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Pesquisas e Práticas Psicossociais
versión On-line ISSN 1809-8908
Pesqui. prát. psicossociais vol.14 no.3 São João del-Rei jul./set. 2019
Estratégias para o fortalecimento de redes sociais comunitárias: a experiência dos bairros Tupi e Lajedo em Belo Horizonte/MG
Strategies for strengthening community social networks: the experience of the Tupi and Lajedo neighborhoods in Belo Horizonte/MG
Estrategias para el fortalecimiento de redes sociales comunitarias: la experiencia de los barrios Tupi y Lajedo en Belo Horizonte/MG
Isabela Saraiva de QueirozI; Liza FensterseiferII; Manoela da Silva Costa MarraIII; Humberto de Aquino CostaIV; Thatiury Sales AraújoV; Thaís Natiele Bessa de MirandaVI; Isadora Silva FonsecaVII; Natasha Cristina da Costa CarvalhoVIII
IProfessora do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de São João del-Rei
IIProfessora do Departamento de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
IIIEstudante de Graduação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
IVEstudante de Graduação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
VEstudante de Graduação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
VIEstudante de Graduação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
VIIEstudante de Graduação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
VIIIEstudante de Graduação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
RESUMO
A pesquisa objetivou sistematizar estratégias para o fortalecimento de uma rede comunitária localizada em Belo Horizonte, desmobilizada em decorrência de conflitos existentes entre suas lideranças e pela forte presença de viés político-partidário nas relações comunitárias. Buscou-se elucidar os fatores que influenciavam no engajamento, motivação e participação política da comunidade nas ações em rede para, a partir daí, propor estratégias para o seu fortalecimento. Foi utilizada a pesquisa participante como método, tendo sido realizada observação participante e um grupo focal como instrumentos de coleta de dados. Repensar a própria rede, seus objetivos e funcionamento, e realizar ações que digam respeito à comunidade e sua história, para que os moradores se identifiquem e estabeleçam uma relação de afeto com o território, foram algumas das estratégias propostas para a reconfiguração da rede comunitária, com vistas ao aumento da sua força de mobilização e à participação efetiva de seus membros.
Palavras-chave: Psicologia Comunitária. Redes comunitárias. Participação social.
ABSTRACT
The main objective of our research was to systematize strategies for strengthening a community network located in Belo Horizonte, demobilized as a consequence of conflicts between their leaders and by the strong presence of partisan political bias in their community relations. We tried to elucidate the factors influencing the engagement, motivation and political participation of the community in the networked actions in order to, from there, propose strategies for community strengthening. Method used was the participatory survey, with participatory observation and focal group chosen as data collection instruments. Some of the proposed strategies for reconfiguration of community network were to rethink the actual network, its objectives and operation, and to make actions related to the community and its history, in order to make the dwellers identify themselves and establish an emotional/affective relationship with the territory, towards the increase of the mobilization force and the effective participation of the community members.
Keywords: Community Psychology. Community networks. Social participation
RESUMEN
La investigación objetivó sistematizar estrategias para el fortalecimiento de una red comunitaria ubicada en Belo Horizonte, desmovilizada como consecuencia de conflictos existentes entre sus líderes y por la fuerte presencia de sesgo político-partidario en las relaciones comunitarias. Se buscó elucidar los factores que influían el compromiso, motivación y participación política de la comunidad en las acciones en red para, a partir de ahí, proponer estrategias para su fortalecimiento. Se utilizó la investigación participante como método, habiendo sido realizada observación participante y grupo focal como instrumentos de recolección de datos. Repensar la propia red, sus objetivos y funcionamiento, y realizar acciones que afecten a la comunidad y su historia, para que los habitantes se identifiquen y establezcan una relación de afecto con el territorio, fueron algunas estrategias propuestas para la reconfiguración de la red comunitaria, con vistas al aumento de su fuerza de movilización ya la participación efectiva de sus miembros.
Palabras clave: Psicología Comunitaria. Redes comunitarias. Participación social.
Introdução
A pesquisa em tela foi realizada no bojo de um projeto de extensão universitária, desenvolvido por professores e alunos do curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, desde o ano de 2012, intitulado "Articulando Redes, Fortalecendo Comunidades". O foco central do projeto consiste na realização de ações de fortalecimento e articulação de redes comunitárias em três comunidades da cidade de Belo Horizonte, a saber: Vila Cemig, São Gabriel e Tupi-Lajedo, a partir da troca de experiências, sistematização de metodologias e formação de atores sociais (Gonçalves, 2014).
A rede comunitária Tupi-Lajedo, um dos focos de atuação do projeto "Articulando Redes, Fortalecendo Comunidades", foi criada em 2008, a partir da demanda da própria comunidade, do centro de saúde local e da mobilização de algumas lideranças comunitárias. A rede era composta inicialmente apenas pelo bairro Lajedo, mas no ano de 2014, em uma reunião proposta pelo centro de saúde local, o grupo decidiu por expandir sua atuação abrangendo também o bairro Tupi, visto que ambos os bairros eram próximos geograficamente, sendo atendidos pelo mesmo centro de saúde, e que algumas lideranças do Tupi cobravam a participação de moradores do bairro Lajedo na articulação dos processos comunitários. Fundou-se, assim, a rede Tupi-Lajedo. Com a nova configuração, houve a inserção de novos parceiros, o que fez com que a atuação na comunidade se ampliasse significativamente (Gonçalves, 2014).
