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Psic: revista da Vetor Editora

versão impressa ISSN 1676-7314

Psic v.7 n.1 São Paulo jun. 2006

 

ARTIGOS

 

Associação entre suporte social, depressão e ansiedade em gestantes

 

Relation to pregnancy, social support, depression and anxiety

 

Asociación entre soporte social, depresión y ansiedad en embarazadas

 

 

Makilim Nunes BaptistaI, 1; Adriana Said Daher BaptistaII, 2; Erika Cristina Rodrigues TorresIII, 3

I Universidade São Francisco
II Centro Universitário Hermínio Ometto
III Clínica Psicológica

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente trabalho objetivou correlacionar a presença de sintomatologia depressiva e ansiosa com o suporte social em gestantes durante o pré-natal. Foram participantes 44 gestantes que se encontravam em atendimento em um Centro de Saúde do interior de São Paulo. Para a coleta de dados foram aplicados, de forma individual, um questionário de identificação, a Escala de Depressão Pós-parto de Edinburgh (EPDS), o IDATE e uma Escala de Percepção de Suporte Social (EPSS).Verificou-se que 29,5% apresentaram sintomatologia depressiva, 70,5% sintomas ansiosos controlados (estado) e 56,8% referiram possuir alto suporte social. Houve correlação positiva entre a escala de depressão, estado e traço de ansiedade, além de correlação negativa entre as escalas de depressão e suporte social, ansiedade traço e estado com suporte social. Os dados apontam para a importância do suporte social no período gestacional.

Palavras-chave: Suporte social, Depressão, Ansiedade, Gestação.


ABSTRACT

This research aimed to correlate depression symptomatology, anxiety and social support during the pregnancy. The participants were 44 pregnant patients in a small town health center (São Paulo-Brazil) and the data were collected by an identification questionnaire, Edinburgh Post-Partum Depression Scale (EPDS), Spielberger´s Trait-State Inventory (IDATE) and Social Support Depression Inventory (EPSS). The results shown that 29,5% had clinical symptomatology of depression; 70,5% have controlled anxiety state and 56,8% reported good social support. The main results showed positive correlation between depression and state and trait anxiety, negative correlation between depression and social support and negative correlation between social support and anxiety trait-state. The data point out the importance of social support in a pregnancy period.

Keywords: Social support, Depression, Anxiety, Pregnancy.


RESUMEN

Este trabajo ha tenido como objetivo correlacionar la presencia de síntomas depresivos y ansiosos con el soporte social en embarazadas durante el pre-parto. Han sido participantes 44 embarazadas que estaban siendo atendidas en un Centro de Salud del interior de São Paulo. Para la cosecha de datos han sido aplicados individualmente un cuestionario de identificación, la Escala de Depressão Pós-Parto de Edinburgh (EPDS), el IDATE y una Escala de Percepção de Suporte Social (EPSS). Se ha verificado que 29,5% han presentado síntomas de depresión, 70,5% síntomas de ansiedad controlados (estado) y 56,8% han dicho tener alto soporte social. Ha habido correlación positiva entre la escala de depresión, estado y rasgo de ansiedad, además de correlación negativa entre las escalas de depresión y soporte social, ansiedad rasgo y estado con soporte social. Los datos han apuntado para la importancia del soporte social en el período de gestación.

Palabras clave: Soporte social, Depresión, Ansiedad, Gestación.


 

 

Introdução

O suporte social pode ser considerado um construto multifacetado e complexo, podendo ser mensurado por intermédio de conceitualizações objetivas e subjetivas, carecendo mesmo de uma precisão em sua definição, pois os instrumentos que mensuram tal construto podem variar em conseqüência de definições adotadas para sua construção, bem como a nomeação das dimensões. De forma geral o suporte social pode ser avaliado pela integração social de um indivíduo em seu meio, além da rede de serviços e pessoas que estão acessíveis e sendo utilizados, observando medidas mais diretas como, por exemplo, os serviços de saúde presentes na localidade ou as medidas mais subjetivas, como a percepção que o indivíduo tem das pessoas e serviços na comunidade. Geralmente o suporte social é relatado em termos de aspectos estruturais (tamanho do grupo, freqüência de contato, participações em atividades e instituições sociais) e funcionais (percepção do apoio afetivo e satisfação das necessidades), no entanto há diversas outras formas de divisão do suporte social que diferem das aqui apresentadas (Keeling, Price, Jones & Harding, 1996; McNally & Newman, 1999; Nath, Borkowski, Whitman & Schellenbach, 1991).

