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Psicologia Hospitalar
versión On-line ISSN 2175-3547
Psicol. hosp. (São Paulo) vol.9 no.2 São Paulo jul. 2011
ARTIGOS ORIGINAIS
Processos atencionais em idosos saudáveis com alta escolaridade da comunidade da cidade de São Paulo
Attentional function in healthy aging with more than 12 years of education from São Paulo's community
Nadia ShigaeffI,1; Eliane Correa MiottoIII,2; Mara Cristina Souza de LuciaII,3; Milberto ScaffIII,4
ICentro de Estudos em Psicologia da Saúde
IIDivisão de Psicologia do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
IIIDepartamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
RESUMO
Muitos estudos apontam para que mais de um terço dos sujeitos de 60 anos ou mais apresente prejuízo na atenção, apesar de não haver um padrão do efeito da idade sobre esta. O objetivo deste estudo foi avaliar o perfil de sujeitos idosos saudáveis de alta escolaridade no desempenho em medidas de atenção. Para isso, 14 sujeitos entre 60 e 89 anos de idade e entre 12 e 17 anos de escolaridade foram avaliados por meio de subtestes do WAIS-III, do Trail Making Test e do Stroop Test, após serem incluídos por critérios pré-determinados. Todos os sujeitos mostraram desempenho satisfatório em medidas de atenção, exceto para atenção seletiva (cartão 1 do teste Stroop). Houve correlação positiva entre as variáveis de desempenho nos testes de atenção sustentada e seletiva. Esse resultado corrobora achados anteriores que mostram um efeito positivo da alta escolaridade sobre o funcionamento atencional de sujeitos idosos saudáveis.
Palavras-chave: Idosos, Alta escolaridade, Atenção, Perfil cognitivo, Avaliação neuropsicológica.
ABSTRACT
Several studies have shown that more than a third of the aging people would have attention impairment, regardless of there is no commun effect of age in this process. The aim of this study was to evaluate the attentional performance of healthy elderly subjects with hight level of education. For this, 14 subjects between 60 and 89 years old and between 12 and 17 years of education were assessed through WAIS-III´s subtests, Trail Making Test and Stroop Test, after been included for pré-determined criterious. All subjects had a sactisfatory performance in attencional tests, except for the selective attention (card 1 of Stroop). There was a positive correlation between two variables (sustained and selective). This result is in agreement with previous findings showing a positive effect of hight schooling on attentional performance in healthy elderly.
Keywords: Elderly, Hight education, Attention, Cognitive performance, Neuropsychology assessment.
INTRODUÇÃO
A atenção é um construto difícil de se definir sem citar também a concentração e seletividade, pois estes podem ser diferenciados teoricamente, mas na prática são difíceis de separar (Lezak, Howieson & Loring, 2004). A integridade atencional é, portanto, uma condição básica para a concentração e a seletividade, que se definem por habilidades de focar e manter o interesse em determinada tarefa e na capacidade de manipular as distrações (Muszkat, 2008).
As bases neurobiológicas da atenção se explicam pelo fato de que, enquanto estamos acordados e motivados, somos bombardeados por uma série de informações e nosso cérebro não possui capacidade de processar todas estas, sendo assim é de extrema necessidade a presença de um mecanismo que regule, foque, selecione e organize a percepção por meio de um mecanismo eletroquímico. Assim, é inquestionável que o organismo precisa ter alguns componentes importantes para garantir o adequado funcionamento dos processos atencionais (Muszkat, 2008):
1. excitação ou alerta: relaciona-se com o estado de alerta do sujeito por meio de estruturas sub-corticais, sistema reticular e do sistema límbico. Além do hipocampo, lobo temporal e frontal;
2. orientação: processo multidimencional e involuntário que proporciona um engajamento contínuo ou não do indivíduo a determinada estimulação por meio de estruturas do córtex parietal e fronto-parietal, além dos gâlglios da base;
3. detecção de novidade e recompensa: o primeiro acessa estímulos não familiares, enquanto que o segundo atribui emoções às informações, por meio de estruturas do sistema límbico;
4. orientação executiva: faz referência ao planejamento e autorregulação do comportamento para predispor uma ação em relação a metas de curto e longo prazo, por meio de estruturas pré-frontais e órbito-frontais em comunicação com áreas sub-corticais e com os gânglios da base.
