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Ciências & Cognição
On-line version ISSN 1806-5821
Ciênc. cogn. vol.18 no.1 Rio de Janeiro Apr. 2013
Revisão
Preditores psicológicos, reações e o processo de intervenção psicológica em atletas lesionados
Psychological predictors, reactions and process of psychological intervention in injured athletes
Victor Barbosa Ribeiro, Sandra Regina Garijo de Oliveira e Flávia Gonçalves da Silva
Departamento de Educação Física, Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Diamantina, Minas Gerais, Brasil
Resumo
Atualmente novas alternativas e intervenções têm sido buscadas para o enfrentamento de lesões sofridas pelos atletas. Esta revisão teve por objetivo avaliar os estudos publicados entre os anos de 2002 a 2012 sobre os traços psicológicos preditores de lesão, a reação frente à lesão, as principais técnicas de intervenção psicológica, a abordagem multidisciplinar e o apoio social. Foram selecionadas 41 publicações, sendo que 10 retratavam o tema traços psicológicos preditores de lesão, 15 a reação frente à lesão e 19 identificavam as principais técnicas de intervenção psicológica, abordagem multidisciplinar e o apoio social. Encontrou-se que dois dos principais traços psicológicos preditores de lesão são a exacerbação do estresse e da ansiedade frente aos eventos internos e externos ao ambiente esportivo. Além disso, diante da lesão, o atleta tende a ter uma negação inicial da lesão e com o tempo de acordo com o suporte recebido e sua personalidade pode agir de diferentes formas na recuperação. Algumas técnicas têm sido descritas como relevantes para a intervenção psicológica, entretanto, ainda é necessária uma melhor capacitação nesta área para os profissionais envolvidos na recuperação, bem como a aproximação e interação destes com psicólogos do esporte. © Cien. Cogn. 2013; Vol. 18 (1): 070-088.
Palavras-chave: lesões atléticas, psicologia, apoio social, estresse psicológico, intervenção.
Abstract
Nowadays new alternatives and interventions are being searched to deal with injuries suffered by athletes. This review study purposed to evaluate the studies published between the years 2002 until 2012 about the psychological predictors traces of injuries, the reaction facing a injury, the main techniques of psychological interventions, the multidisciplinary approach and the social support. It was selected 41 publications, 10 that approach the psychological predictors' traces theme, 15 the reaction facing an injury and 19 about the main techniques of psychological intervention, multidisciplinary approach and social support. It was found that the most predictors of injuries are the stress and anxiety exacerbation dealing with internal and external events in the sportive environment. Besides, facing an injury, the athlete leans to have an initial denial and with time accordingly with the support received and its personality, he/she can act in different ways in recuperation period. Some techniques are described as relevant to psychological intervention, however it is necessary a better preparation of the professionals involved in the recuperation, as a greater proximity and interaction between athletes and sport psychologists. © Cien. Cogn. 2013; Vol. 18 (1): 070-088.
Keywords: athletic injuries, psychology, support social, stress psychological, intervention.
Introdução
Diversas vertentes têm sido incorporadas pela psicologia do esporte, dentre as de maior importância destaca-se uma das que tem sido tratada com muita relevância que é a psicologia do esporte na prevenção e nos processos de reabilitação, uma vez que o alto nível de exigência do treinamento e da atuação dos atletas podem contribuir para o surgimento de lesões. A psicologia do esporte tem papel importante de auxiliar na recuperação do atleta como um todo, principalmente no bem-estar psicológico (Weinberg & Gould, 2008).
Um passo importante é partir do entendimento do atleta sobre os acontecimentos, como a compreensão dos mecanismos de lesão, conhecimento do tipo de intervenção e tratamento que deverá ser realizado, além de escutá-lo quanto à sua responsabilidade, medos e inseguranças sobre a lesão, tratamento e a reabilitação (Samulski, 2009). O diagnóstico através das informações coletadas e percebidas no cotidiano na busca da definição da melhor forma de trabalhar com este atleta é responsabilidade de toda equipe, bem como a transmissão das informações a respeito da situação vivenciada por ele e de como ocorrerá o processo de recuperação.
Segundo Samulski (2009), é importante que os treinadores tenham um conjunto de informações para a avaliação do ajuste psicológico do atleta após uma lesão. Ele sugere a divisão em duas partes, sendo a primeira de observação sobre fatores situacionais e pessoais relacionados à dificuldade de adaptação à lesão, como o porquê de uma possível falta de envolvimento com a reabilitação; a baixa capacidade mental após o retorno à atividade física; recaídas na reabilitação; incapacidade de melhorar a habilidade física; tristeza e apatia; nervosismo frequente; medo excessivo; despreocupação com a lesão e dor. Já na segunda parte chamada de atencional, é necessário que o treinador se atente para informações que podem passar despercebidas no início do processo e consequentemente interferir na recuperação, como problemas pessoais no esporte, em casa, na escola e com amigos; dor de cabeça, sono e dores estomacais; metas de desempenho; preocupação com o tempo perdido e a reação de técnicos ou colegas.
Durante a prática esportiva, o atleta convive com elementos cognitivos e fisiológicos, experimentando respostas diferenciadas ao conviver com situações de estresse. Essas respostas podem produzir efeitos positivos diante de sensações de desafio, bem como sensações negativas, como ansiedade e desconforto. Tais sensações podem ampliar de forma exagerada o campo de atenção e produzir alterações fisiológicas como aumento de estresse e aumento da ativação do sistema nervoso simpático (Samulski, 2009).
Todas as alterações geradas podem fazer com que o atleta esteja mais suscetível ao aumento generalizado da tensão muscular, tenha redução do seu campo visual e fique mais distraído. Estes eventos podem ser preditores de lesão e aumentar o risco de entorses, fraturas e estiramentos devido à redução de flexibilidade, coordenação e eficiência musculares, além da má execução do movimento por causa da possibilidade de distração. Além disso, outros fatores podem contribuir para elevar o risco de lesão, como antecedentes de lesão no exercício, as características de personalidade e alterações de níveis de estresse (Weinberg & Gould, 2008).
