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Avaliação Psicológica

Print version ISSN 1677-0471On-line version ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.14 no.3 Itatiba Dec. 2015

 

 

A quarta edição do teste WAIS

 

WAIS fourth edition

 

La cuarta edición del test WAIS

 

 

Vera Lúcia Marques de Figueiredo1, I; Francisco Antonio Soto VidalII; Elizabeth do NascimentoIII

IUniversidade Católica de Pelotas
IIPrefeitura Municipal de Pelotas
IIIUniversidade Federal de Minas Gerais

 

 


RESUMO

Ao longo de décadas, as escalas Wechsler de Inteligência têm sido periodicamente revisadas, buscando-se o aprimoramento na avaliação da inteligência, tanto em crianças quanto em adultos. O objetivo desta nota é apresentar a quarta edição da versão para adultos, WAISIV, publicada originalmente nos Estados Unidos da América, em 2008. Destacam-se as modificações introduzidas quanto à estrutura, composição e os novos escores de processo para interpretação de resultados. As atualizações dessas escalas de inteligência tendem a ajustar a avaliação cognitiva com as teorias psicométricas atuais e a incrementar a utilidade clínica, particularmente na área neuropsicológica.

Palavras-chave: WAIS-IV; avaliação psicológica; inteligência; cognição.


ABSTRACT

For decades, the Wechsler Intelligence Scales have been periodically reviewed in search of improvements in the assessment of intelligence, both in children and adults. The purpose of this Technical Note is to present the fourth edition of the Wechsler Intelligence Scale for Adults (WAIS-IV), originally published in the United States, in 2008. It presents the major changes in the structure and composition of WAIS-IV and its new process scores. Updates of these intelligence scales tend to adjust the cognitive assessment with current psychometric theories and to increase the clinical utility, particularly in the neuropsychological area.

Keywords: WAIS-IV; psychology assessment; intelligence; cognition.


RESUMEN

A lo largo de décadas, las Escalas Wechsler de Inteligencia han sido periódicamente revisadas, en busca del perfeccionamiento de la evaluación de la inteligencia, tanto en niños como en adultos. La finalidad de esta Nota Técnica es presentar la cuarta edición de la versión adulta, el WAIS-IV, publicada originalmente en los Estados Unidos de Norteamérica, el año 2008. El texto destaca las importantes modificaciones introducidas al test en cuanto a su estrutura, composición y los nuevos puntajes de proceso para la interpretación de resultados. Se confirma la tendencia de las Escalas Wechsler para promover refinamientos que posibiliten la evaluación cognitiva en mayor sintonía con las teorías psicométricas actuales y que contribuyan a mejorar la utilidad clínica, especialmente en el contexto de la evaluación neuropsicológica.

Palabras-clave: WAIS-IV; evaluación psicológica; inteligencia; cognición.


 

 

Nos Estados Unidos, a Escala Wechsler que avalia a inteligência de adultos – Wechsler Intelligence Scale for Adults (WAIS) – encontra-se em sua quarta edição, denominada WAIS-IV (Wechsler, 2008). Nesse país, a quarta versão pode ser aplicada em adolescentes e adultos com idades entre 16 anos e 90 anos e 11 meses. As normas foram estabelecidas com base em uma amostra de 2.200 participantes, estratificada pelo sexo, nível educacional, raça/etnia e região geográfica. Para correção e interpretação dos escores, 13 faixas etárias foram estabelecidas (com 100 a 200 indivíduos em cada), sendo a primeira faixa de 16-17 anos e a última de 85-90 anos.

Tendo em vista a recente publicação do WISCIV no Brasil (Wechsler, 2013), pode-se dizer que o surgimento do WAIS-IV no contexto nacional também parece muito provável. O presente texto pretende contribuir para que os psicólogos brasileiros se familiarizem com as modificações inseridas nessa nova versão.

