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Psic: revista da Vetor Editora

Print version ISSN 1676-7314

Psic vol.5 no.2 São Paulo Dec. 2004

 

ARTIGOS

 

Adolescência: facilitando a aceitação do novo esquema corporal e das novas formas de pensamento

 

Adolescence: improving the acceptance of new corporal scheme and new ways of thought

 

 

Kathia Maria Costa Neiva 1; Mônica Martins de Abreu 2; Tatiana Pereira Ribas 3

Universidade Ibirapuera

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo principal deste trabalho foi facilitar a passagem para a adolescência de um grupo de 20 jovens com idade entre 11 e 13 anos, que freqüentavam uma ONG localizada no bairro do Brooklin, São Paulo, durante o segundo semestre de 2003. Foram realizadas nove sessões de intervenção com aproximadamente uma hora de duração, à razão de uma sessão por semana. Nessas sessões foram utilizadas dinâmicas de grupo com o objetivo de facilitar a aceitação do novo esquema corporal e das novas formas de pensamento. Para avaliar a intervenção foi utilizada a “Escala de Autoconceito” construída pelas autoras, adaptada da Escala de Autoconceito – ERA (Corona, 1999). O instrumento, composto de 16 afirmações que permitem avaliar o autoconceito físico e o autoconceito psicológico, foi aplicado na primeira sessão de intervenção e reaplicado na última. Observou-se que as médias obtidas pelo grupo no pós-teste foram superiores às do pré-teste. Entretanto, as diferenças não se mostraram estatisticamente significativas, o que não permite concluir que a intervenção gerou um desenvolvimento significativo no autoconceito físico e psicológico desses jovens. Supõe-se que as dificuldades surgidas para o cumprimento do planejamento na sua íntegra possam ter contribuído para tal resultado, assim como o instrumento utilizado ainda não validado. Vale ressaltar, entretanto, que a avaliação do grupo com relação ao projeto foi muito positiva.

Palavras-chave: Adolescência, Identidade, Autoconceito.


ABSTRACT

The main goal of this study was to facilitate the entrance into adolescence of a group of 20 teenagers from 11 to 13 years old, that went regularly to a ONG located in a neigborhood of São Paulo city, during the second semester of 2003. Nine meetings took place, lasting approximately one hour each, one meeting per week. In these meetings, many activities were carried out to facilitate the acceptance of new corporal scheme and new ways of thinking. A “Self-Concept Scale”, elaborated by the authors and adapted from the “Self-Concept Scale – ERA” (Corona, 1999), was used to evaluate the program. The instrument, composed by 16 affirmations that allow to evaluate physical self-concept and psychological self-concept, was used in the first and last meeting. It was observed that the averages obtained by the group in the post-test were higher than the averages obtained in the pre-test. However, the differences were not statistically significant, which does not allow to conclude that the program generated a significant development on the physical and psychological self-concept of these teenagers. We suppose that the difficulties found in order to do all the activities may have contributed for such result, as well as the instrument used is no yet validated. Nevertheless, the evaluation of the group concerning the program was very positive.

Keywords: Adolescence, Identity, Self-concept.


 

 

Introdução

Este trabalho surgiu no estágio de Intervenção Psicossocial, obrigatório na Formação de Psicólogo da Universidade Ibirapuera. A proposta desse estágio é, em um primeiro momento, detectar as necessidades psicossociais da clientela atendida em uma instituição educativa ou comunitária e, posteriormente, desenvolver um projeto de intervenção visando a atender uma das necessidades psicossociais detectadas.

A instituição escolhida foi uma ONG (Organização Não Governamental), ainda não oficializada, criada em maio de 1992, que possui seis unidades e atua preventivamente com crianças e adolescentes da favela do Buraco Quente e becos e cortiços da região do Brooklin, São Paulo, dando ênfase à família e à educação, fazendo com que a maioria dessas crianças não freqüente mais as ruas da cidade.