Uma vez que tenha ocorrido a lesão, a psicologia do esporte preocupa-se em estudar e entender a reação do atleta durante todo o processo de recuperação para que medidas efetivas sejam tomadas. De acordo com Samulski (2009), o atleta imediatamente após sofrer a lesão tende a entrar em uma fase de negação, não acreditando que aquela situação tenha acontecido exatamente com ele e não dá a importância devida à situação. Quando compreende a seriedade do acontecimento, pode tornar-se agressivo, com emoções oscilantes, sentir-se com medo e se isolar e posteriormente entrar em um período de tentativa de negociar com si próprio, com a intenção de reabilitar-se mais rapidamente (Weinberg & Gould, 2008).
Levando-se em consideração que a cada dia que se passa, a psicologia do esporte tem se inserido mais nos processos de reabilitação esportiva, almejou-se como objetivo principal deste estudo verificar a produção científica nos últimos anos acerca dos processos de lesão e reabilitação a partir de uma visão da psicologia do esporte. Este estudo teve como objetivos específicos: verificar os traços psicológicos preditores de lesão; as reações psicológicas frente à lesão esportiva; identificar as principais técnicas de intervenção psicológica utilizadas e como tem sido descritos a abordagem multidisciplinar e o apoio social nos últimos anos.
Metodologia
Realizou-se uma revisão bibliográfica, abrangendo publicações do ano de 2002 a 2012. A busca foi realizada a partir de artigos científicos indexados na base de dados Pubmed e dissertações e teses disponíveis no portal da Capes. A definição dos descritores foi feita pela consulta aos descritores da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS). Inicialmente, houve uma busca mais ampla com os descritores lesões atléticas e psicologia tanto no Pubmed como no acervo de dissertações e teses do portal da Capes. Como o portal da Capes forneceu apenas resumos dos estudos, utilizou-se um buscador eletrônico como ferramenta para que os trabalhos fossem encontrados a partir de seus títulos. Posteriormente a busca foi refinada apenas no Pubmed, com os termos "lesões atléticas e apoio social", "lesões atléticas e estresse psicológico" e, por último, "lesões atléticas com intervenção" e "psicologia", totalizando quatro buscas. Foram excluídas das buscas as publicações do tipo revisão de literatura, tendo em vista que o presente estudo teve a intenção de revisar os artigos científicos, dissertações e teses.
Todo o material coletado, necessariamente, relacionou a psicologia do esporte às lesões atléticas. Este foi dividido em três tópicos: o primeiro foi Traços Psicológicos Preditores de Lesão (TPPL), o segundo sobre as Reações dos Atletas Lesionados (RAL) e por último um tópico maior que abrangeu as Técnicas de Intervenção Psicológicas, a Abordagem Multidisciplinar e o Apoio Social (TIPAMAS). Foi determinado que um mesmo artigo poderia ser classificado em uma ou mais categorias, de acordo com o número de assuntos utilizados na discussão.
Resultados
Da busca realizada por dissertações e teses do portal da Capes, foram incluídas três dissertações: Mannrich (2007), Rossi (2011) e Pesca (2004).
Na primeira busca no Pubmed, que envolvia os descritores "lesões atléticas" e "psicologia", foi gerado como resultado 596 artigos. Restringindo a busca a partir de 2002 restaram 357 e tendo relação com o tema da presente revisão somente 37 publicações. Nas buscas seguintes, foram desconsideradas as publicações que já tinham sido encontradas na primeira. Sendo assim foi incluído um artigo fruto da segunda busca. Desta forma, foram selecionadas 41 publicações (Tabela 1), sendo que 10 delas continham o assunto traços psicológicos preditores de lesão (24%); 15 com reações do atleta lesionado (37%) e 19 com técnicas de intervenção psicológica, abordagem multidisciplinar e o apoio social (46%).
ESTUDO | ASSUNTOS | TOTAL |
Galambos et al. (2005) | (TPPL) | Traços psicológicos preditores de lesão 10 publicações (TPPL) (24%) |
Team Physician Consensus Statement (2006) | (TPPL), (RAL), (TIPAMAS) | |
Mannrich (2007) | (TPPL) | |
Osborn et al. (2009) | (TPPL) | |
Steffen et al. (2009) | (TPPL) | |
Vetter & Symonds (2010) | (TPPL) | |
Johnson & Ivarsson (2011) | (TPPL) | |
Rossi (2011) | (TPPL) | |
Wadey et al. (2012) | (TPPL) | |
van Wilgen & Verhagen (2012) | (TPPL) | |
Manuel et al. (2002) | (RAL) | Reações do atleta lesionado (RAL) 15 publicações (37%) |
Kvist et al. (2005) | (RAL) | |
Arvinen-Barrow et al. (2007) | (RAL) | |
Thatcher et al. (2007) | (RAL) | |
Appaneal et al. (2009) | (RAL) | |
Langford et al. (2009) | (RAL) | |
Webster et al. (2009) | (RAL) | |
Carson & Polman (2010) | (RAL) | |
Grindstaff et al. (2010) | (RAL) | |
Podlog & Eklund (2010) | (RAL) | |
van Wilgen et al. (2010) | (RAL) | |
Day & Schubert (2012) | (RAL) | |
Evans et al. (2012) | (RAL) | |
Hemmings & Povey (2002) | (TIPAMAS), (RAL) | Técnicas de intervenção psicológica, abordagem multidisciplinar e apoio social (TIPAMAS) 19 publicações (46%) |
Perna et al. (2003) | (TIPAMAS) | |
Pesca (2004) | (TIPAMAS) | |
Mann et al. (2007) | (TIPAMAS) | |
Arvinen-Barrow et al. (2008) | (TIPAMAS) | |
Hamson-Utley et al. (2008) | (TIPAMAS) | |
Lafferty et al. (2008) | (TIPAMAS) | |
Levy et al, (2008) | (TIPAMAS) | |
Tracey (2008) | (TIPAMAS) | |
Monsma et al. (2009) | (TIPAMAS) | |
Stiller-Ostrowski et al. (2009) | (TIPAMAS) | |
Valovich McLeod et al. (2009) | (TIPAMAS) | |
Mankad e Gordon (2010) | (TIPAMAS) | |
Podlog & Dionigi (2010) | (TIPAMAS) | |
Yang et al. (2010) | (TIPAMAS) | |
Clement e Shannon (2011) | (TIPAMAS) | |
Judge et al. (2012) | (TIPAMAS) | |
Marshall et al. (2012) | (TIPAMAS) |
Tabela 1. Relação dos estudos por assunto (continuação.
