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Psicologia Hospitalar
versión On-line ISSN 2175-3547
Psicol. hosp. (São Paulo) vol.7 no.2 São Paulo jun. 2009
ARTIGOS ORIGINAIS
Ultrassonografia bidimensional e tridimensional e o vínculo materno fetal: um estudo comparativo
Ultrasound two-and three-dimensional and maternal-fetal bonding: a comparative study
Melina Blanco AmarinsI,1; Gláucia Rosana Guerra BenuteI,2; Roseli Yamamoto Mieko NomuraII,3; Maria OkumuraII,4; Maria Livia Tourinho MorettoII,5; Mara Cristina Souza de LuciaI,6; Marcelo ZugaibIII,7
IDivisão de Psicologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
IIDivisão de Clínica Obstétrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
IIIFaculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
RESUMO
Este estudo busca descrever o relacionamento materno-fetal antes e após a realização da ultra-sonografia bidimensional (US2D) e tridimensional (US3D) e comparar o vínculo estabelecido após a realização dos exames. Foram entrevistadas antes e após a realização do US2D e US3D, 50 gestantes primigestas. Verificou-se que para 72% das gestantes, o exame, quer seja o US2D ou US3D aumenta o vínculo materno-fetal. Constatou-se que 90% das gestantes afirmaram ser melhor a visualização do feto no US3D. Observou-se que as gestantes que relatavam ter vínculos ambivalentes (16%US2D) ou negativos (24%US2D) alteraram este sentimento imediatamente após a visualização das imagens fetais no exame. Conclui-se que o exame de US favorece a criação do vínculo materno-fetal independentemente do tipo de US realizado.
Palavras-chave: Ultra-sonografia; Gestação; Vínculo; Feto.
ABSTRACT
This study aimed to describe the maternal-fetal attachment before and after obstetric bidimensional (US2D) and tridimensional (US3D) ultrasound and to compare the bond established following the exams performed. Fifty primigravidas were interviewed before and after US2D e US3D. The maternal-fetal attachment was improved after US2D o US3D (72%). Ninety percent of pregnant women expressed that the fetal image was better in the US3D than US2D. The women with ambivalent bond (16% US2D) or negative bond (24% US2D) changed this feeling immediately after perceive the fetal image at ultrasound exam. In conclusion, the ultrasound improves the maternal-fetal attachment independently of type of ultrasound performed.
Keywords: Ultrasonography; Pregnancy; Bond; Fetus; Attachment.
INTRODUÇÃO
A gestação e o puerpério são momentos privilegiados para compreender os momentos iniciais para a formação do vínculo mãe-bebê. É neste período que a mulher depara-se com inúmeras mudanças físicas e emocionais. A troca de papéis, as mudanças na rotina diária, as abdicações e preocupações e a atenção dedicada ao bebê são algumas das características deste período, que estão diretamente relacionadas à qualidade do vínculo que será formado entre a mãe e seu bebê. Para que seja possível uma troca afetiva favorável entre a díade, a mãe necessita estar apta a estabelecer este vínculo (Borsa & Dias, 2004).
Os nove meses gestacionais permitem, além do desenvolvimento do feto, a criação do bebê imaginário no psiquismo materno. Assim, a previsão da duração da gravidez, internalizada pela mãe, vai marcando o processo de crescimento do bebê dentro de si (Mathelin, 1999).
Neste processo de criação do bebê imaginário, os pais constroem a noção de individualidade do bebê, nomeando alguns de seus comportamentos e características temperamentais. Ademais, desde muito cedo os pais estabelecem um modo costumeiro de interação com o feto, por meio de informações, tais como, o gênero e a maneira de movimentar-se, e determinam a estruturação de um padrão de interação precoce, que tende a continuar após o nascimento.
Em estudo realizado por Borsa e Dias (2004), constatou-se a existência de uma relação materno-fetal bastante intensa, a qual é embasada, especialmente nos sentimentos ou expectativas da gestante sobre o bebê. Pensar no bebê antes do nascimento, imaginar suas características, traz implicações fundamentais para a construção da representação do bebê, da maternidade e para a posterior relação mãe-bebê.
