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Psicologia Hospitalar
versión On-line ISSN 2175-3547
Psicol. hosp. (São Paulo) vol.9 no.1 São Paulo ene. 2011
ARTIGOS ORIGINAIS
Avaliação das funções mnésticas e atencionais em uma amostra de idosos saudáveis engajados em atividade física regular
Assessment of mnestic and attentional functions in a sample of healthy elderly engaged in regular physical activity
Evelin Lisete SchaefferI,1; Ana Luiza Costa ZaninottoII,2; Eliane Correa MiottoII,3; Mara Cristina Souza de LuciaII,4; Milberto ScaffIII,5
ICentro de Estudos em Psicologia da Saúde
IIDivisão de Psicologia do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
IIIDepartamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
RESUMO
Diversos estudos têm mostrado que o prejuízo cognitivo relacionado ao envelhecimento pode ser compensado positivamente por exercício físico. O objetivo deste estudo foi avaliar o desempenho de sujeitos idosos saudáveis engajados em atividade física regular em medidas de memória episódica e atenção, em comparação com sujeitos controles sedentários pareados por idade e escolaridade. Para isso, 14 sujeitos entre 60 e 85 anos de idade e entre 12 e 18 anos de escolaridade foram avaliados através de uma bateria de testes neuropsicológicos, um teste de cognição geral e uma escala de ansiedade e depressão, além de uma entrevista semidirigida. Sujeitos engajados em atividade física mostraram desempenho significativamente melhor em uma medida de memória episódica verbal (evocação imediata) em comparação com sujeitos sedentários (n=7 por grupo; p=0,004). Esse resultado está de acordo com achados anteriores que mostram um efeito positivo da atividade física sobre o funcionamento cognitivo de sujeitos idosos saudáveis.
Palavras-chave: Memória; Atenção; Atividade física; Idosos.
ABSTRACT
Several studies have shown that the cognitive impairment associated with aging may be positively compensated by physical exercise. The aim of this study was to evaluate the performance of healthy elderly subjects engaged in regular physical activity on measures of episodic memory and attention, compared with sedentary control subjects matched for age and education. For this, 14 subjects between 60 and 85 years old and between 12 and 18 years of education were assessed through a battery of neuropsychological tests, a test of general cognition and a scale of anxiety and depression, besides a semi-directed interview. Subjects engaged in physical activity showed significantly better performance on a measure of verbal episodic memory (immediate recall) compared with sedentary subjects (n=7 per group, p=0.004). This result is in agreement with previous findings showing a positive effect of physical activity on cognitive functioning in healthy elderly subjects.
Keywords: Memory; Attention; Pysical activity; Ederly.
INTRODUÇÃO
O envelhecimento normal é caracterizado por déficits cognitivos que atravessam múltiplos domínios, tais como velocidade de processamento de informação, memória de trabalho, atenção e memória de longo prazo episódica, e esses déficits prejudicam a capacidade de alguns indivíduos idosos para levar vidas produtivas, de alta qualidade (Gazzaley & D'Esposito, 2007; Gazzaley, Sheridan, Cooney & D'Esposito, 2007; Park & Reuter-Lorenz, 2009). Prejuízo cognitivo também pode evoluir para demência, uma das principais causas de necessidade de cuidado de longo prazo (Yaffe et al., 2002).
Uma compreensão melhor dos fatores que afetam a cognição poderia levar a uma saúde melhor e independência maior das pessoas idosas. Nesse sentido, há evidências crescentes de estudos observacionais e experimentais em humanos e de estudos experimentais em animais de que o prejuízo cognitivo relacionado ao envelhecimento pode ser compensado positivamente por exercício físico (Weuve et al., 2004; Kim et al., 2010; Klusmann et al., 2010; Liu-Ambrose et al., 2010).
