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Avaliação Psicológica

versión impresa ISSN 1677-0471versión On-line ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.11 no.2 Itatiba abr./jun. 2012

 

 

Eficácia coletiva de professores: análise de escalas internacionais de avaliação

 

Teachers' collective efficacy: analysis of international assessment scales

 

Eficacia colectiva de profesores: análisis de escalas internacionales de evaluación

 

 

Marilda Aparecida Dantas1; Daniela Couto Guerreiro-Casanova; Roberta Gurgel Azzi

Universidade Estadual de Campinas

 

 


RESUMO

O objetivo desta investigação foi analisar as escalas de avaliação da eficácia coletiva de professores com base na perspectiva da Teoria Social Cognitiva proposta por Bandura. Para tanto, foram realizadas buscas de escalas nas bases de dados PsycINFO, Eric, SciELO Brasil e Capes, considerando publicações datadas a partir de 2000. Foram encontradas quatro escalas publicadas, todas elaboradas em contexto internacional e nenhuma encontrada no contexto nacional. As análises foram feitas no que diz respeito à definição do construto e delimitação do contexto, à presença de dimensões (força, nível e generalidade), à construção de itens e respostas, à aplicação da escala e aos processos de busca de evidências de validade. Os resultados observados indicaram que a maior parte das escalas atende aos principais requisitos propostos por Bandura e apresentam evidências de validade. Além disso, por meio da análise realizada, foi possível compreender e estabelecer critérios para a escolha de instrumentos.

Palavras-chave: eficácia coletiva; educação; escalas; professores.


ABSTRACT

The objective of this research was to analyze the teachers´ collective efficacy assessment scales under the perspective of Bandura´s Social Cognitive Theory. For that, a search was conducted in databases Psycinfo, Eric, Scielo Brasil and Capes considering publications dating from 2000 up to the present moment. Four scales were founded, being all of them from the international context, none was found in the national context. Analyses were made according to the definition of the construct, the delimitation of the context, the presence of the dimensions (strength, level and generality), the construction of the items and answers, the application of the scale and the processes of evidences of validity. The observed results indicated that most part of the scales respond to the main proposed requisites, and they present evidence of validity. Besides, through the analysis it was possible to understand and establish criteria for the choice of the instruments.

Keywords: collective efficacy; education; scales; teachers.


RESUMEN

El objetivo de esta investigación fue analizar las escalas de evaluación de eficacia colectiva de profesores con base en la Teoría Social Cognitiva propuesta por Bandura. Así, fueron realizadas búsquedas de escalas en las bases de datos PsycINFO, Eric, SciELO Brasil y Capes, considerando publicaciones con fecha a partir de 2000. Fueron encontradas cuatro escalas publicadas, todas elaboradas en el contexto internacional y ninguna encontrada en el contexto nacional. Los análisis fueron hechos con relación a la definición del constructo y delimitación del contexto, a la presencia de dimensiones (fuerza, nivel y generalidad), a la construcción de ítems y respuestas, a la aplicación de la escala y a los procesos de búsqueda de evidencias de validez. Los resultados observados indicaron que la mayor parte de las escalas atiende a los principales requisitos propuestos por Bandura y presentan evidencias de validez. Además, por medio del análisis realizado fue posible entender y establecer criterios para la elección de instrumentos.

Palabras-clave: eficacia colectiva; educación; escalas; profesores.


 

 

Este estudo tem como objetivo analisar as escalas de avaliação da eficácia coletiva de professores, tendo como referencial a Teoria Social Cognitiva. A análise proposta considerará as indicações realizadas por Bandura (2006) sobre a construção de escalas quanto à definição do construto e delimitação do contexto, à presença de dimensões (força, nível e generalidade), à construção de itens e de respostas, à aplicação da escala e aos processos de busca de evidências de validade. A fim de possibilitar a análise, este artigo se inicia com uma breve apresentação do construto de eficácia coletiva e recomendações sobre a construção de escalas com foco na perspectiva banduriana, para então apresentar a análise das escalas localizadas.

