida, estresse e sobrecarga de familiares de crianças com o transtorno do espectro autista.
A necessidade de desenvolvimento de novos estudos na área voltados à família e cuidadores de crianças com TEA reforçam a importância dessa temática. A introdução da família como parte integrante do reconhecimento, encaminhamento, atendimento e manutenção da criança no processo de atendimento é essencial, sendo considerada parte integrante do processo.
Dessa forma, além dos cuidados necessários voltados a criança com TEA, se faz necessário que a família e cuidadores sejam englobados nesse processo. O entendimento do transtorno, a mobilização familiar, a readequação de hábitos e rotina e o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento são fundamentais para o bom encaminhamento terapêutico e envolvimento da família no processo.
O estresse e sobrecarga sentindo pela família e a consequente interferência na qualidade de vida desse grupo apontam para a necessidade de desenvolvimento de novas técnicas terapêuticas de enfrentamento e direcionamento familiar.
Novas pesquisas sobre os impactos do TEA na qualidade de vida, estresse e sobrecarga dos familiares e cuidadores no Brasil tornam-se necessárias principalmente pela importância das características socioeconômicas de nosso país, para que se amplie o conhecimento acerca dos impactos do TEA no grupo familiar e cuidadores e as diretrizes a serem tomadas a partir desses resultados.
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Recebido em: 27/10/2016
Aceito em: 31/01/2017