Discussão
Traços psicológicos preditores de lesão
O aumento do estresse ocorre principalmente quando as demandas de uma situação excedem os recursos para responder a essas exigências. Este aumento dentro ou fora do seu espaço de trabalho pode interferir no desempenho e provocar lesões em atletas, pois o estresse é capaz de provocar alterações de atenção, como por exemplo, o estreitamento da atenção, distração geral e aumento da autoconsciência (Team Physician Consensus Statement, 2006).
Alguns autores investigaram em 85 atletas de futebol do sexo masculino e 23 do sexo feminino, com faixa de idade entre 17 e 19 anos, durante o período de oito meses, possíveis causas para uma maior chance de ocorrer lesão. Após a aplicação de questionários, encontraram resultados significativos caracterizando que os atletas que sofreram lesões tinham mais tendência a ter maiores traços de ansiedade e que eventos estressores da vida como: deixar sua casa, a pressão dos pais para um bom desempenho na escola e no esporte, a construção de redes sociais em jovens e, para os mais velhos, a construção de relacionamentos e o planejamento para o desenvolvimento de carreiras futuras, poderiam também ser outros fatores que os predispunham à lesão. Ainda citam que estes fatores podem gerar redução na concentração, atenção e no foco durante a prática esportiva, o que poderia justificar essa maior probabilidade de lesão (Johnson & Ivarsson, 2011).
Já em um ensaio clínico randomizado envolvendo jogadoras de futebol, com média de idade de 15,4 anos, já envolvidas com o esporte em média há cinco anos durante uma temporada de atividades, foi possível calcular um risco de 70% maior de chances de lesão em jogadoras com maior nível de estresse em comparação com as de menores níveis. E este achado deve ser levado em consideração porque o estresse pode contribuir para a interrupção da concentração e, por essa razão, ser percebido negativamente. Além disso, eles indicaram que a idade da amostra estudada tende a ter um maior nível de estresse, devido à coincidência com possíveis mudanças de escola, o acesso ao Ensino Médio e também por sofrer com a pressão para obter marcas (Steffen, Pensgaard & Bahr, 2009).
Galambos, Terry, Moyle & Locke (2005) revelaram que raiva, confusão, fadiga, depressão e tensão são preditores para a lesão e podem estar aumentados devido a algum evento estressor e que estes não são diferentes entre o sexo feminino e masculino. De fato, sabe-se que eventos da vida em geral como morte na família, divórcio, mudanças de relacionamentos, transições da vida, dentre outros, podem predispor o atleta a maiores chances de lesão se realmente estes eventos surtirem como estressores e distratores (Team Physician Consensus Statement, 2006).
Tanto atletas quanto treinadores também têm relacionado a lesão não somente a fatores físicos, mas também a sociais e psicológicos. Eles afirmaram que não somente programas de prevenção a partir dos métodos de treinamento devem ser incorporados, mas também estratégias que consigam monitorar fatores comportamentais como dor, fadiga e estresse (van Wilgen & Verhagen, 2012).
Visando justamente uma forma de monitorar o estresse é que Mannrich (2007), ao estudar atletas de futebol, encontrou um importante meio de medir e controlar os níveis de estresse. Foi percebido que a evidência de alguns marcadores bioquímicos ocorreu de modo concomitante ao aumento do estresse. Dessa forma, este estudo revelou que a mensuração contínua desses marcadores pode ser uma forma efetiva no gerenciamento e controle do estresse ao longo da temporada, evitando-se possíveis lesões e preservando os atletas. Outro indicativo de lesão é o esgotamento mental e já se sabe que o melhor controle da intensidade e do volume do treinamento pode reduzir as possibilidades de um excesso de treinamento e a ocorrência de lesões (Vetter & Symonds, 2010; Rossi, 2011).
Outras características não menos relevantes devem ser consideradas, como o temperamento e a personalidade do atleta. Tem sido relatado que atletas aventureiros, em busca de novas sensações, como por exemplo, a de não utilizar equipamentos de proteção, têm maiores riscos de sofrer lesões (Osborn, Blanton & Schwebel, 2009).
Já Wadey, Evans, Hanton & Neil (2012), quando investigaram uma amostra total de 694 atletas, perceberam que dentre eles existem indivíduos que são mais resistentes e menos suscetíveis a sofrer uma lesão diante dos eventos estressores da vida. Além disso, quando estes sofreram lesão por algum outro motivo que não por um estressor da vida, como, por exemplo, pela fadiga ou utilização de técnica inadequada, tiveram uma recuperação mais rápida. Os autores relacionaram este fato à maior capacidade de focar o problema e enfrentá-lo, maior confiança e força mental. Por esse e outros motivos para descrever os preditores psicológicos de lesão em atletas deve-se levar em consideração a individualidade de cada um.
Reações do atleta lesionado
A lesão faz com que o atleta fique afastado de sua atividade esportiva por algum tempo, às vezes muito mais do que o previsto inicialmente ou que gostaria. Quando isto acontece, somada a maior compreensão da seriedade da sua lesão, o atleta pode entrar em um período de depressão até conseguir aceitar melhor a sua lesão e tornar-se definitivamente ativo e disposto para o processo de reabilitação e seu retorno ao esporte (Manuel et al., 2002; Appaneal, Levine, Perna & Roh, 2009). Todo esse processo pode demorar poucos dias, semanas ou até mesmo meses, dependendo das circunstâncias e do estado psicológico de cada indivíduo, além de gerar oscilações entre ganhos e perdas em quesitos psicológicos (Grindstaff, Wrisberg & Ross, 2010).
Segundo um grupo de fisioterapeutas, o estresse e a ansiedade eram as reações mais predominantes. Também relataram uma série de fatores relacionados a atletas com dificuldade de lidar com a lesão, que foram principalmente: o descumprimento com o programa de reabilitação, impaciência e pouca motivação (Hemmings & Povey, 2002).
Curiosamente, van Wilgen, Kaptein & Brink (2010), ao estudar atletas com uma idade de 30 anos em média, praticantes de vários esportes, verificaram uma elevada controlabilidade psicológica com relação à lesão em sua amostra, que pode estar ligada a resultados adaptativos. Todavia, questionaram se realmente estes acreditavam que a lesão não tinha lhes causado forte representação emocional ou se era uma forma de negar a lesão. Eles ainda citaram dois sintomas importantes de serem observados e monitorados, que são: a dor e a fadiga. O primeiro tendendo a estar mais aumentado em mulheres quando comparado a homens e o segundo, maior em indivíduos com estado de humor negativo e com maior tensão.
