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Contextos Clínicos

Print version ISSN 1983-3482

Contextos Clínic vol.5 no.1 São Leopoldo July 2012

https://doi.org/10.4013/ctc.2012.51.03 

ARTIGOS

 

Diagnóstico em saúde mental: por uma concepção não objetivista das representações da loucura

 

Mental health diagnosis: for a non-objectivist conception of representations of madness

 

 

Junia de Vilhena; Carlos Mendes Rosa

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rua Marques de São Vicente, 225, 22453-900, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.vilhena@puc-rio.br, carlosmendesrosa@gmail.com

 

 


RESUMO

O presente artigo pretende discutir a questão da linguagem utilizada nas classificações em saúde mental e as implicações em relação às tomadas de posição entre as diferentes correntes do pensamento linguístico. Iniciaremos a discussão deste texto com duas formas de concepção do mundo através da linguagem; o positivismo lógico e a pragmática. O estatuto dos conceitos define amaneira como determinado conceito passa a ser entendido pela sociedade. Nessa perspectiva, nos parece pertinente questionar qual a visão de doença mental que a sociedade adota e suas possíveis consequências no campo da clínica. Buscamos interrogar o caráter circunstancial, convencional e político dos critérios diagnósticos em saúde mental. E por fim tentamos demonstrar a necessidade de uma concepção não representacional de linguagem como condição para a clínica psicanalítica.

Palavras-chave: diagnóstico, linguagem, psicanálise.


ABSTRACT

The present article intends to discuss the question of language used in the classifications in mental health and the implications regarding the positions taken by the different streams of linguistic thought. We will start the discussion of this text with two ways of understanding the world through language; logical positivism and the pragmatic. The statute of the concepts defines the way a concept is understood by the society. From this perspective, it seems appropriate to question which vision of mental illness the society adopts and its possible consequences in the clinical field. Also it seeks to interrogate the circumstantial, conventional and political nature of the diagnostic criteria for mental health. Finally, we try to demonstrate the need for a non-representational view of language as a condition for psychoanalytic clinic.

Key words: diagnosis, language, psychoanalysis.


 

 

Introdução

"Um conceito não representa a realidade, mas é um modo de lidar com ela."
(Costa, 1999)

Existe uma clara diferença entre o objeto de estudo das ciências humanas e o objeto de estudos das ciências naturais. No entanto, é necessário conhecer o método que cada uma delas adota para determinar a aproximação ou o afastamento que um tipo de ciência possui em relação à outra. É importante ressaltar que mesmo as ciências naturais são formas de discurso produzidas por determinada cultura.

Por muito tempo tentou-se aproximar as ciências humanas do método das ciências naturais, também conhecido como "Método Científico"; chegou-se a pensar que a Psicologia poderia se unir à Biologia, tal como a Física e a Química se uniram. Chomsky (2006) defendeu essa unificação alegando que as faculdades mentais pertenciam ao campo da Biologia, pois o comportamento seria derivado de causas e razões.

Vários modelos psicológicos tentaram inclusive se adaptar a este atrelamento, alguns com relativo sucesso. O conceito de diagnóstico em saúde mental, que iremos discutir, teve suas bases estabelecidas nessa forma de conceber a Psicologia, ou seja, como extensão da Biologia. Não sem razão o diagnóstico em saúde mental nasce a partir da classificação utilizada por Buffon na Botânica, na qual eram separadas as plantas de acordo com características observáveis, tais como a presença de flores ou de semente. Quando Pinel inicia seu trabalho no Grande Hospital, a primeira classificação por ele utilizada, baseada no método da Botânica, separa os "loucos" pela pluralidade fenomenológica de cada doença. Dessa maneira, temos a ala dos agitados, a dos agressivos, dos deprimidos etc. (Schatzberg e Nemeroff, 2006).

Marcondes (2008) utiliza-se da alegoria do "bosque em que as coisas não têm nome", local das aventuras de "Alice no Outro Lado do Espelho", para falar de uma realidade na qual os signos linguísticos não existiriam. Poderíamos pensar em uma realidade em que as classificações do gênero loucura também não existiriam; como seria uma realidade em que os signos clínicos não tivessem os nomes tão conhecidos como os de hoje?

