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Winnicott e-prints
On-line version ISSN 1679-432X
Winnicott e-prints vol.6 no.2 São Paulo 2011
Artigos
Trauma e cuidado na constituição psíquica de uma jovem estudante de Medicina
Trauma and care in the psychic constitution of a young medical student
Lucas Charafeddine BulamahI; Valéria BarbieriII; Daniel KupermannIII
I Psicólogo e Mestrando em Psicologia Clínica pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo.
e-mail: bulamah@gmail.com
II Professora doutora da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, campus Ribeirão Preto, pós-doutoranda na Universidade Paris Diderot – Paris 7
e-mail: valeriab@ffclrp.usp.br
IIIProfessor doutor do Departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP); Psicanalista membro da Formação Freudiana do Rio de Janeiro
e-mail: dkupermann@usp.br
Resumo
O presente trabalho propõe uma reflexão sobre o papel de uma constituição subjetiva traumática na escolha de uma profissão caracterizada pelo cuidado com o outro. Para tal, as ideias de Sándor Ferenczi e Donald Winnicott foram eleitas para a compreensão do material produzido por uma jovem estudante de Medicina com base em procedimentos-projetivos gráficos e de uma entrevista semidirigida. Por meio de seus relatos, especialmente acerca da carência em cuidados parentais e do despontamento em alto grau de uma personalidade intelectualizada e pouco sensível, depreende-se uma maturação marcada pela clivagem defensiva da personalidade. Tal condição estaria relacionada à propensão ao cuidado com o outro que, ao lado da importância identificatória que os profissionais da área médica foram investidos na infância da jovem estudante, teve influência admitida em sua escolha profissional.
Palavras–chave: trauma; clivagem; falso self; verdadeiro self; Ferenczi; Winnicott; Medicina; escolha profissional.
Abstract
This work proposes a reflection on the role of a traumatic subjective constitution in the choice of a profession marked by the care with the other. For such, the ideas of Sándor Ferenczi and Donald Winnicott were elected for the comprehension of the material produced by a young Medicine student through a semi-directed interview. From her reports, especially about the lack of parental care and the high degree development of an intellectualized and rather insensitive personality, a maturation marked by the defensive cleavage of the personality. Such condition would be related to the propension of caring with the other that, along with the identificatory importance that the medical professionals were invested in the childhood of the young student, had an admitted influence in her professional choice.
Keywords: Trauma; cleavage; False self; True self; Ferenczi; Winnicott; Medicine; Professional choice.
1. Sobre a escolha da Medicina
A psicanálise tem estreitas relações com a profissão médica desde suas origens, tendo o próprio Freud sido um destacado neurologista antes de se aventurar pelos territórios do inconsciente. Em quase todos os escritos dos pioneiros da disciplina, a figura do psicanalista é associada à do médico,1 até o momento em que Freud (1926/1973) decide, por iniciativa do processo sofrido por Theodor Reik, analista não médico, dissociar a formação em psicanálise da formação médica, marcando a especificidade de sua invenção e a independência relativa da formação
Tomando como arsenal teórico a psicanálise, alguns estudiosos se dedicaram a elaborar hipóteses a respeito da profissão médica e de elementos que seriam particulares à subjetividade do médico. Por exemplo, Simmel (1926) sugere que a profissão médica seria uma forma de satisfação dos desejos primitivos ligados ao princípio do prazer, aceitos socialmente no contexto do exercício da profissão e do princípio da realidade. Consequentemente, por meio da escolha pela carreira médica, seria possível atingir áreas normalmente inacessíveis e sublimar tendências agressivas e sádicas. Bellodi (2001) também sugere que tal escolha seja determinada pelo desejo de entrar em contato com os tabus da sexualidade pela via sublimatória, sem despertar oposição ou rechaço, além de representar uma oportunidade de lidar com a morte e a separação.
Para esses autores, portanto, a escolha pela profissão médica seria marcada por uma tentativa, mesmo que inconsciente, de conciliação dos impulsos instintivos com os imperativos sociais, mediante o esforço de obter um compromisso que permita uma aceitável satisfação de desejos de outra maneira interditos. No limite, portanto, a escolha médica seria oriunda da resolução de conflitos aloplásticos,2 mediante o processo sublimatório.
No presente trabalho, com base na investigação da constelação psíquica de uma jovem estudante de Medicina, será esboçada uma hipótese diferente, alinhada à problemática do cuidado com o outro, que caracteriza a ética não somente da Medicina, mas também de outras profissões da área da saúde. O que os relatos produzidos pela estudante e aqui analisados evidenciam encontra-se diretamente ligado à sua constituição subjetiva e escolha profissional. Assim, a linha argumentativa apresentada orienta-se num sentido diverso daquele de Simmel (1926) e Bellodi (2001), pois, ao invés de conflitos alinhados às imposições do processo secundário, os relatos da voluntária matizam outra problemática: a da traumatogênese e de seus efeitos na subjetividade.
