Investigaзхes e teorias acerca dos aspectos positivos e saudбveis do ser humano vкm recebendo crescente visibilidade na psicologia em funзгo dos promissores resultados que as pesquisas tкm apontado dentro dessa temбtica. Diversas abordagens tкm direcionado seus estudos e intervenзхes para alйm da diminuiзгo do sofrimento, visando а promoзгo de aspectos saudбveis da personalidade e maior motivaзгo em relaзгo а vida. Na busca pela construзгo de uma prбtica clнnica mais completa e efetiva, a integraзгo entre abordagens e teorias й uma realidade cada vez mais presente na psicologia. Apesar do aumento de interesse nessa temбtica, o investimento na pesquisa й recente, e a literatura ainda й considerada escassa e dispersa no contexto nacional e internacional (Jain & Singh, 2022).
A psicologia positiva (PP) й uma abordagem contemporвnea e pioneira em direcionar o tratamento a aspectos positivos do indivнduo com embasamento cientificamente robusto, cujo grande objetivo й a promoзгo do bem-estar subjetivo e a busca pela sensaзгo de felicidade (Comptom & Hoffman, 2020; Seligman, 2011). A partir de estudos que investigaram indicadores no nнvel de bem-estar subjetivo em indivнduos de diversos contextos socioeconфmicos e culturais, a PP preencheu lacunas importantes na psicologia e na prбtica clнnica e, atualmente, contribui para a construзгo e para o desenvolvimento de construtos e intervenзхes efetivas e promissoras para a saъde mental (Comptom & Hoffman, 2020; Seligman, 2011).
Entre as contribuiзхes da PP estб a identificaзгo das virtudes e forзas de carбter como fatores relevantes na constituiзгo da personalidade e o desenvolvimento de intervenзхes direcionadas, que tкm se mostrado eficazes como ferramenta psicoterбpica (Rachid & Seligman, 2019). As virtudes sгo as caracterнsticas humanas essenciais, positivas e saudбveis, e as forзas de carбter sгo as manifestaзгo das virtudes em aзхes, envolvendo aquisiзгo, utilizaзгo e aperfeiзoamento (Seligman, 2011). O uso frequente das forзas de carбter leva ao aumento das emoзхes positivas, melhora a qualidade de vida, propicia uma vida com mais significado, promove saъde e bem-estar (Oliveira & Dias, 2020) e pode funcionar como recurso de prevenзгo e remissгo de psicopatologias e sintomas disfuncionais (Oliveira & Dias, 2020; Rachid & Seligman, 2019).
Cada virtude й constituнda por um grupo de forзas de carбter, que sгo inatas e universais e podem ser consideradas talentos pessoais. Considera-se que as prбticas de intervenзгo em relaзгo a forзas e virtudes consistem na identificaзгo das forзas caracterнsticas do indivнduo, no estabelecimento de estratйgias para o seu desenvolvimento e na aplicaзгo das mesmas no dia a dia (Seligman, 2011). Sгo identificadas um total de seis virtudes e 24 forзas de carбter: sabedoria, composta por criatividade, curiosidade, pensamento crнtico/julgamento, perspectiva e amor ao aprendizado; coragem, constituнda por bravura, honestidade, perseveranзa e vitalidade; humanidade, formada por bondade/generosidade, amor, inteligкncia social; justiзa, composta por imparcialidade/lealdade, trabalho em equipe e lideranзa; temperanзa, integrada por perdгo, prudкncia, autorregulaзгo e humildade; e transcendкncia, constituнda por apreciaзгo da beleza e da excelкncia, humor, gratidгo, esperanзa e espiritualidade (Seligman, 2011).
Considerando a expansгo de abordagens atuais, a tendкncia a integrar conhecimentos e o interesse na promoзгo dos aspectos saudбveis, й promissora a associaзгo entre a psicologia positiva e a terapia do esquema por se tratar de abordagens em expansгo, com crescente investimento cientнfico e нndices positivos de eficбcia e interesse no funcionamento adaptativo como parte essencial do tratamento. Essas possibilidades de integraзгo entre as duas abordagens serгo melhor descritas a seguir.