A eficácia coletiva é definida como uma crença grupal partilhada de capacidades conjuntas para organizar e executar os cursos de ações requeridos para se produzir determinados níveis de tarefas (Bandura, 1997). A crença de eficácia coletiva não se resume à soma das crenças de cada integrante do grupo, mas, sim, constitui-se como uma propriedade emergente no nível grupal, de modo que as pessoas integrantes de determinado grupo acreditam que, por meio da ação coletiva, esse grupo pode alcançar realizações desejadas. Caprara, Barbaranelli, Borgognie e Petita (2003, p. 16) destacam que a crença de eficácia coletiva se refere aos "julgamentos que as pessoas fazem sobre um sistema social (família, time, organização ou comunidade) e seu nível de comportamento e efetividade em domínios específicos de ações".

Para Bandura (1997), a percepção de eficácia coletiva se apresenta como mediadora das aspirações, do estabelecimento de metas e de expectativas de resultados, bem como das percepções de impedimentos relativos ao ambiente, podendo sofrer alterações ao longo do tempo de existência do grupo. Dependendo do nível de eficácia coletiva, o grupo vai estabelecer metas mais ou menos desafiadoras, esperar melhor ou pior resultado dos esforços empreendidos, avaliar os impeditivos do ambiente como passíveis de serem transpostos ou não. Também para Bandura (1997, 2008), o caráter construtivo das crenças de eficácia coletiva possibilita o desenvolvimento delas nos grupos. A construção da crença de eficácia coletiva se dá por meio das experiências diretas de domínio, da experiência vicária, da persuasão social e da percepção sobre os estados físicos e emocionais vivenciados pelos integrantes de determinado grupo. Essas são as quatro fontes da eficácia coletiva apresentadas por Bandura (1997, 2008) e que compõem o construto.

As áreas da educação, do esporte, da saúde e das organizações têm se apropriado desse construto a fim de potencializar e motivar grupos. No contexto educacional, as percepções de eficácia coletiva escolar têm sido definidas como os julgamentos dos professores de uma escola de que seu conjunto de educadores é capaz de organizar e executar os cursos de ações exigidos para se conseguir resultados positivos junto aos alunos (Goddard, Hoy & Hoy, 2004). Bzuneck e Guimarães (2009) destacam que a crença de eficácia coletiva escolar está relacionada à escola como um sistema social, no qual os professores atuam enquanto grupo.

Tal crença pode ser avaliada e a definição clara e objetiva do construto que se pretende mensurar é fundamental para auxiliar na definição do instrumento que será utilizado, seja este já disponível ou a ser construído (Polydoro, Azzi & Vieira, 2010). À medida que se define o construto, fundamentandoo em uma teoria, parte-se para outras fases, a fim de operacionalizar a definição pelo instrumento a ser utilizado (Laville & Dionne, 1999). No que diz respeito às recomendações de Bandura para a construção e aplicação de escalas de eficácia coletiva, o primeiro cuidado necessário para a mensuração da eficácia coletiva2 é atentar para o instrumento escolhido e/ou a ser construído e verificar se ele se destina à identificação do domínio específico a ser pesquisado (Bandura, 1997, 2006; Polydoro e cols., 2010). Isso ocorre porque a proposição teórica define o construto eficácia coletiva como uma percepção específica a determinado contexto e a determinadas atividades que constituem um domínio específico (Bong, 2006).

Avaliar a eficácia coletiva de um time de futebol, por exemplo, é diferente de avaliar a crença coletiva de uma equipe que trabalha em outro contexto conjuntamente, como ocorre no contexto educacional, com professores, gestores e outros. Esse exemplo sugere que, para cada domínio, haverá perspectivas, atividades e habilidades diferenciadas, e estas devem ser levantadas e analisadas com atenção, de modo que uma generalização para contextos diversos não é uma alternativa viável (Polydoro e cols., 2010; Hutz, 2011).

É necessário considerar que cada domínio é multifacetado, ou seja, é caracterizado por diversas atividades que o integram. Um instrumento que se destine a identificar a crença de eficácia coletiva deve possuir condições de identificar a diversidade que compõe cada domínio. Além disso, deve contemplar condições de analisar as dimensões: força, nível e generalidade da crença de eficácia coletiva como apontadas por Bandura (1997, 2006), Bong (2006) e Polydoro e cols. (2010), discutidas a seguir.