Tal como o WISC-IV, o modelo estrutural do WAISIV contempla quatro fatores denominados Compreensão Verbal (CV), Raciocínio Perceptual (RP)2, Memória Operacional (MO) e Velocidade de Processamento (VP). O primeiro fator, Compreensão Verbal (CV), constitui-se pelos subtestes Informação, Semelhanças e Vocabulário; Raciocínio Perceptual é avaliado por Cubos, Raciocínio Matricial e Quebra-Cabeças Visuais; Memória Operacional (MO) por Dígitos e Aritmética; e Velocidade de Processamento (VP) conserva a mesma estrutura desde a 3ª edição das escalas, com os subtestes Códigos e Procurar Símbolos. Para avaliar tais fatores, a quarta versão conta com 15 subtestes, sendo cinco deles suplementares. Esses subtestes suplementares são aplicados opcionalmente, em lugar de algum dos principais, para garantir a avaliação dos quatro fatores quando algum subteste for invalidado: Compreensão (para CV), Completar Figuras e Pesos de Figuras (para RP), Sequência de Números e Letras (para MO) e Cancelamento (para VP).

Por comparação com o modelo tradicional de quatro fatores, Benson, Hulac, e Kranzler (2010) encontraram que os subtestes do WAIS-IV se ajustam melhor ao modelo inspirado na teoria CHC, avaliando cinco dimensões: Inteligência cristalizada (Semelhanças, Vocabulário, Informação e Compreensão), Processamento visual (Cubos, Quebra-Cabeças Visuais e Completar Figuras), Raciocínio fluido (Raciocínio Matricial, Pesos de Figuras e Aritmética), Memória de curto prazo (Dígitos e Sequência de Números e Letras) e Velocidade de processamento (Procurar Símbolos, Códigos e Cancelamento).

As modificações no WAIS-IV, que dão continuidade às radicais mudanças realizadas no WISC-IV (Figueiredo, Vidal, & Nascimento, 2012), confirmam a proposta de enfatizar a avaliação da inteligência geral (QI Total), com a extinção dos tradicionais QIs Verbal e de Execução (Wechsler, 2013). Foram introduzidos escores de processos que oferecem mais opções para interpretações qualitativas, constituindo, portanto, um importante aprimoramento. Houve a diminuição do número de subtestes obrigatórios para 10. Dos 14 subtestes do WAIS-III, foram excluídos dois (Arranjo de Figuras e Armar Objetos) e incluídos outros três (Quebra-Cabeças Visuais, Pesos de Figuras e Cancelamento). Estes últimos serão descritos a seguir.

No subteste Quebra-Cabeças Visuais, o examinando observa, contando com um tempo limitado, uma configuração completa e deve selecionar, entre cinco possibilidades, três configurações parciais que unidas poderão reconstruir o quebra-cabeças. O novo subteste destina-se a avaliar raciocínio não verbal e a habilidade para analisar e sintetizar estímulos visuais abstratos. Essa tarefa também envolve a capacidade visoespacial geral (McCrea & Robinson, 2011).

Em Pesos de Figuras, o indivíduo examina figuras de balanças que utilizam, como pesos, alguns símbolos de cores e formas diferentes. Pressupondo-se que sempre está omitido um peso num dos pratos, ele deve escolher, num prazo limitado, entre as opções apresentadas, qual a figura que mantém a balança equilibrada. McCrea e Robinson (2011) observam que esse tipo de tarefa, similar às tradicionalmente usadas pela teoria Piagetiana, envolve o raciocínio quantitativo que se expressa matematicamente pela lógica dedutiva e indutiva. Conforme os mesmos autores, o Manual Técnico do WAIS-IV relata que esse subteste avalia principalmente raciocínio quantitativo e analógico, sendo considerado o melhor representante da inteligência fluida na bateria. Segundo Benson et al. (2010), a carga de Pesos de Figuras no fator g é a mais alta de todos os 15 subtestes do WAIS-IV; por outro lado, é o que apresenta a maior carga no grupo não verbal, posição que até então era ocupada pelo subteste Cubos.

Cancelamento é um subteste complementar que requer que o indivíduo examine um arranjo de figuras estruturadas com formas coloridas e marque as idênticas às figuras-alvo, ignorando os estímulos distratores, dentro de um limite de tempo. Esse subteste é similar às tarefas de cancelamento que avaliam velocidade de processamento, atenção seletiva visual, vigilância, velocidade perceptiva e habilidade visomotora (McCrea & Robinson, 2011). Entre todos os subtestes da escala, Cancelamento apresenta a menor carga (0,37) no fator g (Benson et al., 2010). Diferentemente dos outros dois subtestes novos, Cancelamento já estava incluído na quarta versão do WISC.

O WAIS-IV introduziu, assim como o WISC-IV, novos escores de processo, que são indicadores que trazem informações mais específicas sobre os processos cognitivos implicados. Tais coeficientes, descritos a seguir, são aplicados aos subtestes Cubos, Dígitos e Sequência de Números e Letras.