O suporte social também vem sendo associado à diversas outras medidas, tais como competência pessoal, comportamentos de adesão a tratamentos de saúde, estratégias de enfrentamento, percepção de controle, senso de estabilidade e bem estar psicológico, dentre outros. Além dos construtos citados anteriormente, há evidências de que o suporte social seja considerado como um fator de redução de impacto de eventos estressantes e diversos transtornos psiquiátricos/psicológicos, tais como a depressão, transtornos ansiosos e esquizofrenia e, podem também estarem associados ao desenvolvimento e tratamento e prognóstico desses problemas (Langford, Bowsher, Maloney & Lillis, 1997; Lovisi, Milanil, Caetano, Abelha & Morgado, 1996).

Crianças que percebem baixo suporte familiar e social, por exemplo, tendem a ter menos atenção, serem mais agressivas e pouco cooperativas, além de apresentarem mais desesperança (Kashani, Canfield, Borduin, Soltys & Reid, 1994). Homens que percebem baixo suporte social também tendem a ser menos sociáveis, fisicamente ativos e apresentarem maiores sintomatologias de depressão (Undén & Orth-Gomér, 1989).

Um adequado suporte social proporciona também apoio à alguns momentos particularmente diferenciados no decorrer da vida dos seres humanos, como por exemplo os períodos de puerpério, parto e pós-parto, favorecendo, inclusive às gestantes e puérperas um maior controle do ambiente e autonomia, fornecendo esperança, apoio e proteção (Coutinho, Baptista & Morais, 2002; Dessen & Braz, 2000).

O suporte social, bem como o suporte familiar é muito importante para a manutenção da saúde mental e enfrentamento de situações estressantes, além da adequação de comportamentos maternos em relação aos filhos (Dessen & Braz, 2000). Alvarado e colaboradores (1993) relatam que o suporte social e recursos pessoais podem reduzir o aparecimento do distress emocional nos eventos da vida.

Entende-se por gestação o desenvolvimento fetal desde a fecundação até o nascimento. A fecundação é a união de um espermatozóide com um óvulo, formando assim um ovo, que se multiplica em duas células, quatro, oito e assim por diante. O ovo se dirige ao útero, em busca de um lugar para se fixar, com circulação sangüínea capaz de oferecer oxigenação e alimentação, sendo formado então um novo tecido, a placenta, que é responsável pela fixação do ovo à parede do útero (Maldonado, Dickstein & Nahoum, 2000).

Durante a gravidez, o organismo feminino produz hormônios sexuais e não sexuais pela placenta, o que pode trazer mudanças orgânicas e comportamentais significativas, não condizentes com os comportamentos habituais (Barini, 1997; Corrêa & Oliveira, 1999). Muitas vezes, a gestante poderá passar por mudanças físicas como também psicológicas, verificando-se sintomas comuns no primeiro trimestre, que são o aumento de cansaço, irritabilidade, mudanças de apetite, prazer diminuído e distúrbios do sono (Daher, 1999).

No segundo trimestre a gestante percebe os movimentos fetais, é a primeira vez que sente o seu bebê, poderá apresentar preocupação quanto às alterações do corpo (sentir medo de não voltar à forma natural antes da gestação), medo de ficar modificada como pessoa, isto é, perder a sua identidade e se tornar outra pessoa. É mais comum nesta fase à passividade, que ocorre por modificações no metabolismo que são necessárias na preparação de seu novo papel de mãe. Esta se mostra com maior necessidade de afeto, cuidado e proteção (Melo & Lima, 2000). Outras características comuns são: a diminuição dos sintomas de mal estar, vômitos e náuseas, podendo haver um aumento de varizes devido ao volume da circulação sangüínea, o aparecimento da linha escura no ventre, aumento de apetite, micção mais freqüente, sentimento de ciúmes e medo de ser traída por se sentir feia, dentre outras (Baptista & Furquim, 2003).

No terceiro e último trimestre, as gestantes se vêem próximas ao momento do parto e poderão ser tomadas pela ansiedade, pois haverá mudanças na sua rotina de vida diária após o nascimento do bebê. Muitas vezes se preocupam com o parto, como por exemplo, as dores da contração, preocupação com ela e o bebê, e medo de morrer (Melo & Lima, 2000).

A gestação é um momento de mudanças fisiológicas, sociais, familiares e psicológicas, podendo assim ser um período em que se observa aumentos de sintomatologias ou mesmo o desenvolvimento de transtornos psiquiátricos. Um dos transtornos que pode ocorrer durante o período gestacional é a depressão, influenciando negativamente a gestação, já que os sintomas interferem no desempenho das gestantes quanto aos autocuidados e adesão ao tratamento.