A dimensão força se refere à intensidade da percepção demonstrada em relação à capacidade de organizar e executar cursos de ações para realizar a tarefa questionada. Para tanto, é recomendado utilizar escalas estruturadas com 10 ou 100 pontos, que permitem a leitura do contínuo da força da resposta. Por meio da dimensão força, pode-se verificar a intensidade da percepção de eficácia em fazer determinada tarefa e/ou atividade em condições adversas, ou seja, os itens são construídos incluindo uma situação problema, na qual o respondente considera o julgamento de suas crenças ao respondê-la.

A dimensão nível se refere ao grau de dificuldade das tarefas de determinado domínio. Em uma situação na qual os itens não se diferenciam entre si quanto à dificuldade, provavelmente também não serão diferenciados quanto às respostas dos respondentes, pois, se não há obstáculos a serem superados, o desempenho facilmente será concluído.

A dimensão generalidade indica a inclusão de várias esferas do domínio que se pretende avaliar, possibilitando a verificação das múltiplas facetas de um mesmo domínio. Bong (2006) alerta que o pesquisador pode definir o alcance da dimensão generalidade conforme o objetivo da pesquisa a ser realizada, pois a eficácia coletiva pode ser mensurada em várias esferas do domínio, as quais poderão fornecer diferentes informações explicativas e/ou preditivas.

É necessário garantir um amplo conhecimento do domínio a ser pesquisado, de modo que os itens elaborados possam contemplar a quase totalidade das atividades e tarefas, garantindo a generalidade, bem como seus respectivos níveis. Para tanto, recomenda-se um estudo minucioso sobre o domínio a ser pesquisado, preferencialmente realizado a partir da escuta dos sujeitos que integram o domínio a ser pesquisado (Hogan, 2006; Polydoro e cols., 2010).

Outra recomendação de Bandura (1997, 2006) sobre a construção de escalas para mensurar a crença de eficácia coletiva é referente à redação dos itens. Para tanto, deve-se redigi-los utilizando o tempo verbal presente, de modo que o respondente possa refletir sobre o fazer uma determinada ação. Por exemplo, "Quanto as pessoas da sua escola são capazes de estabelecerem regras e procedimentos que facilitem a aprendizagem?". Essa redação, no tempo verbal presente, auxilia a indicar um julgamento de capacidade, e não uma intenção relativa à atividade questionada (Bong, 2006; Henson, 2001; Polydoro e cols., 2010).

Como previamente anunciado, quanto à pontuação, Bandura (1997, 2006) recomenda que sejam utilizados pontos de 0 a 100 (exemplo: 10 ....20..... 30.....) ou pontos de 1 a 10 (exemplo: 1...2...3) como opções de respostas a cada item de uma escala destinada à mensuração da eficácia coletiva. Tal padrão é justificado pelo fato de que escalas com poucos pontos podem ser menos sensíveis e menos fidedignas. Para auxiliar o respondente a entender claramente o que cada número representa, é interessante fornecer a ele instruções como: Respostas1 a 2 (nada); respostas 3 a 4 (pouco); respostas 5 a 6 (razoavelmente); respostas 7 a 8 (muito) e respostas 9 e 10 (bastante).

Na elaboração e aplicação de escalas, faz-se necessário evitar condições que gerem viés de respostas (Pasquali, 2001; Anastasi & Urbina, 2000). É importante viabilizar um ambiente de avaliação propício a dificultar que os respondentes tentem, de alguma forma, manipular os dados ou, ainda, que se sintam pressionados socialmente a emitir uma resposta aceitável, considerando as circunstâncias de cada avaliação. Para tanto, recomenda-se garantir o anonimato dos participantes como meio para se alcançar a autenticidade do conteúdo das respostas. Além disso, sugere-se que o título da escala seja explicitado apenas como "Inventário de Avaliação", sem a indicação direta da palavra "eficácia", de modo a evitar desvios de respostas (Bandura, 1997, 2006).

