Instrumentos de autorrelato estão associados a diferentes benefícios para o processo de coleta e análise dados, tais como facilidade de aplicação, correção e manejo. Todavia, os escores dos testes nesse formato podem sofrer a influência de vieses de resposta. Vieses de resposta são uma tendência dos indivíduos ao responderem instrumentos de maneira distorcida, sendo por circunstâncias intrapessoais ou situacionais (vide Ziegler, 2015). Dentre as diferentes respostas fornecidas pelos participantes em pesquisas de autorrelato, especialmente aquelas coletadas por meios virtuais, realizadas de forma assíncrona, em que se pressupõe menor controle e possibilidades de orientações aos respondentes em comparação à recolha dos dados realizadas no formato presencial, dois tipos podem ser delineados como respostas randômicas e/ou manipuladas: as respostas descuidadas e as respostas propositalmente falseadas (Kam & Meyer, 2015; Meade & Craig, 2012; Nichols et al., 1989).
No que tange o primeiro, foco deste estudo, respondentes fazem uso das escalas de resposta de maneira randômica, selecionando, por exemplo, o número 2 em uma escala Likert por diversas questões ou apresentando um padrão inconsistente (e.g., responder 1, 2, 3 e 4 repetidamente), desconsiderando sistematicamente o conteúdo do item; para o segundo tipo, as escolhas feitas pelos respondentes são deliberadamente alteradas para representarem respostas que estejam de acordo com regras e valores sociais ou para exacerbarem características psicopatológicas (e.g., desejabilidade social e malingering). Tais vieses impactam negativamente a mensuração de características psicológicas, portanto, buscar métodos de controle para ambas as situações pode minimizar a distorção que esses vieses produzem nas propriedades psicométricas dos escores dos instrumentos de medida (Goldammer et al., 2020; Rios et al., 2016), bem como melhorar decisões clínicas baseadas nos resultados desses instrumentos. Este estudo, por conseguinte, terá como enfoque as respostas descuidadas e suas consequências nas propriedades psicométricas dos instrumentos.
Muitas podem ser as causas que motivam respondentes a fazerem uso ou não de respostas descuidadas, existindo estudos que indicam até 20% da presença de respondentes que as emitem na amostra, em particular para instrumentos que possuem itens invertidos (e.g., “Não sou extrovertido”; Woods, 2006) ou quando a amostra coletada se refere a estudantes universitários (Meade & Craig, 2012). É possível assumir quatro características que afetam a presença dessas respostas, a saber, o interesse do respondente no processo avaliativo, o tamanho do protocolo de pesquisa, o contato social – sendo o aplicador um possível fator ansiogênico ou de autoridade ao respondente – e as distrações ambientais nos espaços de coleta de dados. Em resumo, participantes pouco interessados, pesquisas longas, qualificadas como fatigantes, realizadas de maneira online e em locais com maiores distratores tendem a apresentar uma maior proporção de respondentes descuidados (Bowling et al., 2020; Eisele et al., 2020; Gibson & Bowling, 2020; Meade & Craig, 2012). Além de afetarem o desempenho do participante ou seu resultado na testagem, respostas descuidadas prejudicam diretamente a dimensionalidade dos construtos avaliados.
Em um estudo de simulação, foi identificado que a presença de 30% de respondentes descuidados pode impactar negativamente os índices de ajuste em modelos fatoriais (Woods, 2006). Vale ressaltar que, para serem considerados adequados, tais índices de ajuste que avaliam a plausibilidade do modelo, como o Comparative Fit Index (CFI) e o Tucker-Lewis Index (TLI) devem apresentar resultados acima de 0,95 e, ao considerar o erro do modelo pelo Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA), é recomendado que os valores não ultrapassem 0,06 (Hu & Bentler, 1999; Marôco, 2014). No caso do estudo com protocolos que continham respostas descuidadas, na simulação de Woods (2006) com 250 participantes, os índices CFI e TLI verificou-se que foram reduzidos de 1,00 para 0,79 e 0,82, respectivamente, quando estão presentes 30% de respondentes descuidados; o mesmo ocorreu para o RMSEA, dado que este teve um aumento de 0,01 para 0,14, indicando erroneamente a adequação de um modelo de dois fatores ao invés de um, quando na verdade esse segundo fator consistia em um erro sistemático. Desse mesmo modo, pesquisas reforçam o impacto negativo que respostas descuidadas apresentam em diferentes contextos, além de demonstrarem a repercussão prejudicial em análises correlacionais (Eisele et al., 2020; Kam & Chan, 2018; Kam & Meyer, 2015). Para além das influências gerais e nas propriedades psicométricas, é possível também identificar a interferência das respostas descuidadas em contextos e com construtos específicos (e.g., qualidade de vida ou adicção – Godinho et al., 2015; Schneider et al., 2017), podendo ser assumida uma relação entre certas características individuais e o processo de responder randomicamente.
No que se refere às principais características de personalidade associadas a esse viés de resposta, estão a amabilidade e a conscienciosidade (e.g., Modelo dos Cinco Grandes Fatores), bem como traços de personalidade aversivos, a saber, a psicopatia, o maquiavelismo e a orientação à dominância social (McKay et al., 2018; Meade et al., 2017). Assim, esses traços sugerem para a relação entre indivíduos menos empáticos, menos organizados e mais interessados em suas próprias vantagens, com as respostas descuidadas. Uma vez que, tais respondentes se beneficiam por ganharem créditos acadêmicos ou recompensas monetárias, nicho esse que, diferente do que ocorre no Brasil, é exclusivo a países em que os participantes podem ser recompensados por responderem pesquisas. Ademais, não apenas traços de personalidade estão associados à presença de respostas descuidadas, outros fatores culturais também exercem influência nesse viés.