A TE й uma abordagem derivada, especialmente, da terapia cognitivo-comportamental e busca a flexibilizaзгo dos esquemas desadaptativos remotos ou esquemas iniciais desadaptativos (EIDs) visando ao desenvolvimento do adulto saudбvel. O adulto saudбvel й considerado o modo saudбvel do indivнduo, que acessa suas potencialidades e capacidades para desenvolver estratйgias adequadas a nнvel comportamental e cognitivo, diminuindo consideravelmente os prejuнzos de modos de funcionamento disfuncionais (Young et al. 2008; Videler et al., 2020). Estudos relacionados aos EIDs estгo bem consolidados na TE e se mantкm em constante desenvolvimento, ampliando o interesse para os esquemas adaptativos e funcionais do indivнduo a fim de integrar os modos funcionais de forma mais consistente ao tratamento.
Segundo a TE, os esquemas mentais sгo necessбrios para ajudar o indivнduo a compreender suas experiкncias de vida, construindo representaзхes mentais a respeito de si, dos outros e do mundo. Eles sгo desenvolvidos especialmente ao longo da infвncia e da adolescкncia, conforme o nнvel de satisfaзгo das necessidades emocionais bбsicas: vнnculos seguros, autonomia, liberdade de expressгo, espontaneidade e lazer, e limites realistas (Young et al., 2008), manifestando-se por meio do comportamento e das relaзхes interpessoais, como um funcionamento padrгo e repetitivo (Young & Klosko, 2020; Young et al., 2008).
A qualidade no atendimento dessas necessidades bбsicas na infвncia estб relacionada aos fatores de temperamento associados aos estilos parentais dos cuidadores e tem essencial contribuiзгo na formaзгo do funcionamento do indivнduo e no desenvolvimento das estratйgias de enfrentamento ao longo da vida (Basso et al. 2019; Franзa et al., 2023; Marques & Badaro, 2021). Quando as necessidades emocionais sгo devidamente atendidas pelos cuidadores de acordo com as etapas do desenvolvimento, dб-se origem a EIAs, criando modos e estratйgias saudбveis de enfrentamento (Franзa et al., 2023; Jain & Singh, 2022; Young et al., 2008).
Lockwood e Perris (2012) apontam que, apesar de ser possнvel experimentar a ativaзгo de EIAs e EIDs de forma simultвnea, os esquemas adaptativos e desadaptativos constituem grupos distintos e sгo ativados por diferentes situaзхes. Embora a presenзa e a forзa de um EID possam predizer negativamente a forзa do EIA correspondente, a diminuiзгo da intensidade do EID nem sempre causarб um aumento da intensidade do EIA, por representarem dimensхes distintas (Keyfitz et al., 2012; Louis et al., 2018). Essas descobertas evidenciam a importвncia de investigar o funcionamento psicolуgico dos EIAs, sua interaзгo com os EIDs e o seu papel no tratamento psicoterбpico.
Um estudo realizado por Jain e Singh (2022) com uma populaзгo indiana, que teve como objetivo formular o Questionбrio Adaptativo de Esquemas (AQS), identificou seis esquemas adaptativos: adequado, seguro, autфnomo, resistente, sucesso e autoconfiante. Jain e Sing (2022) identificaram convergкncias entre os esquemas adaptativos e elementos positivos encontrados em outros estudos relacionados a autoeficбcia, otimismo, confianзa, sucesso, apego estбvel, autoconfianзa e autocontrole.
No caso do esquema adequado, os indivнduos sentem-se competentes, com boa capacidade de se adequar a situaзхes desfavorбveis, se responsabilizam por suas aзхes e apresentam nнvel de autoconfianзa funcional (Jain & Sing, 2022). No esquema autфnomo, as pessoas tendem a apresentar boa capacidade de resoluзгo de problemas, tomada de decisгo e capacidade de impor suas necessidades e ideias de forma assertiva (Jain & Sing, 2022). Indivнduos com esquema de sucesso acreditam que o bom desempenho os levarб a resultados positivos, se sentem competentes para realizar tarefas, alcanзar metas, tкm motivaзгo pessoal e desejo de desempenhar feitos por prazer e realizaзгo pessoal (Keyfitz et al., 2012). O esquema resistente estб associado a pessoas que tкm capacidade de se recuperar de perdas e situaзхes adversas de forma eficaz e resiliente (Jain & Sing, 2022).