Procedimentos para o estabelecimento de evidências de validade dos instrumentos, que são compreendidas por processos em que a "validade dos escores de teste resulta das evidências acumuladas que corroboram sua interpretação e seu uso" (Urbina, 2007, p. 155) são imprescindíveis. Para analisar a validade de conteúdo na construção de escalas de autoeficácia, especificamente, Polydoro e cols. (2010) orientam a submissão do instrumento a especialistas da área, para que estes possam reconhecer e analisar os itens da escala, de modo a verificar se aquilo que o instrumento se propõe a medir realmente corresponde à proposta teórica.

Deve-se buscar a validade discriminativa que é um processo relevante para a fundamentação teórica, pois é por meio de dados empíricos que se torna possível diferenciar os construtos. Um exemplo comum é diferenciar julgamentos de capacidade da eficácia coletiva de clima organizacional ou, ainda, de escalas que se denominam como eficácia coletiva, mas que utilizam diferentes abordagens teóricas da proposta pela Teoria Social Cognitiva. Da mesma forma, a busca de validade preditiva fortalece a fundamentação teórica, no sentido de compreender e hipotetizar que pessoas que se julgam capazes de realizar algo tenderão a escolher caminhos diferentes daquelas que não se julgam capazes (Bandura, 2006).

Os estudos piloto também devem ser utilizados, a fim de garantir, entre outros dados, que o entendimento daquilo que se indaga esteja sendo alcançado (Anastasi & Urbina, 2000; Urbina 2007; Polydoro e cols., 2010). Outros processos de buscas de evidências de validade, não citados pelo proponente da teoria, podem ser visualizados em Urbina (2007) e Nunes e Primi (2010).

Nota-se, então, que as recomendações na construção e aplicação de escalas, especificamente em eficácia coletiva, enfatizam não somente a objetividade e clareza na formulação dos itens, mas o atendimento e a cobertura do construto teórico de forma ampla e cuidadosa. Com a utilização das recomendações ora citadas, é esperado que o investigador encontre, com maior possibilidade, indicativos de autenticidade de respostas, o que deve ser encorajado quando da abordagem da aplicação do instrumento. Pesquisadores têm sinalizado que escalas destinadas a mensurar a crença de eficácia coletiva nem sempre são coerentes com a concepção teórica (Henson, 2001; Klassen, Tze, Betts & Gordon, 2011), o que muitas vezes decorre em resultados de percepções elevadas de julgamento de autoeficácia coletiva.

Método

Esta pesquisa se caracteriza pelo delineamento de levantamento bibliográfico. Como procedimento de pesquisa, foram realizadas buscas nas bases de dados PsycINFO, Eric, SciELO Brasil e Capes durante o período de abril a maio de 2010. Nessas buscas, foram utilizadas como palavraschave a expressão "eficácia coletiva" e os termos "escala" e "professores"; no caso das bases de dados internacionais, estes descritores foram traduzidos para o inglês.

Como critérios de inclusão, foram considerados artigos com data a partir de 2000 que: (1) apresentaram as palavras-chave citadas no título, no resumo ou como descritores; (2) utilizaram como referencial teórico a Teoria Social Cognitiva de Albert Bandura; (3) apresentaram a escala na íntegra, com todos os itens transcritos e os respectivos dados psicométricos. O procedimento de análise de dados foi qualitativo. Para tanto, as escalas localizadas foram analisadas considerando as indicações realizadas por Bandura (2006) sobre a construção de escalas quanto à: (1) definição do construto e delimitação do contexto; (2) presença de dimensões (força, nível e generalidade); (3) construção de itens, respostas e procedimentos de aplicação da escala; e (4) processos de estabelecimento de evidências de validade.

 

Resultados

Nas bases de dados SciELO Brasil e Capes, não foram localizadas escalas destinadas a mensurar a eficácia coletiva de professores. Já no levantamento realizado nas bases de dados internacionais PsycINFO e Eric foram encontradas quatros escalas, a saber: 1) Escala de Eficácia Coletiva de Professores – CTE – forma longa (Goddard, Hoy & Hoy, 2000); 2) Escala de Eficácia Coletiva de Professores – CTE – forma curta (Goddard, 2002); 3) Escala de Crença Coletiva de Professores (Tschannen-Moran & Barr, 2004); e 4) Escala de Percepção de Eficácia Coletiva de Professores (Skaalvik & Skaalvik, 2007). A Tabela 1 apresenta uma síntese das características gerais de cada escala.