Destarte, para além do âmbito de personalidade e individual, características como nível educacional, emancipação do país, e influências culturais podem também ser preditores das respostas descuidadas (Grau et al., 2019). Apesar de não ter sido encontrada relação estatisticamente significativa entre o nível educacional quando comparados diferentes países, inclusive o Brasil, é possível inferir que a atribuição de significado do processo educacional em nível individual tenha diferentes compreensões (Grau et al., 2019). Por fim, para além da avaliação e compreensão desse viés, é possível controlá-lo fazendo uso de diferentes estratégias.
As ferramentas de controle para o viés de respostas descuidadas, podem ser estatísticas post hoc à coleta de dados ou executadas durante a coleta, por meio de técnicas virtuais (Meade & Craig, 2012; Ward & Meade, 2017; Ward & Pond III, 2015). Entre aquelas do primeiro tipo estão os bogus items (itens falsos), a distância de Mahalanobis, o padrão de resposta e os índices de consistência. De modo geral, estes visam a controlar a influência dos respondentes que apresentaram RDs, excluindo-se os seus protocolos ao final da coleta de dados (Meade & Craig, 2012). Entre os métodos de controle do segundo tipo, estão a presença de inteligências virtuais, coleta online simultânea entre aplicador-respondente e diferentes métodos de instrução (e.g., em vídeo, em texto etc.), consequentemente, estes visam ao maior engajamento do respondente durante o processo de coleta, tornando-o mais atento (Ward & Meade, 2017; Ward & Pond III, 2015). Todavia, pesquisas desse tipo realizados com falantes do português são incipientes, além de não haver estudos específicos na cultura brasileira relatando esse viés.
Considerando tais apontamentos, esta pesquisa teve como objetivo analisar a interferência do viés de respostas descuidadas (RDs) em três instrumentos de autorrelato aplicados em estudantes universitários brasileiros. A partir dos achados prévios na literatura, é possível ter como hipóteses que (a) a estrutura interna e os índices de confiabilidade dos instrumentos tenderão a ser distorcidos por participantes que respondem de maneira descuidada (Woods, 2006); (b) a correlação entre os instrumentos será impactada, tendendo a apresentar diminuição ou aumento de magnitudes por indivíduos que respondem de modo descuidado (Eisele et al., 2020; Kam & Chan, 2018; Kam & Meyer, 2015). No geral, estima-se que o viés de resposta distorcerá as propriedades psicométricas dos escores dos instrumentos.
Nessa perspectiva, esperava-se encontrar correlações estatisticamente significativas e de magnitude moderada entre os fatores da Medida de Empatia Afetiva e Cognitiva (ACME; Ellis et al., 2021) que avalia a empatia e os fatores do Inventário de Competências Emocionais – Versão Reduzida [ICE-R; Bueno et al., 2021], que afere a inteligência emocional (Figueroa & Funes, 2018; Pinto, 2019). Para as correlações entre o ICE-R (Bueno et al., 2021) e a ACME (Ellis et al., 2021), levando-se em conta os fatores da Escala de Avaliação da Motivação para a Aprendizagem – Universitários (EMAPRE-U; Zenorini & Santos, 2010), que aquilatam as metas de realização, a hipótese era identificar correlação de sentido positivo e de moderada magnitude entre a meta aprender, a inteligência emocional e a empatia; correlação de direção positiva e de baixa magnitude entre a meta performance-aproximação e a inteligência emocional; correlações de sentido negativo e de fraca magnitude entre as metas performance-aproximação e evitação com a inteligência emocional e a empatia (Bardach et al., 2020; Costa, 2020).
Método
Participantes
A amostra geral, que englobava participantes que emitiram RDs foi composta de 212 estudantes universitários de Instituição do ensino superior (IES) particulares (n=113) e públicas (n=99). A pesquisa contemplou participantes matriculados em IES das cinco regiões brasileiras – Sudeste (n=129), Sul (n=47), Centro-Oeste e Nordeste (n=14 cada) e Norte (n=8). A média de idade dos estudantes foi de 23,75 anos (DP=5,85), com prevalência do sexo feminino (n=180) correspondente à 84,9% da composição amostral. Com base na amostra geral, nomeada neste estudo de Grupo A, foram excluídos somente os participantes que apresentaram RDs. Essa amostra, denominada de Grupo B, passou a contar com 169 estudantes universitários, sendo 148 do sexo feminino (87,57%). Posteriormente, para identificar o possível efeito da redução de participantes, foram realizadas novas análises, cuja amostra foi composta por pessoas que cometeram ou não esse viés de resposta (Grupo C). Esse grupo contou com 169 estudantes, sendo que 142 pessoas eram do sexo feminino (84%).
Instrumentos
Escala de Avaliação da Motivação para a Aprendizagem – Universitários (EMAPRE-U; Zenorini & Santos, 2010). A EMAPRE-U avalia a motivação para aprendizagem de estudantes do ensino superior na perspectiva das metas de realização pessoais. A escala possui 28 itens divididos em três fatores, sendo que cada uma delas representa uma meta de realização no modelo 1 x 2 – Fator Meta Aprender (MA), Fator Meta Performance-Aproximação (MPA) e Fator Meta Performance-Evitação (MPE). A chave de resposta corresponde as três opções: 1, “Discordo”, 2, “Não sei” e 3, “Concordo”. A EMAPRE-U possui evidência de validade baseada na estrutura interna e estimativas de fidedignidade em amostras de estudantes universitários coletadas de forma presencial (Santos et al., 2013) e remota (Ferraz et al., 2020).