Como suporte teórico para as reflexões aqui esboçadas, serão utilizadas as proposições de dois psicanalistas que se preocuparam em refletir sobre o homem fragmentado que despontava em suas clínicas: Sándor Ferenczi e Donald Woods Winnicott.
2. O trauma em Ferenczi e Winnicott
A Sándor Ferenczi, o enfant terrible da psicanálise, é creditado o uso maciço da matriz clínica como um grande laboratório de experimentações técnicas. Possuidor de uma notável sensibilidade clínica e honestidade científica, o psicanalista húngaro questionou e repensou muitos preceitos estabelecidos pela tradição psicanalítica de Freud, "seu pai teórico, analista e mestre" (Ferenczi apud Sabourin, 1988, p. 183).
Após ter experimentado com a técnica ativa (Ferenczi, 1921/1993; 1926/1993), com a qual ensaiava proibições e injunções aos analisandos, intentando promover uma redistribuição da libido e sendo mais freudiano que o próprio Freud (Kupermann, 2008), Ferenczi, até o fim de sua vida, em 1933, sustentou um estilo clínico peculiar, no qual predominava o relaxamento e o laissez-faire (Ferenczi, 1930/1992). Com efeito, a partir do uso desse modelo, observou que seus pacientes regrediam até serem analisados como crianças, lançando à tona sofrimentos bastante primitivos. Ferenczi se surpreendeu ao notar que, dos analisandos adultos, emergiam neocatarses, gritos infantis, intensas atuações e circulações afetivas durante o tratamento, defronte a uma figura de tato e flexibilidade. Disso resultaram, consequentemente, suas formulações acerca do trauma patogênico e da importância do ambiente e de seu acolhimento à criança, ou seja, dos fatores externos e reais relacionados às pressões traumáticas.
O trauma, em seu primeiro momento, seria a resultante do encontro violento entre o adulto e a criança, entre dois universos linguísticos distintos. A criança, cuja subjetividade em seus momentos mais precoces é caracterizada pela linguagem da ternura3, encontra-se com um adulto que, mesmo momentaneamente, relaciona-se com ela por meio de uma linguagem da paixão. Assim procede o adulto devido ao calor de seus próprios desejos e, cego, não observa, tampouco atende às necessidades da criança mesma. Não sendo capaz de dar sentidos às irrupções afetivas que decorrem dessa invasão linguística estranha, mediante um adulto incapaz de admitir a verdade de sua sedução, a criança passa por uma situação bastante dolorosa que, todavia, ainda não pode ser considerada como traumática. Essa ocorrência é explorada por Ferenczi principalmente em seu notório texto "Confusão de línguas entre adultos e crianças" (Ferenczi, 1933/1992).
No cenário traumático ferencziano, a violência do trauma não tem como resultante um corpo estranho, dentro de um envelope psíquico inconsciente, mediante a operação defensiva do recalque. Na visão de Ferenczi (1934/1992), o envelope psíquico que supostamente conteria o corpo estranho é ele próprio destruído.
O trauma propriamente dito, então, não ocorre somente sob a influência desse processo, mas em virtude de uma segunda atitude dos adultos: o desmentido. A criança, de aparelho psíquico e capacidade de inscrição simbólica limitada, necessita da ajuda de um adulto para dar significação à violência que sofreu; contudo, ao procurá-lo, choca-se contra o silêncio e a impassibilidade. Ausente a ajuda de alguém que reconheça seu sofrimento e perplexidade, e que possa servir de mediador, à criança restará sua própria impotência e mecanismos de identificação com aquele que a agrediu. Um terceiro adulto, a quem a criança recorre em busca de aportes simbólicos para conseguir processar o turbilhão afetivo que opera em si de maneira terrivelmente angustiante, reage com um silêncio de morte. Dessa forma, o nada aconteceu, o desmentido, está na raiz da operação traumatogenética esboçada por Ferenczi (1933/1992).
É devido a essa situação, ao "dar de ombros" daqueles adultos com quem deveria ter sido, em prol da saúde psíquica e resiliência, estabelecida uma relação de confiança e sinceridade com a criança, que efetivamente ocorre o trauma. O que resta ao infante é uma operação autoplástica, a qual Ferenczi nomeou autoclivagem narcísica (Ferenczi, 1931/1992). Esta configura uma operação defensiva na qual o Ego, antes organizado, se divide em dois polos: um sensível e brutalmente destruído, e outro que "sabe tudo, mas nada sente", ou seja, emocionalmente anestesiado, que começa a desempenhar o papel da mãe ou do pai, de cuidador da outra parte, com características e semblantes de notória sapiência e sofisticação. Daí advêm os contornos do "sonho do bebê sábio" (Ferenczi, 1923/1993, p. 77). A criança, mediante tal operação dilacerante, também se adapta a seu meio de maneira flexível e submissa, "à maneira de um saco de farinha" (Ferenczi, 1934/1992, p. 110). Conforme lemos em Ferenczi, é digno do paciente cuja subjetividade é assim configurada dizer: "Em lugar de me afirmar, é o mundo exterior (uma vontade estranha) que se afirma às minhas custas (...)" (Ferenczi, 1985/1990, p. 150). Sem espontaneidade e portando um núcleo traumatogenético assemelhado a uma larva, o bebê, como um fruto carcomido em seu interior, amadurece de maneira acelerada e atabalhoada.