O bairro Lajedo está situado na Regional Norte de Belo Horizonte e tem uma população de aproximadamente 12.400 moradores. A região é classificada como de elevado risco pelo Índice de Vulnerabilidade à Saúde de 2003 (Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte, 2003). Além disso, sua população dispõe de poucos equipamentos sociais, opções de lazer e projetos sociais. Já o bairro Tupi é um dos maiores bairros da região norte de Belo Horizonte e, segundo o Censo 2010 (IBGE, 2010), sua população é de mais de 27.000 pessoas.
Em 2013 foi realizado um diagnóstico social da rede Tupi-Lajedo, que teve como objetivo fazer um levantamento do perfil dos seus moradores e das demandas lá existentes. Além da coleta de dados, o diagnóstico teve também o objetivo de mobilizar pessoas interessadas em participar mais ativamente das ações da comunidade e de conhecer possíveis novas lideranças (Gonçalves, Saadallah & Queiroz, 2015).
O diagnóstico social ouviu 400 famílias do bairro Lajedo mediante a aplicação de questionários em duas etapas, em junho e outubro de 2013. Com esses dados, foi possível caracterizar o perfil sociodemográfico dos moradores e grupos familiares do bairro, identificar demandas na área da saúde, educação, assistência social, habitação, cultura, esporte e lazer, dentre outros temas de abrangência das políticas públicas. O diagnóstico também possibilitou identificar lideranças comunitárias e redes colaborativas presentes na comunidade, sistematizar dados relativos às suas potencialidades laborais e artísticas, no plano individual e coletivo, além de caracterizar as formas de participação política e social dos moradores do bairro, bem como suas percepções mais significativas sobre sua realidade. A comunidade participou de todo o processo, desde a escolha da data para a coleta de dados, infraestrutura, logística, transporte, produção e aplicação do questionário, até a doação e preparo do lanche das equipes, viabilizando toda a execução do diagnóstico.
O instrumento de coleta de dados do diagnóstico foi uma entrevista estruturada, contendo questões fechadas e abertas. As perguntas foram organizadas da seguinte forma: a parte inicial abrangeu as características do grupo familiar e sua percepção acerca do seu acesso a serviços; a segunda parte investigou a percepção do grupo familiar sobre a comunidade de modo geral; e a terceira, seu conhecimento sobre trabalho em rede e a atuação do projeto na comunidade.
Para maior aprofundamento do diagnóstico, também foi realizado um mapeamento dos equipamentos sociais existentes, tais como o Centro de Referência em Assistência Social (Cras), escolas, centros de saúde, igrejas, hospitais, conselhos, associações comunitárias, creches, a fim de facilitar a articulação entre os membros da comunidade e os equipamentos, e entre os próprios equipamentos. Deve-se destacar a dificuldade de contatar os equipamentos, o que revelou a existência de poucas organizações dispostas a se envolver com a proposta. Mesmo assim, ao final da realização do diagnóstico social e do mapeamento dos equipamentos da rede, todas as informações foram organizadas em um documento no qual foram listados os equipamentos dos quais a comunidade dispunha, assim como as formas de acesso e o público atendido por cada um deles.
A partir dessa articulação, a rede Tupi-Lajedo passou a se reunir para discutir assuntos relacionados à vida comunitária, ocasião em que os equipamentos, as lideranças e os demais membros da comunidade discutem suas principais demandas e definem encaminhamentos, com vistas ao fortalecimento da rede e à articulação dos envolvidos, visando à superação dos problemas comuns e ao desenvolvimento comunitário.
De acordo com Gonçalves, Saadallah e Queiroz (2015), o desenvolvimento da rede Tupi-Lajedo passou por momentos de fragilização, decorrentes de conflitos existentes entre as lideranças dos bairros, mas também da forte presença de um viés político-partidário nas relações comunitárias, o que dificultou o trabalho de articulação, resultando na desmobilização do grupo. Outros problemas recorrentes identificados pelas autoras são os diversos conflitos de interesse e a grande diversidade de objetivos e projetos dos membros da comunidade envolvidos. A falta de sistematização e de clareza dos objetivos e a improdutividade das reuniões, muitas vezes orientadas por pautas inespecíficas, também foram citadas como causas de desmobilização. Tudo isso levou à necessidade de uma reflexão sobre a rede Tupi-Lajedo, já que, como afirmam Gonçalves e Guará (2010), toda rede demanda uma constante reorganização de suas formas de funcionamento e deve ser reconhecida como algo flexível e dinâmico, para que possa continuar se constituindo como um dispositivo de desenvolvimento comunitário.
