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Revista Psicologia Política

versão impressa ISSN 1519-549Xversão On-line ISSN 2175-1390

Rev. psicol. polít. vol.16 no.35 São Paulo jan./abr. 2016

 

ARTIGOS

 

Homofobia na Escola: algumas posições assumidas por instituições de Psicologia no Brasil

 

Homophobia at School: some positions assumed by institutions of Psychology in Brazil

 

La Homofobia en las Escuelas: algunas posiciones tomadas por las instituciones Psicología en Brasil

 

Homophobie à l'École : quelques positions assumées par les institutions de Psychologie au Brésil

 

 

Hélen Rimet Alves de AlmeidaI; Luciana Maria MaiaII; Hamilton Viana ChavesIII

IPsicóloga; Historiadora; Mestre e Doutoranda em Psicologia pela Universidade de Fortaleza – UNIFOR, Fortaleza, Ceará, Brasil. helen.rimet@ig.com.br
IIPsicóloga; Doutora em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB; Professora do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade de Fortaleza – UNIFOR, Fortaleza, Ceará, Brasil. lumariamaia@hotmail.com
IIIPsicólogo do Instituto Federal do Ceará – IFCE; Doutor em Educação pela Universidade Federal do Ceará – UFC; Professor do Curso de Psicologia da Universidade de Fortaleza – UNIFOR, Fortaleza, Ceará, Brasil. hamilton@unifor.br

 

 


RESUMO

Homofobia é o termo usado para caracterizar qualquer tipo de discriminação dirigida a homossexuais, devendo ser analisada nos contextos sociais em que ocorre. O objetivo deste artigo é analisar as possíveis contribuições da psicologia relativas à homofobia na escola, considerando publicações online de entidades de Psicologia e, a partir desse material, discutir as contribuições para o enfrentamento dessa problemática, em especial quando ocorre no contexto escolar. Para tanto, realizamos uma análise documental partindo de publicações de entidades da psicologia como ciência e profissão, disponíveis em sites de cinco instituições de psicologia no Brasil entre os anos de 2010 e 2015. Os resultados sugerem que, apesar do desenvolvimento de campanhas e articulações de entidades de psicologia sobre a homofobia na escola, ainda há muito por fazer nesse campo.

Palavras-chave: Homofobia, Escola, Psicologia Política, Instituições, Homofobia na Escola.


ABSTRACT

Homophobia is the term used to describe any type of discrimination directed at homosexuals, it should be analyzed in social contexts in which it occurs. The aim of this paper is to analyze the possible contributions from psychology relating to homophobia in school, considering online publications Psychology entities and, from this material, discuss contributions to addressing this issue, especially when it occurs in the school context. Therefore, we conducted a documentary analysis starting from psychology entities publications as a science and profession, available in five institutions psychology sites in Brazil between 2010 and 2015. The results suggest that, despite the development of campaigns and joints psychology entities on homophobia in school, there is still much to be done in this field.

Keywords: Homophobia, School, Political Psychology, Institutions, Homophobia in School.


RESUMEN

La homofobia es el término utilizado para describir cualquier tipo de discriminación a los homosexuales de orientación, y debe ser analizada en el contexto social en que se produce. El objetivo de este trabajo es analizar las posibles contribuciones de la psicología relacionados con la homofobia en la escuela, teniendo en cuenta publicaciones en línea de entidades de Psicología y, a partir de este material, discutir las contribuciones a abordar esta cuestión, sobre todo cuando se produce en el contexto escolar. Por lo tanto, se realizó un análisis documental a partir de las publicaciones de Entidades de Psicología como ciencia y profesión, disponible en cinco sitios de instituciones de psicología en Brasil entre 2010 y 2015. Los resultados sugieren que, a pesar del desarrollo de las campañas y las articulaciones de entidades de psicología sobre la homofobia en la escuela, todavía hay mucho por hacer en este campo.

Palabras clave: Homofobia, Psicología Política, Las Instituciones, La Homofobia en la Escuela.


RÉSUMÉ

Homophobie est le terme utilisé pour caractériser n'importe quel type de discrimination contre les homosexuels, devant être analysée dans les contextes sociaux où elle se passe. Cet article a comme but analyser les contributions possibles de la Psychologie concernant l'homophobie à l'école, tout en considérant les publications en ligne des institutions de Psychologie et, à partir de ce matériel, discuter les contributions pour faire face à ce problème, spécialement quand il arrive dans le contexte scolaire. Pour ce faire, nous avons réalisé une analyse des documents à partir des publications des institutions de Psychologie comme science et profession, disponibles sur des sites de cinq établissements de Psychologie au Brésil entre les années de 2010 à 2015. Les résultats suggèrent que, malgré le développement de campagnes et articulations des institutions de Psychologie sur l'homophobie à l'école, il y a encore beaucoup à faire dans ce domaine.