A partir da caracterização da instituição e diagnóstico das necessidades psicossociais da clientela atendida, realizada no primeiro semestre de 2003, decidiu-se realizar um projeto de intervenção em um grupo de jovens de 11 a 13 anos, pois segundo a diretora da instituição, esse grupo “apresentava comportamentos de revolta e malcriação para com seus educadores”.

Tendo como base o fato de esses jovens estarem numa faixa etária correspondente ao início da adolescência e da queixa apresentada pela instituição ser um comportamento típico dessa etapa de desenvolvimento, optou-se por desenvolver um projeto que facilitasse a passagem da infância para a adolescência. Decidiu-se assim facilitar a aceitação do desenvolvimento físico e psíquico que ocorre no início da adolescência, ou seja, a aceitação do novo esquema corporal e das novas formas de pensamento (Moujan, 1986).

Adolescência: conceito e características

De acordo com Cabral e Nick (2001), a adolescência é uma fase entre a puberdade e a maturidade que, para as meninas, vai normalmente dos 12 aos 21 anos e para os meninos dos 13 aos 22 anos. Nessa fase ocorre um crescimento importante, incluindo, além das mudanças físicas e fisiológicas do corpo, o desenvolvimento intelectual, dos interesses e das atitudes.

A palavra puberdade vem do latim pubertate e significa sinal de pêlos e barba. Esse período ocorre aproximadamente entre os 9 e 14 anos e caracteriza-se pelo surgimento de mudanças biológicas, principalmente no que diz respeito à atividade hormonal, desencadeando os caracteres sexuais secundários (Outeiral, 1994). Para Cabral e Nick (2001) a puberdade é uma fase de curta duração, cerca de 2 anos ou mais para meninos e não mais do que 6 meses para as meninas, na qual as mudanças fisiológicas tornam-se evidentes e há um amadurecimento dos órgãos genitais.

A palavra adolescência tem dupla definição, ela vem do latim adolescer e significa que o indivíduo está apto a crescer. Seu outro significado também vem do latim adolescere que significa adoecer (Outeiral, 1994).

Para Knobel (1992) a adolescência se caracteriza por ser uma fase evolutiva na qual o indivíduo estabelece sua identidade adulta a partir de internalizações e identificações ocorridas na infância, principalmente na relação com seus pais, mas também levando em conta as influências da sociedade em que vive. A adolescência é, portanto, um período evolutivo humano que deve ser considerado a partir de aspectos biopsicossociais. É uma fase que “obriga o indivíduo a reformular os conceitos que tem a respeito de si mesmo e que o levam a abandonar sua auto-imagem infantil e a projetar-se no futuro da sua vida adulta” (Knobel, 1992, p. 26)

De acordo com Moujan (1986), o processo de aquisição da identidade na adolescência pode ser dividido em três períodos:

a) Período da puberdade

No período da puberdade é que se constrói o novo esquema corporal. O jovem sente seu corpo como estranho, pois ocorrem mudanças físicas, novos impulsos e sensações, gerando uma certa dissociação mente–corpo. Conseqüentemente, ele tenta reformar seu corpo, erotiza seu pensamento e fica, às vezes, confuso com relação à sua identidade sexual. Algumas condutas típicas desse período são: dietas, voracidade, constipação e sujeira. Nessa etapa o adolescente pode ter alterações com relação à percepção do próprio corpo e apresentar fadiga, somatizações e até mesmo desenvolver quadros como anorexia, bulimia e outros. O sentimento de identidade característico desse período é a unidade, que vai sendo formado a partir da necessidade do adolescente de integrar-se e diferenciar-se no espaço como uma unidade que interage. Todo esse processo resulta na configuração da identidade do ego corporal.