A pesquisa aqui apresentada objetivou, portanto, sistematizar estratégias para a manutenção e o fortalecimento da rede Tupi-Lajedo, a partir da participação efetiva de seus membros, considerando que apenas a própria comunidade pode direcionar os caminhos de atuação e as necessidades que deverão ser enfrentadas com vistas à sua emancipação.
Para que esse objetivo pudesse ser alcançado, buscou-se, por meio de ações cooperativas e complementares e, principalmente, por meio do estabelecimento de relações horizontais, elucidar os fatores que influenciam no engajamento, motivação e participação política dos membros da comunidade nas ações em rede para, então, a partir daí, propor estratégias para o seu fortalecimento.
Sobre o conceito de redes
Como Amaral (2007) afirma, o conceito de redes configurou-se na última década como uma possibilidade de organização que permite responder de modo flexível às demandas, tecendo conectividade e descentralização nos contextos e esferas de articulação e atuações sociais diversas. No presente artigo, o termo "redes" será utilizado no contexto das ciências humanas e sociais, a partir da definição de Börzel, citado por Fleury (2005), que as entende como um conjunto de relações relativamente estáveis, de natureza não hierárquica e independente, que vincula uma variedade de atores que compartilham interesses comuns em referência a uma política, e que fazem intercâmbio de recursos para perseguir esses interesses compartilhados, admitindo que a cooperação é a melhor maneira de alcançar metas comuns (Börzel, citado por Fleury, 2005, p. 78).
As redes sociais podem ser compreendidas como o conjunto dos vínculos sociais entre os indivíduos e as organizações. (Scherer-Warren, 2011). Nesse sentido, estudos de redes sociais tratam de relações sociais, da relação entre rede e sociedade e da ação social, visando à transformação da realidade, por intermédio do envolvimento dos atores sociais (sociedade civil e instituições) na participação política.
Redes, nesse contexto, são entendidas como um conjunto de entidades sociais, órgãos do setor público, profissionais independentes, lideranças comunitárias e agentes sociais, articulados entre si, que buscam transformar a realidade de determinada comunidade (Gonçalves & Guará, 2010). Na pesquisa aqui proposta, buscou-se desenvolver estratégias de manutenção de redes comunitárias nos bairros Tupi e Lajedo, caracterizados por alto índice de vulnerabilidade e poucos equipamentos sociais (Gonçalves, 2014).
Fundamentada em práticas da Psicologia Social Comunitária, a metodologia de redes introduz um olhar inovador nas políticas sociais e comunitárias (Gonçalves & Guará, 2010). Ela rompe com o individualismo exacerbado do mundo contemporâneo e coloca-se como ferramenta emancipatória, conscientizando sujeitos historicamente esquecidos, pouco assistidos e injustiçados a reconhecerem e exercerem seus direitos como cidadãos. Essa metodologia também rompe com a fragmentação das ações estatais, enfatizando a participação de todas as esferas sociais, com vistas a atingir os objetivos comuns de uma comunidade (Borges, 2004).
Para que redes comunitárias sejam mantidas, é necessário que sejam desenvolvidas ações contínuas de articulação entre os envolvidos. Conforme Gonçalves e Guará (2010), a rede é uma estrutura dinâmica e, em consequência disso, ela deve sempre se reconfigurar de acordo com as demandas e mudanças da comunidade. Desse modo, pode-se pensar que a desarticulação das redes comunitárias do Tupi e do Lajedo, problema aqui em tela, decorreu da necessidade de reordenamento das demandas das comunidades envolvidas e das ações a elas vinculadas.
Participação e mobilização social
Nas metodologias de rede, a participação efetiva dos membros envolvidos tem papel central. Chirinos (1991) compreende que, em alguma medida, apesar de pequenas especificidades apontadas em conceitos diferentes de participação, esta sempre envolve alguma organização social e feição política, com ocupação de espaço público, construção de identidade e busca por direitos. Desse modo, admite-se que a participação traz benefícios para grupos sociais, independentemente da forma como ela se organiza, ainda que algumas pareçam ser mais eficazes do que outras. Além disso, Demo (2001) ressalta que toda participação precisa ser construída, reforçada e constantemente revista, caracterizando-se por um processo em constante evolução.
Com a ineficiência do Estado em atender todas as demandas da sociedade, os movimentos sociais, mediante ações coletivas, mobilizam-se para expressar suas necessidades e garantir aos cidadãos o acesso aos direitos sociais (Franco, 1994; Teixeira, 1997). No entanto, apesar de haver a participação de vários segmentos como representantes de grupos sociais específicos nos espaços de exercício democrático institucionalizado, é possível observar esses mesmos espaços de participação sendo utilizados unicamente para troca de favores e cooptação partidária, por exemplo, impossibilitando a verdadeira democracia (Wendhausen, Barbosa & Borba, 2006). Borba (2004) cita os limites da participação, com destaque para as desigualdades em relação ao poder, ao saber e ao acesso a recursos políticos dos sujeitos envolvidos. Todos esses aspectos fazem com que nem sempre exista, no interior dos grupos sociais, processos participativos efetivos.