Mots clés: Homophobie, École, Psychologie Politique, Institutions, Homophobie à l'École.


 

 

Introdução

A temática da homofobia tem aparecido com frequência nas falas cotidianas e institucionais de personagens dos mais distintos setores sociais. Essas discussões acerca dos entendimentos sobre homofobia podem explicitar conflitos já existentes ou desencadear novos a partir de suas tematizações. Diversos campos, tais como a mídia, a cultura, a educação, a saúde, a justiça, a política, os movimentos sociais, etc., denunciam ou admitem que a homofobia constitui um grave problema social, uma vez que estabelece fatores de restrição ao exercício dos direitos de cidadania e dos direitos humanos por excelência, relativos à educação, à saúde, ao trabalho, à segurança, entre outros (Camino, 1998; Junqueira, 2007; Mello Neto & Agnoleti, 2014; Rios, 2009).

Borrilo (2015) define homofobia como uma forma de inferiorizar, desumanizar, diferenciar e distanciar o indivíduo homossexual à semelhança de outras formas de exclusão como a xenofobia, o racismo, o antissemitismo ou o sexismo. Para este autor, o termo homofobia designa dois aspectos diferentes em torno da mesma realidade: a dimensão pessoal, de natureza afetiva sendo manifestada através da rejeição ao homossexual; e a dimensão cultural, de natureza cognitiva, declarando que a rejeição não é ao homossexual enquanto indivíduo, mas a homossexualidade como fenômeno psicológico e social.

Considerando a dimensão cultural, a homofobia apodera-se dos mais variados discursos - religiosos, científicos, políticos, etc. - buscando garantir, no campo social, uma percepção negativa e uniformizada da homossexualidade, resultando, no campo individual, em um processo em que o próprio indivíduo, ao tomar consciência de sua orientação sexual, pode ficar insatisfeito, vítima de um ódio ou repulsa da própria homossexualidade (Matos, 2013; Natividade & Oliveira, 2013; Teixeira, 2011).

Compreendendo a complexidade desse fenômeno e para não utilizar de vários termos específicos como gayfobia, para definir homofobia em relação aos homossexuais masculinos; lesbofobia, no caso de mulheres homossexuais; bifobia, para se referir a bissexuais; travestifobia ou transfobia, para caracterizar hostilidades em relação aos travestis ou aos transexuais (Borrilo, 2015), adotamos o termo homofobia, neste artigo, para designar o conjunto de todos esses fenômenos.

Evidenciada por meio de atitudes homofóbicas, a problemática envolvendo questões de sexualidade permanece fortemente associada a uma prática regulatória na representação de mecanismos punitivos e ameaçadores. Tal expediente é explicitado em muitos órgãos institucionais e tem sua representação também na escola. Muitos desses problemas já se arrastam pela história há várias décadas, contextualizados em instituições, na cultura e no cotidiano social (Junqueira, 2009).

Junqueira (2009) afirma que o contexto escolar pode se configurar em um ambiente de opressão, discriminação e preconceitos, em que milhões de jovens, adultos e adultas, Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros (LGBT) são constantemente expostos a uma preocupante carga de violência. Essas pessoas tornam-se alvo de discriminação, sofrem diversos tipos de insultos e são motivos de piadas, apelidos e expressões desqualificantes por parte de colegas e até de educadores, o que em muitos casos, dificulta suas permanências na escola.

Entre as formas de manifestação da homofobia, o bullying homofóbico constitui um grave problema social e global. A porcentagem de alunos LGBT que reportaram ter sido vítimas de bullying homofóbico é alta, no Chile (68%), na Guatemala (53%), no México (61%) e no Peru (66%) (Caceres et. al., 2011). Estudos, de um modo geral, indicam que o bullying no contexto escolar constitui um problema com uma prevalência elevada e que comprometeria a aprendizagem e influenciaria no precoce abandono escolar (Carvalhosa, Moleiro, & Sales, 2009; Santos & Dos Santos, 2013).