Inventário de Competências Emocionais – Versão Reduzida (ICE-R; Bueno et al., 2021). O ICE-R mensura a inteligência emocional, com foco para os aspectos emocionais. O inventário possui 34 itens distribuídos em cinco fatores, a saber, Fator Regulação de Emoções em Outras Pessoas (REOP), Fator Regulação de Emoções de Baixa Potência (REBP), Fator Expressividade Emocional (EE), Fator Percepção de Emoções (PE) e Fator Regulação de Emoções de Alta Potência (REAP). A chave de resposta é Likert, variando de 1. “Discordo totalmente” até 5. “Concordo totalmente”. O ICE-R possui evidência de validade baseada na estrutura interna e estimativas adequadas de fidedignidade avaliada em amostras de estudantes universitários e pessoas com formação de nível superior.
Medida de Empatia Afetiva e Cognitiva (ACME; Vachon & Lynam, 2016; adaptado ao português brasileiro por Ellis et al., 2021). A ACME afere a empatia no âmbito afetivo e cognitivo. Essa medida possui 36 itens divididos em três fatores – Fator Empatia Cognitiva, Fator Ressonância Afetiva e Fator Dissonância Afetiva. A chave de resposta é Likert – 1. “Discordo totalmente” a 5. “Concordo totalmente”. A ACME possui evidência de validade de conteúdo, evidência de validade baseada na estrutura interna e estimativas de fidedignidade avaliadas em amostra de pessoas adultas.
Procedimento de Coleta de Dados
O projeto de pesquisa que derivou este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Francisco (Parecer de aprovação nº 4.098.394). A coleta de dados ocorreu de forma remota/ online. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e os instrumentos foram disponibilizados aos estudantes por meio do Formulários Google. O link de acesso à pesquisa foi divulgado por professores da graduação provenientes da rede de contato dos autores deste estudo, bem como compartilhada na rede social Facebook (snowball sampling). Os instrumentos foram aplicados na seguinte ordem: EMAPRE-U, ICE-R e ACME. Para identificar os protocolos com respostas descuidadas, utilizou-se o método bogus items. Esse procedimento consistiu em inserir um item falso no meio da aplicação de cada instrumento, totalizando a inserção de três bogus items. Os itens falsos consistiam nas seguintes afirmativas “Por favor, selecione ‘Discordo’ para este item” ou “Por favor, selecione ‘Concordo Totalmente’ para este item”. Para a análise de dados, considerou-se os protocolos em que o participante assinalou pelo menos uma resposta descuidada.
Procedimento de Análise de Dados
Softwares utilizados. Software Statistical Package for Social Sciences (SPSS; V. 25.0); Jasp (Goss-Sampson, 2020).
Composição da amostra sem RDs (Grupo B). Excluíramse 43 participantes que cometeram respostas descuidadas ao responderem o protocolo de pesquisa (N = 169).
Composição da amostra quantitativamente equivalente à amostra isenta de RDs (Grupo C). No SPSS foram excluídos aleatoriamente 43 participantes que não haviam cometido RDs.
Aplicação de análises descritivas para a caracterização amostral. Investigação da estrutura interna dos instrumentos por meio da análise fatorial confirmatória aplicada nas amostras com (Grupo A) e sem RDs (Grupo B), bem como para a amostra reduzida (quantitativamente equivalente à amostra sem RDs, N=169 – Grupo C).
Estrutura interna dos instrumentos. Utilização da análise fatorial confirmatória com estimador Diagonal Weighted Least Squares. Índices de plausibilidade dos modelos: razão de χ2/gl<0,05; Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA) <0,10 com Intervalo de Confiança (IC) de 90%, Confirmatory Fit Index (CFI) e Tucker-Lewis Index (TLI), valores entre ≥0,90 (Hu & Bentler, 1999; Marôco, 2014).
Consistência interna dos instrumentos nas três configurações da amostra. Foram considerados os coeficientes alfa (α) e ômega de McDonald (ω total), com valor igual ou superior à 0,70 qualificado como adequado (Dunn et al., 2014).
Correlação entre os fatores dos instrumentos nas três configurações da amostra. Visto que a amostra é composta por um número superior de estudantes do sexo feminino, aplicou-se a correlação parcial com controle da variável Sexo para avaliar as relações existentes entre os fatores dos instrumentos. Referencial de interpretação da magnitude das correlações parciais: r≤0,29, fraca; ≅0,30 e 0,69, moderada; r≥0,70, forte (Dancey & Reidy, 2013).
Resultados
A Tabela 1 exibe os índices de estrutura interna da EMAPRE, do ICE-R e da ACME, assim como de confiabilidade dos seus fatores avaliada nas amostras com e sem a emissão de respostas descuidadas (RDs). Ao confrontar as duas amostras, tanto na EMAPRE-U como na ACME nota-se uma diminuição nos valores da razão de χ2/gl e de RMSEA e o aumento nos índices de ajuste CFI e TLI, o que confere uma melhora na plausibilidade de ambos os modelos. Nesse sentido, no ICE-R se observa apenas a redução no valor da razão de χ2/gl, associada a melhorias na adequação do modelo, visto que houve um aumento no valor de RMSEA e uma diminuição nos índices de ajuste CFI e TLI.