Toro e Werneck (2004) afirmam que a participação é uma decisão individual, devendo ser tratada como um ato de liberdade de escolha, que pode ser influenciada pelo fato do sujeito se beneficiar da mudança produzida, ou ser capaz de produzi-la. Além disso, Toro e Werneck (2004) ressaltam que a participação é uma aprendizagem e que, no processo de mobilização social, ela é tanto meta quanto meio para realizar outros objetivos. Isso faz com que quanto maior seja a participação, maior seja, também, a mobilização, e vice-versa. Assim, para qualquer processo de mobilização social, a participação dos sujeitos envolvidos é fundamental.
Entretanto, Toro e Werneck (2004) salientam que para que haja mobilização social é preciso que seu objetivo esteja orientado para um projeto de futuro e não para o alcance de metas passageiras, caso contrário seu significado pode ser remetido a apenas um evento ou campanha. Caracterizada como um movimento de todos, não pode haver a presença de "donos do processo" de mobilização, sendo fundamental que fique claro a todos que cada um age no seu próprio campo de atuação, mas que todos estão sempre em busca dos mesmos propósitos.
Toro e Werneck (2004) destacam, ainda, que a mobilização social é produzida por pessoas comuns, em uma construção cotidiana. Para contribuir nesse processo, os autores elencam como necessário que: a) a situação, os objetivos e as prioridades da mobilização estejam claros a todos os participantes; b) o reconhecimento, a valorização e o respeito à forma de ser e pensar de todos e de cada um dos envolvidos estejam assegurados; e c) cada um sinta a confiança dos demais em relação à sua capacidade e possibilidade de contribuição para alcançar o objetivo proposto com o movimento de mobilização. Para que isso ocorra, é importante que cada um consiga enxergar no processo de mobilização a explicitação das decisões tomadas conjuntamente e das ações definidas como necessárias ao alcance dos objetivos delimitados.
A seguir apresentaremos a metodologia utilizada para a sistematização de estratégias para o fortalecimento da rede Tupi-Lajedo, elaboradas a partir da participação e mobilização efetivas de seus membros, por meio de ações cooperativas e complementares.
Metodologia
Para o alcance dos objetivos propostos, foi utilizada a pesquisa participante como método, uma abordagem de pesquisa qualitativa que, segundo Haguete (1992), Gabarron e Landa (1994), procura promover a emancipação do saber popular mediante a produção de conhecimento, tanto pelo polo pesquisador quanto pelo polo pesquisado. No contexto da América Latina, a pesquisa participante encontra-se fortemente ligada a movimentos autogestionários e emancipatórios (Thiollent, 1987), e seus resultados estão vinculados à tomada de consciência dos fatores envolvidos nas situações de vida imediatas e à participação coletiva como promotora de mudanças na ordem social (Brandão, 1987).
Tomando como base, então, os pressupostos metodológicos da pesquisa participante e a disponibilidade dos participantes, foi realizado um grupo focal com lideranças comunitárias e com representantes de equipamentos sociais dos bairros Tupi e Lajedo: Centro de Referência em Assistência Social (Cras), centro de saúde, escola, pastoral e Estratégia de Saúde da Família (ESF). O grupo focal qualifica-se como instrumento de pesquisa qualitativa, que utiliza a técnica da entrevista em grupo com o intuito de coletar informações sobre um tópico específico, por meio da interação social entre os participantes (Morgan, 1996; Oliveira, Freitas, 1998; Kitzinger, 2000; Oliveira, Leite Filho & Rodrigues, 2007).
O grupo realizado foi composto por nove participantes, de ambos os sexos, todos com idade superior a 18 anos. O critério para a escolha dos participantes foi a participação em, pelo menos, três reuniões mensais da rede Tupi-Lajedo. O grupo foi conduzido por um moderador, com o auxílio de dois observadores não participantes, e foi utilizado um temário que versou sobre as seguintes questões: conceito de redes comunitárias, fatores que facilitam e dificultam a participação, fatores vinculados à motivação ou à desmotivação para a participação política na comunidade, conquistas da participação social e da articulação comunitária para o desenvolvimento local, entre outras. Foram utilizados dois gravadores de áudio e a ferramenta do Google Drive para sua posterior transcrição. Na abertura do grupo, foram apresentados os objetivos da pesquisa e o temário que seria utilizado para condução do grupo, seguidos do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que foi assinado por todos os participantes. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, estando registrada na Plataforma Brasil com o número CAAE: 57207616.3.0000.5137.
Como instrumento complementar de coleta de dados, os pesquisadores participaram de uma reunião da rede Tupi-Lajedo, na qual, recorrendo à técnica de observação participante, foi possível entrar em contato direto com o contexto e as relações existentes entre os membros das duas comunidades. A participação nessa reunião também foi importante para que os pesquisadores pudessem se apresentar, criar um vínculo inicial com os participantes do grupo focal e conhecer mais profundamente a rede investigada.
