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Revista Psicologia Política

versão On-line ISSN 2175-1390

Rev. psicol. polít. vol.24  São Paulo  2024  Epub 23-Ago-2024

https://doi.org/10.5935/2175-1390.v24e24517 

Dossiê Psicologia e Políticas da Deficiência: ativismos, aleijamentos e a luta anticapacitista - Artigo

CRIP EDUCATION: MARATONEI ESSA TEMPORADA

Educación lisiada: maratoné esta temporada

Crip education: i binge-watched this season

RODRIGO OLIVEIRA FEITOSA VAZ1 
http://orcid.org/0000-0002-8045-9174

1https://orcid.org/0000-0002-8045-9174 E-mail: rodrigovazpsi@gmail.com Mestre em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo


RESUMO

A partir de pensadoras do feminismo negro como bell hooks, Patrícia Hill Collins e Grada Kilomba, elaboro situações-problema vividas em contextos educacionais: marcas que se escreviveram em meu corpo com deficiência, de bicha não binária, nordestine. Como execução metodológica, comporão conosco as problematizações de Sofia Favero (2020) ao pôr em análise a não marcação dos que “pesquisam a dor do outro.” Denunciando este fato, Sandra Harding (1993) também radicaliza a intervenção nas pesquisas, apontando a imbricação direta entre a “realidade de quem pesquisa” e a chamada “realidade pesquisada”. Desta feita, tomaremos como ferramentas de análise os estudos queer e crip.

Palavras-chave: Crip education; Escritas situadas; Narrativas episódicas

RESUMEN

A partir de pensadoras feministas negras como bell hooks, Patrícia Hill Collins y Grada Kilomba, elaboro situaciones problemáticas vividas en contextos educativos: marcas que quedaron escritas en mi cuerpo con discapacidad, como queer no binario, del Noreste de Brasil. Como implementación metodológica, se parte del análisis las problematizaciones de Favero (2020) al analizar el no marcar de quienes “investigan el dolor ajeno”. Al denunciar este hecho, Sandra Harding (1993) también radicaliza la intervención en la investigación, señalando la superposición directa entre la “realidad de quienes investigan” y la llamada “realidad investigada”. Esta vez utilizaremos estudios queer y crip como herramientas de análisis.

Palabras clave Educación crip; Escritos situados; Narrativas episódicas

ABSTRACT

Based on black feminist thinkers such as bell hooks, Patrícia Hill Collins and Grada Kilomba, I elaborate problem situations experienced in educational contexts: marks that were written on my body with a disability, as a non-binary queer, from the Brazilian Northeast. As a methodological implementation, Sofía Favero’s (2020) problematizations will be part of the analysis by analyzing the non-marking of those who “research the pain of others.” Denouncing this fact, Sandra Harding (1993) also radicalizes intervention in research, pointing out the direct overlap between the “reality of those who research” and the so-called “researched reality”. This time, we will use queer and crip studies as analysis tools.

Keywords Crip education; Situated writing; Episodic narratives

EPISÓDIO PILOTO: VELHOS TEMPOS

Sou primeire da linhagem materna a ingressar na universidade pública. São poucos, entre os parentes, os que chegaram ao ensino médio. Muitos mal chegaram ao ensino fundamental. Alguns são chamados de “analfabetos funcionais”. Para tanto, a partir de pensadoras do feminismo negro como bell hooks, Patrícia Hill Collins e Grada Kilomba, elaboro situações-problema vividas em contextos educacionais: marcas que se escreviveram em meu corpo com deficiência, de bicha não binária, nordestino, de modo a pensar os enfrentamentos que se impõe em determinados espaços que reforçam pactos narcísicos da branquitude (Bento, 2022) e imagens de controle (Collins, 2019) assentes também na cisheterossexualidade compulsória (Vergueiro, 2015).

As imagens controladoras, em destaque, por exemplo, nos fazem pensar em uma matriz internalizada de opressão, como coloca Collins (2016), como se fôssemos insiders de uma cultura dominante, cujo objetivo é simplesmente perpetuar padrões de violência e dominação, mantendo o poder que lhe é constituído historicamente (Bueno, 2020). Um dos mecanismos desse insiderism no que diz respeito ao capacitismo e a compulsoriedade da corponormatividade é o benefício do able-passing”, como coloca Itxi Guerra (2021), ou seja, o “você nem parece uma pessoa com deficiência”.

Tal mecanismo também toma forma quando Kimberlé Crenshaw (2002) aponta as noções de super inclusão, bem como de subinclusão. Transposto esse pensamento do feminismo afrodiaspórico para os estudos das deficiências, podemos analisar a super inclusão a partir de uma desresponsabilização da cultura dominante em não reconhecer barreiras perante a criação de espaços físicos inclusivos com acessibilidade arquitetônica, instrumental, comunicacional, programática, metodológica e atitudinal, como aponta Kuppers (2014, p. 3):

a deficiência é aparente na interação entre a pessoa com deficiência e o ambiente social. Uma pessoa apresenta uma deficiência como braços curtos, cegueira ou inabilidade de ler. É apenas quando essa forma particular de corporeificação encontra uma sociedade na qual braços longos, comunicação visual e palavra escrita são favorecidas, que a incapacidade se torna uma deficiência. Para uma mulher que utiliza uma cadeira de rodas, não é o seu corpo ou a cadeira de rodas, mas sim as escadas que a tornam incapaz. As barreiras da arquitetura inacessível, as barreiras de atitude moldadas historicamente para pessoas com deficiência e a discriminação institucional resultante são agora os fatores incapacitantes e não o corpo individual de uma pessoa.

Já a noção de sub inclusão poderia ser entendida a partir de formas atitudinais que dispõem quadros de reconhecibilidade para PCD´s (pessoas com deficiências), conforme Alves (2020), emoldurando “certas formas” de sujeites que terão suas corporalidades mais trespassadas por discursos capacitistas hostis que outras. Isso não quer dizer que haja uma hierarquia de opressão entre as deficiências “visíveis” e “invisíveis”, mas que tal fato, através de vetores de poder, segundo o autor acima, encancera a materialidade e a agência de reconhecimento de alguns corpos.