Observa-se que muitas vezes são cobrados das gestantes, comportamentos que demonstrem felicidade, afeto e cuidados para com a gestação, sendo assim, as mulheres que apresentam sintomas depressivos podem se culpar por não poderem corresponder a estas expectativas. É importante nesse momento que se faça uma avaliação adequada para se discriminar sintomas e sentimentos presentes durante o período gestacional (Baptista & Furquim, 2003).

A depressão é um transtorno psiquiátrico que apresenta uma prevalência em torno de 5% da população geral. Por ser um transtorno multifatorial observa-se que diversas são as variáveis que podem desencadear ou manter a sintomatologia depressiva, bem como diversos fatores de risco estão implicados neste transtorno, tais como gênero, aspectos neuroendocrinológico, indicadores familiares e sociais, estratégias de enfrentamento, dentre outros (Baptista, 2004).

Os transtornos de humor vêm sendo estudados sistematicamente nas últimas três décadas, sendo que a Organização Mundial da Saúde (2001) e a Associação Americana de Psiquiatria (2002) relatam que a depressão é um dos problemas mais comuns encontrados pelos profissionais em contextos de saúde. A principal característica da depressão é o humor deprimido, sendo que a pessoa deprimida possui baixa freqüência de comportamentos (como por exemplo, andar, falar, ter relações sociais) e o aumento de outros comportamentos, tais como os de fuga-esquiva. Essas respostas ocorrem com o objetivo de evitamento do contato com o estímulo aversivo e podem apresentar-se como queixa de labilidade emocional, irritabilidade, lentidão para responder aos estímulos diários, pedidos de ajuda e idéias suicidas.

As mulheres apresentam, significativamente mais sintomatologia depressiva do que os homens, e muitos são os fatores sociais, comportamentais e biológicos encontrados que contribuem para o desencadeamento e manutenção da doença, como foi discutido anteriormente. Um fator de relevância no desenvolvimento da depressão feminina é a questão da maternidade, já que a gestação e o parto são fatores estressantes, além de que as modificações hormonais podem estar diretamente relacionadas com este fato (Baptista, M.N., Baptista, A.S.D. & Oliveira, 2004). A depressão gestacional ainda é pouco estudada e uma explicação a isso seria a dificuldade de se diferenciar a sintomatologia depressiva dos sintomas que ocorrem durante o período gestacional (Daher, Baptista & Dias, 1999), como por exemplo, os distúrbios do sono e apetite, labilidade emocional entre outros (Alvarado e colaboradores,1993).

Alvarado e colaboradores (1993) relatam ainda que os fatores de risco para o desenvolvimento da depressão neste período são os antecedentes psiquiátricos, descontentamento com a gestação, negativismo com relação a eventos vitais, baixo apoio emocional, viver sozinha, menor de idade, solteira, baixo nível educacional e sócio-econômico, histórico de abortos anteriores, partos problemáticos e atitudes negativas. Gotlib, Whiffen e Mount (1989) referem que aproximadamente 10% das mulheres grávidas atendem ao critério de depressão nesta fase, o que justifica uma atenção especial para a importância do diagnóstico e tratamento deste transtorno na gestação.

A presença de sintomatologia ansiosa também se mostra freqüente na gravidez, podendo ser dividida em três dimensões, como fisiológicos (aumento na freqüência cardíaca, insônia, sudorese, boca seca, náusea, vômito, diarréia, tremor e inquietação), emocionais (impotência, choro, nervosismo, perda de controle, irritabilidade e impaciência, tensão e falta e autoconfiança) e cognitivos (incapacidade de concentração, esquecimento, falta de atenção) (Carpenito, 1998). Outros sinais e sintomas da ansiedade são: taquicardia; taquipnéia; alterações na pressão arterial; relaxamento de músculos da bexiga e intestinos; pele úmida; calafrios; boca seca; cefaléia; pupilas dilatadas, e inquietação motora (Grando & Yamamoto, 1997).

A ansiedade é também entendida como sendo um componente emocional que acompanha todo o período gestacional até o momento do parto e é caracterizada por um estado de insatisfação, intranqüilidade, insegurança, incerteza, medo da experiência desconhecida (Tedesco, Zugayb & Quayle, 1997). As sensações de medo, sentimentos de incompetência, transtornos do sono, tensão muscular que causa dor, tremor, inquietação fazem parte deste quadro (Nina, 1997; Santos, Martins & Pasqualli, 2000).