Além de coletar dados, o grupo focal também teve o objetivo de promover entre os participantes um debate acerca do conceito de rede e realizar uma discussão sobre participação e mobilização social - buscando identificar o que facilita e dificulta esses dois processos e a responsabilidade de cada um para sua efetivação. Ouvir a versão dos que trabalham, moram e são usuários dos equipamentos dos dois bairros fez com que nuances dos processos de participação e mobilização social pudessem ser percebidas, o que colaborou para que a construção de estratégias para o fortalecimento da rede comunitária fosse feita a partir de bases mais concretas.
Os dados coletados por meio do grupo focal e da observação participante foram analisados à luz da técnica de análise de conteúdo, que tem como objetivo "compreender criticamente o sentido das comunicações, seu conteúdo manifesto ou latente, suas significações explícitas ou ocultas" (Chizzotti, 2006, p. 98). Foram estabelecidas três categorias de análise, cuja discussão será apresentada a seguir.
Resultados e discussão
Participação social, além de um direito, um caminho para a democracia plena
Nesta categoria buscamos compreender o que se entende por participação social, quais são os fatores que a promovem em uma comunidade, e qual a sua importância. No grupo focal, foram destacados diversos elementos que, aos olhos dos participantes, contribuem para ou dificultam a efetiva participação social.
Inicialmente, os participantes descreveram participação social como uma obrigação do cidadão e como caminho para a resolução dos problemas da comunidade. A partir daí, o debate no grupo fez evoluir a compreensão da participação como obrigação, para participação como direito. Ao final, houve um consenso entre os participantes sobre a participação social como um direito, que deve ser exercido coletivamente, sendo reforçada a noção de cooperação e a necessidade de união de forças para o alcance de objetivos comuns. Os participantes evidenciaram, ainda, a necessidade da participação se dar nas diversas instâncias governamentais, visando contribuir nos processos de decisão e gestão pública. Ao mesmo tempo, identificou-se que essa compreensão ainda não está presente em toda comunidade, o que dificulta a adesão de muitos moradores não apenas à rede Tupi-Lajedo, mas a outros espaços de participação social.
Segundo Toro e Werneck (2004), frequentemente, somente quando se observam os resultados positivos da participação é que os membros de uma comunidade engajam-se em ações coletivas de desenvolvimento local, ou seja, somente quando se dá visibilidade e poder de decisão à comunidade, com vistas a uma melhoria em prol de si mesma, é que há participação. Em consonância com o que trazem os autores, notou-se, a partir do debate no grupo focal, que a participação nos bairros Tupi e Lajedo estava estreitamente vinculada aos interesses pessoais dos participantes.
Ainda de acordo com Toro e Werneck (2004), somente quando os sujeitos se reconhecem como membros da rede é que eles passam a se ver como parte de um processo coletivo de conquista de interesses comuns. Assim, para que os atores sociais emerjam e constituam processos de participação coletiva, é necessário que eles se identifiquem com aquele ambiente ou comunidade, ou seja, é necessário que se reconheçam como parte daquele território. Identificação territorial revela-se, então, como parte essencial do processo de formação da identidade local de determinado grupo ou rede. Nesse sentido, notou-se, a partir das discussões realizadas no grupo focal, que o sentimento de pertencimento dos moradores dos bairros Tupi e Lajedo funciona como um potencializador das ações de participação, com vistas ao encaminhamento de projetos de desenvolvimento local. Constata-se, assim, que conhecer as particularidades locais das comunidades fortalece a identificação territorial e a mobilização dos membros da comunidade como cidadãos ativos na sociedade civil.
Sobre a questão da identidade territorial, o debate no grupo focal evidenciou aspectos conflitantes. Para alguns participantes, o fato de a rede Tupi-Lajedo abarcar os dois bairros faz com que muitos moradores não se reconheçam nela, havendo a defesa de que deveria haver duas redes, a do bairro Tupi e a do bairro Lajedo, separadamente. Para esses participantes, essa poderia ser uma estratégia para aumentar a participação dos moradores, pois possibilitaria uma ação mais efetiva em cada bairro. Por outro lado, outros participantes contestaram essa medida, argumentando que, apesar de morarem no bairro Tupi, utilizavam os serviços públicos do bairro Lajedo, e lembraram que esse fora, inclusive, o motivo principal da decisão de juntar os dois bairros em uma única rede no passado, uma vez que o território de atuação do Centro de Saúde Lajedo abrangia também uma parte do bairro Tupi.
Para os participantes do grupo focal, a motivação para a participação pode ser alcançada, também, por meio da consolidação de parcerias, ampliando os espaços de atuação na comunidade e estabelecendo laços de confiança. Os participantes relataram que essas parcerias são necessárias para compor uma rede de apoio à comunidade, auxiliando em sua automanutenção. Foi apresentado, ainda, que, para além das articulações e parcerias institucionais, é fundamental que haja uma articulação direta entre os moradores, uma vez que as pessoas tendem a se envolver mais quando há um vínculo pessoal entre os participantes, podendo, a partir dele, nascer um interesse coletivo. Sobre isso, Putnam (2002) ressalta que os interesses pessoais também estão presentes nas comunidades cívicas, porém, os cidadãos devem definir seus interesses próprios no contexto das necessidades públicas gerais, um interesse próprio que é sensível aos interesses dos outros.