Para tanto, tais discursos também idealizam o que seria “um corpo com deficiência verdadeiro.” A diferença torna-se invisível, comprometendo análise e ações de enfrentamento (Oliveira, 2020). E as imagens de controle, neste caso, operariam como uma estrutura violenta em um mundo colonizado que nos quer desmobilizades (Bueno, 2020; Collins, 2019), moldados em um discurso individualista, autocentrada e forjado pelo neoliberalismo (Galheigo, 2003). Por isso, desejamos fissurar por dentro essas engrenagens insiderism. E lançaremos também mão da noção de ‘conhecimento situado’ de Haraway (1995): dimensionando sujeitos em situações particulares e contextuais, bem como denunciando a ideia de objetividade e imparcialidade presentes nos modelos hegemônicos (Haraway, 1995; Harding, 1993):

Os conhecimentos situados são a proposta epistemológica de localização e de consideração da contextualidade do conhecimento, no quadro da sua produção. Ou seja, implica partir do princípio de que os conhecimentos têm um ponto de partida e de produção. E que se integrem na análise as condições de produção do conhecimento, os seus pressupostos, o locus da sua produção, em vez de se optar por aquilo que a autora chama “truque divino” (God trick), que obscurece o carácter localizado do conhecimento e o apresenta simultaneamente como um resultado final e como uma lei universal (seguindo os pressupostos positivistas), sem ser possível descortinar o processo nem a sua localização no mundo. (Oliveira & Amâncio, 2006, p. 601)

Neste mesmo diapasão, como coloca Daniela Nascimento (2020), inspirada em Frantz Fanon e Carolina Maria de Jesus, tal escrita cria um território de resistência e enfrentamento, se torno instrumento de uma luta anti-colonial, na qual quem escreve, de acordo com Grada Kilomba (2021), reinventa a si e pode nomear uma realidade erroneamente nomeada ou que sequer fora nomeada. Por esta via, também ressignificamos nossas corporalidades disparatadas a partir de uma performance linguística situada, conforme Rodrigo Borba (2015), que também vai investigar os processos que sustentam os lugares de abjeção , inferioridade e patologia destinados à indivíduos que não são entendidos na vida social como “naturais”, não seguem regras normativas e nem estruturam o desejo da maneira “correta”.

Sendo assim, fica evidente como a linguagem, de acordo Frantz Fanon (2008), nos ajuda a compreender funcionamento de discursos e performances naturalizantes, e de como podemos, também através da mesma, como pontua Kilomba (2021), subverter, contestar, desnaturalizar e contar outras narrativas, com uma dimensão política transformadora. Portanto, esta escrita busca criar intervenções a partir das singularidades de nossas corpas1, fabricando artefatos clínico-políticos, cuja bússola ética parte das problematizações de Favero (2020) ao pôr em análise a não marcação dos que “pesquisam a dor do outro.”.

Tais pesquisadores, quando se utilizam de uma injustiça epistêmica2, deslegitimam e descreditam nossas escritas situadas. Denunciando este fato, Harding (1993) também radicaliza a intervenção nas pesquisas, apontando a imbricação direta entre a “realidade de quem pesquisa” e a chamada “realidade pesquisada”. Desta feita, tomaremos como ferramentas de análise os estudos queer e crip.

Usando como referência o filósofoPaul Preciado (2013), Gavério (2015) pontuará a inseparabilidade entre a invenção e produção do sujeito sexual e a invenção e construção de corpos entendidos como normais e patológicos ou como capacitados e deficientes [discapacitados]. Tratando a deficiência como uma categoria de análise sócio historicamente localizável3, Gavério (2015) construirá um acesso entre posições críticas queer e deficientes [queer-crips], a partir de McRuer (2021) e Davis (1995), pondo a normalidade como foco crítico, e a maneira pela qual esta cria o ‘problema’ da pessoa deficiente como aquelas que não encaixam, conforme o autor, as noções capitalistas relacionadas a uma funcionalidade esperada e entendida como adequada ao “desenvolvimento humano”.

É nesse sentido que a palavra crip (como diminutivo de cripple), cuja tradução é aleijado(a) (e), defeituoso(a) (e), tem sido usada estrategicamente por uma parcela de ativistas da comunidade aleijada, de modo a questionar a compulsoriedade componormativa e toda uma cultura estigmafóbica sustentada em padrões hegemônicos funcionais/corporais (Mello & Nuernberg, 2012). Para tanto, o conceito-ação de ‘autodefinição’ de Collins (2019) também comporá com nossas problematizações pela potência de nomear a própria realidade e desafiar as opressões internalizadas, o que pode gerar algo bastante tumultuoso, pois não só deixa à mostra a heterogeneidade das experiências vividas, mas também as matrizes de dominação.

Neste sentido, vale salientar que esse texto fora gestado em contextos nos quais representantes da cena político-pública brasileiras, entre o período 2019-2022, reproduzem o seguinte discurso: dedicariam seus mandatos a “ajudar os deficientes” e, portanto, estaríamos a serviço da benevolência de suas almas como nos velhos tempos. Durante o seu governo, Jair Messias Bolsonaro incitou diversos retrocessos relacionados às políticas públicas voltadas à população brasileira com deficiências. Destaco: o uso de uma trajetória de “dedicação” às pessoas com deficiência de Michelle Bolsonaro (esposa de Jair) que, na verdade, servia para justificar o exercício da “benemerência aos mais necessitados” ritualizada por primeiras-damas durante a ditadura militar brasileira.

Além disso, visando dissolver os movimentos organizados de pessoas com deficiências, Bolsonaro propôs a extinção do CONADE Conselho Nacional de Pessoas com Deficiências – pelo Decreto nº 9.759/2019. Porém uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (n° 6121/2019) proposta pelo PT derrubou tal decreto. No entanto, em dezembro de 2019, curiosamente no Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, Bolsonaro enviou ao Congresso um projeto para extinguir com as cotas para trabalhadores com deficiência nas empresas brasileiras4.