Na verdade, a tendência é que após a lesão, inicialmente, sejam maiores os componentes mal adaptativos e as dificuldades de enfrentamento. São necessárias mudanças de hábitos diários para que o atleta possa reagir melhor à nova situação, buscando atividades alternativas, como por exemplo, um novo hobby, ter aulas de línguas, evitar a todo o momento citar fatos relacionados à lesão e que recorde a situação vivida e ao fato de não estar junto da equipe nas partidas. Enfim, para um adequado enfretamento da lesão, são necessárias todas essas modificações para que o atleta possa evoluir da melhor forma e vencer sentimentos como o de perda, depressão, frustração e diminuição de autoestima(Carson & Polman, 2010; Grindstaff et al., 2010).
Além do estresse, emocionalmente, reações como tristeza, isolamento por frustração, irritação, falta de motivação, raiva, alterações de apetite, distúrbios do sono, aumento da ansiedade, perda de identidade e da confiança são algumas das reações comuns que podem ocorrer durante todo o processo do momento da lesão até a fase de retorno ao esporte. Para muitos, a atividade física é um mecanismo de enfrentamento de problemas da vida e por essa razão, a lesão ainda pode repercutir como um maior abalo (Team Physician Consensus Statement, 2006).
Adicionalmente, a forma como a informação passada pelo médico será interpretada pelo atleta sobre sua lesão poderá interferir na sua resposta e por este motivo deve ser evidenciada com cautela e haver uma educação das pessoas ao redor para evitar imprecisões e atrapalhar em todo o processo (Team Physician Consensus Statement, 2006). Esse gerenciamento de informações pode ser relevante para o atleta que detém medo de uma recidiva da lesão. Kvist, Ek,Sporrstedt & Good (2005) verificaram em 62 atletas com lesão de ligamento cruzado anterior, se os mesmos voltariam a realizar suas atividades nos níveis de pré-lesão. E um dado relevante é que após a reconstrução do ligamento e a reabilitação cerca de metade da amostra retornou aos níveis de pré-lesão, entretanto, o restante não foi capaz e ficou limitado por causa do medo de recidiva da lesão, de acordo com os resultados da escala de cinesiofobia.
Em ginastas também foi revelado este aumento do medo, descrença e ansiedade, com náuseas e agitação, principalmente após as primeiras 48 horas. Relataram que o fato de terem vivenciado uma lesão, fez com que tivessem mais pensamentos intrusivos recorrentes da lesão e dificuldades de concentração. Dessa forma, o medo de reviver a lesão, a princípio, tornaram mais cautelosas, precavendo-as de algumas habilidades que antes da lesão eram comumente executadas (Day & Schubert, 2012). Entretanto, independente da preocupação com a reincidência da lesão, tem sido demonstrado de forma relevante o desejo do retorno ao esporte por parte dos atletas (Podlog & Eklund, 2010).
Além disso, Langford, Webster & Feller (2009) identificaram em atletas de 18 a 40 anos, que quanto mais próximos do retorno, menores emoções negativas eram sofridas e maior a motivação. E já se sabe que as alterações nos níveis de motivação são cruciais ao longo da recuperação para o retorno ao esporte, assim como maior confiança e um conjunto de modificações psicológicas (Thatcher, Kerr, Amies & Day, 2007; Webster, Feller & Lambros, 2008).
De uma forma geral, Evans, Wadey, Hanton e Mitchell (2012) tentaram simplificar a reação dos atletas em três fases, sendo a primeira classificada como imediatamente após a lesão e o início da fisioterapia (entre 1 a 4 semanas), na qual é evidenciada por um maior número de estressores, ligados a demandas médicas/físicas como a incapacidade de realizar tarefas todos os dias, a perda dos atributos físicos como força por não ter como treinar e a subestimação de diagnósticos; relacionados à demanda dos esportes, como a perda de oportunidades como contratos e a disputa de campeonatos importantes que sirvam de valorização; vinculados à demandas sociais, pois a lesão gera dependência na realização de atividades de vida diária e comparação social com outros atletas que não sofreram a lesão e estão progredindo em suas carreiras e por último, os custos financeiros.
A segunda fase, descrita como a reabilitação (6 a 24 semanas), também possui estressores médicos/físicos. Para alguns, pode ser marcada como frustrante e com desconfiança em relação ao tratamento executado, quanto à eficiência deste e do profissional que o propõe; ligados às demandas do esporte, em que o principal receio encontrado é o de não conseguir retornar ao esporte no mesmo nível de antes da lesão; relacionado às exigências sociais como a pressão dos pais e da equipe para seu retorno, além da comparação com atletas que por não estarem lesados estavam os substituindo, ganhando os seus respectivos lugares na equipe ou ganhando melhores contratos profissionais; e, por último, os gastos financeiros gerados pelo tempo durante a recuperação para aqueles que não recebem apoio da equipe ou familiar (Evans et. al, 2012).
Por fim, a terceira fase, marcada pelo retorno ao esporte, é a que Evans et. al (2012) identificaram como a menos estressante, e essa está relacionada ao medo de recidiva da lesão e mais cautela na respectiva atividade esportiva e pressão interna/externa para que retorne ao alto nível mais rapidamente, já que esta etapa é marcada por uma etapa de volta ao ritmo. Além das três fases, os autores diferenciaram os grupos de atletas e viram que os que estão integrados às equipes tendiam a ter mais estressores ligados a perda de contratos profissionais e de chances de disputar campeonatos, além de serem mais comparados a outros colegas de trabalho.
Para que se obtenha o sucesso na recuperação, alguns fisioterapeutas do Reino Unido citam que existem características cruciais para obter o sucesso na recuperação, enquanto outras devem ser deixadas de lado. Estas são a baixa frequência e a não conformidade com o programa de reabilitação, depressão, impaciência ansiedade, atitudes negativas para com a lesão, raiva, metas e expectativas irrealistas, estresse e exercício extra. Enquanto isso listam como fórmula para o sucesso a boa frequência na reabilitação, atitudes positivas para com a lesão, a conformidade com o tratamento da lesão, expectativas realistas, motivação, paciência com ele mesmo e com os outros, determinação, segurança e confiança no terapeuta (Arvinen-Barrow, Hemmings, Weigand, Becker & Booth, 2007). Para gerir essas características positivas é necessário que se faça o acompanhamento do atleta por parte da equipe médica, apoio social e a utilização de técnicas psicológicas adequadas de acordo com a etapa que o atleta se encontra, como serão relatados no tópico abaixo.