A primeira categoria de análise é relativa à definição do construto e à delimitação do contexto. Como pode ser observado na Tabela 1, os títulos e os itens das escalas indicam que estas estão direcionadas para o contexto escolar. As quatro escalas analisadas foram elaboradas a partir do referencial teórico da Teoria Social Cognitiva e destinam-se a mensurar a crença de eficácia coletiva, entendendo-a como a crença que os professores têm em relação à capacidade coletiva da escola em que atuam para realizar tarefas educacionais com êxito (Goddard e cols., 2000).

 

 

Os itens foram redigidos de modo que a percepção dos professores pudesse ser questionada por meio da expressão "os professores desta escola" (Goddard, 2002; Goddard e cols., 2000; Skaalvik & Skaalvik, 2007; Tschannen-Moran & Barr, 2004) ou do pronome "nós" (Skaalvik & Skaalvik, 2007), o que se mostra coerente com as orientações de Bandura referentes à elaboração de itens para capturar a percepção da crença de eficácia coletiva (Bandura, 1997, 2006, 2008; Goddard e cols., 2004; Henson, 2001).

Na segunda categoria de análise, foi verificada a presença das dimensões (força, nível e generalidade). Inicia-se aqui pela dimensão força. Como comentado anteriormente, por meio dessa dimensão é possível verificar a intensidade da crença relativa ao domínio da pesquisa, neste caso, eficácia coletiva escolar. Nessa categoria, as escalas analisadas apresentaram-se bem diversas, pois as estruturas de respostas foram elaboradas em Likert de 9 pontos, em contínuo de pouco a bastante (Escala de Crença Coletiva de Professores); de 6 pontos, em contínuo de discordo fortemente a concordo fortemente - formas longa e curta (Escala de Eficácia Coletiva de Professores – CTE); e de 5 pontos, variando de falso a verdadeiro (Escala de Percepção de Eficácia Coletiva de Professores), como pode ser observado na Tabela 1.

Pajares, Hartley e Valiante (2001) realizaram um estudo por meio do qual verificaram que escalas com maiores amplitudes de respostas, como de 1 a 10 ou 1 a 100, têm demonstrado melhor preditividade do que escalas com menores variações. Polydoro e cols. (2010) destacam que a utilização de Likerts diferentes do recomendado por Bandura (1997, 2006) pode ser decorrente de questões relativas ao contexto cultural ou a características específicas da amostra.

A dimensão nível destina-se a verificar o grau de dificuldade que a crença de um grupo julgase capaz de lidar. Nesse aspecto, Bandura (1997, 2006) recomenda que as escalas apresentem itens relativos a uma mesma tarefa, mas com graus de dificuldades diferentes entre si. Na Escala de Percepção de Eficácia Coletiva de Professores (Skaalvik & Skaalvik, 2007) pôde ser verificada a presença de itens que se destinam a mensurar a percepção dos professores sobre a capacidade de instrução, motivação, controle do comportamento dos estudantes, atendimento às necessidades dos estudantes e capacidade de criar um ambiente seguro. Dos sete itens que compõem essa escala, três deles se destinam a mensurar a eficácia coletiva relativa à capacidade de controlar o comportamento dos estudantes, de modo que as demais capacidades são mensuradas apenas por um item cada. Isso parece indicar que apenas a capacidade de controlar o comportamento dos estudantes foi verificada em níveis de desafios diferentes, ou seja, as demais capacidades não foram consideradas na dimensão nível.