Estudos observacionais, conduzidos com amostras consideravelmente grandes variando de aproximadamente 2.000 a 9.000 sujeitos do sexo feminino e/ou masculino acima de 65 anos de idade, durante um seguimento de 5 a 8 anos, mostraram que níveis mais elevados de atividade física regular (medida pela distância caminhada por dia ou por semana, ou pela frequência de exercício que podia ser de intensidade maior, igual ou menor do que caminhada) foram associados com risco menor de prejuízo cognitivo e demência (Laurin, Verreault, Lindsay, MacPherson & Rockwood, 2001; Yaffe, Barnes, Nevitt, Lui & Covinsky, 2001; Abbott et al., 2004). Adicionalmente, um estudo realizado com aproximadamente 18.000 sujeitos do sexo feminino acima de 70 anos de idade mostrou que níveis mais altos de atividade física regular de longo prazo (incluindo corrida, caminhada, tênis, natação, ciclismo, dança aeróbica, Yoga, alongamento e fortalecimento muscular) foram associados com melhor desempenho em testes de cognição geral, memória episódica de evocação imediata e tardia verbal (história e palavras), memória de trabalho (Dígitos ordem indireta) e fluência verbal (animais) (Weuve et al., 2004). Esse estudo também mostrou que, após um intervalo de 2 anos, o declínio cognitivo entre mulheres que eram fisicamente mais ativas foi menor nas medidas de cognição geral, memória episódica e memória de trabalho.
Estudos experimentais em idosos sedentários têm sustentado que atividade física é inversamente associada com prejuízo cognitivo (Klusmann et al., 2010; Liu-Ambrose et al., 2010). Em um ensaio clínico realizado com 259 mulheres acima de 70 anos de idade, Klusmann et al. (2010) mostraram que intervenção de 6 meses de exercício físico (incluindo treinamento de resistência aeróbica, treinamento de equilíbrio e força, flexibilidade e coordenação) melhorou o desempenho da memória episódica de evocação imediata e tardia de história em comparação com um grupo controle sem intervenção de atividade física, e manteve estável o desempenho da memória episódica de evocação tardia de palavras e da memória de trabalho (Trail Making Test B/A) em oposição ao grupo controle que mostrou um declínio nessas medidas; no entanto, não houve diferença no desempenho da atenção seletiva (Stroop Test) e da fluência verbal (animais) entre os dois grupos. Ao contrário, em um ensaio clínico conduzido com 155 mulheres entre 65 e 75 anos de idade, Liu-Ambrose et al. (2010) mostraram que intervenção de 12 meses de treinamento de resistência (de intensidade moderada a alta) melhorou o desempenho da atenção seletiva (Stroop Test) em comparação com treinamento de equilíbrio e força (de intensidade leve); porém, não houve diferença no desempenho da atenção sustentada e alternada (Trail Making Test A e B) e da memória de trabalho (Dígitos ordem indireta) entre os dois grupos.
Pesquisas com animais têm fornecido suporte para um efeito positivo da atividade física sobre o funcionamento do cérebro senescente. Tem sido demonstrado que exercício físico estimula a neurogênese (o nascimento de novos neurônios) no cérebro adulto (Van Praag, Kempermann & Gage, 1999; Llorens-Martín, Torres-Alemán & Trejo, 2006; Uda, Ishido, Kami & Masuhara, 2006; Van der Borght, Havekes, Bos, Eggen & Van der Zee, 2007; Van der Borght et al., 2009), bem como no cérebro senescente (Van Praag, Shubert, Zhao & Gage, 2005; Wu et al., 2008; Kim et al., 2010). Neurogênese adulta é um processo que compreende a proliferação de células tronco e progenitoras neurais em zonas neurogênicas específicas, sua migração para regiões alvo, diferenciação em neurônios maduros e integração funcional na rede neuronal preexistente (Ehninger & Kempermann, 2008).
Em relação à neurogênese no cérebro senescente, estudos em camundongos ou ratos velhos sedentários mantidos em um ambiente com uma roda de corrida ou submetidos a exercício regular em esteira motorizada, por cerca de um mês, mostraram especificamente que o exercício físico aumentou a proliferação celular e a diferenciação em neurônios imaturos e maduros, promoveu a sobrevivência dos neurônios recém-nascidos, restabeleceu o declínio dependente da idade do fator neurotrófico derivado do cérebro (brain-derived neurotrophic factor ou BDNF, o qual desempenha um papel na maturação neuronal), atenuou a morte celular por apoptose (ou "morte celular programada", que ocorre em várias condições fisiológicas e patológicas) e melhorou o desempenho em tarefas de aprendizagem contextual e espacial (Van Praag et al., 2005; Wu et al., 2008; Kim et al., 2010).