Dados da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO, 2013) apontam que no Brasil mais de 40% dos homens gays dizem ter sido agredidos fisicamente enquanto estavam na escola; em muitos países, a exposição ao bullying homofóbico provoca redução da frequência escolar, abandono escolar precoce e queda de desempenho e rendimento acadêmico; o bullying homofóbico pode produzir efeitos adversos na saúde mental e psicológica dos jovens, causando impacto negativo na sua educação; existe uma relação entre bullying homofóbico e depressão, ansiedade, perda de confiança, retração, isolamento social, culpa e distúrbios do sono; alunos que são alvo de bullying homofóbico na escola têm maior probabilidade de pensar em se machucar e de cometer suicídio que os jovens em geral.

Além disso, situações que envolvem episódios de bullying homofóbico são mais frequentes em alunos com insucesso escolar do que em alunos com sucesso escolar. Ao ser constatada a prática do bullying no ambiente escolar, medidas imediatas devem ser tomadas visando o seu fim (Carvalhosa, Moleiro, & Sales, 2009; Costa & Pereira, 2010; Santos & Dos Santos, 2013).

O atual momento explicita uma trajetória histórica e social de reivindicações dos movimentos sociais e de comprometimentos da gestão pública. A educação e a escola têm se deparado com projetos, recomendações e diretrizes procedentes, por exemplo, da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC), que apontam para inquietantes debates, entendimentos e problematizações de questões como políticas afirmativas, inclusão curricular, formação para cidadania, parcerias e interfaces, perspectivas holísticas, combate aos estereótipos, promoção da equidade, respeito à diversidade, aceitação da diferença, extensão de direitos e diminuição de dano (Furlani, 2009; Rios, 2009).

O reconhecimento da homofobia como um fenômeno discriminatório a ser enfrentado pelas escolas é recente nas políticas públicas de educação no Brasil, tendo o MEC (2007) apoiado cursos de capacitação de docentes sobre o tema da diversidade sexual. No entanto, apesar das muitas discussões encetadas sobre a homofobia na atualidade e da realização de algumas campanhas e articulações, muito ainda precisa ser feito para a obtenção de resultados significativos nesse campo.

No âmbito da Psicologia, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) tem empreendido mobilizações acerca da participação de profissionais da psicologia no processo transexualizador, bem como na campanha de despatologização das identidades trans. Como exemplo o lançamento em 2008, da cartilha "Adoção, um direito de todos e todas", na qual são apresentados, aos psicólogos e a outros profissionais, argumentos necessários e importantes na luta pelos direitos LGBT a respeito do desenvolvimento da criança e do adolescente em lares de pessoas homossexuais ou casais homofóbicos. Em 2011, lançou a cartilha "Psicologia e Diversidade Sexual: desafios para uma sociedade de direitos", a publicação traz os debates realizados ao longo do seminário realizado em Brasília, em 2010, com o intuito de difundir a discussão e as ideias que por ali circularam; pretendendo, também, ampliar o posicionamento crítico da categoria acerca da promoção dos direitos das pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (Verona, 2011).

Como forma de enfrentamento a homofobia presente na escola e em outros ambientes sociais, é imprescindível expor a invisibilidade que se constrói em torno da violência homofóbica que se manifesta nas práticas reforçadoras de uma norma heterossexual (Leite, 2011). Garcia (2009) concorda que a heteronormatividade presente na sociedade brasileira tem influência marcante no ambiente escolar, sugerindo a necessidade de elaboração de estratégias de enfrentamento que ultrapassem o foco exclusivo na escola, buscando ações que contemplem desde funcionários e professores, até alunos e pais.

Furlani (2009) destaca que a homofobia e a intolerância convidam a educação sexual, na dimensão da formação humana, a realizar uma reflexão didático-metodológica e política, porquanto uma vez que as diferenças sexuais e de gênero, tais como as étnico-raciais, estão sendo constantemente construídas, significadas e hierarquizadas nos processos discursivos da cultura, assim não se concebe a manutenção de uma educação que pretenda apenas respeitá-las, tolerá-las ou compreendê-las. E nesse processo, a homofobia aparece enraizada e persistente na trama social, apontando como um desafio para a psicologia, que apresenta como proposta lutar contra todas as formas de violência presentes nas instituições, a intransigência em relação à diversidade cultural, religiosa, sexual e racial, e as ações preconceituosas e violentas perpetradas contra grupos vulneráveis (CFP, 1998).

