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Pesquisas e Práticas Psicossociais
versão On-line ISSN 1809-8908
Pesqui. prát. psicossociais vol.10 no.1 São João del-Rei jun. 2015
ARTIGOS
O trabalho com grupos no PAIF: um diálogo interdisciplinar com a Oficina de Intervenção Psicossocial1
The work with groups in PAIF: an interdisciplinary dialogue with the Psychossocial Intervention Workshop
El trabajo con grupos en PAIF: un diálogo interdisciplinar com el Taller de Intervención Psicossocial
Maria Lúcia Miranda AfonsoI; Fabiana Meijon FadulII
IPsicóloga social e clínica, Mestre e Doutora em Educação, professora do Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local. Centro Universitário UNA. Endereço: luciaafonso@ibest.com.br
IIPsicóloga, Mestre em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local, Centro Universitário UNA, Analista de políticas públicas da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Endereço: fabianafadul@hotmail.com
RESUMO
O artigo objetiva sistematizar as contribuições da Oficina de Intervenção Psicossocial (OIP) para o trabalho com grupos no Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF), no nível de proteção social básica do Sistema Único da Assistência Social. Inicia sistematizando a proposta de oficinas do PAIF. Em seguida, delineia os fundamentos teórico-metodológicos da OIP, no campo da intervenção psicossocial. Finalmente, apresenta um quadro com as contribuições da OIP, explorando a sua dimensão dinâmica (relativa ao processo grupal) e transversal (relativa à efetivação dos objetivos da política pública). Dessa forma, o artigo busca também contribuir para a coordenação, o monitoramento e a avaliação do trabalho com grupos no PAIF.
Palavras-chave: Oficina de intervenção psicossocial; SUAS; PAIF; processo grupal; políticas públicas.
ABSTRACT
The article aims to systematize the contributions of Psychosocial Intervention Workshop (OIP) to work with groups in the Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF) at the level of Basic Social Protection in the Unified System of Social Assistance. Initially, it presents the guidelines for PAIF´s workshops. Then it outlines the theoretical and methodological foundations of OIP in the field of psychosocial intervention. Finally, it presents a framework with contributions from OIP, exploring its dynamic dimension (on the group process) and its transversalities (relative to the effectuation of public policy goals). Thus, the article also seeks to contribute to the coordination, monitoring and evaluation of the work with groups in PAIF.
Palavras-chave: Psychosocial intervention workshop; SUAS; PAIF; group process; public policies.
RESUMEN
The article aims to systematize the contributions of Psychosocial Intervention Workshop (OIP) to work with groups in the Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF) at the level of Basic Social Protection in the Unified System of Social Assistance. Initially, it presents the guidelines for PAIF´s workshops. Then it outlines the theoretical and methodological foundations of OIP in the field of psychosocial intervention. Finally, it presents a framework with contributions from OIP, exploring its dynamic dimension (on the group process) and its transversalities (relative to the effectuation of public policy goals). Thus, the article also seeks to contribute to the coordination, monitoring and evaluation of the work with groups in PAIF.
Palavras-chave: Psychosocial intervention workshop; SUAS; PAIF; group process; public policies.
Introdução
Neste artigo, discutimos uma proposta de trabalho com Oficina de Intervenção Psicossocial (OIP), que poderia ser utilizada no nível de Proteção Social Básica (PSB) do Sistema Único da Assistência Social (SUAS), especialmente considerando o Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF). Iniciamos por uma breve revisão sobre as diretrizes para o trabalho com grupos no PAIF, ressaltando a importância das metodologias participativas e do diálogo interdisciplinar no SUAS, fazendo especial referência à Psicologia Social e à Intervenção Psicossocial.
Nessa direção, exploramos a potencialidade da OIP, sua possível articulação com os objetivos da Política Nacional de Assistência Social (Brasil, 2004) e o trabalho com grupos no território atendido pelo Centro de Referência da Assistência Social (CRAS). Esperamos, com este artigo, contribuir para a apropriação das metodologias participativas2 no contexto das políticas públicas que, como a PNAS, foram propostas, a partir da Constituição Federal de 1988, para a promoção de direitos, tendo a participação como princípio.
Antes de iniciar, é importante esclarecer que a utilização do termo oficina tanto na OIP quanto nos documentos do PAIF é uma coincidência que não autoriza qualquer conclusão sobre sua mútua identificação. Pelo contrário, pode-se assinalar que o termo oficina tem sido utilizado em diversos trabalhos, com diferentes fundamentações teórico-metodológicas e campos do conhecimento, por exemplo, na Psicologia Social (Afonso, 2000; Spink, Menegon & Medrado, 2014), na Educação (Candau, 2002) e na Saúde (Silva, 2000; Nogueira et al, 2011). No caso da OIP, destacam-se os trabalhos de Afonso (2000; 2006) e Afonso, Vieira-Silva e Abade (2009), que embasam este artigo.
O PAIF e o trabalho com grupos no território
Promulgada em 2004, com base na Constituição Federal de 1988 e na Lei Orgânica da Assistência Social de 1993, a PNAS foi proposta como uma política que integra o sistema de proteção social Brasileiro, junto a outras políticas públicas, voltadas para a promoção dos direitos de cidadania e baseadas na primazia da responsabilidade do Estado. A PNAS se volta para a garantia de seguranças básicas, que equivalem a direitos socioassistenciais (Brasil, 2004).