Podemos brincar através das páginas do tempo e investigar as diferentes nomenclaturas que já foram dadas a este fenômeno que hoje é conhecido como desrazão. Os termos gregos mória, atè e hybris são formas de tentar conhecê-lo. As bruxas que queimaram nas fogueiras da idade das trevas e os "elogios" de Erasmo também entrariam em nosso bosque. As tentativas de Pinel de estabelecer algum critério para iniciar seu famoso trabalho de ortopedia moral no Grande Hospital seriam as primeiras formas sistemáticas de nomear as árvores do Bosque de Alice. Depois viriam Falret, Kraepelin, Bleuler e os alienistas tradicionais. E então o negócio se torna engessado e a realidade cada vez mais compartimentada com o advento das classificações diagnósticas dos Manuais da Associação de Psiquiatria Americana (APA) e da Organização Mundial de Saúde (OMS); com as contribuições da CID e do DSM, cada folha de cada árvore do nosso Bosque agora responde por uma letra seguida de um número.

A brincadeira em relação ao Bosque de Lewis Carroll serve para mostrar que todo signo tem um sentido na medida em que exista alguém para compreender e aceitar aquele sentido, ou seja, os significados são atribuídos, ou melhor, convencionados. Pensando dessa maneira, precisamos interrogar o caráter circunstancial, convencional e político dos critérios diagnósticos em saúde mental.

O quadro atual do campo psicopatológico é resultante das muitas tentativas de recorte (operacionais, filosóficas, psicológicas, empiristas etc.) do sofrimento humano através das diversas fases pelas quais já passou a psicopatologia desde seu surgimento, com Pinel, até a confusão de línguas que se observa na atualidade. No estado de coisas da sociedade "moderna" os embates entre as perspectivas empirista e construtivista promovem reverberações que extrapolam a mera discussão acadêmica de conceitos e posições científicas, gerando tanto efeitos significantes no imaginário dos sujeitos quanto efeitos reais na vida cotidiana desses. Tal amplitude de efeitos e consequências justifica uma investigação mais pormenorizada acerca dos fundamentos da prática psicopatológica, em especial no que se refere ao ato de diagnosticar os pacientes enquadrados no campo da saúde mental.

Para tanto nos serviremos da opinião de Marcondes (1992) de que todas as ciências pressupõem, de um ponto de vista teórico e metodológico, uma teoria da linguagem. Assim, abordar a questão da relação linguagem e cérebro, com a finalidade de aproximar, ou não, o pensamento do biológico, envolve a discussão do estatuto do conceito de linguagem, ou seja, envolve posicionar-se quanto à visão que se está utilizando ao falar de linguagem. Nesse sentido, nos propomos a examinar a questão do diagnóstico em saúde mental a partir do referencial da linguagem, discutindo o estatuto dos conceitos em psicopatologia tanto sob a ótica objetivista ou representacional quanto sob a perspectiva construtivista ou pragmática.

 

Diferentes visões

A evolução das teorias científicas não segue uma trajetória linear de acumulação de conhecimentos, mas desenvolve-se através de rupturas, ou seja, a quebra de paradigmas existentes e o surgimento de novos paradigmas que não necessariamente se baseiam nos anteriores. Existe uma atividade desorganizada que precede a formação do que Kuhn (2003) denominou de nova ciência; essa desorganização torna-se estruturada à medida que a comunidade científica adere a um "novo" único paradigma.

Chalmers (1993) aponta que o paradigma se constitui a partir de suposições teóricas gerais e leis técnicas que regem sua aplicação, adotadas por uma comunidade científica estrita. Grande parte do conhecimento de um cientista será tácita, ou seja, ele não estará cônscio da natureza precisa do paradigma no qual trabalha e não será capaz de articulá-la. O paradigma adotado terá validade enquanto não puder ser falsificado, ou seja, enquanto não forem encontrados problemas insolúveis em relação a sua validade. No entanto, a mera existência de enigmas não resolvidos não coloca o paradigma em dificuldades; isso ocorrerá quando a chamada "anomalia" atacar os fundamentos daquele paradigma e resistir às tentativas dos cientistas de removê-la, ou se tratar de questões sociais urgentes. Quando isso ocorrer, outra revolução será necessária.

A existência de um único paradigma, ou o que Kuhn (2003) denominará mais tarde de matriz disciplinar, é o que diferencia ciência daquilo que não é ciência. Pois a ciência faz tentativas detalhadas de articular os seus paradigmas para que esses correspondam o mais fielmente possível à natureza. Nesse sentido, o paradigma é fundamental para o desenvolvimento das ciências à medida que orienta as observações dos cientistas (Chalmers, 1993). É importante observar que o próprio Kuhn comparava a mudança de um paradigma para outro, por parte dos cientistas, a uma espécie de conversão religiosa. Pois nunca haverá argumentos puramente lógicos que demonstrem a superioridade de um paradigma sobre outro. Aqui temos um pouco de subjetividade em ciência.