Na Escala de Eficácia Coletiva de Professores – CTE – forma longa, a dimensão nível foi contemplada por meio de itens positivos e negativos para mensurar as mesmas capacidades. Por exemplo: "A falta de material e de suplementos instrucionais torna a tarefa de ensinar muito difícil" e "A qualidade da infraestrutura escolar realmente facilita o processo de ensino e de aprendizagem". Essa estrutura com itens positivos e negativos permeia todos os 21 itens da escala, os quais são direcionados a mensurar a capacidade coletiva sobre a competência do grupo e sobre a análise de tarefas instrucionais. Por meio dessa estrutura, pode-se perceber certa possibilidade de se mensurar o nível da crença de eficácia coletiva. No entanto, a dimensão nível pode ser verificada apenas em extremos, e não em níveis gradativos de desafios. O mesmo pode ser dito sobre a Escala de Eficácia Coletiva de Professores – CTE – forma curta, que tem a mesma estrutura, mas conta com apenas 12 itens.

A Escala Crença Coletiva de Professores (Tschannen-Moran & Barr, 2004) apresenta seis itens para mensurar aspectos relativos à disciplina dos estudantes e seis itens para mensurar estratégias instrucionais, nos quais se pode verificar alguma variabilidade de nível ou desafios, por exemplo: "Quanto os professores desta escola são capazes de fazer para promover aprendizagem significativa aos estudantes" e "Quanto os professores desta escola são capazes de fazer para possibilitar que os estudantes aprendam conteúdos complexos".

E, por fim, está a dimensão generalidade, que se refere à amplitude do contexto pesquisado. As escalas aqui analisadas apresentam delimitações diferentes entre si. O primeiro fator indicativo das diferentes delimitações é o número de itens de cada escala, que, como pode ser observado na Tabela 1, é diverso. A escala de Goddard e cols. (2000), com 21 itens, tem condição de obter informações de maneira mais ampla sobre o contexto a ser investigado do que uma escala com sete itens (Skaalvik & Skaalvik, 2007), por exemplo.

Os quatro instrumentos analisados nesta pesquisa oferecem condições de se obter informações sobre a percepção de eficácia coletiva escolar sobre estratégias de ensino, comportamento dos estudantes, ambiente seguro. Itens referentes a estudantes com necessidades específicas e à motivação são observados na escala de Skaalvik e Skaalvik (2007).

No entanto, não foram encontrados nessas escalas itens que se referissem à relação entre docentes e pais de alunos, nem sobre aspectos de gestão escolar, tampouco itens referentes à percepção de eficácia coletiva sobre as demandas educacionais decorrentes de políticas educacionais. Esses itens também se caracterizam como aspectos contextuais que podem exercer algum tipo de influência na crença de eficácia coletiva escolar, porém, cabe destacar que cada pesquisador pode definir os múltiplos aspectos que integram a eficácia coletiva em função do objetivo de sua pesquisa (Bong, 2006).

Na terceira categoria de análise, construção de itens, respostas e procedimentos de aplicação da escala, algumas incongruências com as orientações de Bandura (1997, 2006) foram verificadas. Nas Escalas de Eficácia Coletiva de Professores – CTE (formas longa e curta), destacam-se algumas ocorrências: (1) a utilização da palavra "able" na escrita de itens, não é indicada para mensurar a percepção de eficácia coletiva, visto que se refere à habilidade; (2) a redação de alguns itens apresenta foco nas habilidades correntes dos professores, e não na percepção da capacidade dos mesmos; (3) na redação de alguns itens foi empregado o tempo verbal futuro; (4) a redação de alguns itens não direciona a pergunta para que se possa obter informação sobre a percepção de eficácia coletiva, mas sim sobre a observação que o professor tem em relação ao contexto em que a escola está inserida (Klassen e cols., 2011).

Em relação à Escala de Percepção de Eficácia Coletiva de Professores, de Skaalvick e Skaalvick (2007), foram encontrados dois itens que utilizaram a palavra "able"; no entanto, como os próprios autores sinalizaram no texto, a utilização da palavra supõe que esta incongruência tenha ocorrido durante o processo de tradução, uma vez que os autores são originários da Noruega. Na Escala de Crença Coletiva de Professores (Tschannen-Moran & Barr, 2004), não foram identificadas incongruências deste tipo.