Portanto, a atenção é um processo contínuo e multidimensional que mobiliza tanto a ativação quanto a inibição de circuitos cerebrais concorrentes. Pode se realizar de forma voluntária ou involuntária, dependendo da capacidade de orientação executiva do sujeito, ou seja, da capacidade de modular a atenção e orientá-la para um foco específico.
Os processos atencionais se dividem ainda em três tipos de atenção (Muszkat, 2008):
1. Atenção sustentada: relaciona-se à sustentação da atenção por períodos de tempo, ou seja, o quanto o indivíduo consegue ficar engajado e concentrado em determinada atividade.
2. Atenção dividida: é requisitada quando há a estimulação simultânea de processos sensoriais (como audição e visão, por exemplo) e processamentos automatizados (como dirigir um veículo, por exemplo). Ou seja, é a capacidade de realizar duas atividades ao mesmo tempo de forma eficiente, sem perder o foco atencional. Para isso é imprescindível a relação da habilidade e treino.
3. Atenção seletiva: refere-se ao foco atencional para um determinado estímulo quando há uma variedade imensa de estímulos concorrentes. Ou seja, atenta-se para uma informação preterindo estímulos não relevantes.
4. Atenção alternada: permite a mudança de foco da atenção e de tarefa a ser executada (Lezak et al., 2004).
A neuropsicologia, ao longo das últimas décadas, ocupa-se do estudo das funções cognitivas, dentre elas, dos idosos. A princípio, é esperado que mais de um terço dos sujeitos de 60 anos ou mais apresente prejuízo em algumas funções cognitivas (Gil, 2005). Esse prejuízo seria explicado através do envelhecimento cerebral, associado ao envelhecimento geral do corpo.
Especificamente sobre a atenção, não há um padrão do efeito da idade sobre os processos atencionais, dependendo este da complexidade e da familiaridade das tarefas, isto é, os idosos podem ser capazes de acompanhar uma conversa ignorando outros estímulos concorrentes do próprio ambiente, como conversas paralelas ou outros ruídos (atenção seletiva), mas podem apresentar dificuldade para acompanhar várias conversas simultaneamente (atenção dividida), por exemplo (Camargo, Gil & Moreno, 2006).
Outros autores ressaltam que, com o avanço da idade, os aspectos do tempo que o sujeito demora para reagir diante de uma estimulação (tempo de reação) e a atenção sustentada também podem apresentar prejuízos ( Sanchez-Gil & Perez- Martínez, 2008). As dificuldades na atenção sustentada se fundamentariam principalmente por deficiências orgânicas próprias dos aspectos biológicos do envelhecimento (Rueda & Castro, 2010).
Interessados em investigar mais detalhamente a relação entre os processos atencionais e o componente orgânico, alguns pesquisadores (Madden et al., 2007) realizaram um estudo transversal comparando o desempenho em testes de atenção seletiva visual e tempo de reação de 16 jovens adultos, com idades entre 19 e 28 anos e 16 idosos, com idades entre 60 e 82 anos - todos saudáveis – durante exames de Ressonância Magnética Funcional e por Tensores de Difusão, para avaliar a interferência da integridade da matéria branca na ativação cortical dependendo da idade. O teste utilizado mobilizava principalmente a habilidade de busca visual, apresentando alternadamente as letras A e E em cor vermelha simultaneamente com outras três letras quaisquer em cor cinza. Como resultado se observou que a ativação cortical, no aspecto do controle invertido (previsibilidade do alvo) nos idosos ocorria com a ativação de áreas frontoparietais, já em adultos jovens a área ativada nessa atividade foi occipital. Uma das hipóteses para esse resultado seria a de que idosos fariam maior uso de mecanismos frontoparietais como forma de compensar um possível declínio na eficiência do processamento bottom-up (processamento guiado pelo dado ou estímulo) mediados por regiões córtico-visuais. Quanto ao tempo de reação, os adultos jovens obtiveram significativamente menor tempo de reação em comparação aos idosos, que apresentavam declínio da integridade da matéria branca e por isso podem ter demorado mais para reagir ao aparecimento do estímulo.