Considerando, portanto, os efeitos benéficos de exercício físico sobre o funcionamento cognitivo (principalmente da memória e da atenção) em sujeitos idosos saudáveis, conforme visto em diversos estudos, o objetivo deste trabalho foi avaliar o desempenho de uma amostra de sujeitos idosos saudáveis da população brasileira engajados em atividade física regular em medidas de memória episódica e atenção, em comparação com sujeitos controles sedentários pareados por idade e escolaridade.
CASUÍSTICA E MÉTODOS
O presente estudo faz parte de um projeto de pesquisa aprovado pela Comissão de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (CAPPesq 086/06) que objetiva avaliar o desempenho de uma amostra da população brasileira em uma bateria de testes neuropsicológicos PN-01. Os testes que compõem o Protocolo Neuropsicológico PN-01 serão descritos adiante. O Conselho Federal de Psicologia, através da Resolução CFP n°. 001/2003 Art.16, autoriza o uso de testes não padronizados na população brasileira para fins de pesquisa. Todos os testes usados neste projeto estão padronizados e validados, sendo alguns deles padronizados na população brasileira.
O presente estudo teve como objetivo avaliar o desempenho de sujeitos idosos saudáveis engajados em atividade física regular na bateria de testes neuropsicológicos PN-01 que avaliou as funções intelectuais, mnésticas e atencionais.
Para o propósito deste estudo, os sujeitos foram recrutados na comunidade e em um centro de musculação para todas as idades, na cidade de São Paulo. Foram avaliados 14 sujeitos entre 60 e 85 anos de idade e entre 12 e 18 anos de escolaridade, cujos resultados na avaliação cognitiva preliminar com Mini Exame do Estado Mental (MEEM) estivessem acima do ponto de corte (>18) relacionado à escolaridade (Bertolucci, Brucki, Campacci & Juliano, 1994), e cujos resultados na avaliação do humor com a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HAD) estivessem abaixo do ponto de corte para ansiedade (<8) e depressão (<9) (Marcolino et al., 2007). Todos os 14 colaboradores que aceitaram participar voluntariamente da pesquisa assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido aprovado pela CAPPesq (086/06).
Os participantes foram avaliados individualmente através de um protocolo composto de entrevista semidirigida para a coleta de dados sociodemográficos e clínicos, e de testes neuropsicológicos que avaliaram as funções intelectuais, mnésticas e atencionais. O funcionamento intelectual foi avaliado através dos subtestes Vocabulário e Raciocínio Matricial da Escala de Inteligência Wechsler para Adultos – III (WAIS-III) (Nascimento, 2004). Por meio desses subtestes da escala WAIS-III foi calculado o QI Estimado dos sujeitos (Ringe, Saine, Lacritz, Hynan & Cullum, 2002). Memória episódica verbal foi avaliada através do teste Hopkins Verbal Learning Test-R3 (HVLT-R3) (Brandt & Benedict, 2001), e memória episódica visual foi avaliada através do teste Brief Visual Memory Test-R2 (BVMT-R2) (Benedict, 1997). Atenção sustentada e alternada foi avaliada através do teste Trail Making Test - Partes A e B (TMT-A e TMT-B), e atenção seletiva foi avaliada através do teste Stroop Test (Strauss, Sherman & Spreen, 2006).
PROTOCOLO NEUROPSICOLÓGICO PN-01
1. Funções Intelectuais: Teste: Subtestes Vocabulário e Raciocínio Matricial da WAIS-III (Nascimento, 2004). Descrição: O subteste Vocabulário se constitui de 33 palavras apresentadas oral e visualmente, para as quais o sujeito deve dar definições orais. O subteste Raciocínio Matricial se constitui de 26 figuras apresentadas de forma incompleta, para as quais o sujeito deve escolher uma de cinco alternativas a fim de completar a sequência lógica da figura.