De maneira muito semelhante a Ferenczi, Winnicott teoriza que, antes de ter em seu aparelho psíquico um arranjo suficientemente preparado para abarcar o que é relativo ao fazer (o que decorre da atividade instintual), o bebê relaciona-se com o objeto primordial, a figura materna, mediante o ser. O bebê é o seio e demanda que seja ele mesmo a própria fonte de satisfação onipotente de suas necessidades (Winnicott, 1971a/1994). A função simbólica do adulto está em seu atendimento ao gesto espontâneo da criança (Winnicott, 1965m[1960]/1984).
O Ego, instância psíquica que, com o devir do amadurecimento, torna-se responsável pela mediação da realidade exterior com a realidade interior, é ainda demasiadamente precário no bebê enquanto se encontra no estágio da dependência absoluta. Com efeito, nesse momento fundamental a mãe "empresta" seu próprio Ego à criança, ainda a ela totalmente fundida, enquanto a mesma pode ter a ilusão de criar o mundo exterior, ainda não existente em seu imaginário. O seio, objeto de satisfação de suas necessidades e figura ainda sem contornos definidos, é apresentado a ele por uma mãe suficientemente boa no momento mesmo em que ele pode aluciná-lo, criá-lo. A mãe e o bebê são, dessa forma, um só ente, ou, de acordo com a provocação de Winnicott (1958d[1952]/1992, p. 99): "there is no such thing as a baby".
Portanto, é basicamente o papel da figura materna, nos primórdios do desenvolvimento de seu infante, assegurar que ele se desenvolva de modo a poder se engajar, de maneira saudável e pessoal, na difícil e progressiva tarefa de conciliar a realidade externa com a realidade interna (Winnicott, 1971a/1994). Caberá a ela colocar em prática sua capacidade para o que Winnicott (1958n[1956]/1992) chamou de preocupação materna primária e para ser constante nos momentos cruciais da história do indivíduo que começa a se desenvolver, estando a subjetividade deste num estágio de não integração primária. A integração será assegurada se a mãe puder oferecer holding suficiente para que o bebê realize o resto das tarefas de ser criativo e espontâneo, continuando sua existência (Winnicott, 1945d/1992).
A criatividade e o gesto espontâneo são categorias indissociáveis do que Winnicott (1965m[1960]/1984) chama de verdadeiro self. Essa categoria, importantíssima no pensamento winnicottiano, por si só não quer dizer muita coisa, adquirindo significação quando associada ao conceito de falso self, noção que, por sua vez, é explorada sistematicamente pelo autor. Não podendo ser atendido em sua espontaneidade, o bebê é forçado a operar uma distorção em seu Ego para assegurar o contato com o ambiente de que ainda depende, mesmo que "congele" sua espontaneidade e o curso de seu desenvolvimento. É nesse contexto que surge o falso self. Winnicott fala, em 1960, de uma paciente que nomeou a parte cindida de si mesma como um "Caretaker self" (1965m[1960]/1984, p. 141), entidade subjetiva que, entre outras coisas, a levou a buscar e ingressar em um processo analítico. Com esse caso, Winnicott deixou claro que o papel do falso self é o de proteger o verdadeiro self.
Mediante um ambiente que não pôde ser adaptativo, que não pôde assegurar à criança apoio suficiente para integrar-se e atenção suficiente às suas necessidades para que ela pudesse usar sua ilusão, fundamental no processo de amadurecimento, resta à criança reagir, em um estado de coisas que é tudo, menos espontâneo. Esta é a concepção winnicottiana de trauma. Como resultado, o falso self torna-se, assim, o modo pelo qual a criança traumatizada se relaciona com o mundo, seduzida a ser submissa. Escreve Winnicott (1965m[1960]/1984):
(...) onde a mãe não pôde se adaptar suficientemente bem, o infante é seduzido a uma submissão, e um falso self submisso reage às demandas ambientais e o infante parece aceitá-las. Através deste falso self, o infante constrói um arranjo falso de relacionamentos (...). (pp. 146-147)
Muitas vezes pode ocorrer, em indivíduos com notável potencial cognitivo, a aproximação intelectual por parte do falso self e a hipertrofia do mental como uma consequência do alojamento do falso self na mente. A perigosa resultante disso é a cisão entre mente e psicossoma. Academicamente, o indivíduo pode ser um sucesso estrondoso para quem o observa. Interiormente, o indivíduo assiste a si próprio como uma farsa, tendo no íntimo um constante sentimento de desvalia. Nesse caso, o chamado self cuidador pode, por meio do intelecto, tentar auxiliar o indivíduo em seu esforço defensivo. Contudo, em seu íntimo, o que se espera é um ambiente seguro e confiável para expressar o gesto espontâneo, encoberto e congelado.