Outro estudo (Argimon & Stein, 2005) avaliou longitudinalmente, com intervalo de três anos entre as duas avaliações, 66 idosos com mais de 80 anos na primeira fase (os autores não explicitam a idade média da amostra nessa fase do estudo) e 46 idosos na segunda fase, tendo uma idade média de 87 anos. Para avaliar a atenção o teste escolhido foi o Span de Números da Escala de Inteligência para Adultos – Revisado (Wechesler, 1981). Como resultado foi encontrado um declínio significante na amplitude atencional dos idosos na segunda fase em comparação aos idosos da primeira fase. Apesar disso, as dificuldades apresentadas teriam um nível leve, não caracterizando processos demenciais e nem oferecendo prejuízos às atividades de vida diárias e pragmatismo dos idosos. Propõem, assim, a ideia de que é possível ter um envelhecimento saudável.
Um estudo longitudinal (Balota et al., 2010) de coorte realizado na cidade de Washington (EUA), incluindo 47 idosos saudáveis, avaliou, por meio da versão computadorizada do Teste Stroop, a possibilidade de se obter marcadores atencionais para quadros pré-clínicos de Alzheimer, isto é, os pacientes no tempo 1 (1992) foram avaliados por uma bateria de testes neuropsicológicos e constatado o perfil cognitivo preservado, então eles foram seguidos por um ano e avaliados novamente no tempo 2 (1994) pela mesma bateria de testes neuropsicológicos. A principal conclusão, com relação à atenção, foi de que idosos que posteriormente evoluíram para quadros demenciais obtiveram maior tempo de reação comparado aos idosos que se mantiveram saudáveis, porém não houve diferença significante. Assim, os pesquisadores observaram que um possível e melhor medidor para identificar tais sujeitos mais predispostos a demências seria não só o tempo de reação, mas principalmente o número de erros cometidos, isto é, os idosos que evoluíram para quadros demenciais apresentaram maior dificuldade de inibir determinados impulsos e de selecionar a resposta adequada, voltando a sua atenção para o estímulo que realmente importava.
Observou-se que há uma escassez de estudos que investiguem todos os aspectos dos processos atencionais (atenção sustentada, dividida, seletiva e alternada) em idosos saudáveis e com alta escolaridade. Sendo assim, se faz necessário um estudo mais aprimorado capaz de fornecer um perfil do desempenho dos processos atencionais em idosos saudáveis e de alta escolaridade. Considerando, portanto, a grande variabilidade de efeitos do envelhecimento sobre a atenção, este trabalho objetivou investigar o perfil dos processos atencionais de uma amostra de idosos saudáveis com alta escolaridade da comunidade da cidade de São Paulo.
MATERIAL E MÉTODO
Sujeitos: Foram incluídos nesse estudo 14 idosos provenientes da comunidade, frequentadores de uma unidade do Serviço Social do Comércio – SESC - da cidade de São Paulo, com idades entre 60 e 81 anos e escolaridade entre 15 a 21 anos, cujos resultados na avaliação cognitiva preliminar com Mini Exame do Estado Mental (MEEM) (Brucki, Nitrini, Caramelli, Bertolucci & Okamoto, 2003) estivessem acima do ponto de corte (≥28) relacionado à escolaridade (Brucki et al., 2003), e cujos resultados na avaliação do humor com a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HAD) estivessem abaixo do ponto de corte para ansiedade (<8) e depressão (<9) (Marcolino et al., 2007). Além disso, relataram não possuírem histórico de doença mental e/ou neurológica e não estarem fazendo uso de medicações psicotrópicas atualmente. Todos os 14 sujeitos que aceitaram participar voluntariamente da pesquisa assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido aprovado pela Comissão de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo CAPPesq (086/06).
O presente estudo faz parte de um projeto de pesquisa aprovado pela CAPPesq que objetiva avaliar o desempenho de uma amostra da população brasileira em uma bateria de testes neuropsicológicos PN-01. Os testes que compõem o Protocolo Neuropsicológico PN-01 serão descritos adiante. O Conselho Federal de Psicologia, através da Resolução CFP nº. 001/2003 Art.16, autoriza o uso de testes não padronizados na população brasileira para fins de pesquisa. Todos os testes usados neste projeto estão padronizados e validados, sendo alguns deles padronizados na população brasileira.