Aragão (2001) reforça essa idéia, ressaltando que há dois momentos marcantes durante a gravidez: um deles é o que se desencadeia a partir da percepção da mãe sobre os movimentos do bebê, favorecendo fantasias sobre o desconhecido dentro de si. Tais movimentos permitem-lhe criar significações sobre ele, e por meio das interpretações realizadas pela gestante estabelece-se um modo de comunicação entre a mãe e o bebê. Outro momento importante é a descoberta sobre o sexo do bebê. Carregar um bebê já sexuado ao mesmo tempo em que fecha as possibilidades do jogo imaginário em torno do sexo orienta mais nitidamente as fantasias maternas em torno do filho ou da filha.
O corpo imaginado permite à futura mãe ter a dimensão que este bebê está inserido na mesma ordem humana da qual ela faz parte, sendo regido pelas mesmas leis que a governam. É essa representação do futuro bebê e dela própria como futura mãe que dará o impulso para, quando do nascimento, investir afetivamente e libidinizar aquele corpo que lhe é entregue (Aulagnier, 1990)
Neste sentido, pesquisas têm sido realizadas procurando compreender se o exame de ultra-sonografia facilitaria a criação do vínculo entre mãe e filho, uma vez que permite a visualização e o conhecimento do sexo fetal.
JI; Pretious et al; Newton; Uyan; Hull; Hollenbach; Nelson (2005) constataram uma redução da ansiedade dos pais com a realização da ultra-sonografia bidimensional (US2D). Constataram que a realização do exame permite o reconhecimento do feto, e que poder imaginá-lo e pensar melhor sobre este filho que vai chegar, estabelece uma maior aproximação dos pais com seu bebê.
A ultra-sonografia pode se constituir em um momento de emoções bastante intensas e importantes para a gestante e para a relação com o bebê. Milne & Rich (1981) observaram o comportamento das gestantes durante o exame ecográfico e revelaram que elas permaneceram muito atentas às imagens apresentadas na tela do aparelho. Suas expressões faciais foram de seriedade e concentração. O que acontecia no ambiente não era capaz de lhes chamar atenção, pois elas mantinham os olhos fixos nas imagens do feto.
O confronto do bebê imaginado com o bebê real ocorre imediatamente após o nascimento, mas com a evolução das técnicas diagnósticas, especialmente da ultra-sonografia, alguns aspectos concretos do bebê acabam sendo conhecidos ainda durante a gravidez, e esses dados podem tanto aproximar a relação, aprimorando as fantasias maternas, como também antecipar a vivência de frustrações. (Caron, 2000)
Tais frustrações podem ser desencadeadas, por exemplo, no conhecimento do sexo do bebê, pois conhecer o sexo do bebê antes do nascimento possibilita confrontar o ideal e o real, permitindo nomeá-lo e torná-lo menos desconhecido (Klaus & Kennel, 1992 e Szejer & Stewart, 1997). Para Szejer & Stewart (1997) uma das vantagens deste processo se dá quando os pais têm uma idéia formulada sobre o bebê, que não corresponde ao desejado, pois existe a possibilidade de elaboração do luto e o estabelecimento de nova relação.
O impacto das imagens do feto e do confronto entre o desejável e o real é diferente para cada mãe e o potencial de cada uma delas de lidar com estas expectativas e frustrações interferirá na relação que se estabelece com o bebê. Deste modo, torna-se ainda mais importante compreender a visão das gestantes sobre a ultra-sonografia e sobre suas implicações. (Gomes & Piccini, 2007)
Este estudo teve a finalidade de verificar a contribuição da imagem na construção do vínculo afetivo, descrever como a mulher se posiciona acerca da relação materno-fetal antes e após a realização da ultra-sonografia bidimensional e tridimensional e verificar se existe, para essas mulheres, diferenças quanto ao vínculo estabelecido com o feto dependendo do exame realizado (ultra-sonografia bidimensional e tridimensional)
MÉTODO
Foram convidadas a participar deste estudo 73 gestantes primigestas que se encontravam no Ambulatório de Hospital Universitário, aguardando para realizar pela primeira vez a ultra-sonografia bidimensional (US2D) e para as quais foram agendadas pela primeira vez, a ultra-sonografia tridimensional (US3D).