subjetividade incorre em operações autoplásticas, nas quais o próprio aparelho subjetivo deve se distorcer para dar conta de intrusões ambientais e contrapartes psíquicas lancinantes para o indivíduo. Além disso, para os dois psicanalistas, o trauma e a cisão nos casos graves possuem consequências bastante semelhantes, tais como a emergência e estabelecimento de um fragmento da personalidade voltado para o exterior, o qual encobre e "cuida" do núcleo sensível e "verdadeiro" da personalidade; o amadurecimento acelerado e precário; a hipertrofia do mental, fruto da alimentação intelectiva e racional em detrimento do aspecto sensível; a função adaptativa da cisão; a submissão aos preceitos da realidade externa e a possibilidade considerável do suicídio após a derrocada da função adaptativa da cisão. Veremos agora como os resultantes fenomênicos do trauma e da cisão se mostram nos relatos de uma jovem estudante de Medicina e de que maneira podem ter contribuído para a sua escolha profissional.
3. Método
O presente material constitui o depoimento de um entre seis voluntários de uma pesquisa sobre a constituição psíquica de jovens estudantes de Medicina que buscaram ajuda profissional, alegando algum tipo de sofrimento emocional. Tratou-se de uma pesquisa qualitativa que empregou a estratégia do estudo de caso coletivo (Stake, 2000), utilizando os procedimentos-projetivos gráficos Teste da Casa, Árvore e Pessoa (HTP. Buck, 2003) e Desenho da Família (DF. Corman, 1994), complementadas por histórias elaboradas pelos voluntários sobre suas produções gráficas.
Também foi realizada uma entrevista que abordava os principais fatos da vida e do desenvolvimento dos estudantes – compreendendo inquéritos sobre a infância, adolescência, escolha pelo curso de Medicina, característica das queixas emocionais e redes de apoio –, assim como de sua realidade atual na faculdade de Medicina. Os materiais foram submetidos à análise pelo método da livre inspeção do material (Trinca, 1984), fundamentado na teoria psicanalítica, donde resultaram as reflexões apresentadas no presente artigo.
Os voluntários assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido antes de participarem da pesquisa, a qual foi avaliada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da referida faculdade. Ademais, todas as exigências éticas de pesquisas com seres humanos foram apropriadamente atendidas. A pesquisa contou com o apoio financeiro da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo (Processo no 2009/14688-9).
4. Olívia:4 uma trágica remoção
Olívia tinha 21 anos quando se voluntariou para participar da pesquisa. Sua compleição frágil era digna de nota: além de bastante magra, era ensimesmada e tímida. Foi entrevistada durante 60 minutos e respondia às perguntas com rebuscamento verbal e voz monótona, sem inflexões; seus desenhos foram feitos de maneira econômica e as histórias a eles associadas eram de característica escassez imaginativa e associativa. Não se arrebatou emocionalmente em momento algum, mas se entristeceu visivelmente quando discorreu sobre as queixas que a levaram a buscar psicoterapia no Centro de Atendimento da Faculdade de Medicina, que procurou quando disse estar "toda quebrada".
Sobre sua infância, Olívia relatou poucos fatos. Na escolinha, gostava de estudar. Era a menor da turma, a protegida por seus colegas. Sentiu "um pouco a falta dos pais", pois ambos passavam a maior parte do tempo fora de casa, o pai em turnos de trabalho bastante longos e a mãe no hospital, acompanhando a irmã em seus tratamentos, pois esta apresentava uma doença crônica que demandava muitos cuidados. Disse que, por isso, tornou-se "teoricamente mais independente", em termos de poder tomar a atitude e falar, por exemplo, "ah, mãe, arruma a minha irmãzinha, que ela precisa de mais ajuda; eu dou conta". Fazia suas tarefas, assim, com aparente autonomia, ainda que de maneira um tanto desastrada, como quando diz que "colocava, tipo, um sapato em cada pé, uma meia diferente em cada lado, mas me arrumava". Não gostava muito de comer desde cedo, rejeitando a maioria dos alimentos que a mãe a oferecia. Seus pais foram, conforme afirmou, importantes para sua educação, ensinando-lhe "bons modos, como se comportar e colocavam limites". Brincava com alguns colegas na rua, porém não desenvolveu amizades duradouras e, dos tempos de infância, trouxe até hoje somente uma garota a quem concede a qualificação de amiga.