As pesquisas recentes acerca dos EIAs indicam que os esquemas positivos estгo associados com menores nнveis de ansiedade e depressгo (Chi et al., 2022) e transtornos alimentares (Huckstepp et al., 2023; Maher et al., 2023), e com maiores nнveis de satisfaзгo com a vida e bem-estar (Allen & Tully-Wilson, 2023). Considerando a relevвncia na compreensгo dos aspectos saudбveis do ser humano e das qualidades, talentos e potencialidades individuais como forma de construзгo de recursos internos e estratйgias funcionais para o aumento do bem-estar subjetivo e desenvolvimento do adulto saudбvel (Comptom & Hoffman, 2020; Jain & Singh, 2022; Keyfitz et al., 2012; Louis et al., 2018; Seligman, 2011), a presente pesquisa tem como objetivo investigar as relaзхes entre os EIAs e as virtudes e forзas de carбter em adultos brasileiros a fim de entender de que forma esses construtos se relacionam.
MÉTODO
PARTICIPANTES
A amostra foi selecionada por conveniкncia e composta por 129 adultos, brasileiros, com idade entre 18 e 60 anos, sendo 102 participantes (79,1%) do sexo feminino e 27 (20,9%) do sexo masculino, 106 (86,4%) residentes do Rio Grande do Sul e 23 (13,6%) residentes de outros estados. Em relaзгo ao estado civil, 62 (48,1%) eram casados, 46 (35,7%) eram solteiros, 16 (12,4%) em uniгo estбvel, 4 (3,1%) eram divorciados e 1 (0,8%) era viъvo. Referente а ocupaзгo, 58 participantes (45%) estavam empregados com carteira assinada, 25 (19,4%) eram autфnomos, 22 (17,1%) se declararam como outros e nгo discriminaram, 17 (13,2%) eram estudantes, 3 (2,3%) se declararam desempregados, 3 (2,3%) jб estavam aposentados e 1 (0,8%) era beneficiбrio. O nнvel de escolaridade variou - 6 (4,7%) participantes tinham ensino fundamental incompleto, 2 (1,6%) concluнram o ensino fundamental completo, 2 (1,6%) tinham ensino mйdio incompleto, 23 (17,8%) concluнram o ensino mйdio completo, 47 (36,4%) tinham ensino superior incompleto, 22 (17,1%) finalizaram o ensino superior completo, 25 (19,4%) tinham pуs-graduaзгo, 1 (0,8%) tinha mestrado e 1 (0,8%) tinha doutorado.
A classe social dos participantes predominou como D, constituindo 55,8% da amostra, com 72 participantes; 15 (11,6%) foram incluнdos na classe E (menos de 1 salбrio mнnimo); 18 (14,0%), na classe C (entre 3 e 5 salбrios mнnimos); 10 (7,8%), na classe B (entre 5 e 8 salбrios mнnimos); e 7 (5,4%), na classe A (mais de 8 salбrios mнnimos); 7 participantes (5,4%) preferiram nгo declarar.
PROCEDIMENTOS ЙTICOS E DE COLETA
Este estudo foi submetido а apreciaзгo do Comitк de Йtica e Pesquisa da Universidade Feevale, sendo aprovado sob o CAAE nє 5.907.967. Seguindo os aspectos йticos regidos pela Resoluзгo nє 510 (2016) do Conselho Nacional de Saъde (CNS), os participantes receberam informaзхes claras sobre a pesquisa. O estudo foi divulgado por meio da tйcnica bola de neve, na qual os participantes foram recrutados e indicaram a pesquisa aos seus pares. O link da pesquisa foi divulgado em formato on-line via WhatsApp, Facebook e Instagram.
Os participantes tiveram acesso ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e, apуs o aceite do TCLE, foram direcionados ao questionбrio sociodemogrбfico e аs pбginas de respostas do Questionбrio de Esquemas Adaptativos (ASQ) e do teste VIA Character para adultos. Indicou-se aos participantes o tempo previsto e sugeriu-se buscar um local adequado para o preenchimento dos instrumentos. Os critйrios de inclusгo da amostra foram: (1) ser brasileiro; (2) ter idade entre 18 e 60 anos; (3) estar residindo no Brasil; e (4) aceitar participar da pesquisa mediante assinatura do TCLE. O critйrio de exclusгo foi o nгo preenchimento completo dos instrumentos.