Técnicas de intervenção psicológica, abordagem multidisciplinar e o apoio social
O médico é o primeiro profissional a ter contato com o atleta após a lesão, sendo assim torna-se necessário que este faça um controle não somente dos problemas físicos encontrados perante a lesão do atleta, mas também dos aspectos psicológicos em conjunto com a rede social a qual ele esteja inserido, como outros atletas, pais, amigos e outros, educando-os da forma adequada para evitar que mais turbulências ocorram (Team Physician Consensus Statement, 2006).
Ademais, junto com o treinador recomenda-se que os médicos encaminhem os atletas com problemas emocionais para um profissional da saúde licenciado em saúde mental, de preferência que tenha experiência com atletas. Contudo, alguns obstáculos podem surgir como apreensão geral, preocupações com a confidencialidade, a percepção dos outros, medo de sintomas reveladores e incompreensão da necessidade deste acompanhamento. Por isto é necessário ressaltar a educação por parte dos atletas quanto à importância da terapia (Team Physician Consensus Statement, 2006).
No início da reabilitação, é preciso criar condições para melhorar o comportamento e a adesão do atleta. Para isto, o atleta lesionado deve conhecer sobre a severidade da situação, além de ser orientado sobre a utilização de metas, ser estimulado a atitudes favoráveis no processo de reabilitação e ser encorajado a enfrentar situações adversas (Levy, Polman & Clough, 2008).
Conforme proposto por Mendelsohn (1999, apud Pesca, 2004), o processo de intervenção pós-lesão divide-se em duas etapas: a fase de imobilização e a fase de mobilização.
Assim, a primeira fase, a de imobilização, é marcada por um grande conflito para o atleta, com muita dor e negativismo acerca de sua recuperação. É importante que se utilize estratégias que sejam úteis no controle da ansiedade e para o pensamento positivo. As técnicas recomendadas são: habilidade de comunicação, técnicas de relaxamento, técnicas de visualização e estabelecimento de metas (Mendelsohn, 1999 apud Pesca, 2004).
Já a segunda fase, a de mobilização, é considerada a fase de início da sua recuperação nos níveis funcionais motores, consiste em três momentos, sendo o primeiro de recuperação, no qual devem ser utilizadas estratégias para conter períodos de estresse, alimentando níveis de motivação para que o processo de reabilitação desenvolva adequadamente. Neste momento, é sugerida a utilização de técnicas de habilidade de comunicação, técnicas de relaxamento e visualização e estabelecimento de metas (Mendelsohn, 1999 apud Pesca, 2004).
No segundo momento, caracterizado como de readaptação, no qual ocorre uma melhora da qualidade física do atleta após o período traumático, são recomendadas técnicas de visualização, estabelecimento de metas e diálogo interno. Por último, quando o atleta retorna aos treinamentos do esporte e dá início ao trabalho de habilidades esportivas não realizadas há algum tempo, por causa do seu afastamento temporário, é recomendada a utilização das técnicas de habilidade de comunicação, visualização para volta ao campo e estabelecimento de metas. Além disso, o atleta aos poucos deve ir perdendo o medo do risco de fracassar e sua carga de treinamento deve ser estendida junto aos de seus colegas de equipe de acordo com sua progressão (Mendelsohn, 1999, apud Pesca, 2004).
Algumas dessas técnicas da psicologia têm sido descritas: a técnica de relaxamento progressivo de Jacobson, que consiste na contração de musculaturas solicitadas verbalmente por 10 segundos seguida de relaxamento das mesmas; a técnica de visualização/mentalização, que é utilizada como auxiliar para superação de problemas na atividade esportiva e fora dela, através principalmente da visualização programada, onde o atleta cria uma imagem cheia de paisagem, sabores, sons e aromas, além de pensar em uma meta a alcançar ou na aceleração da sua cura (Pesca, 2004).
A utilização da visualização de imagens foi testada e aqueles que experimentaram a utilização de imagens negativas às imagens positivas demoraram maior tempo para retornar às suas atividades. Segundo os autores, de fato após a lesão existe uma tendência à utilização de imagens que são prejudiciais à recuperação e que o papel de instrução e orientação quanto à utilização de imagens positivas, como as motivacionais, faz parte da tarefa dos treinadores. Além disso, é necessário cuidado no gerenciamento desta técnica, tendo em vista que dependendo da forma como é aplicada, pode aumentar a ansiedade, evento que também está diretamente ligado com a gravidade da lesão e pode prolongar o tempo de recuperação (Monsma, Mensch e Farroll, 2009).
Outros estudos também revelaram a importância da definição de metas. Esta pode ser trabalhada através do relato do atleta acerca das metas já atingidas na sua vida profissional e suas qualidades, e através disso o próprio atleta junto com a equipe de tratamento deverá traçar metas de curto, médio e longo prazo de acordo com a realidade e fases do seu processo de reabilitação. Estas devem ser reavaliadas de acordo com a evolução na reabilitação, para que uma meta em curto prazo, por exemplo, não exerça demasiada pressão, gere mais insegurança, incertezas e frustrações ao atleta (Pesca, 2004; Podlog & Dionigi 2010).
Outra não menos comum, a técnica de respiração profunda de Lindemann, para ser realizada é necessário que haja concentração na respiração durante todo o exercício, com pensamentos positivos durante a fase de inspiração e negativos na expiração, como se estivesse eliminando-os. (Pesca, 2004).
Um pouco diferente das que foram citadas anteriormente, Mankad & Gordon (2010) descreveram uma técnica que utilizava da escrita como estratégia de alívio das emoções negativas trazidas pela lesão. Para isso, os atletas que participaram do estudo tiveram 5 minutos para pensar sobre a experiência da lesão e posteriormente tiveram 20 minutos para escrever continuamente, sem preocupar-se com a ortografia, gramática ou estrutura da frase, para descrever essa experiência de forma profunda, tendo como foco as emoções negativas e que não haviam sido discutidas com outras pessoas. Este procedimento ainda foi realizado uma vez no dia durante três dias. Como resultado, foram identificados redução da dor, da aflição, do sentimento de perda e do sentimento de inquietação (mobilidade restrita). Segundo os autores, no último dia as narrativas estavam escritas de forma mais organizada e que, possivelmente, além de incentivar o otimismo nos atletas, ajudaram-lhes a compreender melhor a sua experiência, atenuando respostas relacionadas à tristeza.