A ansiedade muitas vezes acomete gestantes primigestas, pois o seu equilíbrio emocional é ameaçado, pois estas não compreendem "direito" o que está acontecendo (Lana, 2001). No primeiro trimestre a gestante descobre a sua gravidez e começa a apresentar os sintomas gestacionais, como; náusea, vômito, retenção de líquido, aumento da barriga e mamas, maior labilidade emocional (Baptista & Furquim, 2003). O segundo trimestre é considerado como o mais estável da gestação, pois já pode sentir os movimentos fetais (Melo & Lima, 2000). No terceiro e ultimo trimestre gestacional, a ansiedade tende a elevar-se, há um aumento das contrações uterinas, podem ocorrer à descida do colostro, dificuldades digestivas, pressão dos órgãos internos abdominais, baixo ventre, cansaço mais freqüente (Baptista & Furquim, 2003).

No estudo realizado por Freitas e Botega (2002), ao avaliarem a sintomatologia ansiosa em 120 adolescentes grávidas atendidas em um centro de saúde público em atendimento pré-natal de uma cidade do interior de São Paulo, utilizando-se como instrumentos uma entrevista estruturada, uma escala hospitalar de ansiedade e depressão (HAD) e a escala de ideação suicida de Beck obtiveram como resultados 23,3% de casos apresentando sintomas ansiosos na amostra. Já D'el Rey, Quayle, Lucia e Zugaib (2000), em estudo com 25 gestantes internadas em uma Enfermaria Clínica Obstétrica de São Paulo com idades variando entre 20-35 anos, utilizando como instrumento de avaliação a HAD e uma entrevista semidirigida, obtiveram como resultado 24% dos casos com sintomas ansiosos.

Sendo assim, é importante se avaliar sintomatologias psicológico/psiquiátrica que possam estar associadas ao período gestacional, bem como identificar variáveis relacionadas aos fatores protetivos, tais como o suporte social, que funcionaria como amortecedor do impacto de eventos estressantes na vida das gestantes.

O principal objetivo deste trabalho foi o de avaliar a associação entre o suporte social com sintomatologia de depressão e ansiedade em gestantes, além de verificar a prevalência destes sintomas nesta amostra.

 

Método

Participantes

Foram estudadas 44 gestantes consideradas com uma gestação normal, isto é, sem alguma intercorrência clínica (critério de exclusão). Estas gestantes foram selecionadas de forma a se constituírem em uma amostra de conveniência, possuindo idades entre 18 e 35 anos, casadas ou não, primigestas ou não, independente do trimestre gestacional, e que estavam sendo atendidas no Pré-Natal de um Centro de Saúde de uma cidade do interior de São Paulo.

Instrumentos

Questionário de Identificação - Este questionário tinha o objetivo de coletar dados sócio-demográficos, fatores de risco para o desenvolvimento de depressão, genetograma (constituição familiar) e história gestacional (quantidade de gravidezes, planejamento da gravidez atual e o desejo da gestação pelas famílias dos genitores).

Escala de Auto-Registro de Depressão Pós Parto de Edinburgh (EPDS) - É uma escala que avalia os sintomas depressivos numa graduação de quatro pontos, sendo que os itens avaliam desde a ausência do sintoma até a presença de gravidade e duração (Santos, Martins & Pasqualli, 2000). Os itens se referem à perda da capacidade de experimentar os prazeres do dia-a-dia; sentimento de culpabilidade; elementos ansiógenos; sentimentos de incapacidade sobre os acontecimentos e tarefas diárias; sintomatologia relativa à distúrbios de sono presente na depressão; estado de ânimo da pessoa e, por último, ideação suicida. O escore de corte é de doze a treze, para discriminar as puérperas com sintomas significativos ou não de depressão, das mulheres normais. O instrumento apresentou sensibilidade de 86%, especificidade de 78% e valor preditivo positivo de 73%. A fidedignidade alcançada pelo método das duas metades foi 0,88 e o coeficiente alfa estandartizado encontrado foi 0,87.

O inventário de Ansiedade Traço-Estado (IDATE) - É composto de duas escalas de auto-relato, para medir dois conceitos de ansiedade: estado (A-estado) e traço (A-traço) (Spielberger, Biaggio & Natalício, 1979).

Traço - Ansiedade - refere-se a uma característica duradoura do indivíduo. A medida de traço é menos sensível à mudanças ambientais e permanecem relativamente constantes no tempo (Andrade & Gorenstein, 2000; Holmes, 1997). A escala de traço de ansiedade consiste de 20 afirmações que requerem que os sujeitos descrevam como se sentem (Spielberger, Biaggio & Natalício, 1979).