EMAPRE-U com RDs (Grupo A) | EMAPRE-U sem RDs (Grupo B) | EMAPRE-U: amostra reduzida contendo RDs (Grupo C) | |||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
χ2/gl 1,42 |
RMSEA (IC 90%) 0,045 (0,035 – 0,054) |
CFI 0,961 |
TLI 0,958 |
χ2/gl 1,35 |
RMSEA (IC 90%) 0,042 (0,031 – 0,051) |
CFI 0,968 |
TLI 0,965 |
χ2/gl 1,28 |
RMSEA (IC 90%) 0,041 (0,028 – 0,051) |
CFI 0,965 |
TLI 0,961 |
Confiabilidade | α | ω | Confiabilidade | α | ω | Confiabilidade | α | ω | |||
MA | 0,785 | 0,793 | MA | 0,793 | 0,801 | MA | 0,778 | 0,785 | |||
MPA | 0,812 | 0,822 | MPA | 0,812 | 0,822 | MPA | 0,816 | 0,826 | |||
MPE | 0,892 | 0,893 | MPE | 0,893 | 0,895 | MPE | 0,884 | 0,883 |
ICE-R com RDs (Grupo A) | ICE-R sem RDs (Grupo B) | ICE-R: amostra reduzida contendo RDs (Grupo C) | |||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
χ2/gl 2,24 |
RMSEA (IC 90%) 0,076 (0,071 – 0,082) |
CFI 0,773 |
TLI 0,754 |
χ2/gl 2,11 |
RMSEA (IC 90%) 0,081 (0,074 – 0,088) |
CFI 0,760 |
TLI 0,740 |
χ2/gl 1,61 |
RMSEA (IC 90%) 0,031 (0,017 – 0,042) |
CFI 0,98 |
TLI 0,978 |
Confiabilidade | α | ω | Confiabilidade | α | ω | Confiabilidade | α | ω | |||
REOP | 0,875 | 0,878 | REOP | 0,876 | 0,878 | REOP | 0,868 | 0,869 | |||
REBP | 0,878 | 0,883 | REBP | 0,879 | 0,884 | REBP | 0,712 | 0,806 | |||
EE | 0,752 | 0,755 | EE | 0,755 | 0,758 | EE | -0,155 | 0,399 | |||
PE | 0,696 | 0,702 | PE | 0,700 | 0,706 | PE | 0,643 | 0,654 | |||
REAP | 0,698 | 0,705 | REAP | 0,705 | 0,713 | REAP | 0,629 | 0,636 |
ACME com RDs (Grupo A) | ACME sem RDs (Grupo B) | ACME: amostra reduzida contendo RDs (Grupo C) | |||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
χ2/gl 2,03 |
RMSEA (IC 90%) 0,070 (0,064 – 0,075) |
CFI 0,767 |
TLI 0,751 |
χ2/gl 1,70 |
RMSEA (IC 90%) 0,064 (0,058 – 0,074) |
CFI 0,808 |
TLI 0,798 |
χ2/gl 0,93 |
RMSEA (IC 90%) 0,001 (0,001 – 0,012) |
CFI 1,000 |
TLI 1,012 |
Confiabilidade | α | ω | Confiabilidade | α | ω | Confiabilidade | α | ω | |||
EC | 0,897 | 0,899 | EC | 0,865 | 0,874 | EC | 0,878 | 0,883 | |||
RA | 0,800 | 0,804 | RA | 0,780 | 0,785 | RA | 0,783 | 0,782 | |||
DA | 0,849 | 0,852 | DA | 0,859 | 0,861 | DA | 0,847 | 0,850 |
Nota. MA=Fator Meta Aprender; MPA=Fator Meta Performance-Aproximação; MPE=Fator Meta Performance-Evitação – fatores da Escala de Avaliação da Motivação para Aprendizagem – Universitários; REOP=Fator Regulação de Emoções em Outras Pessoas; REBP=Fator Regulação de Emoções de Baixa Potência; EE=Fator Expressividade Emocional; PE=Fator Percepção de Emoções; REAP=Fator Regulação de Emoções de Alta Potência – fatores do Inventário de Competências Emocionais; EC=Fator Empatia Cognitiva; RA=Fator Ressonância Afetiva; DA=Fator Dissonância Afetiva – fatores da Medida de Empatia Afetiva e Cognitiva
Ao contrastar a amostra sem RDs com a amostra quantitativamente equivalente contendo esse viés de resposta (Grupo B e Grupo C), a Tabela 1 mostra que, na EMAPRE-E e na ACME, houve uma diminuição nos valores dos parâmetros de plausibilidade do modelo – com exceção do RMSEA, que permaneceu estável na EMAPRE-U. No ICE-R, houve um aumento em todos os índices de ajuste e uma diminuição na razão de χ2/gl.
Quanto à confiabilidade dos escores dos instrumentos, a Tabela 1 mostra que houve oscilações nos coeficientes α e ω total quando se compara as amostras com e sem RDs (Grupos A e B). Constatou-se um aumento no α da amostra sem RDs em dois fatores da EMAPRE-U, em todos os fatores do ICE-R e em um fator da ACME. O aumento do ω total na amostra sem o referido viés de resposta englobou dois fatores da EMAPRE-U, quatro fatores do ICE-R e um fator da ACME. Em especial ao aumento desses valores, destaca-se o fator Dissonância Afetiva da ACME que teve um aumento de 0,01 no α e de 0,009 no ω total. A diminuição dos coeficientes α e ω total foi verificada em dois fatores do ICE-R. Dentre os fatores dos instrumentos que apresentaram uma redução nos valores de confiabilidade das suas pontuações na amostra sem RDs se destaca o fator Ressonância Afetiva do ICE-R, com diminuição do α em 0,02.