b) Meia adolescência

No período da meia adolescência se constrói o novo mundo interno. O adolescente sente a si mesmo como diferente, pois ocorrem mudanças nas idéias, nas metas e nos pensamentos. Conseqüentemente, ocorre a mudança do pensamento concreto para o abstrato e o adolescente elabora novas teorias, especulações e reflexões, apresentando como condutas típicas desse período os sonhos diurnos e jogo de palavras. Nessa etapa, o adolescente pode apresentar frieza do pensamento, grandes teorias, flutuações entre identidade negativa e pseudo-identidade. O sentimento de identidade característico desse período é a continuidade que vai sendo formado a partir da necessidade do adolescente integrar-se e diferenciar-se no tempo. Todo esse processo resulta na configuração da identidade do ego psicológico, que requer que as identificações infantis se transformem em identificações adultas.

c) Final da adolescência

No período do final da adolescência se constrói o novo mundo social, com o apoio das identidades já adquiridas. O adolescente percebe que os outros já não o percebem como antes. As condutas típicas desse período são: busca de reconhecimento entre o grupo de pares e entre os adultos; ingresso em atividades sociais, políticas e profissionais. Nessa etapa, o adolescente pode ter alterações com relação à percepção dos objetos externos, por exemplo, troca de objetos de amor, necessidade de pertencer a grupos novos e às vezes marginais, tendência à submissão ou ao despotismo e outros. O sentimento de identidade característico desse período é a mesmidade, que vai sendo formado a partir da necessidade do adolescente de reconhecer a si mesmo no espaço e no tempo e de ser reconhecido pelos demais. Todo este processo resulta na identidade do ego social, que requer a reconciliação entre o conceito que se tem de si mesmo e a imagem reconhecida pelos outros.

A aquisição da identidade exige do adolescente a elaboração de lutos. Aberastury & Knobel (1992) consideram a existência de três tipos de luto na adolescência:

a) Luto pelo corpo infantil

As transformações corporais que ocorrem a partir da puberdade são vividas pelo adolescente, geralmente, com ansiedade. Ele passa por esse momento com uma mentalidade ainda infantil, num corpo que vai se desenvolvendo incontrolavelmente. As restrições dos familiares e da sociedade para controlar seus impulsos chegam a ameaçar seu desenvolvimento, podendo causar um atraso no crescimento ou no aparecimento natural das funções sexuais próprias dessa fase. As mudanças corporais obrigam também o adolescente a reformular a imagem mental que tem de seu próprio corpo, ou seja, seu esquema corporal. Isso só se torna possível à medida que ele elabora a perda do corpo infantil e consegue aceitar o novo corpo. Aceitar a perda do corpo infantil consiste em aceitar também a perda da bissexualidade (psicológica), ou seja, a perda do outro sexo que até então imaginava ser seu também. Na adolescência, o conceito de sexualidade deverá ocorrer no nível psicológico ao mesmo tempo que no biológico.

b) Luto pelo papel e identidade infantis

Na infância, a relação de dependência é algo natural no convívio da criança com os pais. Quando chega a adolescência há uma confusão de papéis, pois o adolescente não é mais criança e não é ainda adulto, tendo assim dificuldade em se definir nas várias situações de sua cultura. Cada avanço que faz para obter sua independência deixa o adolescente com medo e insegurança. Por isso, procura o apoio do grupo no qual ele deposita sua confiança e esperança, deixando as responsabilidades e obrigações para os pais. Fazer parte de um grupo ajuda o adolescente a estabelecer uma identidade adulta, pois facilita o distanciamento dos pais e permite novas identificações, o que o leva a novas construções e reestruturações da personalidade.