Outro fator destacado por Putnam (2002) é que, para superar os dilemas da ação coletiva e do oportunismo contraproducente, a cooperação voluntária é mais fácil quando uma comunidade herda um estoque de capital social sob a forma de regras de reciprocidade e sistemas de participação cívica. Para o autor, capital social "diz respeito a características da organização social, como confiança, normas e sistemas de participação, que contribuam para aumentar a eficiência da sociedade" (Putnam, 2002, p. 177). Ainda, segundo o autor, o capital social facilita a cooperação espontânea, pois é produtivo, possibilitando que se realize muito mais em um local, quando está presente. Por exemplo, quando há confiança entre os membros, eles são capazes de realizar muito mais do que quando não há confiabilidade. A confiança é um componente básico do capital social. Por fim, o autor aponta que o "capital social, corporificado em sistemas horizontais de participação cívica, favorece o desempenho do governo e da economia" (2002, p. 186). O autor conclui dizendo que "criar capital social não será fácil, mas é fundamental para fazer a democracia funcionar" (2002, p. 194).
A rede, então, assume um papel importantíssimo, pois, como foi dito, ela pode ser considerada como um espaço que propicia todas as características destacadas por Putnam (2002) como fundamentais ao seu desenvolvimento. Somado a isso, a rede pode ser vista como uma associação, que promove uma estrutura social de cooperação. Essas associações contribuem para a eficácia e estabilidade de um governo democrático, pois possibilitam fazer alterações internas e externas; internas em um nível individual e externas em um nível macro, da sociedade.
Fatores determinantes da desmotivação na rede comunitária Tupi-Lajedo
Pretendemos, nesta categoria, discutir os fatores apresentados pelos participantes para justificar a desmotivação e o enfraquecimento da participação da comunidade na rede Tupi-Lajedo. A primeira justificativa apresentada no grupo focal foi o desconhecimento da existência da rede. Foi discutido pelos participantes que grande parte da comunidade não conhece a rede ou não entende seu funcionamento e objetivo, o que torna a participação impraticável. A seguir, os participantes citaram o desinteresse e o comodismo, relatando a percepção de que há na comunidade uma dificuldade de organização de um trabalho em comum, em prol de um bem coletivo. Tal percepção reforça a ideia de que as pessoas só são motivadas a participar quando o assunto é de seu interesse individual, e que, quando os problemas coletivos não interferem em sua vida diretamente, não compreendem a importância e a necessidade de cooperação. Quanto ao comodismo, para os participantes do grupo focal, os indivíduos querem mudanças, mas não fazem nada para conquistá-las; cobram muito, mas não se dispõem a contribuir. Citaram, ainda, que as pessoas se acomodam quando percebem que outros podem fazer por elas, e não conseguem compreender como e por que sua participação poderia fazer alguma diferença.
Desinteresse e comodismo fazem com que a participação na rede não seja prioridade para a comunidade. Além disso, a falta de objetivos e metas claras e concretas impossibilita que o trabalho da rede possa ser reconhecido e os avanços conquistados, observados. Sobre isso, Borges (2004) destaca que projetos que apresentam resultados em curto prazo fazem com que as pessoas consigam enxergar de forma mais explícita a importância do seu trabalho, tornando-as mais motivadas.
Outro fator apontado pelos participantes foi o desconhecimento da história dos bairros Tupi e Lajedo pelos seus moradores, o que leva à fragilização de sua identidade territorial e dos vínculos com o lugar onde moram e com as pessoas que ali residem. Nesse sentido, Sawaia (1998) ressalta a importância do afeto para o estreitamento dos vínculos relacionais, aproximando, animando e motivando os indivíduos. Assim, constata-se que o vínculo afetivo entre moradores, lideranças e profissionais dos equipamentos e serviços existentes na comunidade reforça a noção de pertencimento histórico e territorial, sendo fundamental para o fortalecimento da noção de coletividade, motivando a participação e a mobilização social.
Os participantes do grupo focal relataram, ainda, que a ausência de dia e horário fixos para as reuniões de rede são também um grande fator de desmotivação, por dificultar o agendamento e, consequentemente, a participação dos moradores. As reuniões de rede também foram consideradas pouco objetivas, dispersas e sem finalidades claras para os participantes.
Por fim, a identificação territorial dos moradores dos bairros Tupi e Lajedo foi colocada em questão novamente, sendo apresentado, especialmente, o desconforto dos moradores do bairro Lajedo, que sempre se veem englobados ao Tupi, o que descaracteriza suas demandas específicas. Sobre isso, Borges (2004) destaca que o maior desafio da formação de um trabalho em rede é a constituição de relações de complementaridade, ou seja, esse pensar e agir em conjunto, como método mais eficaz para o alcance de transformações sociais mais amplas e duradouras. A integração entre a identidade territorial dos moradores dos dois bairros e sua constituição como membros de uma mesma rede comunitária constitui-se, então, como desafio fundamental para a consolidação dos processos de participação social.