No que se refere à problemática da homofobia, a psicologia, de forma direta, tem historicamente contribuído na construção e socialização de concepções com respeito à sexualidade, influenciadas por saberes oriundos das ciências médicas e sexológicas, que enfatizavam, sobretudo, a descrição de comportamentos sexuais tendo como parâmetro uma visão normativa e disciplinar da sexualidade humana (Borges, Canuto, Oliveira, & Vaz, 2013).

No âmbito institucional, a psicologia tem sido representada por entidades, instituições, associações e organizações, entre as quais apontamos o CFP, seu principal representante no Brasil. No que se refere à promoção de direitos, compete ao CFP zelar pela democracia e por uma psicologia comprometida com as necessidades da sociedade, atuando ao lado das entidades e movimentos que lutam pela efetivação dos direitos humanos, como reza a Resolução CFP nº 011, de 22 de novembro de 1998, que "Institui a Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia". Consta, ainda, na referida Resolução que o CFP propõe lutar contra todas as formas de violência presentes nas instituições e nos locais de isolamento, a intransigência à diversidade cultural, religiosa, sexual e racial e a criminalização dos movimentos sociais, ao mesmo tempo em que busca fortalecer a presença da psicologia nas políticas públicas em articulação com outras profissões e outros saberes.

No que diz respeito à diversidade sexual, o CFP define normas de atuação em relação à questão da orientação sexual, especificamente na Resolução CFP nº 001/1999, de 22 de março de 1999, quando estabelece que os psicólogos deverão, a partir de seus conhecimentos e práticas, contribuir para o enfrentamento do preconceito tendo em vista o desaparecimento de discriminações, patologizações e estigmatizações contra aqueles que apresentam comportamentos ou práticas homoeróticas (Lima, 2011).

Assis (2011) argumenta que a simples existência desta regulamentação sugere posições e práticas excludentes e discriminatórias de alguns profissionais da psicologia no que se refere à diversidade sexual. Esta última Resolução, por um lado, aponta avanços ao proibir a patologização e o tratamento da homossexualidade, mas, por outro, denuncia a existência dessas práticas quando é criada com o intuito de regular a prática profissional e coibir ações contrárias ao entendimento de orientação sexual que propõe.

O argumento de que coexistem diferentes concepções acerca das práticas psicológicas relativas à orientação sexual pode ser evidenciado quando se considera o empenho de um segmento do legislativo federal em tentar sustar a aplicação do parágrafo único do art. 3º e o art. 4º da Resolução CFP nº 001/1999, por meio do Projeto de Decreto Legislativo, PDC 234/11, que ficou conhecido como "Projeto da Cura Gay", proposto pelo deputado da frente evangélica João Campos.

Guimarães (2009) considera que a psicologia, durante muito tempo, mostrou-se bastante omissa diante das problemáticas sociais envolvendo questões de discriminação em razão da orientação sexual e/ou identidade de gênero, contribuindo para a manutenção de estereótipos e da patologização das práticas homoeróticas. Mesmo contrariando as recomendações do CFP, ainda hoje existem profissionais da psicologia que veem a homossexualidade como uma doença ou perturbação, que necessitaria, portanto, de tratamento ou reabilitação, contexto que exige, em caráter de urgência, uma efetiva produção de estudos e a consequente aplicabilidade de suas diretrizes e resoluções em relação ao tema.

De fato, a psicologia tem se inclinado para a não aceitação de teorias que se fundamentam exclusivamente em argumentos genéticos para explicar as orientações sexuais. Portanto, as teorias psicológicas vigentes se alicerçam em processos sociais e histórias de vida das pessoas (Teixeira, 2011). Apesar da ampliação conceitual e dos discursos em torno da diversidade sexual, parecem poucos os avanços no que se refere aos direitos sexuais. Uma expansão de perspectiva vem sendo apontada como necessária à melhoria e à democratização dos direitos sexuais e da diversidade (Correa, 2008).

Partindo da premissa que entidades e organizações que representam a psicologia refletem posicionamentos e práticas partilhadas por seus profissionais, compreender como essas instituições têm lidado de modo geral, e especificamente no contexto escolar, com questões relativas à homofobia, pode contribuir para enfrentamento desse grave problema social. Isso se configuraria, no âmbito das investigações relativas ao campo da psicologia política, como a explicitação de uma dimensão social que encetaria formas e posicionamentos políticos passíveis de questionamentos.