2. Funções Mnésticas (Memória Episódica e Aprendizagem de Novas Informações): Testes: HVLT-R3 (Brandt & Benedict, 2001) e BVMT-R2 (Benedict, 1997). Descrição: O HVLT-R3 se constitui de 12 palavras apresentadas oralmente em 3 tentativas, as quais o sujeito deve repetir imediatamente após cada tentativa, evocar após um período de 25 minutos e, após isso, reconhecer entre outras palavras. O BVMT-R2 possui 6 figuras geométricas apresentadas em 3 tentativas, as quais o sujeito deve repetir imediatamente após cada tentativa, evocar após um período de 25 minutos e, após isso, reconhecer entre outras figuras.
3. Atenção: Testes: Trail Making Test (TMT) – Partes A e B e Stroop Test (Strauss et al., 2006). Descrição: O TMT requer que o sujeito conecte, fazendo linhas com lápis, 25 números circulados em ordem crescente (Parte A), e 25 números e letras circulados em ordem alternada, sendo os números conectados em ordem crescente e as letras em ordem alfabética (Parte B); o TMT inclui exercícios de treinamento para ambas Partes A e B. O teste Stroopé composto por 3 cartões: 1- retângulos, 2- palavras, 3- cores. No cartão 1, o sujeito deve nomear o mais rápido possível a cor de 24 retângulos impressos em verde, rosa, azul ou marrom. O cartão 2 é similar ao 1, porém os retângulos são substituídos por palavras comuns, e o cartão 3 é similar ao 1 e ao 2, mas os estímulos coloridos são os nomes das cores "verde, rosa, azul e marrom" impressas de modo que a cor impressa nunca corresponda ao nome da cor. Nos cartões 2 e 3, o indivíduo deve suprimir uma resposta habitual (leitura) em favor de uma não usual.
RESULTADOS
Os resultados brutos de cada sujeito em cada um dos testes da bateria de Avaliação Neuropsicológica foram transformados em percentis e escores Z através dos manuais originais de cada teste e tabelas com dados normativos da população saudável. A idade, os anos de escolaridade, os escores no MEEM e na HAD (ansiedade e depressão) e os percentis e escores Z dos testes neuropsicológicos foram submetidos à estatística descritiva através do pacote estatístico SPSS 15.0 para Windows obtendo-se a Média e o Desvio Padrão (DP); todos esses dados, com exceção dos escores Z, foram submetidos também à análise estatística pelo teste Mann-Whitney através do SPSS obtendo-se o valor de p.
A amostra foi composta por dez (71,4%) sujeitos do sexo feminino e quatro (28,6%) do sexo masculino, cuja idade média foi de 65,7 anos (DP 4,5) e a média de anos de escolaridade foi de 16,4 (DP 1,4). Todos os sujeitos da amostra eram independentes quanto às atividades de vida diária básicas e instrumentais, e embora todos os sujeitos fossem aposentados, quatro continuaram a exercer atividades laborais. Os resultados de todos os sujeitos no MEEM e na HAD foram dentro dos limites da normalidade.
A amostra foi dividida em dois grupos: (1) Fisicamente Ativo (FA; 50,0% da amostra), incluindo sujeitos praticantes de atividade física regular sob orientação profissional; esse grupo foi composto por sete sujeitos do sexo feminino, e o período mínimo de envolvimento em exercício físico regular (incluindo caminhada, natação, hidroginástica, alongamento, fortalecimento muscular, Yoga e Tai Chi Chuan) nesse grupo foi de 4 anos. (2) Fisicamente Inativo (FI; 50,0% da amostra), incluindo sujeitos não praticantes de atividade física ou praticantes de atividade física não regular sem orientação profissional; esse grupo foi composto por três sujeitos do sexo feminino e quatro do sexo masculino.
A tabela 1 mostra a idade média, a média de anos de escolaridade e os escores médios no MEEM e na HAD (ansiedade e depressão) nos diferentes grupos. Os dois grupos não diferiram significativamente na idade média (p = 0,8), na média de anos de escolaridade (p = 0,15), no escore médio no MEEM (p = 0,54) e nos escores médios na HAD (ansiedade: p = 0,56; depressão: p = 0,3).