O conservadorismo do governo Bolsonaro não cessou, pois este também tentou emplacar o Decreto n° 10.502/2020, que feria diretamente a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva PNEE (Ministério da Educação e Cultura, 2008). Tal política dispõe sobre as configurações da educação especial, considerada uma modalidade transversal, destacando que esta deva constituir o Projeto Político Pedagógico (PPP) da Escola, perpassando todos os níveis e etapas de ensino, como também a realização do atendimento educacional especializado (AEE) em turno inverso e não em caráter substitutivo ao ensino comum (Marquet, Silva, & Baptista, 2022).

De acordo com a BBC News Brasil, um resultado da política de 2008 é refletido pelo censo escolar: de 2020, 93,3% dos 1,3 milhão de crianças e adolescentes com deficiência na educação básica estavam matriculados em escolas regulares. Em 2005, eram apenas 23%.5 A partir destes dados, conforme (Marquet et al., 2022), percebe-se como esse atendimento assume um papel de destaque nos processos de inclusão escolar.

Para tanto, segundo (Magnabosco & Souza, 2018), precisamos discutir não só as relações entre os estudantes e seus pares, bem como entre eles e os vários profissionais da educação, no intuito de problematizarmos a perpetuação de aspectos subjacentes à reprodução de práticas de segregação, para então alcançarmos a produção efetiva de relações implicadas na construção de uma escola acolhedora para todes, pois, conforme tais atores, Mesmo marcada pela manifestação da diversidade existente e as mais variadas práticas culturais, contraditoriamente, a escola também tem por característica a não discussão das diferenças (Vianna & Ridenti, 1998), não rara vezes marcadas como anormalidade ou desvio (Magnabosco & Souza, 2018).

Para Preciado (2011), assim como há um Império Sexual, uma sexopolítica com normas regulatórias de territorialização para cada órgão do corpo e sua funcionalidade, também podemos pensar essas aproximações com o campo dos estudos das deficiências, ampliando a noção de sexopolítica para corpolítica. Desta feita, inicio com a partilha de alguns testemunhos, narrativas episódicas de experiências em espaços da cultura e da educação. Não sei quanto tempo faz. Pode ter sido hoje.

EPISÓDIO 2: OS DIAS EM QUE ROMEU NÃO LEU

Despedaçamos e somos despedaçades desde os nossos primeiros passos tortos, e nos reconstituímos persistindo na falha “fail again, fail better”. Dos cacos da nossa infância, nossos corpos aprendem outras linguagens, outros discursos, que comunicam outras formas de se relacionar, amar, de produzir memória, política e, sobretudo, novos mundos. (Halberstam, 2020, p. 53)

HEMIPARESIA ESPÁSTICA DIREITA É COMO AS NARRATIVAS NEUROMÉDICAS NOMEIAM MEU CORPO

Aprendi esse nome com um neurologista amoroso que me acompanhou (tive esse privilégio!) até os três anos. Lembro-me de uma última consulta com o mesmo. A mãe amedrontada queria comprovar com o médico se o seu filhe poderia começar a frequentar os bancos escolares. Com a confirmação positiva de que havia ali um corpo com vontade de potência para disputar suas marcas, se alegrava, ria-se de si mesma.

A partir das obras dos filósofos Friedrich Nietzsche e Baruch de Spinoza, Martins (2000) conceitua a vontade de potência a partir do conhecimento de si mesme nas relações, através dos afetos como efeitos de encontros inevitáveis e ao acaso, de modo que estas afecções podem aumentar nossa potência de agir, de pensar e transformar a realidade na qual nos relacionamos, afetando-nos de alegria e desejo de expansão. No entanto, podem também nos afetar de modo triste, diminuindo nossa potência de agir e nossa maneira de estar no mundo. Neste sentido, vos apresento minha segunda disputa: as cartas de Papai Noel.

Recebia inúmeras cartas do “bom velhinho” que versava esperança de que um dia meu corpo ficasse “bom e perfeito”. Restaria o desafio de construir e disputar ao longo da vida essa marca. A aula de Educação Física me deixava ansiose. Rompi. A aula de natação me dava medo. Rompi. Durante uma aula na universidade engoli o choro calade quando um professor colocou que hoje as mulheres estariam escolhendo melhor seus parceiros, não só por aspectos físicos, mas genéticos e isso evitaria filhos lesados. Nossa vontade de potência mina, nosso entusiasmo cessa, a ferida se abre. Esse menine olha o adulte.

COMO FORÇA INVISÍVEL, A PALAVRA, AOS POUCOS, TOCOU O CORPO. ENTRE FALA E SILÊNCIO, UM RESÍDUO DE COISA QUE QUER FALAR E NÃO PODE. AOS POUCOS, MURMURO.

Tinha quase quatro anos, quando estava para iniciar na escola. Um amigo do meu avô paterno fala, em meio a uma conversa familiar, que crianças como eu não deveriam ir à escola, afinal, não “aprendem nada”. Este senhor usava esse argumento utilizando-se de seu filho mais novo que nunca permitira ir à escola: uma criança como eu, nascida com o diagnóstico de hemiparesia espástica direita. Fui entendendo essas coisas aos poucos através de pesquisas muito solitárias que fui fazendo.

Meses se passaram, e contrariando as expectativas normativas, uma criança como eu, foi alfabetizada. Recordo a primeira palavra que consegui formular inteira na grafia do papel. Era bola. Estava na casa dos meus avós paternos novamente e àquele mesmo senhor, amigo da família, lá estava. Olhei em sua direção e com a cartilha na mão repeti: bola. Ali, conforme Eliane Brum, em seu “Meus desacontecimentos” (2014), havia desmoronado uma pré-discursividade sobre minha bio, tal ato nos dava uma grafia-outra. E, naquele instante, entre mim e Romeu, seu filho, não só se consumava uma fusão, mas uma separação definitiva. Dedico ao Romeu, esse trecho, uma criança como nós.

O que evidenciamos, portanto, é a deficiência como efeito de um processo sociopolítico de incapacitação e não uma condição natural como nos aponta Preciado (2020, p. 182):

O mundo sonoro não é melhor do que a surdez. A vida bípede, vertical e móvel não é uma vida melhor sem a arquitetura que o possibilita. Esses movimentos criticam os processos de normalização do corpo e da sexualidade que têm lugar na modernidade industrial, com seus imperativos de produção e reprodução da espécie. Não se trata de fazer uma melhor taxonomia da deficiência, nem de reivindicar uma melhor integração funcional do corpo com deficiência, mas de analisar e criticar os processos de construção da norma corporal que incapacitam alguns corpos em detrimento de outros. Não precisamos de melhores indústrias de deficiência, mas de arquiteturas sem barreiras e estruturas coletivas de treinamento.