O presente estudo teve como objetivo avaliar o desempenho dos processos atencionais de idosos saudáveis por meio de parte da bateria de testes neuropsicológicos PN-01 que avaliou as funções intelectuais, atencionais e executivas.
Os participantes foram avaliados individualmente através de um protocolo composto de entrevista semidirigida para a coleta de dados sociodemográficos e clínicos, e de testes neuropsicológicos que avaliaram as funções intelectuais, atencionais e executivas. O funcionamento intelectual foi avaliado por meio dos subtestes Vocabulário e Raciocínio Matricial da Escala de Inteligência Wechsler para Adultos – III (WAIS-III) (Nascimento, 2004). Por meio desses subtestes da escala WAIS-III foi calculado o QI Estimado dos sujeitos (Ringe, Saine, Lacritz, Hynan & Cullum, 2002). Atenção sustentada e alternada foi avaliada por meio dos testes Trail Making Test – Partes A e B (TMT-A e TMT-B) (Strauss, Sherman & Spreen, 2006) e Symbol Digit (Strauss et al., 2006) na forma oral, e atenção seletiva foi avaliada através do teste Stroop Test - versão Victoria (Strauss et al., 2006). Função executiva foi avaliada por meio dos testes Fluência Verbal e Categórica (Controlled Oral Word Association – COWA/FAS) (Strauss et al., 2006) e Wisconsin Card Sorting Test (WCST- versão Nelson) (Strauss et al., 2006).
PROTOCOLO NEUROPSICOLÓGICO PN-01
1. Funções Intelectuais: Teste: Subtestes Vocabulário e Raciocínio Matricial da WAIS-III (Nascimento, 2004). Descrição: O subteste Vocabulário se constitui de 33 palavras apresentadas oralmente, para as quais o sujeito deve dar definições orais. O subteste Raciocínio Matricial se constitui de 26 figuras apresentadas de forma incompleta, para as quais o sujeito deve escolher uma de cinco alternativas a fim de completar a sequência lógica da figura.
2. Atenção: Testes: Trail Making Test (TMT) – Partes A e B, Stroop Test (versão Victoria) e Symbol Digit, na forma oral(Strauss et al., 2006). Descrição: O TMT requer que o sujeito conecte, fazendo linhas com lápis, 25 números circulados em ordem crescente (Parte A), e 25 números e letras circulados em ordem alternada, sendo os números conectados em ordem crescente e as letras em ordem alfabética (Parte B); o TMT inclui exercícios de treinamento para ambas Partes A e B. O teste Stroopé composto por 3 cartões: 1- retângulos, 2- palavras, 3- cores. No cartão 1, o sujeito deve nomear o mais rápido possível a cor de 24 retângulos impressos em verde, rosa, azul ou marrom. O cartão 2 é similar ao 1, porém os retângulos são substituídos por palavras comuns, e o cartão 3 é similar ao 1 e ao 2, mas os estímulos coloridos são os nomes das cores "verde, rosa, azul e marrom" impressas de modo que a cor impressa nunca corresponda ao nome da cor. Nos cartões 2 e 3, o indivíduo deve suprimir uma resposta habitual (leitura) em favor de uma não usual. O teste Symbol Digit consiste na apresentação de um modelo com nove códigos compostos por símbolos abstratos pareados cada um com um número. O examinando, tendo o modelo como base, deve ir respondendo verbalmente, o mais rápido possível, qual é o número correspondente a cada código apresentado em uma sequência aleatória.