Por um certo tempo o adolescente vivencia vários papéis, identificando-se com diferentes figuras ou grupos do seu meio social, e assimilando valores e papéis fora do meio familiar. Nesse período da vida é possível assumir diversas identidades, que podem ser transitórias, ocasionais ou circunstanciais. Para atingir a identidade adulta, o adolescente necessita integrar suas identificações. Só assim a fase adulta será uma meta desejada e não temida.

c) Luto pelos pais da infância

Nessa fase, o aspecto mais importante é o da dependência/independência dos filhos em relação aos pais e vice-versa. O desenvolvimento é vivido, na adolescência, com muita agressividade e culpa, com avanços e regressões. Estabelece-se o fenômeno psicológico no qual, ambas as partes, desejam e temem o crescimento, a maturação sexual e todas as responsabilidades e riscos que isso pode ou poderia acarretar. Os pais, até então idealizados e supervalorizados pelo filho, passam a ser alvo das mais violentas críticas e questionamentos, e surge a necessidade de uma busca de figuras de identificação fora do ambiente familiar. Nessa busca, o adolescente tenta e procura substituir muitos aspectos da sua identidade familiar por outra mais individual e enriquecida por novos elementos do seu ambiente social mais amplo.

Sendo assim, levando em conta a queixa manifestada pela diretora da ONG e a idade dos sujeitos (11 a 13 anos), pode-se considerar que esses jovens encontram-se provavelmente em transição entre a primeira e a segunda etapa do processo de identidade proposto por Moujan (1986), ou seja, finalizando a configuração do ego corporal e iniciando a configuração do ego psicológico. Já com relação à elaboração de lutos (Aberastury & Knobel, 1992), pode-se dizer que estes jovens provavelmente estão, não só elaborando o luto pelo corpo infantil, mas também o luto pelo papel e identidade infantis.

É válido ressaltar que hoje em dia um grande número de crianças com idade entre 7 e 9 anos, que possuem ainda um corpo infantil, adotam comportamentos semelhantes aos dos adolescentes, ou seja, se vestem como tais e exibem sensualidade ao dançar, entre outros. Provavelmente, esses comportamentos ocorrem devido às estimulações ambientais, fazendo-os adolescer mais cedo, pois a adolescência é um fenômeno psicossocial (Outeiral, 1994).

Tomando como base as idéias desses autores, este projeto teve como objetivo facilitar a passagem da infância para a adolescência nesse grupo de jovens, dando ênfase ao desenvolvimento físico e psíquico, priorizando a facilitação da aceitação do novo esquema corporal e das novas formas de pensamento.

Considera-se ainda que desenvolver um trabalho, que facilite a passagem da infância para a adolescência e a elaboração do processo de identidade, pode ter um caráter preventivo importante principalmente com os jovens provenientes de populações menos favorecidas do ponto de vista socioeconômico e cultural, pois nessa população é freqüente a desestruturação familiar, o que pode gerar dificuldades na aquisição de uma identidade autêntica.

 

Método

População-alvo

A intervenção foi realizada em um grupo constituído por 20 jovens, de ambos os sexos, com idade entre 11 e 13 anos, que freqüentavam, no período matutino, uma ONG situada no bairro do Brooklin, São Paulo.

Instrumentos

Durante a intervenção, foram utilizadas dinâmicas de grupo e atividades estruturadas que visassem a facilitar a aceitação do novo esquema corporal e das novas formas de pensamento.

Para avaliar a intervenção foi utilizada a Escala de Autoconceito (Anexo I) construído pelas autoras com base na Escala de Autoconceito – ERA (Corona, 1999). O instrumento é composto de 16 afirmações, sendo que oito delas avaliam o Autoconceito Físico (4 positivas e 4 negativas) e as outras avaliam o Autoconceito Psicológico (4 positivas e 4 negativas), como mostra a tabela 1, apresentada a seguir:

 

 

O jovem tem de analisar cada afirmação e assinalar se concorda, concorda parcialmente ou discorda. Essa escala foi aplicada na primeira e na última sessão da intervenção.