Relativo à comparação entre os valores da amostra sem RDs e da amostra reduzida contendo esse viés de resposta (Grupos B e C), a Tabela 1 também expõe um aumento nos coeficientes de confiabilidade α e ω total no Fator da Meta Performance-Aproximação da EMAPRE-U, em todos os fatores do ICE-R – com exceção do Fator Regulação de Emoções em Outras Pessoas, nos fatores da ACME Dissonância Afetiva e Ressonância Afetiva, sendo que este último se verificou o aumento no ω total. Os demais fatores dos instrumentos tiveram uma diminuição em ambos os índices de confiabilidade.
No que diz respeito às correlações entre os instrumentos, na Tabela 2, levando-se em consideração os índices que apresentaram significância estatística, observa-se que houve um maior índice de aumento do que de diminuição nos valores ao comparar os resultados das amostras com e sem RDs (Grupos A e B). Esse aumento foi de, no máximo, 0,073, identificado na correlação entre o fator da EMAPRE-U Meta Performance-Evitação com o Fator do ICE-R Regulação de Emoções de Alta Potência (rcomDRs=-0,167; p<0,05; rsemRDs=-0,240; p<0,01); e, no mínimo, de 0,003, nas associações entre os fatores Dissonância Afetiva (ACME) e Regulação de Emoções de Alta Potência (ICE-R) – rcomDRs=0,282; p<0,05; rsemRDs=0,285; p<0,01. A diminuição dos valores das correlações foi de, no máximo, 0,053, verificada nas relações entre os fatores Regulação de Emoções de Alta Potência (ICE-R) e Ressonância Afetiva (ACME) – rcomDRs=0,311; p<0,001; rsemRDs=0,258; p<0,001; e, no mínimo, de 0,002, entre o fator da EMAPRE-U Meta Aprender e o fator do ICE-R Regulação de Emoções de Baixa Potência – rcomDRs=0,364; p<0,001; rsemRDs=0,362; p<0,001.
Presença das RDs (N=212) (Grupo A) | |||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 | 7 | 8 | 9 | 10 | 11 | |
1. MA | - | ||||||||||
2. MPA | -0,015 | - | |||||||||
3. MPE | -0,447*** | 0,054 | - | ||||||||
4. EC | 0,232** | -0,026 | -0,110 | - | |||||||
5. RA | 0,155* | -0,189** | -0,062 | 0,249*** | - | ||||||
6. DA | 0,194** | -0,296*** | -0,123 | 0,087 | 0,641*** | - | |||||
7. REOP | 0,371*** | -0,068 | -0,167* | 0,497*** | 0,386*** | 0,171* | - | ||||
8. REBP | 0,364*** | -0,062 | -0,284*** | 0,272*** | 0,056 | 0,094 | 0,367*** | - | |||
9. EE | 0,121 | -0,060 | -0,333*** | 0,148* | 0,178** | 0,193** | 0,129 | 0,154* | - | ||
10. PE | 0,205** | 0,057 | -0,119 | 0,451*** | 0,125 | 0,091 | 0,438*** | 0,499*** | 0,098 | - | |
11. REAP | 0,238*** | -0,074 | -0,082 | 0,351*** | 0,311*** | 0,282*** | 0,489*** | 0,546*** | -0,012 | 0,407*** | - |
Exclusão das RDs (N=169) (Grupo B) | |||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 | 7 | 8 | 9 | 10 | 11 | |
1. MA | - | ||||||||||
2. MPA | -0,051 | - | |||||||||
3. MPE | -0,511*** | 0,123 | - | ||||||||
4. EC | 0,249** | -0,054 | -0,160* | - | |||||||
5. RA | 0,198* | -0,215** | -0,097 | 0,261** | - | ||||||
6. DA | 0,201** | -0,317*** | -0,134 | 0,078 | 0,663*** | - | |||||
7. REOP | 0,403*** | -0,095 | -0,240** | 0,490*** | 0,390*** | 0,168* | - | ||||
8. REBP | 0,362*** | 0,038 | -0,332*** | 0,254** | 0,053 | 0,092 | 0,321*** | - | |||
9. EE | 0,161* | -0,091 | -0,328*** | 0,203** | 0,189* | 0,193* | 0,107 | 0,140 | - | ||
10. PE | 0,275*** | 0,042 | -0,139 | 0,423*** | 0,088 | 0,100 | 0,461*** | 0,504*** | 0,122 | - | |
11. REAP | 0,259** | -0,057 | -0,116 | 0,368*** | 0,258*** | 0,285*** | 0,485*** | 0,568*** | -0,026 | 0,450*** | - |
Exclusão de 46 sujeitos que não cometeram RDs (N=169) (Grupo C) | |||||||||||
1 | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 | 7 | 8 | 9 | 10 | 11 | |
1. MA | - | ||||||||||
2. MPA | 0,019 | - | |||||||||
3. MPE | -0,415*** | 0,033 | - | ||||||||
4. EC | 0,182* | 0,20 | -0,089 | - | |||||||
5. RA | 0,087 | -0,165* | 0,002 | 0,242** | - | ||||||
6. DA | 0,172* | -0,247*** | -0,069 | 0,065 | 0,608*** | - | |||||
7. REOP | 0,316*** | -0,096 | -0,134 | 0,454*** | 0,391*** | 0,144 | - | ||||
8. REBP | 0,373*** | 0,063 | -0,363*** | 0,188* | 0,034 | 0,070 | 0,313*** | - | |||
9. EE | 0,102 | -0,025 | -0,337*** | 0,164* | 0,205** | 0,225** | 0,104 | 0,191* | - | ||
10. PE | 0,245*** | 0,099 | -0,181* | 0,432*** | 0,175* | 0,100 | 0,408*** | 0,436*** | 0,120 | - | |
11. REAP | 0,196** | -0,004 | -0,106 | 0,239** | 0,272*** | 0,223** | 0,438*** | 0,480*** | -0,038 | 0,312*** | - |