A tabela 2 mostra os percentis (Média e DP) referentes aos dados brutos de cada teste da bateria de Avaliação Neuropsicológica coletados nos diferentes grupos. Através da análise estatística das médias dos percentis, observou-se que os dois grupos não diferiram significativamente nos subtestes Vocabulário (p = 0,12) e Raciocínio Matricial (p = 0,89), no QI Estimado (p = 0,24), em duas medidas do HVLT-R3 (memória episódica de evocação tardia verbal: p = 0,09; reconhecimento verbal: p = 0,17), no BVMT-R2 (memória episódica de evocação imediata visual: p = 0,08; memória episódica de evocação tardia visual: p = 0,2; reconhecimento visual: p = 0,39), no TMT-A (atenção sustentada: p = 0,61), no TMT-B (atenção alternada: p = 0,24) e no teste Stroop (atenção seletiva: p = 0,61). No entanto, observou-se que os dois grupos diferiram significativamente na medida de memória episódica de evocação imediata do HVLT-R3 (p = 0,004); essa diferença foi devida a maior pontuação no teste por sujeitos no grupo FA em comparação com sujeitos no grupo FI.
A tabela 2 mostra também os escores Z (Média e DP) referentes aos dados brutos de cada teste nos diferentes grupos, bem como as diferenças de classificação em cada variável entre os dois grupos estudados. Os escores Z indicam quantos desvios padrões acima ou abaixo da média, obtida em tabelas com dados normativos da população saudável, foi o desempenho dos sujeitos em cada teste. Através das médias dos escores Z, observou-se que o desempenho do grupo FA em todos os testes da bateria de Avaliação Neuropsicológica foi na faixa média (escore Z entre 0,6 e -0,3), com exceção do desempenho no teste Raciocínio Matricial que foi na faixa superior (escore Z = 1,9). Por outro lado, observou-se que o desempenho do grupo FI em alguns testes foi na faixa média (escore Z entre 0,4 e -0,6) e em outros na faixa média-inferior (escore Z entre -1,3 e -0,8), com exceção do desempenho no teste Raciocínio Matricial que foi na faixa superior (escore Z = 1,9). Especificamente, o desempenho na faixa média-inferior foi observado nos testes de memória episódica de evocação imediata verbal, de evocação tardia verbal e de evocação imediata visual.
DISCUSSÃO
Neste estudo, foi avaliado o desempenho de uma amostra de sujeitos idosos saudáveis engajados em atividade física regular (grupo FA, Fisicamente Ativo) em medidas de memória episódica e atenção, em comparação com sujeitos controles sedentários (grupo FI, Fisicamente Inativo) pareados por idade e escolaridade.
As medidas de memória episódica consistiram em evocação imediata e tardia e reconhecimento verbal (HVLT-R3, lista de palavras) e visual (BVMT-R2, figuras geométricas), e as medidas de atenção consistiram em atenção sustentada (TMT-A), alternada (TMT-B) e seletiva (teste Stroop). Em todas essas medidas, com exceção de uma (memória episódica de evocação imediata verbal), não foi observada diferença significativa entre os grupos FA e FI. Observou-se, portanto, um desempenho significativamente melhor na medida de memória episódica de evocação imediata verbal no grupo FA em comparação ao grupo FI. Nessa medida, o desempenho do grupo FA encontrou-se na faixa média, enquanto o desempenho do grupo FI foi na faixa média-inferior. Além disso, observou-se um desempenho consideravelmente melhor, tendendo à significância estatística (0,05 < p < 0,1), nas medidas de memória episódica de evocação tardia verbal e de evocação imediata visual no grupo FA em comparação ao grupo FI; nessas medidas, o desempenho do grupo FA também encontrou-se na faixa média, enquanto o desempenho do grupo FI foi na faixa média-inferior.
Os resultados deste estudo mostrando desempenho significativamente melhor da memória episódica de evocação imediata verbal, e desempenho melhor, tendendo à significância estatística, da memória episódica de evocação tardia verbal em sujeitos idosos saudáveis engajados em atividade física regular em comparação com sujeitos controles sedentários, estão de acordo com estudos na literatura mostrando que níveis mais altos de atividade física regular ao longo da senescência ou intervenção de exercício físico de longa duração em sujeitos idosos sedentários são associados com melhor desempenho em testes de memória episódica de evocação imediata e tardia verbal (Weuve et al., 2004; Klusmann et al., 2010).