INSTRUMENTOS
Os instrumentos utilizados para a pesquisa estгo descritos a seguir.
Questionário sociodemográfico: desenvolvido pelas autoras com o objetivo de coletar informaзхes sobre o perfil dos participantes. Й um instrumento de autorrelato, composto por questхes abertas e fechadas, que buscou investigar idade, local de residкncia, gкnero, raзa/etnia, estado civil, nнvel de escolaridade, renda e condiзхes socioeconфmicas.
Questionário de Esquemas Adaptativos (ASQ): desenvolvido na Нndia por Jain e Singh (2022), ainda nгo tem validaзгo no Brasil. O instrumento й composto por 25 itens que indicam os seis esquemas adaptativos jб citados. Para uso na pesquisa, foi solicitada autorizaзгo da autora do ASQ e realizada uma traduзгo livre. O questionбrio passou por trкs traduзхes com profissionais distintos. A primeira consistiu em uma traduзгo direta, em que o tradutor tinha o instrumento original em inglкs e traduziu para a lнngua portuguesa. No segundo momento, foi realizada uma traduзгo reversa, em que o tradutor teve acesso somente а primeira versгo da traduзгo em lнngua portuguesa e fez a traduзгo para a lнngua inglesa. O terceiro tradutor avaliou as duas versхes e fez a versгo final da traduзгo. Foi realizado um estudo piloto com cinco adultos brasileiros para verificar a adequaзгo do instrumento, no qual houve revisгo da questгo 16, que foi modificada de “Eu nгo fico facilmente abalado por infortъnios” para “Eu nгo me prendo facilmente аs adversidades”, pois algumas pessoas relataram nгo compreender a palavra infortъnios, e nгo houve retirada de itens. O instrumento final manteve os 25 itens, pontuados em uma escala de cinco pontos, devendo o respondente indicar o quanto cada item o descreve (Jain & Singh, 2022). As respostas sгo obtidas a partir de uma escala do tipo Likert, a qual й atribuнdo um nъmero para cada resposta, variando de 1 (Discordo fortemente) a 5 (Concordo fortemente).
Classificação das forças e virtudes - VIA Character para adultos: composta por 240 itens, й uma escala de concordвncia de cinco pontos (“nгo tem nada a ver comigo” a “tem tudo a ver comigo”), proposta por Seligman e Peterson, que tem como objetivo mensurar as 24 forзas de carбter. No Brasil, foi adaptada e validada em 2015 pela psicуloga Bruna Larissa Seibel, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) (Seibel et al., 2015). Atualmente, й preenchida apenas no formato on-line e, para esta pesquisa, foi obtida autorizaзгo para que fosse disponibilizada via Google Forms.
ANБLISES DOS DADOS
Os instrumentos foram corrigidos e os dados foram armazenados no pacote estatнstico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versгo 25. Apуs, realizou-se testes de normalidade de Kolmogorov-Smirnov e, considerando que a amostra nгo apresentou distribuiзгo normal, optou-se pelo uso de testes nгo paramйtricos. Foram realizados os testes de correlaзгo de Spearman com o objetivo de indicar as variбveis correlacionadas. O nнvel de significвncia considerado nos testes estatнsticos utilizados neste estudo foi de p < 0,05 e as forзa das correlaзхes foi baseada nos critйrios definidos por Dancey e Reidy (2006) - correlaзгo fraca (0,1 a 0,3), moderada (0,4 a 0,6) e forte (0,7 a 0,9).
RESULTADOS
A Tabela 1 apresenta a correlaзгo das virtudes com os EIAs.
Tabela 1 Correlações entre as virtudes e os esquemas iniciais adaptativos.