Na sociedade contemporânea a internet, os sites, os blogs, as bases de dados são importantes meios de difundir informações. Ao considerar que as discussões por parte de algumas instituições e organizações de psicologia no Brasil podem ser intensas, permanece a questão: como essa discussão chega à sociedade? Assim, a partir da problemática apresentada, propomos como objetivo deste estudo analisar as possíveis contribuições da psicologia relativas à homofobia na escola, considerando publicações online de entidades de Psicologia no Brasil e, a partir desse material, discutir as contribuições para o enfrentamento dessa problemática, em especial quando ocorre no contexto escolar.

 

Percurso metodológico

Realizamos uma revisão narrativa da literatura com a finalidade de fundamentar teoricamente o objeto de estudo, contribuindo com elementos para subsidiar a análise documental do material obtido (Cordeiro et. al., 2007). Tendo em vista que documentos constituem fontes de pesquisa científica e que se enquadram nessa classificação, os arquivos institucionais, consideramos como fonte de análise, neste estudo, documentos que guardam registro de publicações oficiais de algumas entidades, associações e organizações de psicologia no Brasil.

O levantamento bibliográfico realizamos em bases de dados eletrônicas e ainda em documentos de domínio público, manuais de práticas pedagógicas e de atuação de profissionais da psicologia na educação. Para a análise documental, elegemos como instituições representantes da psicologia: além do CFP; a Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO); a Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE); a Associação Brasileira de Psicologia do Desenvolvimento (ABPD); e a Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP). A consulta foi feita nos sites dessas instituições, em que consideramos como fonte de pesquisa documentos produzidos e disponíveis nos links "publicações", "eventos", "notícias" e "matérias", dos seguintes endereços http://site.cfp.org.br/, http://www.abrapso.org.br/, https://abrapee.wordpress.com/, http://www.abpd.psc.br/ e http://sbponline.org.br/.

De forma específica, a pesquisa documental aconteceu em três etapas: (1) levantamento de dados nos sites institucionais, de 2010 ao primeiro semestre de 2015, utilizando para orientar a busca os descritores "homofobia" e "homofobia na escola"; (2) leitura e seleção; e (3) análise dos documentos. Na etapa da seleção, procedemos a uma leitura do material para identificar sua adequação aos objetivos propostos. Em seguida, para posterior análise, as informações foram salvas em arquivos específicos, com a indicação da fonte e data de consulta.

Na etapa relativa à análise do material encontrado, foram definidos os seguintes parâmetros norteadores de discussão: (1) Psicologia e Homofobia, (2) Concepções de algumas instituições que representam a Psicologia no Brasil sobre a Homofobia e (3) Práticas desenvolvidas por essas instituições para o enfrentamento da homofobia na escola na atualidade.

 

Resultados

As informações obtidas a partir da pesquisa documental indicam que em quatro dos cinco sites pesquisados foram localizadas publicações relativas ao tema da homofobia e/ou homofobia na escola, especificamente nos sites do CFP, ABRAPSO, ABRAPEE e ABPD. Dos cinco sites pesquisados, apenas três disponibilizam ferramenta de busca. No site da ABPD realizamos a busca consultando links disponibilizados. No site da SBP pesquisamos nos links notícias e eventos, mas, neste caso, nenhum documento sobre homofobia e homofobia na escola foi encontrado. No entanto, isso, em princípio, não permitiria afirmar que a SBP não esteja discutindo o tema. Contudo, nesta pesquisa, foi considerado o site oficial como uma ferramenta para apresentar essa discussão.

Cabe ressaltar ainda que, nem todas as campanhas e demais articulações realizadas por estas entidades pesquisadas são apresentadas em seus websites e, ainda, não podemos afirmar que os documentos encontrados foram as únicas publicações realizadas por estas instituições e organizações de psicologia no período pesquisado.

Portanto, os resultados desta pesquisa devem ser interpretados com cautela, dado que as informações ora descritas foram apenas os publicados nos websites das entidades pesquisadas e podem refletir de modo limitado, as discussões. E provável que outras contribuições tenham sido conduzidas e não tenham sido publicadas em seus endereços na internet. Neste caso, o acesso a trabalhos não-publicados, publicados em período distinto ou ainda em outro ambiente, poderia resultar em um panorama diferente ao que foi proposto como objetivo deste estudo.

 

Publicações sobre a homofobia na escola

Os dados relativos ao Conselho Federal de Psicologia

No site do CFP, iniciamos a busca pelo termo homofobia na opção "todas as áreas", o que oportunizou o surgimento de 37 resultados. Ao se acrescentar o conectivo "E" "na escola" ao termo homofobia, encontramos treze resultados. Neste caso, privilegiamos o termo homofobia na escola. Ao analisarmos as publicações, que incluem notas, pareceres, matérias divulgadas no site, assim como debates, verificamos que três delas abordam a homofobia e sete, especificamente, a homofobia na escola.