Estado - Ansiedade - é limitado num momento ou situação particular, sendo que os indivíduos com ansiedade-estado tendem a ficar ansiosos apenas em situações particulares (Holmes, 1997). É caracterizado por sentimentos desagradáveis de tensão e apreensão, percebidos conscientemente. "Os escores de ansiedade - estado podem variar em intensidade, de acordo com o perigo percebido e o flutuar no tempo" (Andrade & Gorenstein, 2000). As correlações entrem a escala original e a brasileira variaram de 0,06 a 0,58 com uma média de 0,34 para A-Estado e de 0,24 a 0,92 com uma média de 0,51 para A-Traço e a sua fidedignidade no teste-reteste foi de 0,74 para A-Estado e 0,83 para A-Traço. A consistência interna Alfa A-Estado masculino obteve o valor de 0,93 e feminino de 0,88, enquanto que o A-Traço masculino obteve o valor de 0,93 e feminino de 0,87 (Spielberger, Biaggio & Natalício, 1979).

Os critérios utilizados, na Escala de Traço, para nomear a ansiedade foram: pouco ansiosa (até 33 pontos); ansiosa (entre 34 e 54 pontos) e muito ansiosa (acima de 55 pontos). Os critérios para nomear o Estado foram: baixa ansiedade (até 33 pontos); ansiedade controlada (34 a 54 pontos) e, alta ansiedade (acima de 55 pontos).

Escala de percepção de suporte social (EPSS) - Esta escala tem por objetivo avaliar a satisfação com o suporte social recebido, incluindo a satisfação com amigos e família, intimidade e atividades sociais, constituindo-se de 15 itens com respostas tipo likert de quatro pontos (Ribeiro, 2002). A pontuação da escala foi dividida em três partes, a partir da pontuação máxima para determinar alto, médio e baixo suporte social, ou seja, alto suporte social (de 51 a 75 pontos); médio suporte social (de 26 a 50 pontos) e, baixo suporte social (até 25 pontos).

A versão portuguesa (Portugal) teve a consistência interna total Alfa de Cronbach de 0,85 e demonstrou ser adequada para a psicologia da saúde (Ribeiro, 2002). A escala foi modificada para o uso no presente estudo adaptando-se somente as palavras com grafia diferente do português do Brasil, como por exemplo, "actividades" para "atividades", sendo que as frases eram passíveis de serem compreendidas integralmente pelos brasileiros.

Procedimento

Após a aprovação do Comitê de Ética e da autorização da diretora do Centro de Saúde, os sujeitos da pesquisa foram identificados através da análise do prontuário que se encontrava na recepção do Posto de Saúde, nos dias de Pré-Natal.

A pesquisadora em posse do prontuário de atendimento se apresentava a gestante, explicava os objetivos, o procedimento do estudo e pedia a autorização para a mesma em participar voluntariamente da pesquisa. Após o seu aceite, lia-se então o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e o mesmo era assinado em duas vias. A pesquisa foi realizada três vezes por semana durante aproximadamente três meses em horário de atendimento ambulatorial das 7:00 às 11:00. A coleta de dados ocorreu na sala de espera e fora do horário da consulta médica, com duração média de 30 minutos em cada coleta individual.

 

Análise dos resultados

Os dados foram analisados através do programa para análise estatística SPSS (Statiscal Package for Social Sciences - versão 11.5). Os dados sócio-demográficos e fatores de risco para a depressão serão apresentados de forma descritiva. Para associação entre variáveis ordinais e nominais foi utilizado o teste de Mann-Whitney ou Kruskall-Wallis, utilizando-se o nível de significância de 5%. As correlações entre as variáveis ordinais foram realizadas a partir do teste de Spearman, também com nível de significância de 5%.

Em relação à identificação da amostra, pode-se observar que a média de idade das participantes foi de 24,6 (±4,2) anos; 59,1% possuía renda familiar entre um e três salários mínimos e 36,4% de quatro a seis salários; 79,6% estava casada/amasiada e 20,4% solteira/separada; 68,2% vivia com companheiro ou companheiro e familiar; 63,6% possuía nível médio de escolaridade e 34,1% nível fundamental; 40,9% era primigesta; 22,7% das gestantes se encontrava no primeiro trimestre, 27,3% no segundo trimestre e 50% no último. Os fatores de risco da amostra se distribuíram da seguinte forma: 22,7% tiveram abortamento anterior; 81,8% não planejou a gestação; 40,9% relatou sentir tristeza durante a gestação; 31,8% relatou ter familiares que apresentaram sintomatologia de depressão no decorrer de suas vidas.

Em relação aos sintomas de depressão avaliados pela EPDS, observou-se que 29,5% das participantes obtiveram escores acima da nota de corte, apresentando sintomas clinicamente significativos de depressão para a gestação. Em relação à medida de ansiedade-estado, 77,3% apresentou ansiedade controlada, 22,7% baixa ansiedade e 6,8% alta ansiedade, já na ansiedade-traço, 65,9% se encontrava ansiosa, 27,3% pouco ansiosa e 6,8% muito ansiosa. Na medida da EPSS, verificou-se que 56,8% da amostra possuía uma percepção de alto suporte social e 43,2% relatou uma percepção de médio suporte social, não sendo observado casos com baixo suporte social.