Propostas e estratégias para efetivar a participação comunitária
A partir da coleta de dados no grupo focal e da revisão de literatura realizada, somadas às observações realizadas pelos pesquisadores em campo, serão apresentadas a seguir algumas estratégias que, acredita-se, poderão contribuir para solucionar alguns dos problemas enfrentados pela rede Tupi-Lajedo. Essas estratégias visam à potencialização da participação da comunidade nos encontros da rede, à ampliação dos processos de mobilização social e ao aprimoramento da organização e funcionamento da própria rede.
Inicialmente, considerando o desconhecimento da história dos bairros Tupi e Lajedo pelos moradores, explicitado no grupo focal, e a consequente ausência de uma identificação territorial com esses espaços, considera-se a realização de um projeto participativo de resgate histórico da trajetória de formação dos dois bairros, protagonizado pela própria comunidade, uma ação profícua para o fortalecimento da noção de pertencimento, necessária para a efetivação da participação da comunidade na rede.
Outra questão apontada no grupo focal foi a ineficácia da abordagem da rede à população. Conforme explicitado pelos participantes, os moradores não entendem o funcionamento e os objetivos da rede, o que aponta para a necessidade de se desenvolver uma comunicação mais clara, capaz de mostrar como a rede funciona na prática e qual é sua importância concreta para o desenvolvimento dos bairros Tupi e Lajedo. Nesse sentido, considerando que foi verificada a tendência de a população mobilizar-se apenas quando o assunto diz respeito a seus interesses próprios e, em sua maioria, individuais, revela-se necessário trazer às reuniões de rede temáticas que interessem diretamente aos moradores, com o objetivo de maximizar sua participação. Explicitar que rede é construção, visando relativizar o imediatismo presente entre os moradores, também é fundamental, uma vez que muitas pessoas vão às reuniões de rede esperando soluções rápidas e definitivas para seus problemas cotidianos.
Também percebeu-se no grupo focal que os equipamentos sociais são fortes mobilizadores de participação social, especialmente aqueles relacionados ao sistema de saúde. Os Agentes Comunitários de Saúde (ACS), de modo específico, por conhecerem mais de perto o território e seus moradores, podem contribuir aumentar a participação social, uma vez que a mobilização "corpo a corpo" foi vista pelos participantes como mais eficaz do que aquela feita por meio eletrônico. Para tanto, é necessário que esses profissionais sejam capacitados, apropriando-se das noções de trabalho em rede e desenvolvimento social. É importante, ainda, esclarecer a esses profissionais que o envolvimento deles com as ações da rede não gerará um trabalho a mais para, antes, tende a facilitar o trabalho que já realizam.
Muito foi dito no grupo focal sobre os problemas decorrentes do modo de organização dos encontros da rede. Como propostas de rearticulação, com vistas à potencialização da participação da comunidade, foram destacados os pontos a seguir. Em primeiro lugar, ressaltou-se a necessidade de maior clareza na divulgação dos encontros, de modo que seus objetivos fiquem explícitos. As estratégias de divulgação também foram questionadas, sendo necessária sua ampliação, no intuito de atingir mais pessoas da comunidade. O uso das redes sociais (Facebook e WhatsApp) foi apresentado como uma solução viável para essa questão. Além disso, pontuou-se a importância de que as reuniões da rede sejam objetivas, com horários fixos para início e fim. Em função da grande extensão dos dois bairros, outra estratégia proposta para facilitar a participação de toda a comunidade foi a realização de reuniões itinerantes, beneficiando, a cada mês, uma das regiões dos dois bairros. Por fim, ressaltou-se a importância de a rede ser um espaço aberto e democrático, no qual todos possam se sentir à vontade para falar e contribuir com seus saberes específicos.
A articulação com as escolas dos dois bairros também foi apontada como uma estratégia de mobilização social e potencialização da rede Tupi-Lajedo. Ações como a realização de oficinas de cidadania e participação social com as crianças e a elaboração de projetos juvenis - jornal comunitário, vereadores mirins, rádio Lajedo, dentre outros - foram mencionadas como formas possíveis de mobilização da comunidade, tendo a escola como intermediadora. Para tanto, é necessário fomentar a articulação com as escolas, a partir da participação de integrantes da rede Tupi-Lajedo em suas reuniões de colegiado, das quais participa funcionários e alunos da escola, bem como suas famílias, o que favorece a aproximação entre os moradores dos bairros e a rede.