Foram considerados critérios de exclusão: receber diagnóstico de malformação fetal; já ter realizado alguma vez ultra-sonografia durante a gravidez e não retornar para realizar a US3D agendada. Foram excluídas do estudo 23 pacientes que não retornaram ao ambulatório para realizar o exame de US3D sendo, que deste modo, a amostra foi constituída por 50 gestantes.
Este estudo foi previamente aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa da Instituição. As mulheres que concordaram em participar assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
Para a coleta de dados foram realizadas quatro entrevistas semi-dirigidas sendo uma anterior e outra posterior a realização da US2D e uma anterior e posterior US3D.
O aparelho utilizado para a realização da ultra-sonografia bidimensional foi Voluson 730 PRO e tridimensional foi o Voluson 730 Pro, Marca GE.
O exame de ultra-sonografia foi realizado por uma única médica obstétrica com experiência nestes exames, tanto US2D quanto US3D. Durante o exame, a paciente foi posicionada numa maca e foi aplicado um gel de contato sobre a pele, onde foi aplicada a sonda ecográfica em "varrimentos" sucessivos.
Assim, trata-se de um procedimento totalmente inócuo, indolor, relativamente rápido, não invasivo. As imagens foram observadas em tempo real pelo monitor. O objetivo deste exame é avaliar detalhadamente a anatomia fetal (estrutura fetal, tanto interna como externa), com sensibilidade de aproximadamente 85% para defeitos fetais e cerca de 75% para doenças cromossômicas e também da idade gestacional, peso fetal e comprimento estimado.
A análise dos dados da entrevista semi-dirigida foi realizada através da técnica de Análise de Conteúdo. Esta técnica permite avaliação qualitativa e quantitativa dos resultados, possibilitando interpretar a comunicação de forma objetiva e sistemática do conteúdo manifesto nas entrevistas. É um instrumento que visa descrever, interpretar e compreender os dados (Bardin, 1979).
Os dados foram inseridos em um banco de dados construído em um programa estatístico (SPSS for Windows versão 16.0) e tratados por meio da estatística, descritiva com cálculos de percentuais, médias e freqüências. Para comparação entre os dois grupos foi utilizando o teste não-paramétrico U de Man-Whitney, sob a admissão de probabilidade de erro de 5%.
RESULTADOS
A amostra foi constituída por 50 gestantes, com idade média de 21,6 anos e média de 15,8 semanas gestacionais. A tabela 1 apresenta os resultados sobre a expectativa da realização da US2D; as crença sobre a possibilidade de alteração do sentimento nutrido pelo feto após a realização do US; e as diferenças encontradas na realização do US2D e US3D.
Quando indagadas sobre qual era a expectativa relacionada à realização do US2D, observou-se que 84% das gestantes desejavam saber sobre a saúde e o sexo do feto: "Quero ver o bebê, saber se está bem, se está formado, se não tem problema nenhum."
Investigou-se sobre a crença que a gestante tinha sobre a possibilidade de uma mulher alterar o sentimento nutrido pelo feto após a realização da ultra-sonografia. Seria possível que uma mulher que encontrava-se rejeitando o bebê passasse a aceitar esta gravidez após ter visto a imagem do feto na tela do ultra-som? Constatou-se que 72% das gestantes acreditavam que, após o exame, a mulher se aproximaria mais do bebê, criando um vínculo. Este fato pode ser representado pelo discurso:"Sim. Uma coisa é você não estar desejando e outra é ver o bebê se formando dentro de você, da uma mudada."