Ainda em relação à quantidade de publicações, constatamos que em 2011 foram publicadas seis matérias - entre publicação, parecer e notas - em que o CFP se posiciona em prol da Diversidade Sexual e em relação ao Projeto Escola sem Homofobia. Em 2013 foram publicadas duas notas de repúdio sobre as declarações do senhor Silas Malafaia, que é pastor pentecostal e graduado em Psicologia, uma vez que ele classificaria resoluções específicas do CFP como carregadas de ideologias. E em 2014 foram publicadas duas notas demonstrando preocupação com a mudança no texto do Plano Nacional de Educação (PNE). Em relação ao conteúdo dessas publicações, observamos que, considerando o título e a descrição das matérias, refletem o posicionamento do CFP em relação à homofobia e à homofobia na escola, seja informando, dando apoio ou respondendo a situações ou pronunciamentos homofóbicos.

De fato, o CFP tem se posicionado em relação à temática fornecendo suporte e respondendo a demandas específicas de campanhas de outras entidades, como a UNESCO e o MEC. O apoio do CFP fica evidente no posicionamento favorável que a entidade assume frente ao "Projeto Escola sem Homofobia". Da mesma forma, a entidade deixa clara sua posição no enfrentamento à homofobia quando repudia oficialmente declarações homofóbicas. A posição do CFP também está demonstrada quando a entidade se opõe à retirada do trecho "igualdade racial, regional, de gênero e orientação sexual" do texto do PNE. Essa posição foi acompanhada de discussões e proposição de novas ideias, buscando ampliar o posicionamento crítico da categoria profissional da psicologia no que diz respeito à promoção dos direitos das pessoas LGBT. As informações colhidas permitem constatar que o CFP tem apoiado projetos e respondido a provocações homofóbicas.

Os dados relativos à Associação Brasileira de Psicologia Social

No site da ABRAPSO, utilizando o termo homofobia como descritor, localizamos quatorze ocorrências entre notas, projetos, debates e seminários e três vídeos. Já com o termo homofobia na escola como descritor nenhuma ocorrência foi encontrada. Na análise, considerando o período de tempo definido, obtivemos sete documentos. Entre as publicações encontradas, cinco tratam da homofobia e duas da homofobia no contexto escolar. Constatamos que em 2010 foram publicados manifestos contra a homofobia, nota sobre o discurso da senhora Rozangela Alves Justino, esta, enquanto em exercício da profissão de psicóloga, ofereceria serviços especializados para pessoas que desejassem abandonar a homossexualidade; e nota de repúdio sobre a manifestação homofóbica de estudantes da Universidade de São Paulo (USP). Ainda em 2010 aparece publicação sobre a produção de vídeos com depoimentos de travestis e transexuais na cidade de Juiz de Fora. Em 2011 as publicações foram de posicionamentos declarando que a ABRAPSO assinou o "Manifesto da II Marcha Nacional contra a Homofobia", a expressão do posicionamento em favor do projeto "Escolas sem homofobia", defendendo a livre orientação sexual e se esforçando no combate a todas as formas de homofobia.

Quanto ao conteúdo dessas publicações, observamos, considerando o título e a descrição da matéria, que refletem a postura da ABRAPSO em relação à homofobia e à homofobia na escola. As diretrizes encontradas nos documentos caracterizam-se como informações, oferta de apoio ou reação a situações específicas destinadas aos mais diversos segmentos da população.

Os dados relativos à Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional

No site da ABRAPEE, ao utilizar na ferramenta de busca os termos homofobia na escola ou simplesmente homofobia, não foi encontrado nenhum documento. Ao buscar no link "Boletim de Notícias" foi encontrado um documento de 2011 que trata do "Projeto Escola Sem Homofobia". E em 2012 uma publicação referente a carta enviada ao MEC solicitando apoio para melhorias das condições educacionais e de existência, entre elas, contra a homofobia.

Os dados relativos à Associação Brasileira de Psicologia do Desenvolvimento

No site da ABPD, como não há ferramenta de busca, realizamos a pesquisa consultando os links documentos e congressos, bem como o informativo na página inicial. Não foram encontradas referências nesses dois primeiros e na parte relativa ao informativo foi encontrado um artigo publicado no IX Congresso de Psicologia do Desenvolvimento, no ano de 2013, que trata do bullying homofóbico entre estudantes do ensino médio.