As escalas também foram analisadas conforme as condições de aplicação. Quanto ao quesito de identificação do sujeito, notou-se que nenhuma delas apresenta espaço para o nome, nem número ou letra, o que fortalece a condição de obter respostas, talvez, menos enviesadas pelos sujeitos, uma vez que não são identificados.

Quanto ao título da escala expresso no material, a Escala de Eficácia Coletiva de Professores – CTE – forma longa (Goddard e cols., 2000) e a Escala de Eficácia Coletiva de Professores – CTE – forma curta (Goddard, 2002) atendem às recomendações, pois estas escalas mencionam apenas a sigla do construto, o que possibilita respondentes com mais distanciamento da teoria sem identificação do seu significado. A Escala de Crença Coletiva de Professores (Tschannen-Moran & Barr, 2004), por sua vez, omite a palavra "eficácia", o que também atende às recomendações. Já a escala de Skaalvik e Skaalvik (2007) não segue essa orientação, pois tem como título: Escala de Percepção de Eficácia Coletiva de Professores, apresentando a palavra "eficácia".

Quanto à quarta categoria de análise, relativa aos processos de busca de evidências de validade das escalas, vale mencionar que estes foram realizados de acordo com os contextos específicos dos países de origem, o que não significa uma validação generalizada. A escala de Eficácia Coletiva de Professores – CTE – forma longa (Goddard e cols., 2000) passou pelos processos de busca de evidências de validade, sendo o primeiro deles a análise dos itens por juízes especialistas na área, a fim de verificar a adequação dos itens em relação à teoria proposta. Após as alterações formuladas pelos juízes, os itens foram submetidos a outro grupo, desta vez de professores, a fim de verificar o seu entendimento. Posteriormente, foi realizado um estudo piloto com 70 professores, com a utilização, também, de outras medidas sobre diferentes construtos, entre elas, eficácia pessoal (r =0,41, p < 0,001), senso de empoderamento (r = -0,51, p < 0,001), verdade entre colegas (r =0,67, p < 0,001). As medidas foram correlacionadas para verificar a validade de critério, sendo confirmadas correlações significativas positivas e negativas.

A segunda escala de Eficácia Coletiva de Professores – CTE – forma curta (Goddard, 2002), como pode ser notado, é uma versão posterior, com menor número de itens. Ela foi desenvolvida com a finalidade de aprimorar a primeira escala. A proposta de aprimoramento dessa escala buscou apresentar itens parcimoniosos, ou seja, o autor tentou calibrar os itens quanto à competência de grupo e à análise da tarefa. Tal ação foi justificada pela análise dos dados psicométricos encontrados na primeira forma (longa) que sinalizou uma distribuição desigual de itens. Assim, dos 21 itens da CTE – forma longa, 13 são destinados à competência do grupo e apenas oito à análise da tarefa.

Os resultados indicaram que a escala versão curta (12 itens) representou adequação à proposta teórica, tendo sido indicados seis itens (três positivos e três negativos) para a categoria competência de grupo e seis itens (três positivos e três negativos) para análise de tarefas. Entende-se que os processos de validação se mantiveram quanto à construção dos itens. Acrescentam-se outros processos de validação realizados por esse autor, como a correlação entre dados da escala longa e a escala curta (r= 0,98) e validade preditiva externa, comparando os dados de eficácia coletiva de professores e realização de alunos em matemática (r= 0,55).

Na Escala de Crença Coletiva de Professores (Tschannen-Moran & Barr, 2004) não foram encontrados e identificados processos de validação desta escala quanto à análise de juízes. A informação coletada no texto é de que houve uma adaptação de outro instrumento para verificar a eficácia pessoal do professor. Essa escala foi submetida à análise fatorial, na qual foram identificados dois fatores, sendo um de estratégia instrucional (carga fatorial= 0,67) e outro de disciplina dos estudantes (carga fatorial= 0,64). Segundo as autoras, a presença de dois fatores contribui para ampliar a preditividade. Um processo de validade de critério foi realizado na correlação entre eficácia coletiva e realização dos estudantes em matemática (r=0,41, p < 0,01), em escrita (r=0,50, p < 0,01) e em inglês (r=0,37, p < 0,01).