As seguranças afiançadas pela assistência social são a acolhida (provisão das necessidades humanas por meio do acesso aos direitos), o convívio familiar e comunitário, a renda (o acesso), o desenvolvimento da autonomia (capacidade de prover para si e para seus dependentes) e a sobrevivência a riscos circunstanciais (Brasil, 2004; Brasil, 2012b). O provimento das seguranças básicas acontece por meio da inserção na rede socioassistencial (do SUAS). Porém, a PNAS não pode garantir o acesso aos direitos de outras políticas públicas e, sim, fazer encaminhamentos visando facilitar esse acesso, o que requer a existência de uma rede de serviços articulada e integrada.
As seguranças básicas devem nortear todas as ações da área da política de assistência social, incluindo no PAIF, o que abrange o trabalho com grupos. Porém, é importante lembrar que a não existência de rede de serviços, articulada e integrada, traz dificuldades diversas para esta realização, incluindo para a efetiva utilização de atividades grupais e comunitárias (Afonso, Hennon, Carico & Peterson, 2013).
O SUAS se divide em dois níveis de proteção social: básica (PSB) e especial (PSE). A PSB atende famílias, grupos e indivíduos em situação de vulnerabilidade decorrente de pobreza, exclusão e/ou violência, mas que mantêm os seus vínculos familiares e sociais. Visa prevenir e enfrentar vulnerabilidades e riscos sociais por meio da ampliação do acesso aos direitos de cidadania, do desenvolvimento de potencialidades e aquisições dos usuários e do fortalecimento de vínculos familiares e comunitários (Brasil, 2009). Desde já, pode-se compreender que o trabalho com grupos na PSB deve ter como norte estas seguranças básicas, para elas contribuindo direta ou indiretamente, associado às demais ações desenvolvidas na política pública.
O equipamento da PSB é o CRAS, implantado em territórios com alta vulnerabilidade social, onde são desenvolvidos o PAIF, o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos e o Serviço de Proteção Social Básica no Domicílio para Pessoas com Deficiências e Idosas. Ressalte-se que o PAIF é que serviço que integra os demais (Brasil, 2012 a; 2012b) e objetiva:
fortalecer a função protetiva da família, promovendo o acesso e usufruto de direitos humanos e sociais e da melhoria da qualidade de vida das famílias; prevenir a ruptura de vínculos familiares e comunitários, possibilitando a superação de situações de fragilidade social e, ainda, promover aquisições sociais e materiais às famílias, potencializando o protagonismo e a autonomia das famílias e comunidades. (Brasil, 2009, pp. 4-5)
Dentre as diretrizes para o trabalho social com famílias no PAIF, destacamos, para os fins deste artigo, a matricialidade sociofamiliar, a territorialização e a interdisciplinaridade. A matricialidade sociofamiliar se refere à centralidade da família como núcleo social fundamental para a efetividade da política de assistência social. Trabalha-se com um conceito ampliado de família, como grupo unido tanto por laços consanguíneos como de solidariedade e afetividade, que desenvolvem obrigações recíprocas para a sua sobrevivência e reprodução social, incluindo o compartilhamento de renda e/ou dependência econômica (Brasil, 2004). Reconhece-se a legitimidade da diversidade dos arranjos familiares, sendo a família uma instituição social em constante transformação dentro do seu contexto histórico. Portanto, a família também é marcada por tensões e conflitos (Itaboraí, 2005), ligados ao cotidiano, às relações de geração e de gênero, às relações com instituições sociais e com o próprio Estado.
A territorialização refere-se à centralidade do território para a compreensão das situações de vulnerabilidade e risco sociais, bem como para o seu enfrentamento (Brasil, 2004). Os territórios são constituídos por dimensões espaciais e psicossociais, com seus modos de existir, linguagens, representações e práticas. Além de sua materialidade geográfica, é preciso considerar suas fronteiras e interações com outros espaços e territórios mais amplos, como a cidade e o país, em relações mutáveis no contexto social e histórico (Jovchelovicht; Priego-Hernández, 2013).
No SUAS, propõe-se a incorporação dos enfoques interdisciplinar e intersetorial para a atuação profissional, compreendendo-se que o enfrentamento às vulnerabilidades e riscos sociais é complexo e exige a integração de variadas contribuições teóricas e técnicas e das diferentes políticas públicas. O PAIF objetiva promover a autonomia dos usuários, fortalecer vínculos familiares e comunitários bem como enfrentar processos que geram vulnerabilidade e risco sociais. Para realizar seus objetivos, desenvolve atividades articuladas: acolhida a indivíduos/famílias; atividades grupais (oficinas); ações comunitárias; encaminhamentos à rede socioassistencial e às demais políticas públicas. A articulação dessas atividades é crucial para a garantia dos acessos (Brasil, 2012 b).
As oficinas são "encontros previamente organizados, com objetivos de curto prazo a serem atingidos com um conjunto de famílias, por meio de seus responsáveis ou outros representantes, sob a condução de técnicos de nível superior do CRAS" (Brasil, 2012b, p. 23). Por meio delas, os usuários podem se perceber como sujeitos de direitos e dialogar sobre questões de interesse coletivo. Podem construir formas de cooperação na família, fortalecer vínculos e identificar ações e articulações necessárias para a proteção social junto às famílias e no território (...) (Brasil, 2012 b).