Acerca de sua escolha pelo curso de Medicina, Olívia relatou que a ideia surgiu, primeiramente, em virtude da "convivência com um ente da família que é portador de deficiência física". Foi dessa maneira formal que se referiu à sua irmã, atualmente com 23 anos, que padecia de mucopolissacaridose.5 A mãe, depois de suas longas e frequentes incursões aos hospitais, reportava a ela o cuidado prestado por parte dos médicos, "excelentes profissionais", "muitos deles preocupados com a questão social, ajudando várias pessoas, independentemente de classe social, independentemente de qualquer coisa", segundo as palavras da estudante.
Sua adolescência foi um período marcado por "mudanças e incertezas". Continuava não gostando de comer, mas o fazia para acompanhar alguns colegas que gostavam, quando saíam juntos. Na infância, seu sono foi agitado em épocas mais atribuladas, mas de forma geral relatou que não houve maiores problemas quanto a isso. Continuou estudando muito e participou de diversas olimpíadas acadêmicas, além de outras competições. Mudou para um colégio mais "puxado" atenta a seus "propósitos de passar em uma faculdade pública", embora contou que deveria ter feito isso antes, pois teve de estudar durante dois anos num cursinho pré-vestibular. O relacionamento com o pai não mudou, continuando este ausente a maior parte do tempo, ocupado com seu trabalho. A mãe, por sua vez, "tentou recuperar o tempo perdido", esforçando-se por estar ao lado de Olívia com maior frequência, mas tendo seus gestos de mimo rejeitados pela filha, que assegurava repetidamente saber cuidar de si mesma.
Sua iniciação amorosa foi "complicada", pois na adolescência deixou de se relacionar com garotos para dedicar-se mais aos estudos, o que era inclusive "motivo de orgulho" para seus pais, já que não "dava problema" com namorados, "só estudava". Achava-se muito imatura e "não queria mostrar as transformações que estavam ocorrendo" com ela. Na faculdade, conta que sua postura quanto aos relacionamentos amorosos não mudou.
O processo de saída de casa para cursar Medicina em outro município foi, em suas palavras, "trágico". Ingressar no curso almejado em uma cidade vizinha à casa de sua família foi sua opção primeira. Porém, sua classificação no vestibular somente lhe possibilitou ingressar na faculdade de outra cidade um pouco mais distante da sua. Essa situação foi vivida por Olívia como mais um fracasso, que a impeliu a buscar pessoas para apoiarem-na na ideia de seguir um terceiro ano de cursinho, possibilidade prontamente "podada" pelo pai, cansado de vê-la "fugindo da faculdade". Em protesto, decidiu pela inércia, por não se mover no sentido de mudar-se para a nova cidade, esperando que seus pais então realizassem por si mesmos o processo de sua mudança. E foi justamente o que eles fizeram: arrumaram sua mala e colocaram-na no carro junto com Olívia. Na nova cidade, contou que se deparou com um mundo muito diferente, em um local onde não queria estar.
Logo que ingressou na universidade, percebeu que não mais conseguiria repetir os feitos do ensino médio e fundamental, nos quais se destacava facilmente. Segundo ela, na faculdade há uma "competitividade sem noção", e a queda no desempenho foi "frustrante, bem frustrante". Nesse contexto, e marcada por intenso sofrimento psíquico, procurou o Centro de Atendimento Psicológico da Faculdade de Medicina por duas vezes. Quando da primeira procura, reportou: "(...) não era mais eu mesma", "apenas chorava, não comia, o que comia, vomitava, sono inquieto"; e sentia que o ambiente era muito hostil. Buscou e iniciou o atendimento, que logo abandonou "por motivos acadêmicos". Ingressou no atendimento uma segunda vez, por ter se passado um ano e ainda não se sentir adaptada. Nesse contexto, inclusive, Olívia pensava em suicídio, mas sempre abdicava do ato, justificando lembrar-se de sua mãe. Não obstante, queria que "forças da natureza" a matassem enquanto dormia. Sentia-se identificada com um colega veterano que havia cometido suicídio no ano anterior, e acreditava que os outros estudantes de Medicina a viam como "o suicida da vez". Seus pais se assustaram com suas queixas e seu anúncio de procura por ajuda psicoterápica, dizendo: "nossa, Olívia, você nunca foi assim, não achava que você fosse ficar tão fragilizada, você que sempre foi tão independente". Tanto o pai quanto a mãe foram ao seu encontro para ajudá-la, mas, segundo relatou, somente a mãe conseguiu oferecer um apoio efetivo. Questionada sobre a razão disso, respondeu que "mãe é mãe, é isso". Procurou a ajuda de um psiquiatra e este a diagnosticou com "transtorno de adaptação", receitando-lhe fluoxetina. O medicamento foi recusado depois de dez dias por Olívia, que estudou o mecanismo de ação do psicofármaco e decidiu que sua mudança deveria ser "uma coisa de dentro".