Depois de ter realizado os exames de US2D e US3D investigou-se sobre qual dos exames as mulheres preferiam estar realizando (US2D ou US3D). Observou-se que apenas 6% preferiu realizar a US2D, afirmando que conseguiram imaginar melhor como é o seu filho a partir da imagem e dos movimentos observados no exame de US2D: "Prefiro US2D porque vi o bebê se mexendo, me senti mais tranqüila que no 3D."
As demais gestantes (90%) elegeram a US3D como melhor afirmando que a imagem obtida permitiu conhecer o seu filho: "O US3D é melhor porque além de ver como o bebê está, dá pra ver os detalhes do corpinho dele."
As mulheres afirmaram que no US3D as cores e as formas físicas ficavam mais precisas. Ressaltaram ainda que no US2D só foi possível reconhecer as partes do corpo do feto a partir da descrição do médico: "No US3D consegui reconhecer as partes do corpo, sem a médica falar, diferente do US2D que precisei da ajuda dela."
Foi solicitado que as gestantes relatassem o que estavam sentindo pelo bebê antes e depois da realização dos exames de US2D e US3D. A tabela 2 apresenta os resultados.
Observou-se que antes da realização do US2D 16% das mulheres apresentavam sentimentos ambivalentes e 26% sentimentos negativos. Após a realização do exame todas as gestantes que apresentavam sentimentos ambivalentes e 24% das que relatavam sentimentos negativos passaram a relatar sentimentos positivos.
Com relação aos sentimentos vivenciados pelo feto antes e após a realização do US3D, observou-se que 8% das mulheres apresentaram sentimentos ambivalentes antes do exame. Após a US3D, todas as gestantes passaram a relatar sentimentos positivos.
O discurso que representa a categoria "positiva" diz respeito ao bem estar vivido na situação: "Meu coração disparou, me emocionei demais. Comecei a chora, quando vi meu bebê." (100%)
Já a situação vivida pelas mulheres que apresentaram respostas negativas, são exatamente opostas: "Fiquei muito ansiosa, passei muito mal, tive uma sensação ruim." (4%)
As respostas ambivalentes apresentaram uma mistura de bem estar e insatisfação: "Me sinto ansiosa, não sei o que é, talvez carinho. É tudo muito diferente." (16%)
Quando questionadas se as gestantes acreditavam que a realização do exame de ultra-sonografia havia alterado a relação com o bebê, aproximando-a ou afastando-a, constatou-se que 88% após a realização do US2D e 80% após o US3D afirmou ter aproximado ainda mais o contato com o filho gerado, conforme a tabela 3.
Não foi observada diferença estatisticamente significativa (p>0,05) entre os grupos US2D e US3D. De acordo com a avaliação das mulheres, tanto o US2D quanto o US3D permitiram maior aproximação com o bebê.
Quando associado a existência ou não de aproximação no vínculo após a realização do exame de ultra-sonografia, independentemente se foi no US2D ou no US3D, constata-se, então, diferença significativa (p<0,05), o que permite dizer que a realização da ultra-sonografia exerce influência significativa na aproximação do vínculo materno-fetal (tabela 3).
As mulheres que afirmaram aproximação na relação com o feto após o US2D podem ser representadas pelos discursos
"Aproximou mais, peguei mais amor. Não acreditava que estava grávida, não queria. Agora é diferente". (0,5%)
"Aproximou mais, porque agora vi que é uma menina e está bem, vou ter mais interesse em conversar, vou ser mais boba a partir de hoje." (87,5%)
Os discursos que representam as mulheres que afirmaram que a relação não alterou, justificaram afirmando que a relação já era suficientemente boa: "Não alterou em nada, vi que ele está bem, o amor é o mesmo." (8%)
Já após a realização do US3D a aproximação com o feto pode ser representada com a fala: "O ultra-som fez aproximar mais, pude ver onde ele está, em que posição e se ele está bem." (80%)
As mulheres que afirmaram que a relação já era satisfatória relataram: "Não alterou porque já sinto amor por ele, mesmo fazendo o ultra-som." (18%)
DISCUSSÃO
Neste estudo verificou-se que com a realização da ultra-sonografia a maior preocupação da mãe era a constatação de um bebê saudável e perfeito, que acaba por permitir que esta mãe sinta-se mais confiante e segura, conseguindo imaginar o seu bebê.