A comparação de atletas que sofreram por lesão semelhante e obtiveram sucesso pode ser outro mecanismo de elevar a autoestima do atleta em recuperação. Podlog & Dionigi (2010) sugerem que se possível, o atleta lesionado e o que está passando por situação parecida, conversem entre eles, para que toquem em pontos como as dificuldades e desafios enfrentados, falem sobre altos e baixos, expectativas e o que se esperar do futuro. Esta interação traz exemplos positivos que podem gerar um retorno bem sucedido, além de proporcionar apoio emocional e informações sobre lidar com desafios ligados às lesões (Podlog & Dionigi, 2010).
A partir de técnicas já descritas, Pesca (2004) desenvolveu um protocolo com o objetivo de testar se a intervenção psicológica (técnica de relaxamento progressivo, estabelecimento de metas, visualização e respiração profunda) era eficiente quando realizada de forma interdisciplinar entre uma psicóloga e um fisioterapeuta que auxiliavam na recuperação da lesão de três atletas de futebol com idade entre 17 e 22 anos. Após o conhecimento de todo o processo de lesão do atleta e de sua avaliação, a psicóloga deu início à sua intervenção que era realizada após as sessões de fisioterapia, na fase da crioterapia (aplicação do gelo). O protocolo de cada sessão consistia na técnica de relaxamento progressivo (grupos musculares diferentes por dia), seguida da técnica de visualização (de acordo com as informações trazidas pelo atleta no dia, como por exemplo, o sentimento de dor), intercalando com a técnica de respiração profunda por 15 minutos, durante três vezes por semana no período vespertino (no primeiro momento, início de sua recuperação) e posteriormente duas vezes por semana sendo intercaladas com a aplicação da técnica de estabelecimento de metas que em seguida passou a ser aplicada uma vez por semana, passado o período crítico.
Pesca (2004) utilizou os questionários validados IDATE, que analisam o grau de ansiedade e o stress adulto que verifica o grau de estresse, além de questionários semiestruturados com perguntas sobre a satisfação com o tratamento. Como resultados, este estudo apresentou redução do tempo de recuperação de um dos atletas e tempo mínimo de recuperação para o outro; empatia e satisfação por parte dos atletas no trabalho interdisciplinar entre psicólogo e fisioterapeuta; constatação da diminuição da ansiedade e aumento de confiança, além da diminuição do estresse de um dos atletas que o apresentava em maior grau. No entanto, este estudo contou com uma pequena amostra e a parte da avaliação sobre a satisfação com o tratamento pode ser um viés, se for pensado que os atletas poderiam ter respondido como forma de agradecimento ao tratamento proposto.
A psicologia do esporte voltada para área também pode atuar de forma preventiva. Trinta e quatro remadores da equipe júnior de uma universidade foram divididos em dois grupos (experimental e controle) e participaram de um programa de estudos de técnicas de psicologia do esporte na pré-temporada. O programa foi ministrado por um psicólogo e uma estagiária de psicologia e consistiu em sete sessões (três semanas com duas sessões e a quarta com uma sessão, todas com duração de 35 a 40 minutos), onde foram realizadas as partes da informação didática, da experimental e uma lição para a casa (Perna, Antoni, Baum, Gordon & Schneiderman, 2003). Nas duas primeiras sessões foram transmitidas informações a respeito da eficácia da intervenção sobre o alívio psiquíco e melhora do rendimento esportivo. Já as técnicas ensinadas foram de relaxamento muscular progressivo e exercícios de respiração diafragmática nas três primeiras sessões e técnicas baseadas na cognição (por exemplo, visualização da ação motora, imagem emotiva e reestruturação cognitiva) nas últimas quatro sessões. Como resultado, foi encontrada a redução do número de lesões no grupo experimental, além da redução pela metade dos atendimentos em serviços de saúde em comparação ao grupo controle, sendo sugerido pelos autores que a intervenção pode ter sido importante no controle do estresse, diminuindo a quantidade de lesões (Perna et al., 2003).
Uma vez conhecido os bons resultados encontrados pela utilização de técnicas psicológicas, também é necessário preocupar-se em manter uma estreita comunicação e participação de todos os profissionais envolvidos no processo de recuperação para que haja efetividade na reabilitação e no retorno ao esporte (Pesca, 2004).
Podlog & Dionigi (2010) entrevistaram oito treinadores (três mulheres e cinco homens) vinculados a um instituto que trabalha com alto desempenho em esportes e emprega uma gama de profissionais da área de ciências do esporte para desenvolver e promover atletas de talento de classe mundial. As entrevistas tiveram duração entre 1 e 2 horas e nestas os treinadores foram perguntados sobre os meios de tratamentos utilizados na recuperação psicológica em relação à lesão. Todos os treinadores tinham experiência média de 14 anos em trabalhar com atletas nível júnior nacional (18-20 anos), assim como também em auxiliá-los no processo de reabilitação e na fase de retorno ao esporte, apesar de nenhum deles ter formação em educação psicossocial.
Durante as entrevistas, os autores buscaram compreender a opinião dos treinadores com relação à importância da abordagem em equipe, principalmente com o fisioterapeuta, e este fator foi tratado como sendo necessário na definição do retorno do jogador ao esporte para evitar riscos de reincidência de lesão, principalmente porque os jogadores geralmente querem um retorno mais rápido do que o tempo previsto e apesar da necessidade de promover que o atleta sinta-se com autonomia, esta deve ser limitada de acordo com a sequência do tratamento proposto pela equipe multidisciplinar, prevenindo um retorno prematuro, e garantindo o desenvolvimento adequado da saúde, do bem estar físico e psicológico (Podlog & Dionigi, 2010).
Logo após a lesão, um dos profissionais da saúde que tem contato imediato e em consultas periódicas com o atleta-paciente é o médico. Dessa forma, Mann, Grana, Indelicato, O'Neill & George (2007) investigaram se os médicos utilizavam da discussão de aspectos psicológicos gerados pela lesão. De acordo com os médicos entrevistados, os assuntos mais frequentemente discutidos são o medo de uma recidiva da lesão, a falta de paciência com a recuperação/reabilitação, estresse, pressão, cansaço e ansiedade. Além disso, um dado importante encontrado é que os médicos cirurgiões ortopedistas relataram menor preocupação em promover discussões sobre aspectos psicológicos em comparação com outros médicos. Segundo os autores, isso se deve principalmente à alta especialização do médico cirurgião, a pressa para realizar novas cirurgias e à crença de que outros profissionais na equipe como o treinador, possam participar desse tipo de discussão. Não menos importante, um dado preocupante é que parte dos médicos relataram limitação em recursos que envolvessem as necessidades psicológicas dos atletas e outros que não tinham conhecimento de recursos na área.