No curso de Medicina, segundo ela, havia uma série de ordens dadas principalmente pelos veteranos, tais como "você tem que honrar a sua faculdade, você tem que participar dos esportes, você tem que ir a festas, você tem que se integrar". Tais injunções a revoltavam e reforçavam ainda mais sua vontade de se isolar dos colegas. Contudo, com o passar do tempo e após um "período muito difícil", começou a buscar atividades prazerosas, tais como esportes (futsal), dança e uma liga assistencial específica, destinada aos cuidados com idosos, chamada "feliz idade". Com os idosos, Olívia contou que enxerga outro lado, outros problemas, que fazem com que suas próprias dificuldades pareçam "bobas". Questionada sobre quais seriam tais dificuldades, remeteu à questão do desempenho no curso, a luta pelas melhores notas e também comentou sobre os maus sentimentos oriundos da exclusão social de certas pessoas que não estão dentro dos parâmetros, "coisas bobas", repetiu. Nos momentos mais difíceis, Olívia disse se remeter principalmente ao apoio da mãe e de alguns amigos, e também "daquelas pessoas que você não espera, mas que se apresentam lá", dependendo de suas disponibilidades, mas não de sua própria iniciativa na busca de ajuda.
Por fim, relatou boas perspectivas no curso e esperava se formar e ser uma boa médica, conseguindo perceber-se nesse papel mesmo que houvesse receio por vezes, o que pode ser relacionado à procura pelo Centro de Atendimento. Como especialização, pensava em seguir anestesiologia ou geriatria, diferente de quando ingressara, "toda metódica", visando à especialização em neurologia. Quando voltava para a casa dos pais, recebia mimos e era poupada de trabalho, mas se queixou disso dizendo que queria muito poder "ajudar nos cuidados" com a irmã.
5. Análise e interpretação da subjetividade de Olívia
A leitura do conteúdo dos relatos de Olívia remete quase automaticamente às ideias de Winnicott e Ferenczi acerca do sujeito traumatizado. Boa parte das decorrências do trauma na subjetividade dos pacientes, conforme exploradas pelos dois psicanalistas, estão presentes nos conteúdos manifestos e latentes dos relatos de Olívia, ao mesmo tempo tão pequena e, no semblante, tão idosa.
Olívia narrou a experiência de uma infância na qual sentiu "um pouco a falta dos pais". No caso do pai, a razão devia-se à sua ausência de casa na maior parte do tempo, além dele ter um aspecto um tanto apagado e inerte em sua vida (ausência física e psíquica). A mãe, por outro lado, revelou-se, em toda entrevista, uma figura de proeminente importância, mas que aparentemente não foi sentida por Olívia, nos primórdios de sua existência, como suficientemente boa.
Como esteve durante a maior parte do tempo, desde o nascimento de Olívia, ocupada com os cuidados da irmã, portadora de mucopolissacaridose e necessitada de amplos e frequentes cuidados médicos, supõe-se que a mãe não pôde oferecer à sua filha caçula o holding e constância demandados, além de muitas das funções ambientais que estão implicadas na preocupação materna primária e no papel da mãe suficientemente boa, definido por Winnicott (1958n[1956]/1992). Como o retrato da ausência materna, ocupada com os cuidados especiais da filha necessitada, é bastante frequente nos relatos de Olívia, e dada a sintomatologia da estudante, pode-se supor que sua vivência subjetiva é a de que a mãe tenha se ausentado um tanto demais e, consequentemente, falhado em retroalimentar com vivacidade seus objetos internos, os quais se tornaram, em consequência, mortificados. Tal mortificação é explícita em seu Desenho da Figura Humana (DFH) e da Família (DF), simbolicamente representativos por remeterem diretamente à sua autoimagem e à qualidade de seus objetos internos. Ambos os desenhos são caracterizados por diversos círculos, o DFH (Figura 1) apresentando uma figura antropomórfica que se assemelha a um idoso – e posteriormente descrita também como um ancião extenuado –, curvado à frente e apoiando suas mãos na parte posterior da cintura.
Já no DF (Figura 2), sua própria família é descrita topograficamente como círculos entrelaçados, a parte escurecida servindo como ilustração do núcleo da mesma, ou seja, pai, mãe e irmã. Isolados à margem esquerda da folha, estão dois outros círculos, sendo que o círculo inferior, segundo sua atribuição, a representa em sua localização atual.