O escore Cubos sem Tempo de Bônus (Block Design No Time Bonus) é calculado pelo total de pontos obtidos, sem incluir as bonificações por tempo de execução. A comparação entre esse escore de processo e o escore com bonificações pode ajudar a determinar como a velocidade influi no desempenho do examinando no subteste (Lichtenberger & Kaufmann, 2009). É digno de nota que, em estudo brasileiro realizado por Banhato (2005), verificou-se, em uma amostra de 346 idosos, haver diferenças significativas do ponto de vista estatístico (p<0,001) nos tempos gastos para execução correta dos itens do subteste Cubos do WAIS-III. Tal achado já indicava a importância de se considerar a velocidade de processamento da informação, particularmente em idosos.

No subteste Dígitos, podem-se obter seis escores adicionais: Dígitos na Ordem Direta (Digit Span Forward), que consiste num escore ponderado relativo ao escore bruto da Ordem Direta, e Dígitos na Ordem Inversa (Digit Span Backward), que é o escore ponderado que deriva dos pontos obtidos na Ordem Inversa. Os dois permitem verificar se a diferença no desempenho nas duas tarefas é significativa, uma vez que os desempenhos envolvem processos cognitivos diversos. Outros dois escores de processo – Série Máxima na Ordem Direta (Longest Digit Span Forward) e Série Máxima na Ordem Inversa (Longest Digit Span Backward) – referem- -se ao maior número de dígitos memorizados, respectivamente, na Ordem Direta e na Ordem Inversa, não importando se ele acertou uma tentativa ou as duas de uma determinada série. Cumpre destacar que no manual do WAIS-III, tanto na versão original quanto na adaptada para o Brasil (Wechsler, 2004), há tabelas disponíveis para analisar os desempenhos nas ordens direta e inversa. Figueiredo e Nascimento (2007) destacam a relevância clínica dessas análises para melhor compreensão da memória, tanto em crianças quanto em adultos.

A inovação presente nos escores de processo no WAIS-IV relacionados ao subteste Dígitos está no fato de se poder converter o escore bruto em ponderado, oferecendo, assim, um parâmetro de comparação entre o desempenho do examinando em cada parte e o da amostra normativa. O subteste Dígitos do WAIS-IV acrescenta uma terceira tarefa, presente pela primeira vez nas Escalas Wechsler de inteligência: ao examinando são apresentados oito novos itens – cada um com duas tentativas, variando de dois a nove dígitos – e ele deve reenunciar a série em ordem numérica crescente. Os dois escores de processo resultantes denominam-se: Dígitos na Ordem Crescente (Digit Span Sequencing), equivalente ao total de pontos obtidos em todas as tentativas, e Série Máxima na Ordem Crescente (Longest Digit Span Sequence), calculado pelo maior número de dígitos corretamente ordenados em sequência crescente.

Desses coeficientes, os quatro primeiros (Cubos Sem Tempo de Bônus, Dígitos na Ordem Direta, Dígitos na Ordem Inversa e Dígitos na Ordem Crescente) utilizam a mesma métrica dos escores ponderados dos demais subtestes – com média igual a 10 e desvio padrão de 3 – enquanto os demais somente contam com escores brutos. Da mesma forma que Dígitos na Ordem Inversa, a tarefa Crescente envolve maior complexidade de operação mental e de visualização de números, enquanto a tarefa na Ordem Direta apenas exige uma evocação automática. Segundo Lichtenberger e Kaufmann (2009), pessoas com maior habilidade numérica desempenham- se melhor nas tarefas da Ordem Inversa e da Ordem Crescente.

O subteste Sequência de Números e Letras traz mais um escore de processo – Série Máxima de Números e Letras (Longest Letter-Number Sequence), equivalente ao tamanho da maior série memorizada. É interessante observar que a tarefa exigida nesse subteste relaciona- -se conceitualmente com as funções cognitivas envolvidas em Dígitos na Ordem Inversa e Ordem Crescente. Lichtenberger e Kaufmann (2009) observam que as estratégias que o indivíduo possa ter usado nessas duas tarefas em Dígitos serão provavelmente aproveitadas na tarefa de Sequência de Números e Letras.