No período pré-natal os pais constroem a noção de individualidade do bebê, reconhecendo alguns de seus comportamentos e características temperamentais. A realização da ultra-sonografia permite obter informações precisas como sexo e a maneira de movimentar-se, determinando a estruturação de um padrão de interação precoce, que tende a continuar após o nascimento (Borsa, 2007). A existência de uma relação materno-fetal intensa é embasada especialmente nos sentimentos ou expectativas da gestante sobre o bebê, assim conhecer o bebê antes do nascimento, estar com ele, pensar sobre ele, imaginar suas características, traz implicações para a construção da representação do bebê, da maternidade e para a posterior relação mãe-bebê, aspectos estes facilitados pela visualização do bebê na tela do exame.
Observou-se neste estudo uma mudança no sentimento da gestante com relação ao feto após a realização do exame de ultra-sonografia. A mãe, ao ver seu bebê na tela do exame, conseguiu se aproximar dele, acreditando ter criado um vínculo maior. Pode-se pensar que além do corpo da gestante encarregar-se do crescimento físico do feto, acontece, no seu psiquismo, a formação da idéia de ser mãe e a construção de uma imagem mental do bebê (Stern, 1997). É como se ocorressem três gestações ao mesmo tempo: o desenvolvimento físico do feto no útero, uma atitude de mãe no psiquismo materno e a formação do bebê imaginado na sua mente (Stern, Stern- Bruschweiler y Freeland, 1999).
A relação da mãe com o bebê se constitui ao longo da gestação, e é influenciada por suas expectativas e pela interação que estabelece já neste período. Esta primeira relação serve de base para a relação mãe-bebê que se estabelecerá depois do nascimento. A ultra-sonografia, como estímulo projetivo, propicia a construção do bebê imaginário, possibilitando que a relação entre mãe e bebê se estabeleça de forma mais concreta (Borsa, 2007).
Com relação à comparação dos dois tipos de exames de ultra-sonografia, as gestantes elegeram o US3D como o melhor, pois acreditavam ter conseguido ver melhor o bebê, possibilitando o reconhecimento de características físicas e permitindo imaginá-lo como integrante da família.
O exame da ultra-sonografia pode representar um recurso útil para a formação do vínculo materno-fetal, pois permite a aproximação da mãe e do bebê. O exame de US3D facilita ainda mais a identificação do bebê e favorece a projeção das expectativas maternas, pois as imagens observadas aproximam-se ainda mais do bebê real. Assim, a mãe começa a fazer leituras, que com certeza, tem relação com seus desejos a respeito desse filho.
Ferrari, Piccini e Lopes (2007) postulam que na construção do vinculo com seu bebê, a mãe vai personificando o feto para que, no momento do nascimento, ela não se encontre com alguém completamente estranho. Essa personificação do feto vai acontecendo à medida que os pais escolhem o nome do bebê, suas roupas e, também modificam a casa. Ao dar características aos movimentos fetais, personificar esses movimentos, dizendo o que esse filho será, acaba atribuindo uma personalidade ao feto. Em geral, as mães atribuem características físicas e psíquica ao bebê que o familiariza, fazendo parte desde o inicio daquela família em particular.