O PAIF (Brasil, 2012b) adota a diretriz de que o trabalho com grupos deve potencializar três dimensões do processo grupal - convivência, reflexão e ação. Interessante a associação dessas dimensões, como já desenvolvido em PBH/SMAAS (2007), ao trabalho com vínculos sociais, visão de mundo e operatividade dos grupos no território. As oficinas com famílias se diferenciam (Brasil, 2012 b; PBH/SMAAS, 2007) pela maneira como articulam estas dimensões, dando ênfase a uma ou mais delas, conforme as aquisições a se desenvolver. É importante dizer que estas três dimensões sempre estão presentes em um grupo, mesmo quando uma delas é priorizada, passando a ser o elemento articulador para o trabalho com as outras (Brasil, 2012 b; PBH/SMAAS, 2007).
Oficinas de reflexão priorizam a abordagem de questões e temáticas de interesse do grupo; oficinas de convivência desenvolvem atividades diversas com ênfase no sentimento de pertencimento, comunicação e interação entre os participantes, podendo fomentar a participação social e o fortalecimento dos grupos no território. O desenvolvimento da participação social, do protagonismo e da autonomia são objetivos de oficinas de ação, buscando mudanças para o acesso a direitos (Brasil, 2012 b).
Para o trabalho com famílias, o PAIF recomenda a pedagogia problematizadora de Paulo Freire e a pesquisa-ação. Porém, concede que outras metodologias poderão vir a ser úteis, desde que interligadas às diretrizes e objetivos da PNAS (Brasil, 2012b).
A partir daí, podemos introduzir a questão da utilização de metodologias participativas na construção de políticas de promoção e garantia de direitos:
As metodologias participativas são um conjunto de métodos com características semelhantes usados para atingir o mesmo objetivo, baseado no princípio fundamental da participação. (...) na metodologia participativa se juntam vários métodos usando diversos instrumentos específicos, e constitui-se num convite à ação e ao aprendizado conjunto, possibilitando maior acesso ao poder decisório (empoderamento das pessoas envolvidas e da organização). (Kummer, 2007, p.67)
Sendo a participação um princípio da PNAS, entendemos que deve estar presente desde as suas formas mais básicas, como no direito do usuário de se fazer escutar em situações de atendimento, até formas politicamente organizadas tais como a participação em conferências, fóruns e conselhos de direitos, visando ao controle social da política pública. Outras dimensões de participação poderiam ser consideradas, levando-se em conta a diversidade social e cultural dos territórios atendidos.
Nessa perspectiva, um ponto relevante é que o trabalho com famílias e território deve contemplar o planejamento da oferta de atividades grupais e coletivas de acordo com as necessidades percebidas pela equipe técnica, e com a participação dos usuários. Esse planejamento deve envolver o levantamento de vulnerabilidades e potencialidades, as características sociais e culturais do território. A realização de oficinas e outras atividades no CRAS precisa estar articulada a um plano de ação no território.
As metodologias participativas têm o potencial de facilitar a escuta da demanda dos usuários e a construção de ações (setoriais e intersetoriais) para responder a essa demanda. Podem colaborar com a formação para a cidadania, fortalecendo a capacidade dos atores sociais para atuar em seu contexto de vida.
Como reflete Bronzo (2005), as metodologias de trabalho social com famílias devem colaborar para o acesso aos direitos, bens e serviços públicos e sociais, fortalecendo o protagonismo e apoiando-se no processo de inclusão social. É nessa perspectiva que resgatamos, aqui, a importância do diálogo interdisciplinar.
Um diálogo com a Intervenção Psicossocial
A Psicologia Social é um campo de conhecimento interdisciplinar que investiga o vínculo social em seus aspectos intersubjetivo e social, os sentidos produzidos na interação social, suas formas instituídas e instituintes, direções e estratégias de mudança (Pichon-Rivière, 1998). Em torno do vínculo social, outros conceitos se articulam, tais como identidade, representações sociais, grupos, instituições, poder, em diferentes teorias e amplo diálogo com outros campos de conhecimento, sendo que muitos conceitos vêm sendo construídos de forma inter ou até mesmo transdisciplinar.
A intervenção psicossocial, práxis da psicologia social, nasce interdisciplinar. Aborda processos de transformação em contextos sociais diversos, a partir da análise crítica das estruturas e das relações sociais, do cotidiano, das instituições, da escuta qualificada e do trabalho com os sujeitos individuais ou coletivos, suas crises, demandas e projetos. A transformação social é um campo atravessado por múltiplos saberes e a Psicologia Social se reconhece como um deles, na articulação com outros tantos.
As práticas de intervenção psicossocial de cunho democrático e participativo envolvem produção de conhecimento (o grupo-sujeito produz conhecimento sobre si mesmo e sobre o seu contexto com a cooperação do sujeito-analista); e produção de ação sobre o mundo (os sujeitos fazem escolhas, individuais e coletivas, sobre seu agir no contexto histórico-social). O que está em jogo na intervenção psicossocial inclui a reflexão, mas vai além. Implica justamente na relação entre a mudança social e as escolhas feitas pelos sujeitos, em processos grupais e coletivos. Assim, interliga reflexão e ação (Lévy in Machado, Castro, Araújo & Roedel, 2001).