Entre as mudanças relacionadas à estrutura dos itens e aos procedimentos de aplicação, podem-se destacar: diminuição do número de itens com bônus de tempo (em Aritmética e Cubos), a inclusão de maior número de itens de exemplo, inclusão de itens mais fáceis para discriminar os indivíduos no extremo inferior da capacidade intelectual, e a redução dos limites de erros que determinam os critérios de suspensão em oito dos 15 subtestes. Com o fim de adequar o teste às características evolutivas dos examinandos, foi aumentado o tamanho das figuras nos subtestes Completar Figuras, Códigos e Procurar Símbolos, bem como foi minimizada a ênfase na psicomotricidade fina, pela exclusão dos subtestes de execução Arranjo de Figuras e Armar Objetos (Wechsler, 2008). Em relação aos escores compostos, a medida da Memória Operacional ficou fortalecida com as modificações nos subtestes que compõem o fator: acréscimo de sete escores de processo em Dígitos e em Sequência de Números e Letras, e a simplificação do raciocínio matemático envolvido em itens de Aritmética, priorizando a habilidade mnemônica. Adicionalmente, a bateria diminui a relevância do tempo de execução para avaliar a inteligência. Uma importante melhoria do WAIS-IV em relação a escalas anteriores é a representação do raciocínio fluido (com os subtestes novos Pesos de Figuras e Quebra- Cabeças Visuais) e da memória operacional (com os novos escores).

As várias modificações introduzidas no WAIS-IV confirmam a tendência em promover refinamentos nas Escalas Wechsler de Inteligência que venham possibilitar a avaliação cognitiva em maior proximidade com as teorias psicométricas atuais e incrementar a utilidade clínica, particularmente no contexto da avaliação neuropsicológica. Inúmeros estudos empíricos têm sido realizados no cenário internacional com o intuito de investigar a adequação de tais mudanças em favor da avaliação e compreensão do funcionamento intelectual por meio desse instrumento – por exemplo: Theiling e Petermann (2014) investigaram perfis neuropsicológicos de adultos com e sem TDAH; Donders e Strong (2015) analisaram a utilidade clínica do WAIS-IV após traumatismo crânio-encefálico. Quando estiver disponível no cenário brasileiro, o instrumento exigirá que os profissionais habituados com a terceira edição se atualizem e se capacitem na aplicação, correção e interpretação dos escores produzidos, para que possam se beneficiar de tais refinamentos do WAIS-IV.

 

Referências

Banhato, E. F. C. (2005). Avaliação das funções executivas em uma amostra de idosos da comunidade de Juiz de Fora/MG (Dissertação de mestrado não publicada, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte/MG).         [ Links ]

Benson, N., Hulac, D. M., & Kranzler, J. H. (2010). Independent examination of the Wechsler Adult Intelligence Scale-Fourth Edition (WAIS-IV): what does the WAIS-IV measure? Psychological Assessment, 22(1), 121-130.         [ Links ]

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Figueiredo, V. L. M., & Nascimento, E. (2007). Desempenhos nas duas tarefas do subteste Dígitos do WISC-III e do WAIS-III. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 23(3), 313-318.         [ Links ]

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Wechsler, D. (2013). Escala Wechsler de inteligência para crianças: WISC-IV. Manual técnico. Tradução do manual original. São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

 

 

recebido em fevereiro de 2015
reformulado em julho de 2015
aprovado em julho de 2015

 

 

Sobre os autores

Vera Lúcia Marques de Figueiredo: é psicóloga graduada pela Universidade Católica de Pelotas (UCPel), pós-graduada no mestrado em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e no doutorado em Psicologia da Universidade de Brasília. Atua como docente de graduação e de pós-graduação na UCPel desde 1980.
Francisco Antonio Soto Vidal: é psicólogo graduado pela Universidad de Chile e mestre em Saúde e Comportamento pela Universidade Católica de Pelotas.
Elizabeth do Nascimento: é psicóloga, doutora em Psicologia pela Universidade de Brasília, professora associada do curso de graduação em Psicologia e do Programa de Pós-graduação em Psicologia do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), membro do Laboratório de Avaliação das Diferenças Individuais (LADI) do Departamento de Psicologia/UFMG e bolsista produtividade do CNPq.


1Endereço para correspondência: R. XV de Novembro, 457, apto 704, 96015-000, Pelotas-RS. Tel.: (53) 3225-0273. E-mail: verafig@terra.com.br


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