No momento da pesquisa, os bairros Tupi e Lajedo não estavam cobertos por todos os serviços assistenciais básicos nas áreas da saúde, assistência social, segurança pública e educação, o que aumentava a vulnerabilidade da sua população. Vulnerabilidade social, de acordo com Bronzo (2009), relaciona-se com a disponibilidade de recursos acessíveis às pessoas e/ou comunidades para o enfrentamento dos riscos aos quais estão expostos, ou seja, o acesso restrito a direitos sociais básicos configura condições de vulnerabilidade, mais presentes em comunidades com pouca ou nenhuma representatividade social. A insuficiência de equipamentos sociais básicos nos bairros Tupi e Lajedo também fazia com que seus moradores tivessem que buscar assistência em outros territórios, o que criava uma distância simbólica entre a população e seu bairro. Sendo assim, para os participantes do grupo focal, uma demanda posta à rede Tupi-Lajedo era a tentativa de mobilizar a volta de programas como o Fica Vivo e o Mediação de Conflitos, que já existiram nesses bairros em períodos anteriores, considerando que a sua atuação poderia se configurar como uma importante estratégia de mobilização, beneficiando toda a comunidade, que passaria a dispor dos meios para acessar os dispositivos que auxiliam na diminuição dos riscos aos quais está exposta.
No grupo focal, foi relembrada uma conquista da rede Tupi-Lajedo, que foi a criação de uma Unidade Municipal de Educação Infantil (Umei) na região. Por meio da rede, moradores e o Centro de Saúde local realizaram uma pesquisa com as mães dos dois bairros e, a partir dela, evidenciaram a necessidade da criação de uma Umei. O mesmo ocorreu com a mobilização das mães trabalhadoras de uma maternidade local, que gerou como conquista a criação de uma creche para seus filhos. Evidenciar essas conquistas tem efeito mobilizador, pois revela que ações coletivas podem resultar em vitórias significativas, motivadoras de novas ações.
Por último, foi mencionado como estratégia para melhorar a participação na rede Tupi-Lajedo a criação de microcomissões de trabalho. Nesse sentido, tendo como referência a divisão em microrregiões, utilizada pelo Centro de Saúde para facilitar a atuação das ACS nos bairros, estão sendo realizadas reuniões melhorar a articulação da rede, além de possibilitar o levantamento de questões específicas de cada microrregião e a identificação de representantes locais que possam estar presentes nas reuniões da rede.
Considerações finais
Um dos grandes desafios que a metodologia de redes enfrenta na contemporaneidade é superar a cultura individualista promovida pelo capitalismo e conseguir provocar, a partir desse método, transformação social. Assim, a efetiva organização de uma rede social comunitária exige a mobilização de forma horizontal, de todas as instâncias envolvidas, na elaboração de estratégias de manutenção e fortalecimento das ações participativas de toda a comunidade.
Neste trabalho, foram formuladas, por meio da metodologia de redes, estratégias para o fortalecimento da participação da comunidade na rede Tupi-Lajedo. Repensar a própria rede, seus objetivos e funcionamento, e realizar ações que digam respeito à comunidade e sua história com os bairros, para que os moradores se identifiquem e estabeleçam uma relação de afeto com aquele território, foram algumas das ações consideradas propiciadoras de uma nova configuração da rede, com potencialidade de mais força de mobilização e participação social efetiva.
A execução de projetos de pesquisa e intervenção apresenta limitações que na pesquisa em tela podem ser caracterizadas pela insuficiência dos dados que a técnica de grupo focal permitiu alcançar, uma vez que os participantes foram muitas vezes vagos e/ou pouco diretos na explicitação das suas percepções e motivações, o que deixou a impressão de que as questões colocadas poderiam ter sido mais bem exploradas, assim como novas perguntas poderiam ter sido elaboradas, para que pudessem ser obtidas respostas mais detalhadas.
Entendemos, também, que apreender a realidade como ela é de fato é impraticável, visto que o contato com aquela comunidade, com aquelas pessoas e com a rede aconteceu em um recorte específico de tempo, além de não ser possível descrever aqui como se deram todos os fenômenos humanos vivenciados. Também é relevante mencionar que, como duas das pesquisadoras já tinham um contato prévio com a rede, com os bairros Tupi e Lajedo e com seus moradores e equipamentos, já havia certas concepções e posicionamentos sobre seu funcionamento, elaborados antes mesmo da execução do grupo focal, que podem ter influenciado tanto na sua condução quanto na descrição e análise dos resultados alcançados.
Quanto aos desdobramentos futuros desta pesquisa, algumas ações em parceria com o Projeto de Extensão "Articulando Redes, Fortalecendo Comunidades" foram pensadas, com vistas ao estreitamento do vínculo da comunidade com o próprio bairro e ao desenvolvimento da identidade territorial dos seus moradores, como a realização de uma sessão de fotos do território e a exposição destas em locais públicos para que, assim, os moradores possam perceber, com outras perspectivas, seus lugares de existência.
A rede Tupi-Lajedo, com toda dinamicidade que caracteriza uma formação em rede, encontra-se em um momento de reorganização, protagonizada por seus próprios moradores. São as mudanças da comunidade e as novas demandas que elas engendram que dão o tom às necessárias reorganizações. Cabe a seus membros responder criativamente, definindo coletiva e horizontalmente estratégias de ação, objetivando o aprofundamento da sua identificação histórica e territorial, condições essenciais para a execução e conquista de objetivos comuns.
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Recebido em: 17/9/2018
Aprovado em: 24/6/2019