Para a avaliação do instrumento, estabeleceram-se critérios de pontuação para as respostas dadas às afirmações positivas e às negativas, atribuindo-se uma pontuação que variou de 1 a 3. Para as afirmações positivas, referentes ao Autoconceito Físico e ao Autoconceito Psicológico (afirmações de números 1, 4, 6, 8, 10, 13, 15 e 16), atribuiram-se 3 pontos para “Concordo”, 2 para “Concordo parcialmente” e 1 para “Discordo”. Já para as afirmações negativas (de número 2, 3, 5, 7, 9, 11, 12, e 14), atribuiu-se 1 ponto para “Concordo”, 2 para “Concordo parcialmente”, e 3 para “Discordo”. Feito isso, somaram-se os pontos obtidos por cada sujeito, obtendo-se três pontuações totais: Autoconceito Físico, Autoconceito Psicológico e Autoconceito Geral. Finalmente, obteve-se a média do grupo para cada um desses aspectos.

Para avaliar a intervenção, foi feita uma comparação das médias obtidas no pré-teste e no pós-teste, nos três aspectos: Autoconceito Físico, Autoconceito Psicológico e Autoconceito Geral.

Duração

Para esse projeto, foram inicialmente previstas 12 sessões que teriam a duração de 50 minutos cada, a serem realizadas à razão de uma por semana. Apesar de considerar-se 50 minutos de sessão um tempo curto para um trabalho de grupo, a instituição não permitiu que essa duração fosse maior, pois interferiria nas demais atividades a serem realizadas por esse grupo. Além disso, o horário disponibilizado pela instituição foi o primeiro horário matutino.

No entanto, esse projeto foi realizado em apenas nove sessões, por problemas na execução como cancelamento de sessões por parte da instituição e outros.

Procedimentos

A descrição das sessões, que será apresentada a seguir, corresponde ao planejamento inicialmente construído para o projeto. Entretanto, ao longo da aplicação do projeto, algumas modificações foram feitas no planejamento, modificações estas que serão apresentadas ao longo da seção de resultados e discussão.

Sessão 1

Objetivos: Promover o conhecimento e a integração grupal e aplicar o pré-teste.

Procedimentos: a) Apresentação das alunas-estagiárias e do trabalho a ser realizado; b) aplicação da dinâmica “Apresentação aos pares” (adaptada de Andrade, 1999); c) aplicação da “Escala de Autoconceito” (pré-teste).

Sessão 2

Objetivos: Facilitar o reconhecimento das várias partes do corpo.

Procedimentos: Aplicação da dinâmica “Descoberta de si mesmo” (Yozo, 1996).

Sessão 3

Objetivos: Facilitar o reconhecimento das várias partes do corpo.

Procedimentos: Aplicação da dinâmica “Partes do corpo” (Yozo,1996).

Sessão 4

Objetivos: Facilitar a percepção das mudanças corporais que acontecem na puberdade.

Procedimentos: Aplicação da técnica “Percepção das minhas mudanças corporais” (elaborada pelas autoras).

Sessão 5

Objetivos: Facilitar a aceitação das mudanças corporais vividas.

Procedimentos: Aplicação da técnica: “Mudanças corporais positivas e negativas” (adaptada da técnica “Reconhecendo quem eu sou e quem eu quero ser – 1ª etapa, desenvolvida pelas psicólogas Kathia Maria Costa Neiva e Maria Elci Sppacaquerche.

Sessão 6

Objetivos: Facilitar a aceitação do novo esquema corporal.

Procedimentos: Aplicação da técnica Desenho da Figura Humana.

Sessão 7

Objetivos: Facilitar a passagem do pensamento concreto para o pensamento abstrato e desenvolver o raciocínio lógico, a cooperação e a comunicação não-verbal.

Procedimentos: Aplicação da dinâmica Jogo dos Quadrados Quebrados (Militão & Militão, 1999).

Sessão 8

Objetivos: Facilitar a passagem do pensamento concreto para o pensamento abstrato, promovendo um exercício de consenso, a partir da imaginação de uma determinada situação.

Procedimentos: Aplicação da dinâmica “A dificuldade de um consenso” (Fritzen, 2000).

Sessão 9

Objetivos: Facilitar o desenvolvimento do raciocínio abstrato, desenvolvendo a defesa de idéias e argumentações.

Procedimentos: Aplicação da dinâmica “O julgamento” (Yozo, 1996).