O resultado deste estudo mostrando desempenho melhor, tendendo à significância estatística, da memória episódica de evocação imediata visual em sujeitos idosos saudáveis engajados em atividade física regular em comparação com sujeitos controles sedentários, poderia ser melhor investigado em estudos futuros, pois não se encontrou nenhum estudo na literatura relacionando exercício físico com o desempenho da memória episódica visual em sujeitos idosos saudáveis.
O achado deste estudo mostrando que não houve diferença significativa no desempenho nas medidas cognitivas de atenção sustentada e alternada em sujeitos idosos saudáveis engajados em atividade física regular em comparação com sujeitos controles sedentários está de acordo com o único estudo similar encontrado na literatura, o qual não mostrou diferença no desempenho nessas medidas de atenção entre um grupo de sujeitos idosos saudáveis com intervenção de atividade física de intensidade moderada a alta e um grupo de sujeitos idosos saudáveis com intervenção de atividade física de intensidade leve (Liu-Ambrose et al. 2010).
Finalmente, o achado deste estudo mostrando que não houve diferença significativa no desempenho na medida de atenção seletiva em sujeitos idosos saudáveis engajados em atividade física regular em comparação com sujeitos controles sedentários está de acordo com um estudo na literatura, o qual não mostrou diferença no desempenho nessa medida de atenção entre um grupo de sujeitos idosos saudáveis com intervenção de exercício físico e um grupo controle sem intervenção de atividade física (Klusmann et al., 2010). No entanto, o estudo conduzido por Liu-Ambrose et al. (2010) relatou diferença significativa no desempenho da atenção seletiva entre o grupo de sujeitos idosos saudáveis com intervenção de atividade física de intensidade moderada a alta e o grupo de sujeitos idosos saudáveis com intervenção de atividade física de intensidade leve. Portanto, o efeito de exercício físico sobre o desempenho da atenção seletiva poderia ser melhor investigado em estudos futuros.
Os déficits nas medidas cognitivas de memória episódica observados em sujeitos idosos saudáveis (sedentários) neste estudo são coerentes com diversos estudos na literatura mostrando que o envelhecimento normal é acompanhado por tais déficits (Gazzaley & D'Esposito, 2007; Gazzaley et al., 2007; Park & Reuter-Lorenz, 2009). Da mesma forma, o melhor desempenho nos testes neuropsicológicos de memória episódica observado em sujeitos idosos saudáveis engajados em atividade física regular, neste estudo, estão de acordo com diversos estudos na literatura mostrando que o prejuízo cognitivo relacionado ao envelhecimento pode ser compensado positivamente por exercício físico (Weuve et al., 2004; Kim et al., 2010; Klusmann et al., 2010; Liu-Ambrose et al., 2010). Portanto, os achados deste estudo sugerem que o melhor desempenho por sujeitos no grupo FA, pelo menos no teste que avaliou memória episódica de evocação imediata verbal, pode ter sido influenciado pelo maior engajamento em atividade física regular. Os estudos com animais senescentes mostrando que exposição a exercício físico estimula o processo de neurogênese adulta e melhora a função de memória (Van Praag et al., 2005; Wu et al., 2008; Kim et al., 2010) permitem especular que o melhor desempenho em um teste de memória episódica por sujeitos idosos no grupo FA neste estudo poderia ser resultante, em parte, de um aumento da neurogênese induzido pelo maior engajamento em atividade física regular.
O pequeno tamanho da amostra em cada grupo estudado pode ter contribuído para que alguns resultados apresentassem apenas tendência à significância estatística. Portanto, acredita-se que seja relevante dar continuidade ao estudo aumentando o tamanho da amostra.
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1Aluna do Curso de Especialização em Neuropsicologia pelo Centro de Estudos em Psicologia da Saúde (CEPSIC), Brasil.
2Neuropsicóloga da Divisão de Psicologia do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (ICHC-FMUSP), Brasil.
3Diretora Técnica da Divisão de Psicologia do ICHC-FMUSP, Brasil.
4Diretora da Divisão de Psicologia do ICHC-FMUSP, Brasil.
5Professor Titular do Departamento de Neurologia da FMUSP, Brasil.