Tal cena deste episódio também nos aponta como o capacitismo, conforme Mello (2016), também hierarquiza de maneira generalizada, ao estereotipar a pessoa com deficiência como incapaz de realizar atividades ordinárias, além de corroborar com uma prática protecionista quando favorece políticas neoliberais que unem “familismo” (modo privatista de pensar o bem-estar de pessoas com deficiências) e adequação às demandas de uma economia corponormativa.

Tal aspecto se torna uma barreira diante o caráter das relações de dependência e interdependência, para que possamos produzir agências que desviem da interpelação do poder, dos enquadramentos patologizantes e dos espaços hostis ao corpo diverso, de modo que também possamos elaborar novos quadros de reconhecibilidade (Alves, 2020).

EPISÓDIO 3: A SUAVE VIOLÊNCIA SIMBÓLICA, SUAVE COISA NENHUMA

Quais são nossas alianças de dissidências somatopolíticas atuais?

Durante uma discussão sobre as questões que perpassam as pessoas com deficiência no Brasil atual e seus desafios, um professor reforçou em sala de aula o impedimento de outras narrativas possíveis para o lugar das pessoas com deficiências, ‘amolando sua faca’6 ao afirmar que hoje as mulheres estão mais espertas e sabem escolher melhor seus companheiros, através de atributos não só socioeconômicos, mas também genéticos, escapando de gerarem ‘filhos lesados’, pois não gostariam de ter um filho com deficiência. Havia mulheres e pessoas com deficiências na sala. Era evidente, o desconforto e o efeito constrangedor que esta situação violenta produzia nos estudantes.

Uma leitura da deficiência a partir dessa racionalização é feita por Rosemarie Garland-Thomson (teórica feminista dos disability studies) a partir dos efeitos de corporalização de uma “prática de entretenimento” chamada freak show, ocorrida principalmente nos Estados Unidos entre meados do século XIX e XX, e marcada pelo movimento espetacularizado das aberrações clínicas: as fantásticas figuras freaks, ou melhor, o gigante, o anão de Madagascar, a mulher barbada, em suma, corpos tornados falhos em seu funcionamento (Gavério, 2015).

Quando os freak shows declinam nos idos de 1920, as narrativas das deficiências “ganham o status” de evento biológico ou adquirido, não menos anômalo, não menos problemático. O termo freak, portanto, era frequentemente relacionado a uma rotulação, a uma classificação pejorativa de determinados tipos de pessoas que não se “enquadravam nas normas”. Eram estigmatizados ainda os “desviantes”, logo enquadrados como “aberrações”, reproduzidos como disformes, assimétricos, degenerados, retardatários, defeituosos, deficitários, grotescos. (Gavério, 2015, 2020).

E bem antes, em 1863, Galton, primo de Charles Darwin, teorizou, baseando-se na ‘Teoria da Evolução das Espécies’, que as pessoas talentosas que procurassem outras pessoas talentosas garantiriam descendentes “perfeitos”. Tal teoria eugênica rapidamente se tornou uma ideologia racista e repressiva, cujos alvos passaram a serem os negros, os asiáticos e as pessoas com deficiência (Dias, 2013). Curiosamente, na Alemanha, de 1933, mais especificamente em 14 de julho, uma lei foi sancionada, permitindo uma “higiene racial”; ou melhor, necropolítica, com vistas de um futuro em que esses grupos fossem exterminados:

A Lei determinava que as pessoas que possuíam determinadas condições tidas como congênitas (retardo, esquizofrenia, bipolaridade, transtorno maníaco-depressivo, epilepsia, doença de Huntington, cegueira, surdez ou deformidade física grave) fossem conduzidas para um processo de esterilização, do qual faziam parte um parecer médico e uma autorização judicial. Mais de 400 mil pessoas foram esterilizadas. (Dias, 2013, p. 7)

E além da esterilização, acrescenta Dias (2013), cerca de 260 mil pessoas com deficiência foram assassinadas na Alemanha em nome da misericórdia. Tal lei que permaneceu ativa por longos anos depois do regime nazista, só foi considerada “errada”, no ano de 1988. Vale salientar, segue a autora, que as famílias que foram vítimas dessa lei nunca foram indenizadas. Desta feita, fica cada vez mais difícil sobrevivermos a milhares de “eventos” como esses.

Ademais, temos sido doloridas testemunhas dos constantes casos de suicídios nas universidades, inclusive de colegas nossos. De acordo com o Portal Sul21, em agosto de 2023, um estudante de engenharia cometeu suicídio nas dependências de um dos prédios da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sendo o terceiro caso de suicídio no mesmo local registrado em um intervalo de quatro anos. Só em 2020, no Brasil, os casos de depressão e ansiedade subiram 25%, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Além disso, uma pesquisa da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), de 2019, entrevistou 400 mil estudantes de 63 instituições: 23,7% relataram problemas emocionais ou psicológicos e mais de 80% dos estudantes se identificaram como ansiosos, insones, junto a sentimentos de solidão, desamparo e desânimo; 8% relataram ter ideação suicida7. De janeiro a dezembro de 2022, foram mais de 80 ações demandadas pela comunidade acadêmica, de acordo com levantamento do projeto de extensão MEDUSA, cujo público-alvo são estudantes da UFRGS, especialmente do Instituto de Psicologia e da Casa do Estudante, tendo como objetivo geral construir espaços de escuta, acolhimento e intervenções com estudantes e demais atores universitários acerca de questões relacionadas à saúde mental e vivências na universidade8.

Para tanto, nos parece válido questionarmos quais os pactos que fecham e quais abrem caminho para políticas de permanência na universidade pública. Passamos a não apenas sermos indesejáveis erótico-afetivos, somos também indesejáveis políticos. Neste sentido, torna-se improrrogável que tornemos marca essas experiências, deixando-as a ponto de registro.

CENA BÔNUS– QUE OCORRE QUANDO UMA BICHA DEFI*9 NÃO BINÁRIE NORDESTINE FALA?