Nota. MA=Fator Meta Aprender; MPA=Fator Meta Performance-Aproximação; MPE=Fator Meta Performance-Evitação – fatores da Escala de Avaliação da Motivação para Aprendizagem - Universitários; REOP=Fator Regulação de Emoções em Outras Pessoas; REBP=Fator Regulação de Emoções de Baixa Potência; EE=Fator Expressividade Emocional; PE=Fator Percepção de Emoções; REAP=Fator Regulação de Emoções de Alta Potência – fatores do Inventário de Competências Emocionais; EC=Fator Empatia Cognitiva; RA=Fator Ressonância Afetiva; DA=Fator Dissonância Afetiva – fatores da Medida de Empatia Afetiva e Cognitiva.Nota. Índices de correlação parcial em negrito estatisticamente significativas em nível. ***p<0,001; **p<0,01; *p<0,05
Tanto na amostra com RDs como na amostra sem RDs identificaram-se correlações entre os fatores dos instrumentos classificadas como fraca a moderada magnitude. Ao confrontar os resultados das correlações parciais, a Tabela 2 mostra que correlações de fraca magnitude na amostra com RDs passaram a ser de forte magnitude na amostra sem RDs—associação entre os Fatores Meta Performance-Aproximação (EMAPRE-U) e Dissonância Afetiva (ACME), rcomDRs=-0,296; p<0,001; rsemRDs=-0,317; p<0,001; e entre os fatores Regulação de Emoções de Baixa Potência (ICE-R) e Meta Performance-Evitação (EMAPRE-U), rcomDRs=-0,284; p<0,001; rsemRDs=-0,332; p<0,001. Por sua vez, a correlação de moderada magnitude entre os fatores Ressonância Afetiva (ACME) e Regulação de Emoções de Alta Potência (ICE-R) na amostra com RDs (r=0,311; p<0,001) passou a ser de fraca magnitude na amostra sem RDs (r=0,258; p<0,001).
Ao correlacionar os fatores dos instrumentos aplicados na amostra com RDs também ocorreram casos de correlações parciais que não apresentaram significância estatística passarem a ser estatisticamente significativas após a exclusão dos participantes que emitiram esse viés de resposta. Isso ocorreu nas correlações entre os fatores Meta Aprender (EMAPRE-U) e Expressividade Emocional (ICE-R) – rcomDRs=0,121; p=0,08; rsemRDs=0,161; p<0,05, e entre os fatores Meta Performance-Evitação e Empatia Cognitiva (ACME) – rcomDRs=-0,110; p=0,10; rsemRDs=-0,160; p<0,05. Situação oposta foi identificada nas correlações entre os fatores do ICE-R Regulação de Emoções de Baixa Potência e Expressividade Emocional, que apresentou significância estatística na amostra com RDs (r=0,154; p<0,05) e passou a não ser estatisticamente significativa na amostra sem RDs (r=0,140; p=0,07).
Verificou-se, ainda, a alteração dos valores de p, que dizem respeito ao nível da significância estatística das correlações parciais apresentadas nas amostras com e sem RDs. Nesse sentido, houve maior ocorrência de diminuição do valor de p. O p<0,001 na amostra com RDs passou a ser de p<0,01 na amostra sem esse viés de resposta nas correlações parciais entre os fatores Meta Aprender (EMAPRE-U) e Regulação de Emoções de Alta Potência (ICE-R), e entre o Fator Empatia Cognitiva (ACME) com os fatores Ressonância Afetiva e Regulação de Emoções de Baixa Potência (ICE-R). O p<0,01 passou a ser p<0,05 nas correlações entre o Fator do ICE-R Expressividade Emocional com os fatores da ACME Ressonância Afetiva e Dissonância Afetiva. Quanto ao aumento do valor de p, verificou-se que as correlações parciais entre os fatores Meta Aprender (EMAPRE-U) e Percepção de Emoções (ICE-R) passou de p<0,01 na amostra com RDs para p<0,001 na amostra sem RDs. O p<0,05 na amostra com RDs passou para p<0,01 na amostra sem esse viés de resposta nas correlações entre o Fator Meta Performance-Evitação (EMAPRE-U) e Regulação de Emoções em Outras Pessoas, bem como entre os fatores Empatia Cognitiva (ACME) e Expressividade Emocional (ICE-R).
A Tabela 2 também apresenta os valores das correlações parciais entre os fatores da EMAPRE-U, ACME e ICE-R considerando a amostra reduzida formada por estudantes que não haviam cometido o viés de respostas descuidadas (Grupo B), equiparando, assim, com o número de sujeitos na amostra em que foram verificadas as RDs (N=169; Grupo C). Levando-se em conta ambas as amostras, 61,76% das correlações parciais estatisticamente significativas entre os fatores dos instrumentos tiveram um decréscimo nos valores e um acréscimo dos coeficientes de 20,59%. Deixaram de apresentar correlações parciais estatisticamente significativas o fator Meta Aprender da EMAPRE-U e os fatores da ICE-R Ressonância Afetiva e Expressividade Emocional; entre o Fator Regulação de Emoções em Outras Pessoas (ICE-R) e os fatores Meta Performance-Evitação (EMAPRE-U) e Dissonância Afetiva (ACME). Passaram a apresentar correlações estatisticamente significativas o Fator Percepção das Emoções (ICE-R) e os fatores Meta Performance-Evitação (EMAPRE-U) e Ressonância Afetiva (ACME); e entre os fatores do ICE-R Regulação de Emoções de Baixa Potência e Expressividade Emocional.