Sabedoria | Coragem | Humanidade | Justiça | Temperança | Transcendência | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|
Esquema adequado | r | 0,380** | 0,427** | 0,333** | 0,373** | 0,314** | 0,446** |
p | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | |
Esquema seguro | r | 0,320** | 0,255** | 0,361** | 0,375** | 0,291** | 0,369** |
p | 0,000 | 0,004 | 0,000 | 0,000 | 0,001 | 0,000 | |
Esquema autônomo | r | 0,545** | 0,645** | 0,458** | 0,447** | 0,443** | 0,570** |
p | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | |
Esquema resistente | r | 0,407** | 0,493** | 0,287** | 0,321** | 0,347** | 0,386** |
p | 0,000 | 0,000 | 0,001 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | |
Esquema sucesso | r | 0,556** | 0,606** | 0,391** | 0,451** | 0,459** | 0,544** |
p | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | |
Esquema autoconfiante | r | 0,355** | 0,401** | 0,342** | 0,375** | 0,437** | 0,422** |
p | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 |
Nota.
*= p<0,05;
*p< 0,01.
Й possнvel observar, de forma geral, correlaзхes positivas e altamente significativas entre todos os esquemas e virtudes, em sua maioria de forзa moderada. Em relaзгo аs forзas de carбter da virtude coragem, foram identificadas correlaзхes altamente significativas, positivas e de forзa moderada entre os esquemas autфnomo e sucesso, bem como correlaзхes altamente significativas, positivas e de forзa fraca a moderada entre todas as forзas da coragem e os esquemas adequado e resistente. Os esquemas seguro e autoconfiante tiveram correlaзхes significativas, positivas e de forзa fraca a moderada entre todas as forзas da coragem, com exceзгo da bravura, que nгo apresentou correlaзгo com esses dois esquemas, e da perseveranзa, que nгo se correlacionou com o esquema seguro. No que tange аs relaзхes dos EIAs com as forзas de carбter referentes а sabedoria, foram encontradas correlaзхes significativas, positivas e de forзa fraca a moderada entre todas as forзas e todos os esquemas, com exceзгo da relaзгo entre julgamento e esquema adequado e julgamento e esquema seguro, que nгo apresentaram correlaзгo. No que diz respeito аs relaзхes entre os EIAs e as forзas de carбter referentes а humanidade, foram identificadas correlaзхes significativas, positivas e de forзa fraca a moderada entre todas as forзas e todos os esquemas, com exceзгo da relaзгo entre a generosidade e o esquema adequado, que nгo apresentaram correlaзгo. Referente аs relaзхes entre os EIAs e as forзas de carбter da virtude justiзa, foram identificadas correlaзхes positivas, significativas e de forзa de fraca a moderada, com exceзгo de trabalho em equipe, que nгo apresentou correlaзгo com os esquemas autфnomo e resistente. Por fim, relativo аs correlaзхes entre os EIAs e as forзas de carбter da temperanзa, foram identificadas correlaзхes significativas, positivas e de forзa fraca a moderada entre todas as forзas com os esquemas de sucesso e autoconfiante. Tambйm foram encontradas relaзхes entre as forзas de carбter da temperanзa e a maioria dos esquemas, porйm, nгo foram encontradas correlaзхes entre prudкncia e esquema adequado, perdгo e prudкncia com o esquema seguro, e humildade e humor com o esquema resistente. Todas as correlaзхes entre as forзas de carбter e os EIAs estгo descritas na Tabela 2.
Tabela 2 Correlações entre as forças de caráter e os EIAs.