Para Machado (2004), o principal objetivo da Intervenção Psicossocial é a autonomia dos grupos envolvidos no processo de transformação social. A mudança é um processo que nasce não apenas da necessidade de resolver este ou aquele problema, mas que está associado ao desejo de autonomia dos grupos sociais. Não se trata de se definir qual é a mudança certa para um dado grupo social, mas de construir com ele as possibilidades de transformação que, em seu contexto, desenvolvem a sua autonomia.
Esse processo é movido por uma demanda de intervenção, apresentada pelo grupo-sujeito. É necessária a análise da demanda, mas esta não se confunde com um diagnóstico que tenha por base apenas dados, ainda que gerados nas melhores pesquisas e levantamentos. Trata-se de analisar, de maneira participativa, e junto com o grupo, o seu contexto histórico, socioeconômico, cultural; o que, nele, se configura como crise; quais são as suas demandas (conflituosas ou não) de transformação; quais os recursos materiais e simbólicos percebidos e desejados; quais os projetos do grupo diante do que vive, como realidade instituída e como demanda instituinte.
A demanda surge em situações coletivas e compartilhadas. Mesmo quando se manifesta através de um único indivíduo ou grupo, a demanda é sempre social, estando ligada às condições de existência e devendo ser compreendida no âmbito da sociedade. Sendo a expressão de uma falta, a demanda já apresenta elementos de um projeto que busca responder a essa falta (Lévy in Machado et al., 2001).
O processo de intervenção psicossocial (Lévy in Machado et al., 2001) implica na produção de um saber conjunto entre analistas e sujeitos sociais, adotando uma postura de pesquisa-ação, de cunho participativo. A equipe deve ajudar a elaborar a crise, incluindo os elementos da situação-problema que têm um efeito paralisante e alienante; trabalhar a construção de consensos (ainda que provisórios) e decisões conjuntas; problematizar os elementos contidos na situação, as possibilidades que podem orientar e sustentar a mudança, com suas continuidades e rupturas com os modos de vida existentes; construir pactos de ação, pois a escolha dos objetivos e estratégias de mudança incide sobre a realidade - e não apenas sobre o discurso.
Não se trata de negar que, na história, mudanças sociais acontecem pelas mais diferentes razões e inúmeras vezes por meio de pressões externas aos grupos. O que está em jogo é que, se um campo de conhecimento, no caso a intervenção psicossocial, quer constituir um saber e uma práxis, não pode, como tal, excluir os sujeitos e precisa incorporar a participação como motor de produção de conhecimento e de mudança. Pode-se compreender, por exemplo, que as políticas públicas têm um potencial de impactar e transformar a realidade e a vida de seus usuários. Porém, metodologias participativas, nas políticas públicas, têm que refletir sobre tais mudanças e suas escolhas implícitas e explícitas.
Foge ao escopo deste artigo discorrer sobre a diversidade de vertentes no campo da intervenção psicossocial. Para o nosso argumento, interessa, antes de introduzir a OIP, apresentar de maneira sintética duas metodologias muito utilizadas naquele campo: a Pesquisa-Ação e o Grupo Operativo.
A Pesquisa-Ação e o Grupo Operativo
Nas orientações técnicas do PAIF (Brasil, 2012b), a pesquisa-ação é uma das duas metodologias recomendadas, junto à pedagogia problematizadora de Paulo Freire. A pesquisa-ação surge nos anos 1940, com Kurt Lewin, e amplia a sua proposta até os dias atuais, abrangendo concepções com diferentes vinculações teórico-metodológicas. Thiollent (1994) a define como uma pesquisa de base empírica, realizada de maneira associada à resolução de uma questão coletiva e que pressupõe a participação, de maneira cooperativa, tanto dos pesquisadores quanto dos sujeitos que vivenciam a situação. Para Pimenta (2005), uma pesquisa-ação crítica não se limita a compreender e analisar, devendo ser um instrumento de transformação da realidade.
Assim, a pesquisa-ação visa: (1) um objetivo prático, de resolução de problemas, no contexto social; (2) elaboração de propostas de ação que colaborem com os sujeitos sociais em sua atividade transformadora; (3) construção de conhecimento do grupo sujeito sobre si mesmo, suas condições de vida, valores, projetos, visando subsidiar suas escolhas diante dos problemas enfrentados; (4) produzir e socializar conhecimentos, a partir de situações específicas, que possam ser utilizados na sociedade (Thiollent, 1994).
O grupo operativo se coloca como base extremamente relevante para várias outras construções sobre o processo grupal. Em nosso entender, torna-se especialmente interessante inseri-lo nessa discussão uma vez que Lévy (in Machado et al., 2001) não explicita abordagens para trabalho com os grupos face a face. Consideramos que a abordagem de Pichon-Rivière, mais do que ser compatível, aprofunda as possibilidades de intervenção dentro de uma perspectiva de intervenção psicossocial3. Uma leitura atenta aos princípios e processos da pesquisa-ação e do grupo operativo mostra a sua sintonia com a intervenção psicossocial, por exemplo, no que diz respeito à participação dos sujeitos, à produção dialética do conhecimento no processo de mudança, à articulação grupo-contexto e a preocupação com a transformação social.