3. Função Executiva: Testes: Fluência Verbal e Categórica (Controlled Oral Word Association – COWA/FAS) e Wisconsin Card Sorting Test (WCST- versão Nelson) (Strauss et al., 2006). Descrição: O teste FAS consiste na construção de três listas de palavras iniciadas por uma determinada letra. O conjunto de três letras que utilizamos foi o F-A-S. Neste teste o examinador pede para que o examinado diga o maior número de palavras que conseguir pensar começadas com a letra proposta (F, A ou S) durante um minuto, excluindo nomes próprios, números ou a mesma palavra, mas com sufixo diferente. O teste WCST contém 48 cartões impressos com uma ou até quatro figuras (triângulos, estrelas, cruzes ou círculos) em vermelho, verde, amarelo ou azul. Não existem dois cartões iguais. Os cartões são numerados no verso para que sejam entregues aos examinados sempre na mesma ordem. O examinado é apresentado a quatro cartões (estímulo) que ficam em cima da mesa, em frente ao examinado, em seguida é instruído a combinar consecutivamente cada um dos cartões resposta (que o examinado vai pegando de uma pilha ao seu lado) com um dos quatro cartões estímulos na mesa. Após cada combinação o examinador diz se esta está "correta" ou "incorreta" sem que nunca lhe seja dito qual o critério que rege as combinações. Quando o examinando consegue combinar corretamente seis cartões respostas consecutivos, o examinador avisa que o critério de combinação deve ser mudado e novamente o examinado tem que descobrir o novo critério a partir do feedback de "correto" ou "incorreto" após cada tentativa de combinação. O teste termina quando o examinando completa seis conjuntos de seis respostas corretas consecutivas ou quando os cartões resposta acabam. Os critérios de combinação da primeira rodada podem ser em qualquer ordem que o examinando escolha e assim acontece até que sejam contempladas as três categorias possíveis (cor, forma e número). Então, o examinando deve novamente realizar as mesmas categorias na ordem que ele escolheu previamente até completar mais uma rodada de critérios sempre nessa mesma ordem.
RESULTADOS
Os resultados brutos de cada sujeito em cada um dos testes da bateria de Avaliação Neuropsicológica foram transformados em escores Z e depois em percentis por meio dos manuais originais de cada teste e tabelas com dados normativos da população saudável. A idade, os anos de escolaridade, os escores no MEEM e na HAD (ansiedade e depressão) e os percentis e escores Z dos testes neuropsicológicos foram submetidos à estatística descritiva através do pacote estatístico SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) 17.0 para Windows obtendo-se a Média e o Desvio Padrão (DP) (análise de dispersão), além da análise da normalidade por meio dos cálculos de Skewness (assimetria da distribuição das frequências) e do Kurtosis (achatamento da distribuição). Realizou-se também o cálculo de correlação (Spearman) entre as variáveis testadas.
A amostra foi composta por treze (92,9%) sujeitos do sexo feminino e um (7,1%) do sexo masculino, cuja idade média foi de 67,2 anos (DP 5,8) e a média de anos de escolaridade foi de 16,5 (DP 2,5). Todos os sujeitos da amostra eram aposentados. Os resultados de todos os sujeitos no MEEM e na HAD foram dentro dos limites da normalidade, assim como demonstrado na tabela 1.
A tabela 2 mostra os percentis (Média e DP) referentes aos dados brutos de cada teste da bateria de Avaliação Neuropsicológica coletados na amostra de idosos.
Observou-se que o desempenho médio da amostra de idosos, quando comparado a grupos de semelhantes idade e nível de escolaridade, atingiu valores de percentis referentes à classificação média, com exceção do desempenho da função de atenção seletiva, mais especificamente no cartão 1 do teste Stroop, que obteve classificação média inferior quando comparado a grupos de mesma idade e escolaridade do da amostra de idosos desse estudo.
Ao analisar a distribuição das frequências verificou-se que a maioria dos dados, com exceção do desempenho no teste que avalia atenção seletiva (cartão 1), se aproximam de uma distribuição normal, visto que os valores da assimetria (Skewness) e do achatamento (Kurtosis) se encontram entre -1 e 1. Mas pelo fato da amostra ser muito pequena, se faz mais adequada a aplicação do teste de correlação Spearman, sendo o resultado apresentado na tabela 3.
Os resultados do teste de correlação de Spearman indicaram que houve relação significativa e positiva entre os desempenhos de atenção sustentada e alternada e atenção seletiva (cartão 3), e também entre os desempenhos de atenção seletiva (cartão 1) e atenção seletiva (cartões 2 e 3).
DISCUSSÃO
Neste estudo, foi avaliado o desempenho de uma amostra de sujeitos idosos saudáveis e de alta escolaridade em medidas de desempenho dos processos atencionais.