Justiça | Temperança | Transcendência | |||||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
IMP | LID | TE | PERD | PRUD | HUM | AR | AB | HUM | GRAT | ESPI | ESP | ||
Esquema adequado | r | 0,235** | 0,356** | 0,181* | 0,184* | 0,138 | 0,226** | 0,298** | 0,309** | 0,256** | 0,295** | 0,377** | 0,415** |
p | 0,007 | 0,000 | 0,040 | 0,037 | 0,120 | 0,010 | 0,001 | 0,000 | 0,003 | 0,001 | 0,000 | 0,000 | |
Esquema seguro | r | 0,287** | 0,258** | 0,265** | 0,142 | 0,157 | 0,189* | 0,293** | 0,307** | 0,185* | 0,249** | 0,348** | 0,334** |
p | 0,001 | 0,003 | 0,002 | 0,076 | 0,032 | 0,001 | 0,001 | 0,036 | 0,004 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | |
Esquema autônomo | r | 0,295** | 0,453** | 0,163 | 0,366** | 0,236** | 0,304** | 0,429** | 0,364** | 0,356** | 0,496** | 0,380** | 0,478** |
p | 0,001 | 0,000 | 0,065 | 0,000 | 0,007 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | |
Esquema resistente | r | 0,183* | 0,398** | 0,080 | 0,357** | 0,195* | 0,170 | 0,376** | 0,161 | 0,293** | 0,350** | 0,173* | 0,437** |
p | 0,038 | 0,000 | 0,367 | 0,000 | 0,027 | 0,053 | 0,000 | 0,069 | 0,001 | 0,000 | 0,050 | 0,000 | |
Esquema sucesso | r | 0,284** | 0,423** | 0,198* | 0,359** | 0,285** | 0,273** | 0,445** | 0,311** | 0,389** | 0,419** | 0,362** | 0,540** |
p | 0,001 | 0,000 | 0,025 | 0,000 | 0,001 | 0,002 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | |
Esquema autoconfiante | r | 0,248** | 0,285** | 0,330** | 0,264** | 0,320** | 0,325** | 0,374** | 0,330** | 0,150 | 0,391** | 0,326** | 0,388** |
p | 0,005 | 0,001 | 0,000 | 0,002 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,090 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | |
Sabedoria | Coragem | Humanidade | |||||||||||
AP | CUR | CRIA | JULG | PERS | BRA | HON | PER | VIT | AM | GEN | IS | ||
Esquema adequado | r | 0,293** | 0,353** | 0,281** | 0,167 | 0,360** | 0,226** | 0,239** | 0,289** | 0,461** | 0,268** | 0,137 | 0,371** |
p | 0,001 | 0,000 | 0,001 | 0,059 | 0,000 | 0,010 | 0,006 | 0,001 | 0,000 | 0,002 | 0,123 | 0,000 | |
Esquema seguro | r | 0,203* | 0,252** | 0,200* | 0,146 | 0,382** | 0,105 | 0,207* | 0,172 | 0,297** | 0,278** | 0,292** | 0,353** |
p | 0,021 | 0,004 | 0,023 | 0,098 | 0,000 | 0,236 | 0,018 | 0,051 | 0,001 | 0,001 | 0,001 | 0,000 | |
Esquema autônomo | r | 0,374** | 0,411** | 0,452** | 0,389** | 0,378** | 0,446** | 0,353** | 0,511** | 0,489** | 0,417** | 0,253** | 0,427** |
p | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,004 | 0,000 | |
Esquema resistente | r | 0,227** | 0,303** | 0,404** | 0,349** | 0,269** | 0,372** | 0,264** | 0,377** | 0,351** | 0,207* | 0,256** | 0,307** |
p | 0,010 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,002 | 0,000 | 0,003 | 0,000 | 0,000 | 0,019 | 0,003 | 0,000 | |
Esquema sucesso | r | 0,395** | 0,446** | 0,441** | 0,404** | 0,372** | 0,331** | 0,399** | 0,398** | 0,587** | 0,319** | 0,319** | 0,338** |
p | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | |
Esquema autoconfiante | r | 0,300** | 0,337** | 0,175* | 0,344** | 0,235** | 0,120 | 0,420** | 0,345** | 0,310** | 0,256** | 0,319** | 0,257** |
p | 0,001 | 0,000 | 0,047 | 0,000 | 0,007 | 0,177 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,003 | 0,000 | 0,003 |
Nota.
*= p<0,05;
*p< 0,01; AP = amor ao aprendizado; CUR= curiosidade; CRIA= criatividade; JULG= julgamento/pensamento crнtico; PERS=perspectiva; BRA= bravura; HON= honestidade; PER= perseveranзa; VIT= vitalidade; GEN= generosidade/bondade; AMO= amor; IS= inteligкncia social; IMP= imparcialidade; TE= trabalho em equipe; LID= lideranзa; PERD= perdгo; PRUD= prudкncia; AR= autorregulaзгo HUM= humildade; AB= apreciaзгo da beleza e da excelкncia; HUM= humor; GRAT= gratidгo; ESPE= esperanзa; ESPI= espiritualidade.