Pichon-Rivière (1998) elaborou a teoria do grupo operativo na Argentina dos anos 1940. Define o grupo como um conjunto de pessoas, ligadas no tempo e no espaço, articuladas por sua mútua representação interna, que se propõem explícita ou implicitamente a uma tarefa, interatuando para isto em uma rede de papéis, com o estabelecimento de vínculos entre si. O sujeito social se constitui na relação com o outro. A organização de todo grupo é, a um só tempo, objetiva e subjetiva, racional e afetiva, englobando objetivos racionais, explícitos, bem como ansiedade, medo e prazer.
O grupo tem uma tarefa externa e uma tarefa interna. A tarefa externa é aquela delimitada pelos seus objetivos conscientes, explícitos, e que lhe dá identidade no contexto social. Já a tarefa interna inclui todas as formas de elaboração das relações no e do grupo para que este consiga realizar a sua tarefa externa, isto é, o seu trabalho (Pichon-Rivière, 1998). Para desenvolver o seu processo, o grupo precisa construir um Esquema Conceitual Referencial Operativo (ECRO) que, já naquele momento, é pensado como um trabalho de produção de sentidos e não como desvelamento de verdades positivas e absolutas. Pois o que se aprende no grupo operativo é que o ECRO muda, principalmente pelas vicissitudes do processo grupal e suas implicações (ademais políticas) no contexto. Trata-se de uma aprendizagem viva, participativa e problematizadora, que pode ser articulada à compreensão que Paulo Freire tem sobre a educação como prática transformadora, que problematiza o mundo e o sujeito no mundo, sendo, dessa maneira, uma prática para a liberdade (Freire, 1967).
No grupo, há processos básicos, inter-relacionados e em constante movimento, chamados de vetores do processo grupal, quais sejam: afiliação/pertencimento, comunicação, cooperação, tele, aprendizagem e pertinência. A afiliação é o nome dado quando a inclusão no grupo se limita a uma inclusão formal. O pertencimento implica em maior grau de identificação dos membros do grupo entre si e destes com a tarefa externa. A identificação sustenta a cooperação, que pressupõe reciprocidade e se processa pelo desempenho de diferentes papéis e funções. No processo de mudança é preciso elaborar o que se chama de mal-entendido no grupo e dinamizar a comunicação em torno dos seus objetivos e ideais (Pichon-Rivière, 1998).
Ao formular os seus objetivos, o grupo se propõe a uma mudança, mas, ao mesmo tempo defronta-se com as dificuldades desta... e resiste! O seu processo de mudança traz ao mesmo tempo, desejo e ansiedade. Explicita diferenças de interesses e pontos de vista. Exige, portanto, um trabalho de elaboração dos seus conflitos, medos e projetos. À medida que enfrenta as suas dificuldades, o grupo pode evoluir em suas tarefas, tornando-se mais consciente, flexível e criativo (Gayotto & Domingues, 1998).
O grupo operativo deu origem e embasamento teórico-metodológico a muitas experiências com grupos. Porém, desde a década de 1940, ao longo de mais de meio século que viu a ascensão e queda de ditaduras e a conturbada experiência de regimes chamados democráticos, na América Latina, outras discussões surgiram tanto na Psicologia Social quanto nas abordagens psicodinâmicas sobre grupos. Assim, embora mantendo muitos elementos teóricos do grupo operativo, algumas abordagens contemporâneas, como é o caso da OIP, procuram novas articulações teórico-metodológicas. Esta tendência é provocada também pelo desafio atual de inserção de metodologias participativas, dentre elas o grupo, nas políticas públicas, principalmente quando estas assumem o objetivo da promoção de direitos e de cidadania, o que seria um laço importante para novas produções no campo da intervenção psicossocial.
A oficina de intervenção psicossocial4: uma proposta de articulação
A Oficina de intervenção Psicossocial (Afonso, 2000; Afonso, 2006; Afonso, Vieira-Silva & Abade, 2009) é uma metodologia que tem sido utilizada no contexto de intervenção em políticas públicas, como na saúde e assistência social. O termo oficina expressa o seu caráter operativo, onde é desenvolvido um trabalho com as demandas, as identidades sociais as relações e processos do grupo. Pode ser definida como:
[...] um trabalho estruturado com grupos, independentemente do número de encontros, sendo focalizado em torno de uma questão central que o grupo se propõe a elaborar, dentro ou fora de um contexto institucional. A elaboração que se busca na Oficina não se restringe a uma reflexão racional, mas envolve os sujeitos de maneira integral, suas formas de pensar, sentir e agir. (Afonso, 2000, p.34)
A OIP, tal como trabalhada por Afonso (2000; 2006), é herdeira do Grupo Operativo, de Pichon-Rivière, dele conservando diversas concepções, tais como tarefa externa e interna, ECRO e vetores do processo grupal. Porém, dele também se diferencia por buscar fazer uma articulação teórico-metodológica, incluindo outros autores, agregando uma dimensão psicossocial (relações de poder e comunicação, articulações com o contexto, processos, discursos e projetos de mudança, identidades sociais, etc.); uma dimensão clínica (investimentos, desejo, relações subjetivas e intersubjetivas, medo da mudança, defesas, efeitos nas identidades individuais e no grupo; etc.) e uma dimensão educativo-reflexiva (informação, transmissão, relação do conhecimento com processos de transformação, etc.).