Quando se analisou o trimestre em relação ao estado de ansiedade-estado e traço, não se observou diferença estatisticamente significante nesta condição (H=1,31;p=0,518 e H=5,74;p=0,057), apesar do valor ter sido limítrofe para a última medida. Também não se observou diferença estatisticamente significante entre o suporte social e a sintomatologia de depressão com o trimestre da gravidez (H=2,093; p=0,351 e H=1,64;p=0,439).

Em algumas variáveis consideradas de risco para a depressão, tais como familiares com transtornos psiquiátricos, renda, estado civil e trimestre gestacional não foram encontradas diferenças quando da análise com a sintomatologia de depressão, no entanto algumas diferenças foram observadas, como por exemplo, a percepção de sentimentos e cognições de tristeza expressada pelas gestantes, avaliada por uma pergunta no questionário de identificação com a pontuação de depressão medida pela EDPS (U= 63,00; p< 0,005), significando que as mulheres que relataram mais pensamentos e sentimentos de tristeza apresentaram também maiores níveis de depressão na EPDS; houve diferença entre ter ou não abortos anteriormente (U=90,5; p< 0,005), sendo que o grupo que relatou abortos anteriores pontuou mais nos sintomas depressivos em relação ao grupo que não relatou abortos; grau de escolaridade e sintomas de depressão (U=114,0; p< 0,005), ou seja, o grupo com primeiro grau de escolaridade apresentou maiores níveis de depressão quando comparados com o grupo do segundo grau (nesta análise foi eliminada a única participante com terceiro grau). As correlações entre as medidas, bem como os comentários sobre os resultados podem ser avaliados na Tabela 1.

 

Tabela 1 - Correlação entre as variáveis: traço-ansiedade; estado-ansiedade; depressão e suporte social.

 

Em relação à escala de depressão e escala de ansiedade-estado, percebe-se que a correlação é positiva com intensidade moderada, sendo que quanto maior foi a pontuação da escala de depressão, maior a pontuação da escala de ansiedade-estado. Com referência a escala de depressão e escala de ansiedade-traço, percebeu-se que a correlação é positiva com intensidade moderada, ou seja, quanto maior a pontuação da escala de depressão, maior a pontuação da escala ansiedade-traço.

Já na percepção da gestante sobre o suporte social e a escala de depressão, observou-se uma correlação negativa de intensidade fraca (r= -0,408), ou seja, quanto maior a pontuação na escala de percepção de suporte social, menor a pontuação na escala de depressão pós-parto de Edinburgh. A respeito da percepção da gestante sobre o suporte social e a escala de estado do IDATE, observou-se uma correlação negativa de intensidade fraca (r= -0,428), ou seja, quanto maior a pontuação na escala de percepção de suporte social, menor a pontuação na escala de ansiedade-estado. O mesmo ocorreu entre a escala de traço do IDATE e a percepção da gestante sobre o suporte social, observando-se uma correlação negativa de intensidade moderada (r= -0,507), denotando que quanto maior a pontuação na escala de percepção de suporte social, menor a pontuação na escala de ansiedade traço.

 

Discussão

O papel do suporte social nas diversas fases da vida é fundamental para o amortecimento de fatores estressantes que ocorrem no cotidiano, principalmente em momentos em que se observam diversas modificações psicossociais e fisiológicas como é o caso da gravidez e do puerpério, sendo que o suporte social está associado com a saúde mental, especificamente com sintomatologia depressiva e ansiosa nos estados gravídicos e puerperais (Clay & Seehusen, 2004; Hung & Chung, 2001).

Alguns fatores de risco para sintomatologia depressiva e ansiógena na gravidez foram avaliados nesta pesquisa e serão abordados a seguir. A respeito da condição civil dos sujeitos, a maioria morava com companheiro e familiares, na condição de casado ou amasiado e um pequeno número de sujeitos estava solteira na ocasião da aplicação. Alvarado e colaboradores (1993) afirmaram que ser solteira e ter baixa renda são fatores de risco para o desenvolvimento de sintomatologia depressiva durante este período, no entanto, não foram encontradas estas associações nos resultados atuais, contrariando o estudo referido.