DISCUSSÃO
Considerando os resultados apresentados, foi possнvel observar a existкncia de relaзхes entre os EIAs e todas as virtudes. A partir destes resultados, considera-se que pode existir sustentos teуrico e cientнfico na integraзгo da PP e TE, e й possнvel prever que o conhecimento acerca das possнveis correlaзхes entre ambas potencialize as intervenзхes voltadas ao desenvolvimento do adulto saudбvel (Videler et al., 2020; Young et al., 2008) e do florescimento (Seligman, 2011). As correlaзхes identificadas neste estudo permitem constatar evidкncias iniciais de que os EIAs, desejбveis no desenvolvimento de estratйgias assertivas e funcionamento saudбvel do indivнduo, possam ser facilitados pela potencializaзгo das virtudes individuais. O objetivo desta seзгo й pontuar as potencialidades da interaзгo dessas teorias a partir das correlaзхes mencionadas e indicar benefнcios clнnicos, enfatizando que nгo hб intenзгo em hierarquizar virtudes, forзas de carбter ou EIAs.
A sabedoria й uma virtude que contйm forзas relacionadas а constante busca por conhecimento (Seligman, 2011). As forзas de carбter dessa virtude aparecem fortemente relacionadas com os esquemas de sucesso e autфnomo, podendo indicar que, quando desenvolvida de forma saudбvel, exerce influкncia sobre esses EIAs, aumentando a sensaзгo de autoeficбcia, autoconfianзa, melhor perspectiva a respeito da vida e do futuro, flexibilidade em situaзхes do cotidiano e capacidade de resoluзгo de problemas e situaзхes adversas (Rashid & Seligman, 2019).
A virtude coragem apresentou relaзхes positivas sobretudo com os esquemas de sucesso e autфnomo, que tкm caracterнsticas de um perfil resolutivo, com senso de autoeficбcia, boa capacidade de resoluзгo de problemas, estabelecimento e cumprimento de metas, limites adequados e comportamentos sociais assertivos (Jain & Sing, 2022; Keyfitz et al., 2012; Oliveira & Dias, 2020). O desenvolvimento dessas caracterнsticas tende a aumentar a capacidade de concretizaзгo e produзгo na busca por uma vida com plenitude e propуsito, no direcionamento eficaz desses talentos, promovendo funcionalidade na vida cotidiana e aumento de realizaзгo.
Os esquemas autфnomo e de sucesso tambйm estгo associados com a virtude da justiзa, relacionada аs forзas cнvicas que fundamentam a vida saudбvel em comunidade (Seligman, 2011). Й possнvel entender que o aprimoramento do modo saudбvel em pessoas com esses EIAs fortaleзa forзas de carбter para o desenvolvimento efetivo da justiзa, tornando as aзхes mais assertivas e resolutivas (Jain & Sing, 2022; Keyfitz et al., 2012), promovendo propуsito e experiкncia de sentido (Oliveira & Dias, 2020; Seligman, 2011).
A virtude humanidade surge com maior potкncia na interaзгo social com familiares, amigos e conhecidos, pois diz a respeito а disponibilidade em ajudar e ser ъtil ao outro e ao mundo e а capacidade de manter vнnculos saudбveis (Seligman, 2011), apresentando correlaзгo de fraca a moderada com todos os EIAs. Pessoas com essa virtude desenvolvida tкm maior facilidade em se sentir felizes (Seligman, 2011), potencializando a capacidade de regulaзгo emocional e, possivelmente, maior capacidade na flexibilizaзгo de esquemas disfuncionais e crenзas negativas (Franзa et al., 2023). A humanidade bem desenvolvida pode ser considerada um importante recurso protetivo para a saъde mental e para o fortalecimento de EIAs.
As virtudes temperanзa e transcendкncia, ambas apresentando relaзхes de fraca a moderada com todos os EIAs, estгo relacionadas a uma capacidade de estabilidade e regulaзгo emocional, conexгo adequada consigo e com os prуprios desejos, interaзгo assertiva com os outros e com o mundo, e sentimento de sentido e propуsito (Seligman, 2011). A experiкncia de uma vida com significado e com propуsito direcionado a algo maior do que si, promove maior esperanзa, disposiзгo e motivaзгo com a vida. O desenvolvimento dessas virtudes em indivнduos que jб as apresentam pode auxiliar no fortalecimento do adulto saudбvel com maior estabilidade e consistкncia (Keyfitz et al., 2012), no engajamento aos exercнcios propostos em psicoterapia e em um desfecho psicoterбpico mais eficiente.