A oficina diferencia-se dos grupos estritamente terapêuticos ou educativos, porque articula essas três dimensões: psicossocial, clínica e educativo-reflexiva, enfatizando-se que todas elas estão sempre presentes nos diferentes grupos sociais (Afonso, 2000; Afonso, Vieira-Silva & Abade, 2009). Essas dimensões recobrem, de maneira dialética, interconectadas e transversalizadas, a capacidade de sentir, pensar e agir. Ou seja, a capacidade de subjetivar, objetivar e transformar-se a si mesmo e ao mundo. Os grupos podem variar segundo seus objetivos e a ênfase que dão a cada uma dessas dimensões. A possibilidade de reflexão e de ação é sustentada no vínculo grupal que, por sua vez, é sustentado pelo vínculo do grupo com a sociedade (a política pública, a instituição, outros grupos sociais) à qual remete, em última instância, pela tarefa externa.
A reflexão, ou problematização, que o grupo desenvolve sobre suas questões (Freire, 2003) pode ser promovida ou dificultada pela transversalidade (Enriquez in Machado et al., 2001). Os questionamentos produzidos incidem não apenas sobre a visão de mundo (Freire, 2003) como também sobre as identidades, vínculos e modos de vida dos participantes. Quase sempre mesclam desejo e medo da mudança. A OIP envolve sensibilização, diálogo, desconstrução e construção de sentidos, identidades e relações sociais, processos decisórios e organizativos em um contexto social.
O grupo constitui uma rede de vínculos, comunicação e poder (Lewin, 1988; Pichon-Rivière, 1998; Enriquez in Machado et al., 2001), em relação dialética com o seu contexto institucional e sociocultural. Como portador de um projeto, o grupo é ao mesmo tempo analista e sujeito de sua ação e, portanto, da produção de sua própria consciência no contexto da ação (Lévy, in Machado et al., 2001). Ao atravessamento das ideologias, discursos e práticas sociais no grupo, Enriquez (2001 in Machado et al., 2001) nomeia transversalidade, e este é um fator extremamente importante na análise das resistências à mudança, junto à compreensão dos medos da perda e medo do ataque, proposta por Pichon-Rivière (1998). A resistência à mudança, ponto chave no trabalho, abrange as vicissitudes dos vínculos, intersubjetivo e social, e as implicações políticas (no sentido amplo) das escolhas no processo (Lévy in Machado, 2001).
Para manejar essas dimensões é preciso trabalhar com o processo grupal e tudo o que ele implica em termos de fases, resistências, comunicação, cooperação, processos decisórios. A incorporação de elementos comunicacionais e lúdicos, a famosa dinâmica de grupo, ganha nova fundamentação com base em Winnicott (1975), Huizinga (2000) e, mais recentemente, Afonso & Abade (2013). Entretanto, é preciso reconhecer que a OIP é um projeto interdisciplinar, em contínua construção, que ainda tem muito o que desenvolver, como, por exemplo, a discussão sobre a relação entre os processos de comunicação no grupo e os discursos no contexto social e histórico (Fadul, 2014; Fadul & Afonso, 2014).
A organização do trabalho com grupos na OIP
Para o trabalho na OIP, é proposta uma metodologia (Afonso, 2000; Afonso, 2006) que deve ser pensada como uma estratégia que busca congregar elementos para potencializar o grupo e não como um roteiro rígido para sua condução. A explicitação dos elementos torna-se aqui um mecanismo didático. Cabe à coordenação, junto ao grupo, decidir como se apropriar desses elementos, criando a sua própria dinâmica e processo. A OIP abrange e articula:
(a) a análise da demanda: o profissional busca escutar o grupo, interpretar os pedidos explícitos que fazem, dentro de seu contexto, associados às suas condições de existência, modos de vida e desejos de mudança. No contexto do PAIF, estaria relacionada ao afiançamento da segurança de acolhida como tradução das demandas da população em oferta de serviços;
(b) a pré-análise: inclui o levantamento e sistematização de dados sobre a realidade dos participantes, no caso das famílias e do território atendido pelo PAIF. Está ligada a uma construção de diagnóstico com participação de toda a equipe técnica e de usuários, em processos cada vez mais amplos de participação. Esse diagnóstico precisa ser afinado com os objetivos da política pública e subsidiar a proposição de oficinas e outras atividades a serem desenvolvidas de maneira articulada no período, incluindo ações intersetoriais. Ou seja, o trabalho com grupos começa antes mesmo de cada grupo começar. Nesse diagnóstico, recomenda-se incluir a discussão das concepções que partem da política pública e que vão ser transversalizadas no grupo: cidadania, família, vulnerabilidade e outras.