Discussão
O presente estudo objetivou analisar a interferência do viés de respostas descuidadas (RDs) em instrumentos de autorrelato que avaliam a motivação para aprendizagem, a inteligência emocional, e a empatia cognitiva e afetiva. Foram avaliados estudantes universitários, público amplamente utilizado como amostra de conveniência em pesquisas direcionadas em diferentes contextos da Psicologia (Grau et al., 2019). De modo geral, as hipóteses iniciais foram confirmadas ao indicar que a estrutura interna e os índices de confiabilidade dos instrumentos apresentaram diferenças quando se desconsiderou os protocolos com RDs. Conforme esperado, o coeficiente das correlações entre os instrumentos, na sua maioria, aumentou quando se excluíram os protocolos de respondentes descuidados. Os resultados indicaram que a desatenção e/ou os descuidos dos participantes impactam negativamente as propriedades psicométricas dos instrumentos, bem como as correlações entre medidas que avaliam construtos relacionados.
Os índices de χ2/gl, RMSEA, CFI e TLI das escalas EMAPRE, do ICE-R e da ACME ficaram dentro do limite aceitável (Hu & Bentler, 1999; Marôco, 2014), conforme esperado a exclusão dos protocolos com RDs alteram os resultados obtidos pelos estimadores de estrutura interna dos instrumentos e, consequentemente, tornam as propriedades psicométricas mais condizentes com o contexto e público avaliado (Woods, 2006). A razão de χ2/gl, índice que avalia a magnitude da discrepância entre a matriz de covariância observada e a modelada, quando comparados com o grupo de protocolos sem RDs diminuíram os valores, indicando melhor ajuste dos dados para o modelo teórico das escalas. Observou-se o mesmo no RMSEA, quando se considerou apenas o grupo sem RDs, a raiz da média dos quadrados dos erros de aproximação apresentou uma leve diminuição. Cabe considerar que o tamanho amostral interfere no valor do RMSEA. No estudo de simulação realizado por Woods (2006), o autor identificou que, quanto maior o número de participantes que apresentam RDs, maior é o impacto na média de erros, isto pode ser confirmado a partir dos índices de ajuste obtidos para a amostra reduzida contendo indivíduos que cometeram RDs (Grupo C) quando comparados com as análises do grupo sem RDs (Grupo B).
Os índices de CFI e TLI, por sua vez, apresentaram poucas mudanças em relação ao ajuste do modelo observado – sem RDs (Grupo B), ao compará-los com um modelo de base – com RDs (Grupo C). Esses resultados corroboram os achados de Kam e Chan (2018) e Kam e Meyer (2015) que identificaram que excluir participantes que cometem RDs impactam positivamente os índices de ajuste dos instrumentos. Assim sendo, considera-se que a identificação e exclusão de indivíduos que respondem as pesquisas de modo descuidado é uma prática recomendável. Os diferentes métodos utilizados para se identificar protocolos com RDs, dentre eles o bogus items procedimento utilizado nesta pesquisa, apresentam evidências de serem capaz de diminuir a variância do erro e aumentar o poder estatístico em pesquisas que utilizam instrumentos de autorrelato, o que contribui para a aproximação do parâmetro populacional, considerando o recorte amostral, neste caso, de estudantes universitários (Maniaci & Rogge, 2014). Ainda em relação à melhoria na estrutura interna das escalas pondera-se que, neste estudo, o ICE-R não apresentou melhora em alguns índices de ajuste ao retirar os indivíduos que respondem de modo descuidado. Ressalta-se que, por um lado, o RMSEA tende a penalizar modelos mais complexos (Taasoobshirazi & Wang, 2016), nesse caso, os cinco fatores que compõem a escala de inteligência emocional são altamente relacionados e tornam mais difíceis o ajuste de um modelo, o que justifica a diminuição do TLI e CFI. Por outro lado, a ACME – foi o instrumento que apresentou maiores diferenças entre os índices de ajustes estimados com e sem a correção das RDs. Estes achados podem estar associados as características dos construtos (e.g., inteligência emocional e empatia), de modo que, o conteúdo de alguns itens podem despertar diferentes emoções no participante que consequentemente estará mais engajado para responder de maneira mais atenta. Todavia, essa hipótese necessita de novas investigações que avaliem a presença de RDs em diferentes instrumentos psicológicos.
No que tange a consistência interna das escalas, os valores dos coeficientes alfa e ômega demonstraram ser adequados para os três grupos, universitários que apresentaram as RDs – amostra geral (n=212; Grupo A), grupo sem os indivíduos que emitiram esse viés de resposta (n=169; Grupo B) e para o grupo reduzido com participantes que apresentaram descuidos ao responder a pesquisa (n=169; Grupo C). Observou-se que houve uma pequena melhora dos coeficientes entre os grupos, demonstrando que os participantes que respondem a um bogus items corretamente tendem a ser mais atentos nas respostas dos demais itens (Kam & Chan, 2018; Woods, 2006). Em contrapartida, participantes que respondem os itens aleatoriamente apresentam maior probabilidade de enfraquecer as correlações entre médias que avaliam construtos relacionados. Portanto, enfatiza-se novamente que o controle das RDs tende a proporcionar a obtenção de modelos mais condizentes com a manifestação dos construtos aqui abordados, nomeadamente o funcionamento da motivação na perspectiva das metas de realização expressas no contexto universitário, a inteligência emocional e a empatia.