“pode um saber dominante escutar uma fala subalterna quando ela se manifesta?” (Mombaça, 2015)

Uma mesa composta por esquizoanalistas bem ‘prafrentex’ discute políticas de acessibilidade para pessoas com deficiência na universidade, banalizando a experiência com a tese vulgar de que seriam tão ou mais “deficientes” por não saberem lidar com essa situação como acadêmicos. Ergo a voz e denuncio que eles não poderiam seguir reproduzindo tamanha violência ali, não aceitaria aquele acordo tácito. Encerraram a mesa na sequência, e apenas um colega negro me abordou sintonizado com a intervenção, os demais colegas sustentados pelo pacto narcísico de branquitude se aproximaram dizendo não ter compreendido minha fala: “No fim das contas, eles são de outra época, mas são bons deleuzo-foucaultianos!” Não, não são, mesmo que digam que é pra gente seguir o baile!

Tal episódio dá a ver o que Bento (2022) nomeou tão bem como pacto narcísico da branquitude, acordos de cumplicidade não verbalizados de autopreservação e expurgadores da diferença: “Trata-se da herança inscrita na subjetividade do coletivo, mas que não é reconhecida publicamente. Um herdeiro branco se identifica com outros herdeiros brancos e se beneficia dessa herança, seja concreta, seja simbolicamente, em contrapartida, tem de servir ao grupo, protegê-lo, fortalecê-lo (Bento, 2022, p. 24)”.

A partir deste conceito, Bento (2022) elabora conosco como pessoas brancas têm dificuldades de reconhecer a assimetria de acesso a oportunidades e recursos entre os vários grupos raciais, além de se sentirem ameaçadas quando se deparam com pessoas negras em posições de destaque, desnudando os códigos de fragilidade da branquitude e o mito da meritocracia.

E no que tange as políticas afirmativas e de acessibilidade às pessoas com deficiências, Mascarenhas e Moraes (2017) apontam como são sutis os mecanismos de inclusão/exclusão: não são naturais, nem inocentes e podem cair em armadilhas dicotômicas que são partes constitutivas de certas ordens discursivas e redes de poder, e urgem serem desnaturalizadas.

As supracitadas autoras chamam a atenção para os perigos dos discursos da diversidade, dos “somos iguais na diferença”, bem como o mito da “incompetência docente” como testemunhamos acima. Tais amarras emperram o campo da experimentação no encontro com a diferença e os circuitos de inclusão em rede, que não são um estado que alcançaremos, mas um processo, uma luta incessante e coletiva que não visa à homogeneização das formas de vida e não se fazem sem parceiras, risos, dúvidas, resistências...

SPIN-OFF: STRATUS DE UMA DERMATOLOGIA ESPECULATIVA

Me levanta, porra! (Leandrinha DuArt)

“A primeira memória acerca de meu corpo vem de quando eu tinha seis anos.” – é assim que DiMarco (2020) abre um dos capítulos de seu livro-testemunho para nos dar a pensar conforme Preciado (2020) como a escola é uma ‘fábrica de subjetivação’, não sendo um simples lugar de aprendizagem de conteúdos, podendo até promover inúmeros assassinatos sociais:

Eu caminhava na ponta de um dos pés, o que fazia minha marcha ser esquisita perante o olhar alheio. Na escola, as crianças colocavam o pé para eu cair, me esperavam escondidas nas dobras das paredes para que eu não as visse. Mesmo como seu privilégio de estar em uma escola regular, meu corpo ai não era sinal e regra. Não via outras crianças com o marcador da diferença, não me via em ninguém e, por assim, dizer, nem em mim mesmo. Foi me tirado o direito à memória e ao reconhecimento, meus gestos e meu andar se tornaram naquele lugar um símbolo de risada. (Dimarco, 2021, p. 23)

Bastante ‘engatilhade’ com o relato do autor, emociono-me, mas retomo o texto:

Tenho uma memória muito forte de quando eu estava na segunda série. Em um belo dia, fazia frio e eu usava touca da cabeça, pois bem, na hora do recreio as crianças a puxavam da minha cabeça e ficavam se tocando de um lado para outro, rindo enquanto me viam correr mancando para alcançar a touca. O corpo que nasce nessa situação, além do imaginário do cômico, é o de servir ao entretenimento alheio, ao divertimento dos seres bípedes que em nome da sua normalidade se afirmam nas nossas particularidades. (Dimarco, 2021, p. 23)

Testemunhamos aqui o que Preciado (2020) chama de o castigo aos dissidentes potencializado e tendo sua teatralização valorizada pela convencionalidade de códigos corponormativos que vigiam gestos e premeditam violências sob o aval de repetições impunes quando confrontados. Algo que Silveira (2018) problematizará como um palco montado para que corpos com deficiências sejam tornados “aberrações” sob a custódia da patologização de um teatro médico e atravessados pelo olhar do espectador que hiperboliza a diferença, marcando a monstruosidade, na esteira de Douglas (1976), como uma ferida na ordem social, bem como um veredicto final para corpos com deficiências.

Portanto, para pormos em marcha uma insurreição queer-crip, há que nos aprofundarmos nestes conflitos, nos espalharmos (Bash Back!, 2020) e encontrarmos essa potência monstra, bizarra, híbrida, conforme Moscheta (2022), cujo horizonte geográfico é ocupar as bordas como espasmos de incongruência, perturbação, imprecisão e perplexidade. Análogo ao que propõe o supracitado autor para uma bússola cuir, estas seriam nossas tentativas de gestos crip de instauração, ou seja, de apontar a existência de um horizonte aleijado; de desobediência, de emergir da audácia sem se deixar capturar em uma cidadela de monstres; e de experimentação, em outras palavras, transitar como força, como virtualidade pedindo um pouco mais de existência, pode ser aquilo que só se conhecerá logo aconteça. Faísca crip.