Sessão 10

Objetivos: Facilitar o desenvolvimento do pensamento abstrato, desenvolvendo a defesa de idéias e argumentações.

Procedimentos: Aplicação da dinâmica “A águia que (quase) virou galinha” (Alves apud Yozo, 1996).

Sessão 11

Objetivos: Facilitar a aceitação das novas formas de pensamento e desenvolver a argumentação.

Procedimentos: Aplicação da dinâmica “Estudo de caso – Prova” (adaptado de Andrade, 1999).

Sessão 12

Objetivos: Avaliar e encerrar as atividades e reaplicar a “Escala de Autoconceito”.

Procedimentos: a) Aplicação da dinâmica “Bilhete Alegre” (adaptada de Andrade, 1999) e b) aplicação da “Escala de Autoconceito” (pós-teste).

 

Resultados e discussão

1. Desenvolvimento das sessões

Como mencionado anteriormente, foram realizadas apenas nove das doze sessões previstas, o que certamente prejudicou a execução do planejamento original não permitindo alcançar devidamente alguns dos objetivos. Até a quinta sessão o planejamento foi realizado na íntegra; a partir daí foram feitas adaptações. As atividades programadas para as sessões de número 6, 9 e 10 não foram realizadas. A sessão 6 tinha como objetivo “facilitar a aceitação do novo esquema corporal” e as duas outras “facilitar o desenvolvimento do pensamento abstrato”. O alcance desse último objetivo foi prejudicado, visto que das cinco sessões previstas para trabalhar esse aspecto, apenas três foram realizadas.

Com relação à participação, as sessões contaram em média com 18 participantes, indicando assim uma boa receptividade ao trabalho e às alunas-estagiárias que realizaram a intervenção. Além disso, os jovens se mostraram participativos e interessados e, em geral, entenderam bem as instruções das atividades. Entretanto, muitos chegaram com atraso às sessões o que prejudicou o aproveitamento do tempo de cada sessão, pois com freqüência as alunas-estagiárias esperavam a chegada de um mínimo de alunos para dar início às atividades e repetiam as instruções para os que chegavam atrasados. Com os atrasos, várias atividades tiveram o tempo planejado para sua execução reduzido, mas, na sua maioria, foram realizadas na íntegra. Vale ressaltar, que o trabalho foi desenvolvido no primeiro horário matutino (horário oferecido pela instituição) e por essa razão os atrasos eram freqüentes.

Desde as primeiras sessões, observou-se que os adolescentes possuíam uma boa percepção corporal, identificando devidamente as partes do corpo. Na técnica em que deveriam identificar as mudanças corporais de que mais gostaram e menos gostaram (sessão 5), contatou-se de que as que mais gostaram foram: crescimento, mudança do rosto, crescimento e mudança de cor do cabelo, dos seios e dos dedos. Além disso, os jovens citaram: diminuição do cabelo, crescimento de pelos nas pernas e braços, crescimento dos dentes, das nádegas, cabelos mais lisos, mudanças no pé, evolução do crânio. Com relação às mudanças corporais que menos gostaram, citaram: o fato de terem engordado ou emagrecido, dos pés terem mudado, das costas ficarem mais largas, do cabelo ter ficado mais curto e dos dentes terem crescido. Além disso, os jovens citaram que o cabelo ficou mais crespo, que não paravam de roer as unhas; se referiram ao crescimento da bochecha, da boca, das coxas, da cintura, das orelhas, do cabelo, dos dentes e da barriga, e ao surgimento de espinhas e sardas. Alguns consideraram que ficaram mais feios. Nessa técnica buscou-se trabalhar a aceitação no novo corpo e das mudanças ocorridas, o que parece ter gerado um bom resultado. Em geral, os jovens se mostraram descontraídos para abordar o assunto e aos poucos foram se sentindo mais seguros para falarem do próprio corpo.