De acordo com Kam e Meyer (2015) é difícil prever o efeito que as RDs podem causar nas correlações entre os instrumentos, uma vez que estas podem ser tanto infladas quanto diminuídas. Neste estudo, em consonância com outras pesquisas que também avaliaram esse viés de resposta (Eisele et al., 2020; Kam & Chan, 2018), observou-se que ao retirar os protocolos de respondentes descuidados, além de diminuir os erros de mensuração, o nível de significância também apresentou valores menores e os coeficientes de correlação aumentaram. Os resultados também se mantiveram inflados ao serem excluídos 46 participantes que não cometeram RDs quando comparados com àqueles que cometeram, sinalizando assim a distorção que participantes descuidados podem causar nos resultados. A esse respeito, Rios et al. (2016) indicam que o p-valor tende a ser influenciado pelo tamanho amostral. Desse modo, ao controlar o viés das RDs se pressupõem que o aumento nos valores das correlações estaria mais próximo da realidade, justificando as oscilações nos resultados apresentados pelas amostras com e sem respondentes descuidados.
Em relação as escalas EMAPRE, ICE-R e ACME esperava-se correlações positivas e significativas, uma vez que a motivação para aprender, a inteligência emocional e a empatia cognitiva e afetiva recorrem a componentes cognitivos que vão favorecer a autorregulação emocional e contribuir no direcionamento de ações comportamentais adequadas ao contexto (Corso et al., 2013; Ioannidou & Konstantikaki, 2008). Destarte, a proposta de considerar o viés das RDs não impacta somente na significância estatística, mas também na relevância psicológica quando se leva em conta as associações entre construtos específicos do âmbito acadêmico (metas de realização) e aqueles que abarcam o funcionamento global da pessoa (inteligência emocional e empatia). Portanto, assume-se que os resultados das correlações entre estes construtos no Grupo B (amostra sem RDs) sejam mais precisos em comparação aos demais grupos aqui analisados, considerando não somente o p-valor, mas também a direção e a magnitude desses coeficientes. Destarte, verificou-se que os resultados corroboraram as hipóteses iniciais desta pesquisa, no que se refere à direção das correlações. Neste sentido, identificou-se a correspondência entre a orientação motivacional pela meta aprender, os segmentos da empatia e da inteligência emocional (Bardach et al., 2020; Costa, 2020; Figueroa & Funes, 2018; Pinto, 2019). Também se confirmou que a orientação pela meta performance-aproximação apresentou associações de direção negativa com o aspecto afetivo da empatia, cujas relações requerem maior investigação dado que este direcionamento foi verificado tanto no Fator Ressonância Afetiva como no Fator Dissonância Afetiva da ACME. Na orientação pela meta performance-evitação verificou-se menor habilidade na empatia cognitiva, ligada a uma possível incompreensão dos universitários guiados por esta meta acerca do que as pessoas sentem e vice-versa (Ellis et al., 2021).
Em suma os achados desta pesquisa sugerem que pessoas que respondem os protocolos de pesquisa sem levar em consideração o conteúdo do item podem alterar os resultados do estudo. Nesta pesquisa também se evidenciou que a emissão de RDs é identificada em respondentes brasileiros, sugerindo que esse viés de resposta independe da cultura, bem como o procedimento de coleta de dados envolver ou não algum tipo de remuneração pela participação no estudo. Nessa conformidade, levanta-se a hipótese de que os indivíduos de culturas coletivistas aderem as pesquisas que não os remuneram, no intuito, por exemplo, de ajudar o pesquisador, todavia, isso não garante maior atenção às respostas emitidas.
Nesse sentido, o controle das RDs é uma alternativa que viabiliza a condução de investigações em Psicologia e áreas afins a alcançarem resultados mais próximos da realidade analisada. Portanto, uma das práticas a serem implementadas na coleta de dados é a inserção de bogus items e o descarte de protocolos com RDs, visto que esse procedimento tende a contribuir para que os instrumentos apresentem medidas psicométricas mais confiáveis. Contudo, também se reconhece a existência de outros vieses de resposta que, juntamente com as RDs, é possível que interfiram na performance dos instrumentos de medida.
Como limitações se reconhece o número reduzido de participantes que, em estudos futuros, deve ser ampliado, bem como a não avaliação do conteúdo dos itens nos instrumentos utilizados. Uma vez que, itens com conteúdo situacional (e.g., “Eu fico empolgado(a) ao dar para alguém um presente que penso que irá gostar”) podem ser respondidos de maneira diferente quando comparados com itens com conteúdo autorreflexivo (e.g., “Sei como gerar em mim mesmo o sentimento apropriado para aquilo que tenho que fazer”). Além disso, recomenda-se a avaliação da atenção e proficiência em leitura para aprofundar a compreensão da emissão das RDs em diferentes contextos de aplicação da testagem. Ademais, existem outros métodos de controle das RDs que podem ser testados no Brasil, como, por exemplo, métodos post hoc (e.g., distância de Mahalanobis) ou por técnicas virtuais (e.g., instrução online simultânea). Bem como, realizar novos procedimentos estatísticos que avaliem o impacto de respondentes descuidados nas cargas fatoriais dos instrumentos.