 

Discussão

Considerando que o CFP, a ABRAPSO, a ABRAPEE e a ABPD são importantes representantes da psicologia no Brasil, e defendendo que seus sites institucionais são importantes meios de compartilhamento de informações produzidas ou apoiadas por essas instituições, consideramos que a Psicologia, como ciência e como profissão, tem discutido as questões relativas à homofobia, sobretudo, em resposta a acontecimentos sociais e políticos. Para ilustrar essa assertiva, apontamos a análise e posicionamento sobre o material educativo do "Projeto Escola sem Homofobia"; a nota de repúdio às declarações do senhor Silas Malafaia e de senhora Rosângela Justino; a resposta da psicologia frente a mudança no PNE, entre outras manifestações.

Em relação ao apoio institucional, os resultados desta pesquisa apontam sua existência, ao reunir matérias sobre o enfrentamento da homofobia e especificamente sobre a homofobia na escola. As publicações institucionais encontradas nos sites, de modo geral, sugerem como estratégias de enfrentamento a esse fenômeno, a veiculação de informações e a criação de espaços de apoio e de discussão. As respostas produzidas por essas entidades demonstram que as mesmas reconhecem a complexidade do fenômeno e procurariam atender a demandas, porém voltadas a questões específicas.

Na educação, a psicologia está presente de diversas formas, seja como âncora e conteúdo de disciplinas, seja como inspiradora de propostas de formação humana e área de aplicação. Existem saberes e práticas psicológicas que têm sido relevantes para a formação dos seres humanos a partir das suas necessidades, que surgem nos diferentes espaços educacionais (CFP, 2008).

Silva e Barreto (2012) afirmam que no âmbito desse complexo tema, é importante abordar o papel exercido pela sociedade na construção de mecanismos homofóbicos e na vigilância sobre a sexualidade dos estudantes, advindos de uma política de não aceitação da diversidade sexual, e que a psicologia poderia trabalhar na desconstrução desses mecanismos.

Consideramos que a participação da psicologia na discussão das contradições e dificuldades experimentadas na escola é vital para favorecer mudanças no sistema escolar brasileiro, sob o risco de se continuar formando gerações de excluídos, de adolescentes e jovens sujeitos às ideologias vigentes, cada vez mais distantes dos direitos e garantias sociais, da melhoria da condição de vida, do respeito às diversidades e da construção de uma educação emancipatória, democrática e cidadã (Nenevé & Souza, 2006).

Sobre o posicionamento da psicologia, Teixeira (2011) afirma sua responsabilidade social, como categoria profissional, de tentar diminuir as desigualdades sociais, compreender melhor o risco e a opressão que cada gênero enfrenta na rede social, reduzir as vulnerabilidades sociais e garantir o acesso aos dispositivos de saúde e de educação a todas as pessoas, independentemente do gênero, orientação sexual ou condição psíquica. Deste modo, combater a homofobia é uma meta a ser atingida, e isso pressupõe que os profissionais da psicologia se empenhem não somente na realização de uma revisão pessoal de valores, crenças e discursos, mas também na busca de novos referenciais teóricos, profundamente comprometidos com a desnaturalização de verdades seculares. De fato, embora a identificação da homofobia não seja recente, as iniciativas ainda não têm sido suficientes para seu enfrentamento, o que pode ser atribuído precipuamente às resistências e à desinformação sobre questões de gênero e sexualidade.

Faria e Carvalhaes (2010) sugerem que ações que possibilitam reflexões e debates sobre questões relacionadas à diversidade sexual produzem novos saberes, que configuram práticas e discursos poderosos, aumentam as possibilidades dos(as) psicólogos(as) em sua formação e atuação profissional e enfraquecem os enunciados homofóbicos.

A homofobia se apresenta como um grave problema social e a psicologia propõe algumas ações para o seu enfrentamento. No entanto, depende da identificação e compreensão da violência homofóbica, principalmente no ambiente escolar, para que se possa analisar a questão nos seus mais variados contextos e elaborar ações mais objetivas destinadas ao seu enfrentamento.

Como sugere Guimarães (2009), à medida que um número maior de pessoas compreenderem que cada um tem direito a pensar de forma diferente, o profissional de psicologia precisa se dispor a pesquisar e a contribuir para a produção de estudos sobre essa questão. Isso porque a contribuição da psicologia nesse campo pode ser bastante efetiva, envolvendo a incorporação de temas relacionados à homofobia e pautando seus estudos pela exigência por respeito, sem perder de vista a afirmação da sexualidade, e pela demanda da criminalização da homofobia.