Por fim, sobre a Escala de Percepção de Eficácia Coletiva de Professores, desenvolvida por Skaalvik e Skaalvik (2007), também não foram encontradas informações a respeito da construção do instrumento utilizando a análise de juízes ou estudo piloto. O processo de validação identificado foi o de validade de critério externo, que, por meio da path analysis (0,64), identificou relação entre autoeficácia de professores e eficácia coletiva de professores.

 

Considerações Finais

A análise apresentada neste trabalho aponta a possibilidade de um caminho a ser percorrido pelo pesquisador/profissional no processo de escolha de instrumentos. Nesse sentido, traz elementos que favorecem o atendimento às questões éticas e técnicas, os objetivos da avaliação a ser consumada e, principalmente, a uma postura crítica no processo de avaliação.

Nunes e Primi (2010) sinalizam que a escolha de instrumentos psicológicos requer uma análise de suas qualidades. Elas são verificadas por meio de evidências de validade e precisão, de uma fundamentação teórica do construto que ofereça suporte adequado ao sistema interpretativo dos resultados (normatização), assim como de dados de aplicação e indicação de literatura especializada.

De acordo com os dados levantados nesta pesquisa, notou-se que tais qualidades foram claramente identificadas nos instrumentos analisados. Os dados psicométricos de precisão e validade também foram mencionados, sendo Alpha de Cronbach o dado mais recorrente nas pesquisas (ver Tabela 1), e os procedimentos de evidências de validade foram realizados por meio de validade de conteúdo, de critério externo, preditivo, divergente e convergente.

A qualidade de normatização, que consiste em indicar um valor normal ou médio (o escore de um indivíduo é interpretado por meio de sua comparação com os escores obtidos por outros no mesmo teste), não foi indicada nas pesquisas. Vale ressaltar que Bandura (2006) não especifica a normatização, mas indica que, em uma escala de 0 a 100, há valores extremos e intermediários, sendo classificados como: a) não pode fazer tudo; b) pode fazer moderadamente; e c) altamente certo de que pode fazer. Isso não desqualifica as escalas, apenas nos possibilita entender que, para uma avaliação adequada de acordo com a Teoria Social Cognitiva, os resultados encontrados merecem uma análise interpretativa, considerando aspectos pessoais, comportamentais e ambientais, de acordo com a natureza do construto, ou seja, um conjunto de crenças que se caracteriza por não ser estático, e sim associado à dinâmica de interações indivíduo–comportamento–ambiente.

Este trabalho permitiu identificar escalas de eficácia coletiva escolar, desenvolvidas em diferentes países. Ressalta-se, portanto, a necessidade de se construir e/ou adaptar tais escalas para o contexto escolar brasileiro, a fim de contribuir para o aprimoramento de pesquisas e possibilitar intervenções nesta área que carece, certamente, de mais investimento. Tal ação poderá contribuir para que se compreenda a percepção de eficácia coletiva em instituições escolares, o que, segundo Guerreiro- Casanova e Azzi (2010), é importante para explicar como uma escola pode organizar sua capacidade de ação grupal a fim de realizar seus objetivos pedagógicos, bem como é relevante no sentido de fornecer condições para que a unidade escolar possa exercer controle sobre as circunstâncias nas quais está inserida.

 

Referências

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Recebido em junho de 2011
Reformulado em maio de 2012
Aceito em junho de 2012

 

 

Sobre as autoras:

Marilda Aparecida Dantas: Doutoranda em Educação – Unicamp.
Daniela Couto Guerreiro-Casanova: Doutoranda em Educação – Unicamp, Bolsista FAPESP.
Roberta Gurgel Azzi: Docente da Faculdade de Educação – Unicamp.


1Endereço para correspondência:
Rua Agostinho Rossi, no 139, Parque Bela Vista, Pedreira-SP– CEP: 13920-000. Fone: (19) 3852-3252. E-mail: marildapsi@uol.com.br
2As recomendações aqui apresentadas também se referem à construção de escalas de autoeficácia, como pode ser observado em Bandura (2006). Privilegiaram-se as indicações desse autor em função do estudo de sua proposta teórica, porém outros autores são citados a fim de ampliar o diálogo.