A amostra possui como característica o nível sócio-econômico baixo, fato este que Cunningham e Zayas (2002), apresentam como um importante fator no desencadeamento de sintomatologia depressiva, podendo este também contribuir para o desencadeamento de estado depressivo desta amostra, mas também não houve diferença significante entre nível sócio-econômico e sintomas de depressão na atual amostra. Gestantes primigestas podem apresentar sintomatologia depressiva durante o período gestacional segundo Daher (1999), no entanto, na atual pesquisa, constatou-se que a grande maioria se encontrava na primeira gestação, mas a maior porcentagem de gestantes com sintomatologia clinicamente significativa de depressão estava relacionada com o terceiro trimestre, apesar de não ter sido encontrado diferença estatística, não sustentando tal diferença. Quanto à experiência de abortamento, observou-se que a grande maioria declarou nunca ter experienciado um aborto, no entanto este dado esteve associado à sintomatologia depressiva, confirmando os achados de Alvarado e colaboradores (1993), que citam esta variável como fator de risco para o desencadeamento da sintomatologia depressiva.

Melo e Lima (2000) relatam que o 2º trimestre gestacional é o mais estável para a gestante, o que vem a confrontar com dados obtidos da pesquisa, no qual 20,4% se mostraram ansiosas durante este período, seguido pelo 1º trimestre na qual 11,3% da amostra apresentaram tal sintomatologia. Maldonado, Dickstein e Nahoum (2000) e Melo e Lima (2000), referem que o 3º trimestre gestacional é o momento mais difícil para a gestante, pois está próximo ao momento do parto, aumentando-se a ansiedade com a chegada do parto e do bebê. Este dado vem corroborar o resultado descritivo na atual pesquisa, no qual obteve-se 34% da amostra apresentando ansiedade durante este período gestacional, apesar de não se ter encontrado diferenças estatísticas de sintomatologias ansiógenas nos trimestres.

Apesar da pesquisa de McMahon, Barnett, Kowalenko, Tennant e Don (2001), ter sido realizada com mulheres no período do quarto mês do puerpério (n=128), os autores encontraram uma porcentagem semelhante de mulheres com alta ansiedade (9%), quando comparadas com a atual amostra (6,8%), sendo que os autores levantam a possibilidade dos sintomas depressivos e ansiosos co-ocorrerem. Observou-se que a grande maioria da amostra da atual pesquisa se encontrou com ansiedade controlada, provavelmente influenciado pela percepção de adequado suporte social relatado pela amostra. Tedesco et al. (1997) apontam que a ansiedade não controlada pode levar a um desajustamento emocional com a gestação, trazendo efeitos indesejáveis quanto à condição materna e desenvolvimento emocional e cognitivo da criança.

A porcentagem de depressão em gestantes encontrados na atual pesquisa (acima da pontuação 12 considerada como note de corte para a população brasileira) foi de 29,5% da amostra, vindo ao encontro da pesquisa de Alvarado e colaboradores (1993) o qual foi observada uma prevalência de 30,4% dos sintomas depressivos em gestantes chilenas, sendo esta pesquisa que mais se aproximou com os dados obtidos da atual pesquisa. Jadresic, Jara, Miranda, Arrau e Araya (1992), também em uma amostra chilena (n=108), encontraram uma prevalência de 35,2% de sintomatologia depressiva nas gestantes. No estudo realizado por Freitas e Botega (2002), com adolescentes grávidas brasileiras, verificou-se que 20,8% da amostra apresentava sintomas depressivos clinicamente significantes.

Associações entre depressão e ansiedade foram confirmadas pelo estudo de MacMahon, Barnett, Kowalenko, Tennant e Don (2001) que encontraram, em uma amostra de 58 puérperas, diagnosticadas com depressão e ansiedade pelo CIDI (Composite International Diagnostic Interview), EPDS e IDATE, correlações semelhantes, sendo que as correlações entre o estudo citado e o atual observado foram: EPDS x Traço (0,61 e 0,73); EPDS x Estado (0,45 e 0,52). MacMahon e colaboradores (2001) e Cindy-Lee (2003), apontam a importância de estudos com delineamentos experimentais para avaliar os fatores causais entre a depressão e a ansiedade, já que o conhecimento do desenvolvimento dos transtornos nos períodos gravídico e puerperal são fundamentais para a implantação de programas preventivos em atenção primária e de suporte em atenção secundária de saúde como, por exemplo, programas de suporte por telefone dado por mães treinadas.