As medidas de atenção consistiram em atenção sustentada (TMT-A), alternada (TMT-B) e seletiva (teste Stroop – cartões 1, 2 e 3). Observou-se um desempenho satisfatório do grupo avaliado quando comparado ao grupo padronizado de mesma idade e nível de escolaridade. Com exceção do desempenho no teste de atenção seletiva (cartão 1), em que foi apresentado um desempenho abaixo do esperado em 1 desvio-padrão, isto quer dizer que os idosos avaliados obtiveram um desempenho médio na faixa médio inferior. Mas esse resultado deve ser avaliado com ressalvas, pois o valor de desvio padrão da amostra estudada é muito amplo (M= 23,22 DP= 29,12), ou seja, houve uma variação significativa no desempenho dos 14 sujeitos.
Este achado está de acordo com outros estudos (Castro-Costa et al., 2011; Foss, Carvalho do Vale & Speciali, 2005; Christensen et al., 1997; e Evans et al., 1993) que discutem a ideia de que idosos com alta escolaridade teriam um tipo de reserva cognitiva que os protegeria de possíveis prejuízos ou alterações cognitivas, o que inclui os processos atencionais também. Assim, corroboraria o fato de os idosos da amostra do presente estudo apresentarem desempenhos médios preservados nos processos atencionais. Curiosamente, todos os idosos que obtiveram piores desempenhos em atividades que avaliaram atenção seletiva (cartão 1) tinham os níveis de escolaridade mais baixa do grupo (15 anos de estudo).
Correlacionando as variáveis de desempenho médio (em percentil) nos testes de processamento atencional, os resultados do teste de correlação de Spearman indicaram que houve relação significativa e positiva entre os desempenhos de atenção sustentada e alternada e atenção seletiva (cartão 3), indicando que quanto melhor o desempenho nos testes de atenção sustentada, melhor seria o desempenho também nos testes de atenção alternada e seletiva (cartão 3) e vice-versa. Também houve correlação positiva e significativa entre os desempenhos de atenção seletiva (cartão 1) e atenção seletiva (cartões 2 e 3), ou seja, quanto melhor fosse o desempenho no teste de atenção seletiva cartão 1, melhores eram os desempenhos nos testes que avaliaram atenção seletiva nos cartões 2 e 3 e vice-versa.
Tal resultado sugere que, quanto maior a capacidade do sujeito em se concentrar em determinada tarefa, maior a probabilidade deste também conseguir selecionar estímulos do ambiente e manter-se focado na atividade selecionada, sendo capaz também de mudar o foco de sua atenção sem perder o tônus atencional.
Sabe-se que a atenção alternada e a seletiva mobilizam mais recursos cognitivos quando comparadas à atenção sustentada, como por exemplo, a capacidade de inibir estímulos concorrentes. Sendo assim, os resultados encontrados no presente estudo vão ao encontro da ideia de que, se o indivíduo é capaz de obter um desempenho satisfatório em atividades que recrutam tais recursos, este é consequentemente capaz de obter bom desempenho em tarefas que os recrutem isoladamente. Isso fica evidenciado na correlação entre os desempenhos médios nas tarefas de atenção seletiva (cartão 2 e 3) e atenção sustentada.
Os estudos descritivos são de grande valor para estabelecer o perfil cognitivo de uma determinada amostra, principalmente no Brasil, em que há uma carência de estudos com esse delineamento e especialmente para população idosa saudável. A partir destes, os resultados poderiam servir de medidas-referência, sendo padronizados, para uso clínico, por exemplo.
O pequeno número de sujeitos da amostra do presente estudo não tem tal poder de generalização, sendo esta uma importante limitação. Portanto, acredita-se que seja relevante dar continuidade ao estudo aumentando o tamanho da amostra.
REFERÊNCIAS
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Endereço para correspondência
e-mail – nadia.shigaeff@unifesp.br
1Aluna do Curso de Especialização em Neuropsicologia pelo Centro de Estudos em Psicologia da Saúde (CEPSIC), São Paulo, Brasil.
2Livre Docente pelo Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), São Paulo, Brasil.
3Diretora da Divisão de Psicologia do Instituto Central do Hospital das Clínicas da FMUSP, São Paulo, Brasil.
4Ex-Professor Titular do Departamento de Neurologia da FMUSP, São Paulo, Brasil.