Com relação às atividades realizadas objetivando o desenvolvimento do pensamento abstrato, observou-se certa dificuldade do grupo para a realização das mesmas, o que era esperado em virtude da faixa etária dos participantes. No “Jogo dos quadrados quebrados” (Militão & Militão, 1999) apenas um grupo conseguiu realizar a tarefa e colaborou devidamente para concluí-la. Muitos dos jovens pensaram que não havia uma solução para a tarefa e sentiram dificuldade em realizá-la sem comunicação verbal (o que fazia parte das instruções). Observou-se, nos grupos que não concluíram a tarefa, que a falta de colaboração foi o fator principal para o resultado.

Nas dinâmicas que exigiam discussões para a tomada de decisões, “A dificuldade de uma consenso” (Fritzen , 2000) e “Estudo de caso – Prova” (adaptada de Andrade, 1999), observou-se uma dificuldade de cada um expor no grupo sua própria opinião, defendê-la e argumentar devidamente.

Durante as atividades, em geral, o grupo mostrou uma boa percepção corporal, inclusive com relação às mudanças ocorridas na fase da puberdade, indicando assim que provavelmente vários de seus membros já haviam adquirido a configuração da identidade do ego corporal. Entretanto, percebeu-se certa dificuldade no que diz respeito à expressão e defesa das idéias, à argumentação, à análise de situações, o que indica que a identidade do ego psicológico, para a maioria desses jovens, ainda não está configurada (Moujan, 1986). Os comportamentos observados condizem com a faixa etária do grupo.

2. Avaliação da intervenção

Para avaliar a intervenção foi construída pelas autoras a “Escala de Autoconceito” (Anexo I) baseada na “Escala de Autoconceito – ERA” (Corona, 1999), com o objetivo de avaliar o autoconceito físico e psicológico desses jovens, no início e final da intervenção. Foram obtidas assim três pontuações: Autoconceito Físico, Autoconceito Psicológico e Autoconceito Total. Para verificar a existência de diferenças significativas entre as médias obtidas no pré-teste e no pós-teste utilizou-se a estatística t de student. Os resultados do pré-teste e pós-teste são apresentados na tabela 2, a seguir.

 

 

As diferenças observadas não foram estatisticamente significativas. Logo, não se pode afirmar se houve uma mudança significativa no Autoconceito Físico, Psicológico ou Total, dos adolescentes. Entretanto, as médias obtidas no pós-teste foram superiores às obtidas no pré-teste, indicando que houve um leve desenvolvimento do autoconceito físico e psicológico desses jovens.

Pode-se supor que, com os atrasos freqüentes de boa parte do grupo, o aproveitamento das sessões ficou comprometido, não permitindo mudanças significativas no autoconceito de alguns participantes do grupo. Além disso, a supressão de três das sessões previstas provavelmente deve ter contribuído para que o avanço do grupo não fosse significativo.

Com relação aos comentários dos jovens sobre o trabalho desenvolvido, constatou-se que se referiram mais às atividades relacionadas ao reconhecimento e aceitação corporal. Mencionaram que gostaram de se conhecer melhor e às diferentes partes do próprio corpo, assim como identificar as mudanças corporais de que mais e menos gostaram. Além disso, gostaram de trabalhar em pequenos grupos, colaborando entre si. Ao se referirem ao que menos gostaram, comentaram que não gostaram de acordar cedo, de tocar certas partes do corpo na técnica de relaxamento e do fato de não conseguirem realizar adequadamente o “Jogo dos Quadrados Quebrados”. Referiram-se ainda à “bagunça” que o grupo fez em algumas sessões, prejudicando o bom andamento das atividades.

 

Conclusão

Durante a intervenção pode-se observar que os participantes do grupo, na sua maioria, possuíam mais desenvolvida a identidade do ego corporal do que a identidade do ego psicológico, o que condiz com a faixa etária do grupo, conforme Moujan (1986). Observaram-se também muitos comentários dos participantes do grupo mostrando que estavam processando os lutos pelo corpo infantil (Aberastury & Knobel, 1992).