Estou na casa da minha mãe, no sertão paraibano, e faço uma pausa da leitura, quando recebo um convite de um novo amigo para uma “fechação da beecha” na praça central da cidade. Logo chego, o percebo “com muitos dedos” se deveria me ajudar ou não a subir as escadas da choperia que entramos. Digo que está tudo bem e ele com o peito mais aberto, uma ‘dose de Campari’ e algumas cervejas, me relata uma cena inusitada: durante um evento musical estava ao lado da ativista Leandrinha DuArt10 e temendo reproduzir capacitismo não sabia se fazia alguma coisa para deixa-la mais confortável na cena dançante. Ao passo que Leandrinha lhe interpela: “Me levanta, porra!”. E a festa seguiu. Rimos (Vaz, 2023).

Nesta via, acompanho o pensamento de Lobo (2016) ao tomar a deficiência como acontecimento sentido e produzido historicamente, como derivação, e não como sentença de morte, como um fantasma real que se fixa na falta, no não-ser (porque é falta-de-ser) da anormalidade, na identidade da não-eficiência.

Então, é preciso perguntar: quem diz o que é este padrão de eficiência a partir do qual os outros devem ser julgados? Quem institui as palavras-de-ordem para que os outros lhes obedeçam? Ser “eficiente” para quê e para quem? Nem a igualdade, esta máscara piedosa da integração, nem o gueto, que é seu subproduto puras sentenças de morte. (Lobo, 2016, p. 232)

Querer o acontecimento, não o “ser deficiente”, mas um devir-deficiência acrescenta a autora, que rompa as tutelas, e afirmar as diferenças, correndo o risco de misturar-se no mundo enquanto modo minoritário e singular. O que não quer dizer que:

Opor-se à ideia de deficiência como algo anormal não significa ignorar que um corpo com lesão muscular necessite de recursos médicos ou de reabilitação. Pessoas com e sem deficiência buscam cuidados médicos em diferentes momentos de sua vida. Algumas necessitam permanentemente da medicina para se manter vivas. Os avanços biomédicos proporcionaram melhoria no bem-estar das pessoas com e sem deficiência; por outro lado, a afirmação da deficiência como um estilo de vida não é resultado exclusivo do progresso médico. É uma afirmação ética que desafia nossos padrões de normal e patológico. (Diniz, 2007, p. 4)

Para tanto, nos interessa, a fuga:

das identificações (sempre da piedade) e dos reconhecimentos (sempre da má consciência moral). É chamar para si o acontecimento, conquistar a cidadania para além do pessoal e do coletivo, do público e do privado (Deleuze, 1969/1974), embora se tenha que enfrentá-los em suas lutas e suas misérias cidadão do mundo. É uma política de expansão das potências dos corpos, uma vida ético-estética e política de um modo menor e impessoal um devir-deficiência que nada tem a dizer sobre o que os nossos corpos são, mas que afirmam o poder de se tornarem livres, soberanos e belos. (Lobo, 2016, p. 232)

Me levanta, porra!” Pois resta-nos algum entusiasmo depois do choro, e algumas doses de Campari e drinks de corote. . . Memórias-outras se atualizam. Oxalá que a vida siga se afirmando. . .

Usando de Deleuze (1999), Lazzarotto (2009) problematiza o conceito de memória como não sendo redutível a uma experiência psicológica e ontológica relacionada a um passado eterno que carregaríamos. O passado, por essa linha, não se constituiria depois de ter sido presente, ele coexiste como presente, ao passo que este seria o passado inteiro em seu estado mais contraído. Sendo assim, como coloca Lapoujade (2013), introduzimos uma outra forma de memória que não é apenas reserva, lembrança, contração do presente, mas memória do futuro e para um futuro engendrado como potência e reconduzido ao afeto do qual partiu.

Portanto, passearemos (na companhia da memória) por um derradeiro espaço educacional habitado por mim. Era uma escola no interior do nordeste brasileiro, na qual todo fim de ano acontecia uma Semana de Arte e Cultura. Os estudantes é que escolhiam com um mês de antecedência os temas que iriam abordar durante a Semana. Os stands iam de Shakespeare a Jorge Amado; da chegada da ‘Família Real’ ao Brasil às discussões éticas sobre a possível clonagem de seres humanos. Juntavam-se todes: os que sentavam na frente, no meio, e no fundão da sala. Nem essa divisão existia mais, pois os encontros davam-se às rodas, entre professores e leituras dos textos, na construção dos cenários, das montagens, entre ensaios... E todos se saiam muito bem...

Quando a sensibilidade se faz ferramenta política ao que nos acontece, interrompemos não só uma concepção futurocêntrica como meta ou finalidade, conforme Hillesheim e Cruz (2008), mas também trazemos a possibilidade do incompreensível e do imprevisível, embaralhando e perturbando cálculos embasados na previsão e no controle, introduzindo a descontinuidade e a diferença, abrindo as portas de um mundo-outro, ao mesmo tempo em que desmanchamos alguns desses mundos, acrescentam as autoras.

Durante a quarta e última temporada de Sex Education (série disponível pela plataforma de streaming Netflix e que muito inspirou este artigo), os personagens frequentam a progressista e aparentemente inclusiva Cavendish Secondary School. Lá temos sala de yoga e um escorregador, obrigatoriedade na reciclagem de lixo, um meso-palco italiano para estudantes se expressarem a qualquer instante, além de incontáveis moments of pride da diversidade sexual e gênero, já que o casal mais popular da escola é formado por Abbi (Anthony Lexa), uma garota trans, e Roman (Felix Mufti), um garoto trans11.

Elus são melhores amigues de Aisha (Alexandra James), uma garota surda oralizada, com implante coclear, apaixonada por tarô e astrologia, e que fofoca eventualmente, causando uma reação moralista em seus amigos, pois há um traço bem marcante de “positividade tóxica” intragrupo. Ademais, temos uma junção improvável entre Isaac e Aimee. Isaac (George Robinson) é um jovem cadeirante e Aimee (Aimee Lou Wood) uma garota, que vai aos poucos atravessando um capacitismo internalizado, se entendendo como neurodivergente.