Outro profissional com um contato bem próximo do atleta, principalmente após a lesão, é o fisioterapeuta e a sua postura e utilização de recursos durante o tratamento foram descritas em vários estudos (Arvinen-Barrow, Hemmings, Becker & Booth, 2008; Lafferty, Kenyon & Wright, 2008; Tracey, 2008; Marshall, Donovan-Hall & Ryall, 2012).
Hemmings & Povey (2002) avaliaram o relato de 90 fisioterapeutas com qualificação na área esportiva ou de psicologia que afirmaram fazer uso de uma variedade de habilidades psicológicas nos protocolos de tratamento como variação de exercícios, metas em curto prazo e auto-conversação positiva e utilizavam menos do apoio social, e de técnicas que visassem à redução da depressão e o ensino de estratégias de controle emocional. Contudo, afirmaram que ainda precisavam aprender mais sobre o assunto, principalmente tratando-se das técnicas de estabelecimento de metas realistas e motivação individual. Outro dado importante do estudo, é que somente menos de 10% deles já tiveram contato ou encaminharam seus pacientes para psicólogos do esporte. Os autores sugerem a necessidade de uma relação mais estreita entre fisioterapeuta e psicólogo do esporte para formação de técnicas de referência para um tratamento mais eficaz (Hemmings & Povey, 2002).
Além disso, é válido ser dito que a importância deste profissional na adesão do tratamento é crucial, uma vez que esta pode ser reduzida caso não haja estímulo e apoio social por parte do profissional, prescrição de exercícios inadequados e sem direcionamento com alta complexidade, que possam deixar o atleta perdido e ansioso ao realizar, monótonos e em excesso que dificulte o gerenciamento por parte do atleta. Estes também relataram que a realização de exercícios em casa, sem interação social, é uma situação desagradável, pois tende a deixá-los ainda mais deprimidos pela falta do convívio social. Não obstante, a falta de confiança no fisioterapeuta e o fato deste comunicar a evolução do tratamento diretamente com o treinador dos atletas ao invés de com os próprios, tornando-os membros ativos do tratamento, também pode reduzir a adesão (Marshall et al., 2012).
Segundo os atletas, para que a adesão se eleve, é importante que os fisioterapeutas tenham o hábito de explicar os motivos para a utilização de determinado tratamento, melhorando a compreensão do atleta sobre a lesão; sejam interessados em entender a situação em questão, mais sobre o esporte e a rotina que ele levava antes da lesão, utilizem mais dos aspectos motivadores; mantenham um tratamento regular, para que sirva de reforço e lembrete ao atleta; deem feedback regulares sobre sua evolução, dentre outros (Marshall et al., 2012).
Em contrapartida, Tracey (2008), ao entrevistar fisioterapeutas e treinadores verificou a percepção destes profissionais sobre a recuperação psicológica dos seus clientes atletas. Eles acreditavam serem influenciadores na recuperação de atletas, principalmente pela proximidade e afirmaram que poderiam contribuir diretamente na educação e no entendimento por parte do atleta de sua lesão de forma simples, inclusive através de livros e desenhos se necessário, o que segundo eles, é muito bem visto pelos atletas. Além disso, creditaram importância da sua classe profissional importância no apoio social e na redução do medo, ao transmitir confiança a esses atletas lesionados.
Um dado importante encontrado por Lafferty et al. (2008), é que mesmo dentro da classe dos fisioterapeutas não é difícil encontrar diferenças. Isto porque, quando entrevistaram fisioterapeutas não vinculados a clubes e os vinculados, identificaram que estes apesar de preocuparem com outros fatores psicológicos, tinham como foco do seu tratamento a utilização de metas em curto prazo, uma vez que a pressão interna e externa para o retorno do atleta era maior. Já os fisioterapeutas não vinculados declararam maior utilização do apoio social e preocupação com a redução da depressão, estresse e ansiedade e talvez um motivo seja que estes estivessem mais expostos a um amplo ambiente clinico de tratamento, levando-os a ter uma maior preocupação com esses fatores.
Para obter melhores resultados em seus atendimentos, um grupo de fisioterapeutas, quando entrevistados demonstraram o interesse em aprender novas técnicas psicológicas. Para estes, o ideal era que os cursos fossem ministrados em locais próximos ao qual residem, sendo principalmente em forma de workshop e seminários, retratando sobre intervenções psicológicas gerais que os ajudassem a identificar preditores de lesão e também pudessem auxiliá-los no momento da reabilitação. A técnica mais buscada por eles era a de traçar metas, pois sentiam necessidade de melhorar o conhecimento quanto a traçar metas realistas (Arvinen-Barrow et al., 2008).
Tendo em vista, que de fato existe uma falta de programas que oportunizem o aprendizado de técnicas psicológicas para profissionais da saúde em geral, é importante entender qual seria o impacto de um se aplicado. Dessa forma Stiller-Ostrowski, Gould & Covassin (2009), avaliaram a efetividade de um programa de ensino no aumento do conhecimento de preparadores físicos de estudantes atletas sobre a intervenção por meio de habilidades psicológicas em lesões. O programa de ensino consistiu em um curso de seis semanas dividido da seguinte forma: as três primeiras semanas com duas horas-aula por semana nas quais ensinaram sobre a comunicação na sala de treinamento, técnicas que facilitariam o cumprimento da reabilitação, estratégias de motivação e introdução ao treinamento de habilidades psicológicas e outras três semanas com 30 minutos semanais de seminários com revisão dos temas e discussão do que colocaram em prática em relação ao que tinham aprendido na última semana e troca de experiência. Após o término do curso, quando comparado ao grupo controle que não havia feito o curso, o grupo de intervenção aumentou seus conhecimentos a respeito da aplicação da psicologia em lesões em relação ao início do curso. Este resultado é relevante, visto que diante de um curso de curta duração, profissionais envolvidos com estudantes atletas que podem conviver com lesões foram capazes de aprender técnicas de psicologia que facilitam o processo de reabilitação. Talvez este estudo seja um modelo inicial para uma proposta ainda maior, com o ensino de mais técnicas e instrumentos que possam ser utilizados pela equipe de saúde, intensificando a aprendizagem.