Winnicott (2001) afirma que a mãe encontra-se num estado especial, denominado "preocupação materna primária". Esta condição gradualmente se desenvolve e se torna um estado de sensibilidade aumentada durante, e especialmente, no final da gravidez. Este estado organizado (que, não fosse pela gravidez, seria uma doença) poderia ser comparado a um estado retraído, ou a um estado dissociado ou uma fuga, ou mesmo a uma perturbação a um nível mais profundo, tal como um episódio esquizóide, no qual algum aspecto da personalidade assume temporariamente o controle. Não é possível compreender o funcionamento da mãe na fase mais inicial da vida de um bebê, sem entender que ela deve ser capaz de atingir este estado de sensibilidade aumentada, quase uma doença, e recuperar-se dele. Winnicott (2001, p.491) esclarece que introduz a palavra
(...) ‘doença’ porque é necessário que a mulher seja saudável tanto para desenvolver este estado quanto para se recuperar dele quando o bebê a libera. Se o bebê morre, o estado materno surge repentinamente como uma doença. A mãe assume este risco.
Constatou-se que independentemente do tipo de ultra-sonografia realizado, quer US2D ou US3D, as mulheres relataram aumento do vínculo imediatamente após a realização de ambos exames. No entanto ressalta-se que embora algumas mulheres afirmaram ter vivido sentimentos positivos após a realização do exame de ultra-som 2D ao retornarem para a realização do exame de US3D o vínculo não se mantinha como positivo, alternando entre ambivalente e negativo. Assim, pode-se pensar que o aumento do vínculo materno fetal após a realização da ultra-sonografia ocorre imediatamente após a realização do exame, não tendo como afirmar a permanência desta relação e o que o vínculo materno–fetal depende de uma série de fatores entre eles a pré-disposição interna da mãe.
As expectativas da mãe em relação ao bebê originam-se de seu próprio mundo interno, de suas relações passadas e de suas necessidades conscientes e inconscientes relacionadas àquele bebê (RAPHAEL-LEFF, 1993; SZEJER & STEWART, 1997). Estas expectativas são mais freqüentes e intensas no segundo trimestre da gestação, que é o momento em que o feto, por meio dos movimentos, anuncia realmente sua existência. Depois do sétimo mês, o volume e a intensidade desses desejos tendem a diminuir, preparando, desta forma, o lugar do bebê real (CARON, FONSECA & KOMPINSKY, 2000; STERN, 1997). Assim, Spitz (1961) e Alaugnier (1990), enfatizam a importância da construção de um bebê imaginário para o vínculo materno-fetal que se estabelecerá após o nascimento.
Neste momento da gestação a mãe apresenta vários sentimentos ambivalentes, de amor, por um ser que está se formando dentro dela, e de medo pela responsabilidade em ser mãe. Segundo Freud (1914) para poder investir narcisicamente em uma criança é necessário, amar o que somos. O que fomos e o que gostaríamos de ser, assim como aqueles que cuidaram de nós. Portanto, uma mulher vai se constituindo em mãe, frente às mudanças físicas do seu corpo, psíquicas e sociais.
Neste estudo verificou-se a importância do exame de ultra-sonografia durante a gestação na constituição do vinculo materno-fetal, independentemente do tipo de ultra-sonografia realizado, quer seja o US2D ou US3D. Após a realização do exame, independente do tipo, a mãe consegue ter a confirmação da gestação e visualizar seu bebê, podendo imaginá-lo e inseri-lo no contexto familiar. Porém o vínculo materno-fetal engloba várias características a serem detectadas, não somente o exame, ressaltando a importância da continuidade de novos estudos sobre o vínculo materno-fetal.
REFERÊNCIAS
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1Especialista em Psicologia Hospitalar pela Divisão de Psicologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, São Paulo, Brasil.
2Doutorado Diretor técnico de serviço de saúde da Divisão de Psicologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, São Paulo, Brasil.
3Livre docente Médica assistente da Divisão de Clínica Obstétrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, São Paulo, Brasil.
4Doutorado Médica assistente da Divisão de Clínica Obstétrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, São Paulo, Brasil.
5Doutorado Médica assistente da Divisão de Clínica Obstétrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, São Paulo, Brasil.
6Doutorado Diretora da Divisão de Psicologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, São Paulo, Brasil.
7Livre docente Professor titular da disciplina de Obstetrícia da Faculdade de Medicina da USP, São Paulo, Brasil.