A psicologia tem possibilidade de se firmar como instrumento para essa batalha no âmbito da educação e das políticas públicas, devendo estar estritamente vinculada a princípios orientadores de uma sociedade democrática, como igualdade, liberdade, autonomia e respeito às diferenças (Lionço & Diniz, 2008).

 

Considerações Finais

A proposta deste estudo consistiu em refletir sobre as possíveis contribuições da psicologia para o enfrentamento da homofobia na escola, partindo de publicações em sites de algumas instituições que a representam no Brasil.

Observamos que algumas iniciativas têm sido elaboradas para o combate da homofobia, contudo a efetividade do enfrentamento desse problema passa também pela compreensão de como as práticas em psicologia têm lidado com questões relativas à homofobia, visto que ainda há muito por fazer nesse campo.

Dos cinco sites institucionais pesquisados somente quatro faziam referências à homofobia ou homofobia na escola - CFP, ABRAPSO, ABPD e ABRAPEE. O fato de não terem sido encontradas publicações no site da SBP relativas a esse tema, não permitiria afirmar que essa instituição não tem um posicionamento e nem que não está discutindo a respeito. Contudo, nesta pesquisa, foi considerado o site oficial como uma ferramenta para apresentar essa discussão e, desse modo, pode-se considerar que a presença/ausência das publicações, bem como seus conteúdos, manifestam de forma explícita os posicionamentos dessas instituições.

Do mesmo modo, não se poderia afirmar que os documentos encontrados foram as únicas publicações realizadas por estas instituições e organizações de psicologia no período pesquisado. Ressaltamos que nem todas as campanhas e articulações em torno dessa temática, realizadas por essas entidades, aparecem em seus websites, talvez isso possa ser explicado pela forte tendência atual em migrar informações de sítios tradicionais para redes sociais. Desse modo, parece importante que essas entidades reconheçam quais canais e espaços virtuais podem contribuir para dar maior visibilidade aos posicionamentos que assumem frente a temas que dizem respeito ao campo teórico e prático da psicologia.

Embora façamos essas ressalvas, reconhecendo que existem, mesmo que ainda incipientes, avanços teóricos importantes acerca das questões de gênero, sexualidade e homofobia no campo da Psicologia, parece razoável supor a dificuldade dessa disciplina de atualizar, de dar visibilidade a seus posicionamentos teóricos e de tornar efetivas suas práticas, o que acaba por limitar seu papel enquanto ciência na transformação da realidade social.

A partir dos resultados deste estudo, consideramos que uma das principais medidas de posicionamento que a psicologia precisaria realizar é recolocar-se cada vez mais e a seus profissionais no apoio aos movimentos sociais, principalmente os que se direcionam ao combate à homofobia.

Do mesmo modo que ressaltamos a importância da psicologia no enfrentamento à homofobia, também o fazemos em relação à potência da educação no contexto político-social e econômico, não somente para estreitar a discussão da escola como lugar-comum a todos, mas principalmente para articular o processo de construção do ensino, da instituição escolar com a diversidade existente na atualidade. Acreditamos que essas questões podem ser discutidas considerando as propostas das políticas sociais e educacionais atuais e a necessidade de intervenções no campo da Psicologia que contribuam para que a compreensão e o respeito à diversidade cultural e sexual se materializem de forma plena nas escolas brasileiras.

Em relação aos limites dessa pesquisa, reconhecemos a possibilidade de utilizarmos outras estratégias de coleta de dados, inclusive partindo de uma consulta direta aos representantes das instituições pesquisadas, tendo em vista identificar outras formas de discutir e enfrentar a pauta da homofobia na escola.

Então, mesmo reconhecendo que existem outras possibilidades de investigação e a necessidade de se ampliar as análises acerca desse tema, esperamos que este estudo tenha contribuído para fomentar a discussão referente às possibilidades e impossibilidades de intervenção da Psicologia no enfrentamento à homofobia no contexto escolar. Ressaltamos, por fim, que embora avanços sejam identificados, ainda há muito por fazer para o desenvolvimento de propostas e medidas de prevenção e combate à violência e à estigmatização da homossexualidade na sociedade contemporânea, em especial na Escola.

 

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Recebido em 09/09/2016.
Aceito em 13/06/2017.

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