O grupo aceitou bem a intervenção, mostrando-se participativo e interessado mesmo com todas as dificuldades vividas por conta dos atrasos e cancelamento de sessões.

Não puderam ser observadas, com o instrumento utilizado, diferenças estatisticamente significativas no autoconceito físico e/ou psicológico desses jovens entre o início e o final da intervenção. Entretanto, constatou-se que as médias finais foram superiores às iniciais. Além disso, os comentários dos jovens a respeito da intervenção também foram, na sua maioria, positivos.

Algumas situações podem ter interferido nos resultados dessa intervenção. Uma delas é o fato de as sessões terem se iniciado sistematicamente com atraso, devido ao horário cedido pela instituição e à falta de pontualidade dos jovens. Outra situação que pode ter interferido no resultado dessa intervenção foi o fato de três sessões terem sido canceladas. O projeto original previa 12 sessões e foram realizadas apenas nove. Das 12 sessões originais, cinco tinham como objetivo desenvolver a aceitação do novo esquema corporal (autoconceito físico) e outras cinco desenvolver a aceitação das novas formas de pensamento (autoconceito psicológico). Com o cancelamento de três sessões a partir da realização da sexta sessão, a maior parte da intervenção acabou sendo direcionada à aceitação da parte física.

Além disso, vale ressaltar que o instrumento utilizado não é um instrumento validado, o que pode também ter comprometido os resultados.

Entretanto, os comentários finais dos participantes mostraram que a maioria deles compreendeu os objetivos do projeto e muito provavelmente se beneficiou das atividades desenvolvidas. Sendo assim, considera-se que a intervenção deixou um saldo positivo. Entretanto, sugere-se que esse projeto seja reaplicado na íntegra para que se possa avaliá-lo melhor, em um horário que não gere problemas de atraso e que se utilize um instrumento já validado para avaliar a intervenção ou se proceda à validação da escala utilizada.

 

Referências

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Corona, L. C. G. (1999). Escala de autoconceito – ERA. Rio de Janeiro: CEPA.        [ Links ]

Fritzen, S. J. (2000). Exercícios práticos de dinâmica de grupo (30ª ed.). Petrópolis, RJ: Vozes.        [ Links ]

Knobel. M. (1992). A síndrome da adolescência normal. In A. Aberastury & M. Knobel, Adolescência normal (10ª ed., pp. 24-62). Porto Alegre, RS: Artes Médicas.        [ Links ]

Militão, A. & Militão, R. (1999). S.O.S. dinâmica de grupo. Rio de Janeiro: Qualitymark.        [ Links ]

Moujan, O. P. (1986). Abordaje teorico y clínica del adolescente. Buenos Aires: Nueva Visión.        [ Links ]

Outeiral, J. O. (1994). Adolescer: estudos sobre adolescência. Porto Alegre, RS: Artes Médicas.        [ Links ]

Papalia, D. E, & Olds, S. W. (2000) Desenvolvimento humano (7ª ed.). Porto Alegre, RS: Artes Médicas.        [ Links ]

Yozo, R. Y. K. (1996). 100 jogos para grupos: uma abordagem psicodramática para empresas, escolas e clínicas. (11ª ed.). São Paulo: Ágora.        [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Rua Inhambú, 1069 - apto. 82
CEP: 04520-013 - São Paulo, SP
E-mail: neivasp@webcable.com.br

Encaminhado em 05/10/04
Revisado em 25/10/04
Aceito em 08/11/04

 

 

Sobre as autoras:

1 Kathia Maria Costa Neiva: Psicóloga, Doutora em Psicologia pela Université Paris V – René Descartes, Professora-supervisora do Curso de Psicologia da Universidade Ibirapuera.
2 Mônica Martins de Abreu: Psicóloga formada pela Universidade Ibirapuera em 2003.
3 Tatiana Pereira Ribas: Psicóloga formada pela Universidade Ibirapuera em 2003.