Devido a todos os benefícios já citados anteriormente, as técnicas de intervenção psicológica têm sido cada vez mais buscadas, utilizadas e exigidas no processo de reabilitação de atletas lesionados por fisioterapeutas e preparadores físicos. De acordo com os autores algumas técnicas mais buscadas: mentalização, autoconversação positiva, estabelecimento de metas e técnicas de tolerância à dor para melhorar a adesão e acelerar a recuperação de atletas. Eles perceberam que os profissionais da amostra com formação adicional ou com interesse em ter essa formação adicional tinham mais atitudes positivas na utilização destas técnicas. Eles identificaram que existe um grande interesse na aquisição de conhecimentos e habilidades necessárias para fazer uso dessas técnicas. No entanto, reconheceram que as oportunidades educacionais não são abundantes e que é necessária a aquisição desses conhecimentos através de uma educação continuada (Hamson-Utley, Martin & Walters, 2008).
Atletas lesionados também podem precisar mais de apoio social do que não atletas durante a fase de recuperação, principalmente pelas preocupações e dificuldades passadas por eles nesta fase (Yang, Peek-Asa, Loew, Heiden & Foster, 2010). Dentre as dificuldades, estão uma menor qualidade de vida, maior nível de dor e menor função social e física quando comparados aos não lesionados (Valovich Mcleod, Bay, Parsons, Sauers & Snyder, 2009).
É necessário o apoio principalmente da equipe e que ele se mantenha inserido no grupo enquanto estiver lesionado, seja, por exemplo, na academia durante a reabilitação ou mesmo no café da manhã, assegurando que ele se sinta bem ao perceber a preocupação do treinador e dos outros colegas de equipe com a sua recuperação, sendo importante inclusive para uma maior motivação, progresso e cumprimento do programa de reabilitação (Podlog & Dionigi, 2010).
Em um estudo, envolvendo 256 jovens atletas de ambos os sexos com média de idade de 20 anos, no qual mais da metade referiram algum tipo de lesão nos últimos 12 meses, foi comparado o tipo de apoio social entre atletas do sexo feminino e do sexo masculino. Foi encontrado que tanto os atletas do sexo masculino quanto do sexo feminino estavam satisfeitos com o apoio recebido pela família (96%), amigos (93%) e que atletas do sexo feminino não estavam satisfeitas com o apoio fornecido por treinadores e médicos. Porém após a lesão, comparando-se com a linha de base, houve um aumento na confiança em relação ao apoio social exercido por treinadores, preparadores físicos e médicos tanto por atletas do sexo masculino quanto do sexo feminino. Um dado interessante, é que as atletas do sexo feminino afirmaram ter recebido maior apoio social dos amigos quando comparado ao sexo masculino e os do sexo masculino também relataram menor satisfação com o apoio social dado pela família após a lesão (Yang et al., 2010).
Yang et al. (2010) sugeriram que o apoio social de amigos, treinadores, preparadores físicos e médicos pós-lesão é importante. Da mesma forma, Clement & Shannon (2011) descreveram que a participação do preparador físico no apoio social contribuiu para um maior bem estar geral.
O apoio social deve sempre ser avaliado, visto que em menores faixas etárias, os jovens podem estar em cidades diferentes cursando a Universidade (Yang et al., 2010). Outros resultados encontrados relataram que os treinadores têm papel importante no processo de reabilitação do atleta. Além disso, afirmaram que os treinadores não precisam somente do conhecimento, mas também de meios através de habilidades e estratégias que forneçam suporte psicológico para esses jovens atletas no período de reabilitação, sendo talvez os mais necessários: o apoio social, a empatia e o incentivo na progressão (Stiller-Ostrowski et al., 2009; Judge et al., 2012).
Considerações finais
Vários estudos têm demonstrado a importância da inclusão da psicologia do esporte no processo de prevenção e recuperação de lesões esportivas. Apenas 24% dos estudos selecionados envolveram os cuidados que devem ser tomados frente aos preditores psicológicos de lesões esportivas. Essa é uma das áreas com maior necessidade de ser investigada, tendo em vista que é uma forma de prevenir que fatores internos do próprio ambiente esportivo assim como fatores externos da vida do atleta, como problemas familiares, falta de apoio, transições de vida possam modificar sua atenção, aumentar o estresse, gerar alterações de ansiedade, fatores estes prejudiciais e que elevam as possibilidades para o desencadeamento de uma lesão.
Já a respeito das reações psicológicas frente a uma lesão, estas são bem discutidas e devem ser mais bem gerenciadas, uma vez que podem influenciar de várias formas o retorno do atleta, acelerando ou retardando este processo, além de modificar a confiança com que ele retornará. Diversas técnicas de intervenção psicológica foram descritas, entretanto, essas ainda não têm sido muito bem aplicadas no meio esportivo, uma vez que existe uma deficiência no conhecimento das mesmas por parte dos profissionais da saúde. Também existe certo distanciamento destes profissionais com o psicólogo do esporte, o que acaba prejudicando na recuperação do atleta, uma vez que a aproximação desses profissionais poderia fornecer melhor definição do psicólogo do esporte quanto às melhores técnicas a serem utilizadas em cada momento, principalmente pelo médico, fisioterapeuta e educador físico que são os profissionais mais envolvidos no processo.
Além disso, a falta de capacitação dos profissionais de saúde na área deve ser revista pelas equipes e por todos que trabalham diretamente com atletas, uma vez que apesar do interesse dos profissionais em participar de programas que envolvam esse tipo de conteúdo da psicologia, parece não existir interesse em treiná-los e capacitá-los.
Enfim, um cuidado especial deve ser dado ao atleta seja no momento pré ou pós-lesão, pois as alterações na esfera psicológica podem reduzir ou aumentar o rendimento do atleta, influenciando não só a sua atuação como também gerando alterações a todos os envolvidos.
Considera-se que um trabalho multidisciplinar possa colaborar na solução dos problemas apontados pelos artigos descritos nesta revisão, ressaltando-se o papel das ciências do esporte, em pesquisar esta temática além de propor metodologias que possam colaborar para uma melhor condição do atleta esteja ou não lesionado e sua equipe de trabalho.
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Notas
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