Mediante o choque traumático, operou-se em seu ego incipiente a distorção que foi explorada no início deste texto: uma parte sensível e "verdadeira", brutalmente destruída, foi sobrepujada por uma parte caracterizada por evidente sofisticação intelectual, sapiência e potencial de cuidado o suficiente para causar a impressão em seus pais de que sua filha caçula fosse apta, em termos de vocação e responsabilidade, a ser uma boa médica. Possivelmente se insinue, inclusive, nesta miopia dos pais no que concerne à imagem da filha – sempre tão independente e autônoma aos olhos dos dois –, a presença do desmentido, da incapacidade dos pais em aportar sentidos e, mediante uma presença sensível, acolher a experiência dolorosa dos conflitos de Olívia, às voltas com um choque traumatogênico. Segunda fase do traumatismo patogênico, de acordo com os termos de Michael Balint (1967/1992), esse desmentido é uma espécie de eco do momento em que Olívia intentou obter reconforto, ou mesmo, simplesmente, compreensão de seus pais que manifestaram uma distância afetiva por não estarem implicados, mesmo que estivessem respondendo com atos.
Organizando-se de maneira precária em torno do processo autoplástico da cisão do Ego, Olívia esteve, em sua infância, às voltas com uma maneira estéril de se adaptar às exigências do ambiente à sua volta. Encontra-se em seus relatos, e também em sua aparência física, sinais de anorexia que também podem ser compreendidos no contexto da teoria de Winnicott (1968f[1967]/1996) sobre os transtornos alimentares: "(...) a vasta maioria das dificuldades na alimentação do infante não têm nada a ver com infecção ou com a inadequação bioquímica do leite. Elas têm a ver com o imenso problema que todas mães têm em se adaptarem às necessidades de seus bebês" (p. 40). Ecos dessa não adaptação, os quais parecem ter ocorrido na relação primordial de Olívia, se encontrariam, portanto, na raiz de sua recusa a se nutrir.
Os relacionamentos de Olívia com seus amigos eram, segundo descreveu, de notável precariedade. Desde a infância, a voluntária não costumava relacionar-se com ninguém de relativa importância fora os membros de sua família. A inépcia em fazer amigos também é algo premente nas personalidades caracterizadas pelo falso self, segundo Winnicott (1996j[1968]/1996). Além disso, nos momentos de maior dificuldade, Olívia relata que conta com presenças lábeis, de pessoas que experienciam tanto ou mais sofrimento que ela própria. Reflexos da estereotipia adaptativa da personalidade cindida podem ser encontrados também no relato de Olívia de que comer nunca lhe apeteceu e, mesmo assim, com seus colegas da infância e adolescência saía principalmente para comer.
Na adolescência de Olívia, momento de mudança em que ela "não queria mostrar as transformações que estavam acontecendo", é significativo que ela tenha "deixado de lado" a "parte amorosa" para se dedicar aos estudos. Sentia-se muito imatura para ingressar no universo dos relacionamentos amorosos. No quadro geral do caso analisado, esta forma de funcionamento pode ser tomada como ilustrativa de uma falha na constituição ontológica do sujeito, o ser, que, num desenvolvimento satisfatório, permitiria abarcar posteriormente tudo o que é relativo à sexualidade, secundária e relacionada ao fazer (Winnicott, 1988), com ganhos em termos de experiência criativa. Secundária, mas de maneira alguma desimportante, a sexualidade para Winnicott só pode ser assimilada e usada de maneira incongruente caso o indivíduo não tenha uma experiência existencial primária e pessoal satisfatória.
Considerando esse psicodinamismo, aparentemente Olívia tornou-se, por meio da operação da autoclivagem narcísica ou distorção do ego, um sacerdote intelectualmente potente que, inclusive, enxergava no imaginário mesmo da carreira Médica um "sacerdócio". Nesse contexto, depreende-se que, de maneira latente, ela tenha elaborado uma espécie de plano inconsciente: tornando-se médica, semelhante aos profissionais de que tanto falavam a mãe e a irmã quando retornavam a casa depois de suas longas incursões, poderia cuidar de sua irmã e resgatar a atenção da mãe, de quem ainda era tão dependente. Há que se notar, ademais, a maneira particular com que Olívia é incumbida, pelas circunstâncias acima descritas, de dar conta de um problema grave, a doença da irmã, e a mobilização familiar em torno disso. Se segue realizando tal auxílio, a despeito de suas próprias necessidades, como um psiquiatra da família, não é por puro e verdadeiro desinteresse, supõe Ferenczi, mas sim para manter um fio de ternura que ainda figura no horizonte do desenvolvimento. Tal ocorrência, muito comum na configuração familiar onde ocorre o tipo de traumatismo aqui descrito, pode ser nomeada como "terrorismo do sofrimento" (Ferenczi, 1933/1992; p. 105).