Baptista, M. N., Baptista, A. S. D. e Dias (2001), Gotlib, Whiffen e Mount (1989) e Matsukura, Marturano e Oishi (2002), referem como um dos fatores de risco para desenvolver a sintomatologia depressiva o baixo apoio emocional. Mesmo que, na atual pesquisa observou-se que as gestantes possuíam médio e alto suporte social, a correlação entre esta variável e sintomatologias de depressão e ansiedade pode ser averiguada. Coutinho, Baptista e Morais (2002) também encontraram correlações negativas entre o suporte da família de origem e o EPDS, bem como valores estatísticos limítrofes entre depressão e suporte provindo do marido e suporte social total, em uma amostra de 73 puérperas da zona leste de São Paulo. Hudson, Elek e Campbell-Grossman (2000), da mesma forma, encontraram correlação negativa entre o suporte social e sintomatologia depressiva em uma amostra de conveniência de 21 mães adolescentes em um centro de atenção à saúde em Nebraska, além de correlações positiva entre suporte social e auto-estima e negativa entre suporte social e solidão, apontando a importância do suporte social no bem-estar psicológico.

Em um estudo com mães adolescentes americanas, avaliando-se as correlações entre depressão, auto-estima, solidão e suporte social, encontrou-se fortes correlações negativas entre depressão, solidão e suporte social, bem como correlação positiva entre suporte social e auto-estima, no entanto é importante se aventar a possibilidade da depressão e solidão estarem distorcendo a percepção de suporte social (Baptista, M. N. & Oliveira, 2004; Hudson, Elek & Campbell-Grossman, 2000). O suporte social também pode ser considerado com parte de um modelo estatístico explicativo que considera-o diretamente relacionado com o sentimento de solidão e, conseqüentemente com a percepção de pertencimento ao grupo, estando indiretamente relacionado com a depressão, provavelmente indicando que o pertencimento é um bom preditor de sintomatologia depressiva (Hagerty & Williams, 1999).

Este estudo possui como limitação o tamanho restrito e conveniência da amostra, o que deve ser levado em consideração na tentativa de generalização dos dados para outras gestantes. Outro fator limitante se refere à inexistência de um instrumento que avalie a depressão durante a gestação, sendo utilizado um instrumento que avalia sintomas de depressão no pós-parto, fato este importante, pois a nota de corte utilizada para distinguir caso dos não casos foi à proposta pelos autores da escala EPSD (Santos, Martins & Pasqualli, 2000). Por último, não foi utilizada uma entrevista estruturada para avaliar a presença de transtorno depressivo ou ansioso, podendo-se apenas afirmar a presença de sintomatologia, sendo assim, em futuros estudos poder-se-ia utilizar avaliações diagnósticas para confirmar a presença de transtorno, o que torna o delineamento mais completo, no entanto mais demorado e cansativo para as grávidas na coleta de dados.

A depressão durante a gravidez e/ou puerpério pode trazer diversas conseqüências negativas para a relação mãe/filho(a), além da relação familiar, como apontam Cunningham e Zayas (2002), relatando que a depressão na gravidez e puerpério está associada com maiores atitudes punitivas da mãe em relação aos filhos anteriores e/ou com o bebê, menor espontaneidade e responsividade nos cuidados do infante, além de problemas (maiores eventos estressantes) entre o casal. Por ser um período diferenciado de vida, é importante conhecer quais os fatores que podem evitar ou amortecer os eventos estressantes relacionados com gravidez e puerpério, como por exemplo, o suporte social, a fim de se desenvolver estratégias psicossociais eficazes, capazes de minimizar o impacto de sintomatologias psicológicas/psiquiátricas na relação mãe-bebê, bem como nas relações familiares. A depressão pode implicar em vínculos inadequados entre mãe-bebê e intra-familiares, sendo que o suporte social e, mais especificamente o suporte familiar podem ser muito importantes no sentido de evitar o desenvolvimento ou piora de sintomatologias depressivas (Baptista, 2004; Herring & Kaslow, 2002).

 

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Endereço para correspondência
Rua Dr. Miguel Pierro, 61 - Cidade Universitária II - Barão Geraldo
13083-300 Campinas - SP
Tel.: +55-19 3287-7224 (res)
Tel.: +55-11 4534-8046 (com) / +55-11 4534-8040 (com)
Cel.: +55-19 9714-4972
E-mail: daherbaptista@ig.com.br

Recebido em: setembro/2005
Revisado em: novembro/2005
Aprovado em: janeiro/2006

 

 

Sobre os autores:

1 Makilim Nunes Baptista é Doutor pelo Departamento de Psiquiatria e Psicologia Médica da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), e docente do Programa de Pós-Graduação Strictu-Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco - Itatiba/SP.
2 Adriana Said Daher Baptista é Doutora pelo Departamento de Psiquiatria e Psicologia Médica da Escola Paulista de Medicina - Universidade federal de São Paulo (UNIFESP) e membro do Centro Universitário Hermínio Ometto - Araras/SP.
3 Erika Cristina Rodrigues Torres é psicóloga clínica.