A discussгo proposta se baseia num inнcio de resultados promissores e permite levantar que, quando EIAs e forзas de carбter sгo devidamente identificados e desenvolvidos, tкm grande influкncia na promoзгo da saъde mental, amenizaзгo de sintomas disfuncionais e psicopatologias e melhora na qualidade de vida e bem-estar subjetivo (Rachid & Seligman, 2019). O trabalho em TE visando ao fortalecimento dos aspectos saudбveis tambйm й capaz de promover maior consciкncia acerca das prуprias qualidades, potenciais e talentos, e proporcionando melhora na qualidade da relaзгo terapкutica (Comptom & Hoffman, 2020; Keyfitz et al., 2012; Louis et al., 2018; Rachid & Seligman, 2019).
Por fim, й importante que sejam feitos investimentos em estudos sobre os conceitos e as funcionalidade dos EIAs dentro da TE. Й necessбria a investigaзгo desses aspectos em outras populaзхes, a validaзгo de novos instrumentos para avaliar os EIAs em populaзхes clнnicas e geral, bem como o aprofundamento do conhecimento sobre as relaзхes entre EIAs e virtudes e forзas de carбter, especificando os mecanismos dessas interaзхes e os aspectos explicativos na integraзгo desses construtos, possibilitando estudos experimentais na psicoterapia individual e em grupo e a construзгo de intervenзхes psicoterбpicas cada vez mais robustas e eficazes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo buscou identificar as relaзхes entre as virtudes e forзas de carбter e os EIAs no funcionamento de adultos brasileiros por meio das referкncias da PP e da TE, uma vez que ambas se relacionam com os aspectos positivos e saudбveis dos indivнduos e tкm embasamento cientнfico sуlido. Os objetivos desta pesquisa foram concluнdos e as correlaзхes entre as virtudes e forзas de carбter e os EIAs foram observadas.
Trabalhar com EIAs se mostra importante na identificaзгo dos aspectos positivos e saudбveis do funcionamento, auxiliando no desenvolvimento de habilidades interpessoais, resoluзгo de problemas, fortalecimento da relaзгo terapкutica e construзгo de um ambiente seguro para que o indivнduo possa expor sentimentos e pensamentos e explore seus esquemas e processos internos importantes (Videler et al., 2020). O uso das virtudes e forзas de carбter na prбtica clнnica e os conhecimentos da PP como abordagem centrada nos aspectos saudбveis do indivнduo tкm se mostrado eficazes, apontando importantes resultados em pesquisas recentes tanto em relaзгo ao aumento dos talentos e promoзгo de bem-estar quanto na amenizaзгo de sintomas negativos e contribuiзгo na remissгo de psicopatologias (Rachid & Seligman, 2019).
Considerando os resultados desta pesquisa e a interaзгo com a literatura referente, й possнvel constatar que a integraзгo de ambas as abordagens й promissora e tem potencial para a construзгo de recursos e ferramentas clнnicas, oferecendo grande contribuiзгo para a бrea. Este estudo contribuiu para expandir a literatura e incentivar a realizaзгo de mais investigaзхes a respeito do tema. Embora as virtudes e forзas de carбter estejam bem estabelecidas, os EIAs ainda contam com poucos estudos e instrumentos de avaliaзгo, por se tratar de um construto bastante novo e que carece de estudos confirmatуrios e descritivos, limitando a interpretaзгo desses dados.
Cabe apontar algumas limitaзхes desta pesquisa. As anбlises correlacionais identificam a associaзгo entre as variбveis, mas nгo permitem estabelecer relaзгo de causa e efeito entre as forзas e virtudes e os EIAs, tampouco afirmar se hб um construto responsбvel pela intensificaзгo um do outro ou se ambos se reforзam simultaneamente. Alйm disso, os instrumentos sгo baseados no autorrelato e estгo sujeitos a vieses relacionados а pouca consciкncia acerca das prуprias experiкncias emocionais e а desejabilidade social. A coleta de dados em formato on-line nгo permite o controle sobre o ambiente de aplicaзгo dos instrumentos e apresenta um viйs em relaзгo аs caracterнsticas da amostra.