Isaac sofre constantemente com as barreiras arquitetônicas: elevadores quebram no meio do trajeto às aulas, ou estão sempre em manutenção. A experiência vivenciada pelo personagem refere-se ao entrelaçamento que Santos e Pinheiro (2021) fazem da “experiência defiça” com o conceito de outsider within, de Patrícia Hill Collins (2016), pelo caráter de ser o mesmo e ainda ser o outro, o que nos remete:

ao sistema educacional que trata o aluno com deficiência como aluno de educação inclusiva por estar em convivência escolar, porém sem ser de fato incluído metodologicamente com todas adequações necessárias às disciplinas ou com a naturalização no tratamento social entre ele e os colegas de classe para integrar e coexistir de dentro de todas as demandas de afeto e atenção entre os alunos, mais do que isto, poder virar referência em componentes curriculares através de exemplos de representatividade. (Santos & Pinheiro, 2021, p. 86)

Em dado momento da série, Isaac junto a Aimee disparam o alarme de incêndio da escola, com vias a chamar atenção de todes para as barreiras arquitetônicas e instrumentais, que não estão livres de serem reproduzidas em um ambiente cool. A partir do discurso de Isaac, Aisha também se mobiliza ao denunciar as barreiras comunicacionais e atitudinais que a mesma enfrenta. Evidenciamos aqui o que Preciado (2023) chamará de comunismo somático, dysphoria mundi, como alianças que se dão além da construção de uma identidade em comum, mas pela perspectiva política das multidões queer (Preciado, 2011), emergindo como desontologização de sujeites frente a efeitos normalizantes.

Por esta via, Cruz (2022) apostará na potência ética inclusiva das multidões queer, por alimentar e possibilitar a produção de novos modos de vida, além de incluir múltiplos modos de nos comunicarmos. A partir de então, se cria algo que Mello, Aydos e Schuch (2022) chamam de affordances: interações em um ambiente significativo pelos seus traços, e que Arseli Dokumaci (2017), citada por estas autoras, considera como não só adaptações ambientais, mas também “performances de deficiência”, sejam elas individuais, coletivas, improvisadas ou coreografadas.

Através da intervenção de Isaac e Aisha, se desvela a responsabilidade institucional, conforme (Sassaki, 2010), de executar as devidas adaptações razoáveis quando o ambiente possui barreiras que impedem a plena acessibilidade ao local. E, deste modo, de acordo com Fietz (2020), podemos elaborar o cuidado como uma questão de justiça social, e de dispor de seu tempo para o outro, de “fazer o tempo” (make time) (Puig de La Bella Casa, 2017).

Sendo assim, acrescenta Fietz (2020), reconhecer o tempo aleijado (crip time) é coexistir com temporalidades alternativas, dissidentes, cuja marca é desafiar, questionar, tensionar as noções dominantes de “tempo produtivo”. O tempo aleijado, nas palavras de Kafer (2013), também desacomoda o ritmo dos relógios e a futuridade crip (crip futurity). Tal autora propõe, na esteira de Veena Das (2007) e Puig De La Bella Casa (2017), um regime de temporalidade como agente trabalhando nas relações, feito na prática, desde arranjos sociotécnicos e experiência vivida, corporificada e situada socio historicamente, coproduzindo-se dentre uma variedade de timescales (escalas de tempo), que também se contestam.

Ao termos o tempo do cuidado e o tempo aleijado desafiando as temporalidades dominantes, temos fissuras, ímpetos, arroubos, pequenas desviadas, avessos e contrapelos, sendo suas próprias exceções, podendo existir e ser encontrado, conforme Bensunsan (2014). Um cuerpo como um touchscreen, dermatologia sensível e especulativa, encruzilhada do que existe, disponibilidade para os bacilos, os desejos, os ventos, os acasos. Stratus spinosum, matrioska das peles (Bensunsan, 2014).

SPOILERS PARA A PRÓXIMA TEMPORADA: O QUE NÃO PÁRA DE ESTAR POR VIR

Todes listes! Muy pronto, monstres.

A partir de então, desejamos realizar uma crip rides, um passeio aleijado, que opere nossos corpos como uma enunciação arriscada, conforme Mombaça (2020), que redistribuía uma violência histórica sem levar a bomba pra explodir, mas estudando seus efeitos, desenhando como a gente atravessa uma onda de explosões distópicas, desautorizando uma matriz de autoridade que construiu um mundo com medo de ser um planeta aleijado (Gavério, 2015).

A intenção de nosso gesto político é antes de tudo, de acordo com Mombaça (2021), uma ferramenta de interrupção de vozes hegemônicas, para que emerjam vozes historicamente interrompidas. Em última instância, partimos de uma posição comum de escuta politica, com vias a também canibalizar as “narrativas de origem”, como coloca Axt (2023), para que assim possamos produzir quiasmas em placas cimentadas de entulho colonial (Miranda, 2022).

Desta feita, a direção de nossa bússola para a próxima temporada nos aponta às gramáticas de reconhecimento, de tal modo que sejamos reenviados à alteridade e à reciprocidade e escapamos de movimentos “generosos” de “oferta de uma voz” (York et al., 2022). O que não será tarefa difícil, como coloca hooks (2018, 2019), pois, não raras vezes, chegamos a alguns chãos teóricos muito machucades, e para “erguer uma voz”, ou seja, para encontrar uma voz libertadora é preciso promover solidariedades políticas.

A partir destas, agências coletivas e acolhedoras serão instauradas, modificando e buscando outros frames dentro dos quadros de reconhecibilidade (Butler, 2017), pois, como coloca Rivera (2013), somos atores de um filme, de uma ficção fundamental, e quando mudamos uma geografia, não só a função normativa de uma epistemologia é alterada, mas toda a produção de conhecimento, quem é autorizado a produzir, de que modo critérios de credibilidade são distribuídos e como os objetos de investigação são delineados e delimitados (Alcoff, 2016).

Neste aspecto, a nossa próxima temporada também tem como plot denunciar as violências epistêmicas que predominaram sobre nossas crip stories a partir de versões unívocas, tomadas por verdadeiras, frutos do monopólio de fala (Gomes, 2019) eivado pela ignoração de um “extrativismo epistêmico” (Grosfoguel, 2016), que só notabiliza determinadas teorias (especialmente do Norte Global), depreciando as que são elaboradas aqui no Sul Global.