Talvez em virtude da necessidade de manter a função de provedora de cuidados como uma espécie de esperança de resgate, a obrigação ditada por seu pai, e consentida por sua mãe, de ir estudar na faculdade de Medicina que conseguisse ingressar, afastada de casa, tenha sido sentida por Olívia como algo "trágico". Diante disso, é possível que Olívia tenha vivido, ao lado da queda de desempenho intelectual mediante as altas exigências da estrutura curricular, episódios depressivos e graves angústias. A saída de casa pode ser classificada como um segundo trauma, o novo traumatismo ao qual se refere Ferenczi (1934/1992), responsável pelo solapamento da parte cuidadora da personalidade, o Caretaking self descrito por Winnicott (1965m[1960]/1984) ou o "anjo da guarda", batizado por Ferenczi (1985/1990, p. 40). Às voltas com esse novo traumatismo arrebatador, Olívia desenvolveu, inclusive, ideias suicidas, muito frequentes quando falha a função cuidadora, protetora, assumida pela parte amadurecida prematuramente.
Finalmente, no que concerne mais especificamente à relação entre o trauma de Olívia e sua escolha pela carreira médica, as ideias de Winnicott e Ferenczi oferecem interessantes ferramentas de análise. É explícito em Ferenczi (1931/1992) que os sujeitos traumatizados têm, por muito sofrerem, moral e fisicamente, uma propensão para o cuidar, cercar os outros de maneira maternal. Tal opinião é assim referendada por Verztman (2002):
Um fato marcante, todavia, que pude perceber, é a disposição que eles [os sujeitos traumatizados] apresentam para a solidariedade e o cuidado ao outro. Salvo quando imersas em episódios depressivos severos, estas pessoas são capazes de atos altruístas raramente concebíveis. O desamparo do outro as toca com uma intensidade que muitos de nós perderam ao longo da vida. (pp. 72-73)
Isso fica explícito no relato de Olívia:
Olha, no início do curso [ser médica] significava um sacerdócio, né? Eu queria [me] dedicar única e exclusivamente a isso, mas só que aí eu vi que eu também precisava cuidar de mim. Agora, pra mim a Medicina significa como se você fosse um espelho, sabe, do paciente, você não é maior nem menor, você é igual, você é ser humano, você pode sentir as mesmas coisas que ele sente e você como ser humano, por já ter sofrido e passado por muitas coisas, pode tentar ajudar alguém.
É possível, então, que a escolha por uma profissão tão diretamente relacionada ao cuidado com o outro seja a ressonância de uma espécie de sobrevivência da ternura, só que para o exterior, pois, segundo Vertzman (2002), todas as angústias e sentimentos que essas pessoas "(...) não podem sentir em relação a si são deslocadas para o outro em sofrimento" (p. 73), na forma de um retorno do clivado.
Outro fator importante a ser considerado é a presença preponderante e influente da figura do médico no discurso da mãe e da irmã do paciente. Segundo Winnicott (1965m[1960]/1984), de maneira passiva e reativa, o sujeito se identifica com figuras pregnantes naquele contexto:
(...) por meio de introjeções até mesmo mantém uma imagem de ser real, sendo que a criança cresce de modo a ser como se fosse a mãe, enfermeira, tia, irmão ou quem quer que domine a cena naquele momento. O falso self tem uma função positiva e muito importante: esconder o self verdadeiro, e o faz por submissão às demandas ambientais. (pp. 146-147)
Ou seja, coube a Olívia, naquele momento crucial de seu desenvolvimento, realizar uma operação estrutural dolorosa em sua personalidade, de modo a dirigi-la para o cuidar do outro, ao invés de ser cuidada. Cuidar do outro, da maneira que lhe coube, às expensas do cuidado de si mesma, do cuidado que lhe faltou.
Referências
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11 Vide, por exemplo, o texto técnico de Freud, de 1912, intitulado "Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise".
2 Ou seja, por meio da modificação da forma externa com a qual se buscará a satisfação dos instintos.
3 Caracterizada pelo "amor objetal passivo ou estádio da ternura" (Ferenczi, 1933/1992, p. 103), no qual a criança não objetiva travar comércio sexual com os adultos cuidadores, mas sim, pretende ser o outro, construir sua própria identidade.
4 Para preservar o sigilo da voluntária, foi adotado um nome fictício. Os relatos literais da voluntária serão transcritos entre aspas, em itálico.
5 A mucopolissacaridose (MPS) é um distúrbio inato grave, causado por deficiência de enzimas lisossômicas essenciais à degradação de polissacarídeos. Doença rara, gradualmente pode evoluir para uma ameaça à vida caso não diagnosticada e tratada com prontidão. Suas manifestações clínicas incluem alterações no sistema nervoso central e periférico, sistema osteoarticular, sistema digestório e nos aparelhos auditivo e respiratório.