(c) Proposição de foco e temas-geradores: O tema geral da Oficina é o "foco" em torno do qual o trabalho será deslanchado. Pode receber um nome relacionado ao possível interesse do grupo. Em vez de um teórico oficina de reflexão ou genérico oficina de convivência, pode-se dar um nome como oficina de igualdade racial ou oficina de contação de histórias. Em torno desse foco surgem temas-geradores, que podem ser trabalhados em um ou vários encontros, acompanhando o desejo e a linguagem do grupo e conectados ao trabalho de enfrentamento de vulnerabilidades. Os temas-geradores são escolhidos e aprofundados pelo próprio grupo, pois ele é o contexto onde se ressignificam as questões vivenciadas e pensadas. À maneira das palavras geradoras de Freire (1967), os temas-geradores mobilizam o grupo porque se relacionam à sua experiência, tocam nos conflitos e nas possibilidades, aguçam o desejo de participação e troca (Afonso, 2000). Na política pública, o profissional deve buscar articular os objetivos da política com aqueles apresentados pelos usuários. É o momento também de buscar possíveis questões que poderiam gerar práticas intersetoriais;
(d) Construção de enquadre: diz respeito ao número e tipo de participantes, local, recursos disponíveis, número de encontros, e assim por diante. É preciso preparar uma estrutura para dinamizar o trabalho e esta precisa estar afinada com os objetivos da política pública na qual se opera;
(e) Planejamento flexível da oficina: Iniciando o processo, a estrutura criada serve de base, mas é preciso dinamizar. Em cada encontro, acontece o desdobramento dos temas-geradores. O coordenador do grupo prepara materiais e técnicas para dinamizar o encontro, mas o grupo pode mudar esse planejamento inicial, dependendo do rumo que o seu processo toma. O grupo pode escolher dentro das temáticas, aceitar ou recusar técnicas, apontar novas questões e assim por diante;
A ideia de um planejamento flexível se desdobra no trabalho com outros elementos do processo grupal, nomeadamente:
(f) Articulação entre tarefa externa, tarefa interna e contexto socioinstitucional, buscando por meio dos temas-geradores, aproximar os objetivos do grupo, a sua dinâmica interna, os objetivos da política, os atravessamentos do contexto;
(g) Potencialização do vínculo grupal e dos vetores do processo grupal: É importante trabalhar com o processo grupal como um todo (ao longo de toda a duração do grupo) e com a dinâmica interna a cada encontro. Os vetores do processo grupal são ferramentas úteis ao longo desse processo. Cada encontro é organizado em momentos de sensibilização, problematização e sistematização (Afonso, 2000; Afonso, 2006).
(h) Uso de recursos interativos, lúdicos e comunicacionais: Os recursos para dinamizar o grupo são diversos: podem ser usados elementos da cultura local, atividades, jogos e técnicas de dinamização. Constituem dispositivos para criar novas interações, situações desafiadoras e linguagens, incentivando o processo grupal. Busca-se provocar uma abertura dialógica. Pode ser interessante mesclar situações estruturadas de aprendizagem e recursos lúdicos, não apenas jogos, mas também dinâmicas de grupo, passeios, gincanas, feiras, atividades comunitárias e outros (Afonso & Abade, 2013). Pensando no fortalecimento de vínculos, no PAIF, sugere-se que a participação no grupo possibilita o desenvolvimento de competências psicossociais, por meio da comunicação, interação, construção de regras, eleição de objetivos comuns, construção de consensos, escolhas coletivas, cooperação, manejo de conflitos, etc.
(i) A Relação coordenação-grupo é fundamental para facilitar e dar sustentação ao processo do grupo. A coordenação do grupo tem a função de promover, facilitar e mobilizar processos de reflexão, informação, aprendizagem e organização na situação grupal. No caso do PAIF, essa atuação será entrelaçada aos objetivos do serviço, contribuindo para o enfrentamento das vulnerabilidades. A relação da coordenação com o grupo precisa ser horizontalizada/democratizada, mediando os processos de comunicação e atribuição de sentidos no grupo (Afonso, Vieira-Silva & Abade, 2009). A atuação da coordenação será, muito provavelmente, influenciada pelas suas concepções de proteção social, cidadania, família, pobreza e exclusão social, havendo necessidade de constante capacitação dos trabalhadores do SUAS sobre essas questões.
(h) Auto-gestão e autonomia do grupo: na OIP, o desejo de autonomia é o que move o processo grupal, sendo ao mesmo tempo o seu princípio e a sua finalidade. Independentemente de sua questão, de sua crise e de seu projeto, o que move o grupo é a busca por autonomia (e o que o paralisa é justamente a desistência dela). Em uma oficina dentro de uma política pública, pressupõe-se uma constante negociação entre usuários e o que está em pauta é o que se oferece em termos de garantia de direitos;
(i) Relação grupo-contexto social e histórico: No OIP, indaga-se sobre os impactos do grupo no contexto e do contexto no grupo. No PAIF, coloca-se em causa a relação trabalho com grupos - trabalho com o território. Indaga-se o que, nas oficinas, ajuda a alcançar os objetivos da política. Afonso (2010b) argumenta que os grupos não podem se limitar a intervenções educativas, ainda que respaldadas em metodologias problematizadoras. É importante que haja sustentação para as reflexões desenvolvidas e isto requer iniciativas que ultrapassam os limites do grupo, como a articulação da rede de serviços. Quando o trabalho de reflexão se centra apenas na atuação dos membros do grupo, deixando de implicar a rede de serviços e as políticas públicas, corre-se o risco de se criar um efeito de "quase culpabilização" dos usuários. As mudanças precisam ter ancoragem em formas tangíveis de apoio social.