Vale frisar também, conforme Alcoff (2020), que a premissa de falar por nós mesmes não resolve o problema, pois o “eu” não é um todo unificado e autônomo, mas produzido desde múltiplos atravessamentos, discursos e graus de mobilidade. Para tanto, cabe a questão colocada por Favero (2022): embora nos posicionarmos não encerre com a violência, escrever aqui é um ato de teimosia. E a estratégia ensaística no contexto de um crip education implica sofrer o exílio, reconhecendo, conforme bell hooks (2022), que se deixou o contexto de origem e que mesmo, em meio a amargura e o gris de um clima nublado, move-se com algum jeito de corpo.

Sendo assim, acrescenta a autora, tal exílio não se materializa apenas em dor e pessimismo, no qual o presente do exilado gira nostalgicamente em torno de seu passado, lamentando. Quando nos deixamos tocar (de corpo inteiro) pelo exílio, projetamos e existimos no presente, no qual preparamo-nos, não para um volta no tempo em busca de um paraíso atemporal, mas para uma volta possível, convertendo a forma-de-vida em força sensível, conforme Tiqqun (2019).

Algo bem próximo ao que coloca Haraway (2016) também acerca da escrita-ciborgue, que não tem a ver com um “era-uma-vez”, mas com um marcar o mundo que nos marcou como “os outros”, pois como coloca Nascimento (2021), também em diálogo com Kilomba (2021): a história dos grupos subordinados, não raras vezes, ganha contornos de eventos exóticos, como uma sub-história da história tomada como oficial.

Para tanto, a próxima temporada pegará também a direção do passado como uma posição (Trouillot, 2016), ou como uma memória ativa transformadora de um presente. (Gagnebin, 2009). E retomando Collins (2016), a noção de outsider within embarcará conosco devido a sua composição peculiar de unir distância e proximidade e lograr uma abertura incomum ao apontar o imperceptível por “nativos” em determinadas situações.

Talvez isso esteja próximo a o que Gavério (2015) chama de desestabilização do binarismo: ameaças crí(p)ticas, aleijadas em suas esquisitices, monstruosidades, perversões, defeitos, espectros que assombram as normalidade, já que nossa presença em espaços hegemônicos, conforme bell hooks (2019), é uma interferência, e enquanto outsiders within, podemos desafiar os limiares entre real e ficção, como no caso das escrevivências (Miranda, 2019), bem como as redes de poder que sejam conformes com uma história tomada como oficial para corpos com deficiências.

Como forasteires de dentro, podemos criar outras agências para nossas existências, disjuntar o próprio tempo, redistribui-lo e fabricar uma memória do porvir (Lapoujade, 2015), cujo work in process é um monster theory que, nas palavras de Mombaça (2016), constrói seu percurso metodológico através de fragmentos, pegadas, ossos, sombras, vislumbres obscurecidos. Seguindo esta via, Halberstam (2020) também embarcará conosco através da noção de wild archives (arquivos selvagens), abrindo caminho para que marcadores somáticos possam se tornar de fonte de conhecimento a partir de sua singularidade e seu modo de existência (Greiner, 2023).

Tal exercício também é acrescido pela afrobulação de Tavia Nyong’o (2018), pela fabulação crítica de Saidya Hartman (2022) e pela ficção especulativa de Donna Haraway (2023). A afrofabulação desconstrói, conforme Greiner (2023), uma relação contínua entre história e roteiro, ao reconhecer que a imaginação é inevitável no tempo. Nesse mesmo diapasão, acrescenta a autora, a fabulação crítica e a ficção especulativa explicitam histórias invisíveis que foram encobertas tanto por questões políticas quanto por dispositivos de dominação.

É, neste sentido, que Miranda (2022) potencializa escavar o encoberto como ato político, ancestral e contra colonial, proporcionando que o subalternizado repense o seu não lugar no sistema-mundo. E esse não lugar, complementa o autor, é sempre uma fronteira, instável e que gera desconfortos, mas também pequenas esperanças estratégicas em articular insurgências político-epistêmicas, suturas entre discursos e práticas que nos interpelam (Hall, 2000). Por ora, vos deixo com um intervalo de descanso. À bientôt!

2As injustiças epistêmicas produzem frames, enquadramentos, nas palavras de Butler (2020), que delimitam a esfera de aparição de determinados corpos. A partir desse entendimento, Harding (2019), desde a teoria do ponto de vista (standpoint theory), irá apontar como alguns pesquisadores exercem uma influência injusta na construção do pensamento.

4A Lei de Cotas (Lei n° 8.213/91) determina que empresas com mais de 100 funcionários mantenham de 2% a 5% de seus quadros reservados para a contratação de pessoas com deficiência, permitindo sua inclusão no mercado de trabalho (Fachini, 2022).

6Conceito forjado por Luis Antonio Baptista (1999) para denunciar olhares psicológicos habituados a usar as máscaras e as lentes supostamente neutras da ciência. Querem-se inocentes e cheios de boa vontade, mas revelam facas que esquartejam e possuem alguns aliados, podendo ser encontrados em discursos, textos, falas, modos de viver, modos de pensar. Aparentemente destituídos de crueldade, os amoladores de faca buscam enfraquecer suas vítima, com o intuito de torna-las cúmplices do ato, carentes, fracas e estrangeiras de sua condição humana.

9A palavra “defiça” ou defi* é uma abreviação carinhosa de “deficiente”, segundo Mello, Aydos e Schuch (2022), utilizada por ativistas aleijades como autoidentificação, aniquilando assim a adjetivação, ao substantivar a identificação e positivar um marcador da diferença.

10Leandrinha DuArt nasceu em Passos, Minas Gerais. É ativista pelos direitos das pessoas trans e com deficiência. Mulher trans e cadeirante, nascida com uma condição rara chamada Síndrome de Larsen (síndrome que afeta o desenvolvimento dos ossos), Leandrinha é também comunicadora e colunista NINJA, teóloga, fashionista, photographer, makeup artist, fashion icon and style, youtuber, vlogger e blogueira, além de ter sido candidata a deputada federal em Minas Gerais pelo PSOL, em 2018.

Financiamento

Não houve financiamento

Consentimento de uso de imagem

Não se aplica.

Aprovação, ética e consentimento

Não se aplica.

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Recebido: 15 de Novembro de 2022; Revisado: 29 de Outubro de 2023; Aceito: 29 de Outubro de 2023

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