O trabalho com Grupos na Proteção Social Básica: contribuições a partir da OIP
Até aqui, apresentamos a proposta de oficinas do PAIF (Brasil, 2012b) e delineamos, em linhas gerais, a fundamentação teórico-metodológica e a metodologia da OIP. Trata-se agora de buscar pontos de convergência entre elas.
Neste artigo, apresentamos a nossa elaboração sobre as possíveis contribuições da OIP ao trabalho social com famílias e território no CRAS, mais especificamente no PAIF. Essas contribuições são descritas no Quadro 1, que pode servir como referência para a proposição e condução das oficinas no PAIF e oferecer subsídios para seu monitoramento e avaliação. Nesse sentido, é importante lembrar que o avanço das metodologias de trabalho com grupos nas políticas públicas precisa ser acompanhado de estratégias para o seu monitoramento e avaliação. É preciso indagar se o trabalho com grupos respondeu ao planejamento feito para o território, se respondeu aos objetivos da PNAS, se houve articulação com outras ações, e assim por diante.
Não é incomum que o trabalho com grupos no PAIF seja descrito pelos seus aspectos formais (número de oficinas, número de participantes, etc.). Esses dados são válidos para acompanhar os resultados do planejamento feito. Porém, mais importante ainda é monitorar e avaliar os aspectos dinâmicos e transversais do grupo, conforme descritos no Quadro 1. Os elementos dinâmicos correspondem ao processo grupal. Os elementos transversais são aqueles interligam o processo do grupo aos objetivos da política pública, no caso a PNAS e mais especificamente o PAIF.
O Quadro 1 resume a contribuição que intencionamos com o presente artigo. Esperamos que possa ser apropriado como uma matriz para a utilização da OIP no PAIF, e quiçá em outras políticas públicas que trabalham com grupos, na perspectiva da promoção dos direitos de cidadania.
Considerações Finais
Cada metodologia tem sua contextualização histórica e sua utilização em políticas públicas não pode ser mera repetição de procedimentos e técnicas, fazendo-se necessária uma visão crítica sobre suas possíveis contribuições (Afonso, 2010a). Mais importante ainda, deve contemplar o esclarecimento e aprofundamento de noções envolvidas no arcabouço da política pública e em sua relação com a população. No caso do PAIF, colocam-se não apenas conceitos (tais como grupo, demanda, enquadre e temas-geradores) como também noções de cidadania, família, proteção social, e outras.
Nesse sentido, lembramos que o processo de construção da Política de Assistência Social foi, e ainda é, permeado de tensões e contradições, especialmente vinculadas a diferentes visões de proteção social e de cidadania e que essas tensões podem perfeitamente se expressar nas metodologias adotadas no SUAS. Torna-se necessário construir referências para que o trabalho com famílias e grupos venha de fato a colaborar na promoção da participação e da cidadania.
No presente artigo, procuramos apresentar nossas contribuições diante dos desafios do trabalho com grupos no âmbito do PAIF, explicitando a proposta de OIP, dentro de uma abordagem de intervenção psicossocial. Sem negar a riqueza de outras abordagens, esperamos ter colaborado para o debate sobre metodologias participativas nas políticas públicas, ao mesmo tempo em que nos permitimos explorar novas correlações da OIP com o campo da intervenção psicossocial.
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Recebido em: 10/08/2014
Reformulado em: 30/05/2015
Aprovado em: 30/06/2015
1 Este artigo foi construído a partir de três trabalhos anteriores: (1) o texto "Revisão bibliográfica sobre metodologias de trabalho social com famílias e análise do estado da arte do seu emprego" (Afonso, 2010a); (2) a dissertação de Fabiana Meijon Fadul, intitulada "O trabalho social com famílias no âmbito da Proteção Social Básica: diálogos e conflitos no campo discursivo da Assistência Social" (Fadul, 2014), defendida, com orientação de Maria Lúcia M. Afonso, no Mestrado em Gestão Social e Desenvolvimento Local, do Centro Universitário UNA, Belo Horizonte; e (3) o relatório da consultoria (Afonso & Fadul, 2011) prestada à Equipe Regionalizada de Proteção Social Básica à Família (que atende famílias fora dos territórios de abrangência dos CRAS), Prefeitura de Belo Horizonte, em 2012, por Maria Lúcia M. Afonso, com a participação de Fabiana Meijon Fadul, que, à época, integrava a equipe técnica. Aproveitamos para prestar nossos agradecimentos à equipe, na pessoa da gestora Maria Ângela de Amorim Corrêa.
2 Para uma visão mais diversificada de tipos de metodologias participativas, ver Brose (2001).
3 A riqueza das abordagens grupais e suas diferenciações foge ao escopo deste artigo, mas fica a sugestão para a pesquisa de abordagens que buscam, além de compreender o processo grupal, trabalhar com os seus atravessamentos dentro do contexto institucional, sociocultural e histórico, o que é também projeto da OIP.
4 Inicialmente designada por Oficina em Dinâmica de Grupo (Afonso, 2000; Afonso, 2006) vem sendo designada mais recentemente de Oficina de Intervenção Psicossocial (Afonso; Abade, 2007; Afonso, Vieira-Silva & Abade,2009), como uma forma de deixar mais clara a sua inserção na vertente teórico-metodológica da Intervenção Psicossocial.