Para a visão representacional (empirismo lógico), a linguagem é tida como representação da realidade: de um lado, existe uma "realidade-em-si mesma" - uma coisa ou objeto -, e do outro, a linguagem - a palavra ou nome - que a representa (Lampreia, 2008). Nessa lógica, o significado do nome é determinado pelo objeto, a partir de associações que seguem regras naturais. Como a linguagem cotidiana não representa a realidade de forma correta devido a sua pluralidade de interpretações, então é necessária uma linguagem formal construída através de símbolos; o símbolo é aquilo que fica no lugar de algum correspondente do real (objeto, pensamento, entidade abstrata).

A linguagem para os empiristas lógicos representa a verdade na medida em que corresponde à realidade. Para essa corrente de pensamento, o signo linguístico é visto como representando, ou indicando, ou ainda substituindo um objeto externo, tanto ao sistema de representações, quanto à ideia que lhe dá conteúdo. Nesse caso, o significado do signo deve ser explicado pela sua referência, ou seja, um objeto na realidade (Marcondes, 2008).

Essa é a visão da determinação natural do sentido, ou seja, toda proposição é significativa na medida em que fornece alguma informação sobre o estado atual do mundo (Lampreia, 2011), e pode tanto afirmar a ocorrência de certos fatos quanto excluir a ocorrência de outros. O valor de verdade de uma proposição deve ser determinado a partir do conhecimento da ocorrência, ou não, dos fatos envolvidos. Esta corrente de pensamento idealiza uma linguagem capaz de exprimir cada fato corrente na realidade e que toda proposição significativa possa ser reduzida a uma combinação de proposições atômicas mediante funções de verdade, em relação unívoca entre as mesmas (Barreto, 2001).

Para os positivistas lógicos todos os problemas filosóficos são resultados de equívocos sintáticos; uma vez solucionados esses equívocos, tais problemas desaparecem, ou então, são insolúveis pela via da razão (Rodrigues Júnior, 2002).

Em uma vertente menos radical, a Sociologia do Conhecimento entende que se o conhecimento tem a sua gênese nos nexos existentes entre as condições sociais, posicionadas historicamente, e as produções culturais de atores individuais e coletivos, podemos, assim, admitir que diferentes contextos produzam diferentes conhecimentos e que esses somente teriam validade em determinadas condições sociais. Isso nos leva a pensar na existência de conhecimentos apenas particularizados, e a considerar que todo o conhecimento estaria inevitavelmente vinculado a uma forma social, impossibilitando a construção de uma verdade única (Rodrigues Júnior, 2002).

Defendemos aqui a posição de Francis Jacob, ao afirmar que nada causa tanta destruição quanto a obsessão de uma verdade absoluta. Todos os crimes da história são consequência de algum fanatismo. Com o atual progresso do conhecimento é preciso que fique claro, para cada pessoa, que nenhum sistema explicará o mundo em todos os seus aspectos e detalhes (Jabob, 1983).

Na contramão do pensamento representacional e objetivista temos a Pragmática. Para essa área da Linguística, não faz sentido pensar em uma realidade em si, independente da linguagem, pois se entende a linguagem como uma prática social. Ou seja, não se pode falar em uma realidade em si na medida em que se aprende a interpretar essa realidade a partir dos significados dados pela cultura (Lampreia, 2008).

A linguagem pode representar a realidade; no entanto, possui outros "usos", como participar na construção da realidade. Por esta forma de pensar não existe reificação dos conceitos, pois o significado é dado pelo seu próprio uso. A linguagem não traz em si nenhuma essência imutável. Ou, como diria Wittgenstein (2000), todo signo em si está morto, é apenas em seu uso que o signo está vivo.

No final das contas, somos nós que reconduzimos as palavras de seu uso metafísico para sua utilização no cotidiano -, uso aqui entendido em um contexto muito mais amplo que o verbal. A linguagem adquire status de "forma de vida" no contexto das relações sociais. Mais do que nunca, a linguagem se equipara à ação, tal como andar, comer e jogar (Condé, 1998).

Retomamos aqui algumas considerações de Freud (1910) a respeito dos significados que certas palavras comportam, quando afirma que algumas palavras trazem em si as marcas de opostos que convivem sem formar unidade, mas numa palavra única. É a proposição de que essas palavras demonstram o que a atividade dos sonhos revela: a possibilidade de unidade de opostos que guardem suas peculiaridades.

São dois sentidos contrários que convivem, mas não dão surgimento a um terceiro elemento: são um em dois. O filólogo Abel mostrou que, na língua egípcia -que ele considera uma relíquia única de um mundo primitivo -, há um grande número de vocábulos com duas significações, uma das quais é o oposto exato da outra.

Podemos estender essa afirmação para todas as línguas. Basta pensarmos na conhecida palavra alemã Unheimlich, que ao mesmo tempo pode significar estranho e familiar, utilizada por Freud para designar fenômenos que são estranhamente familiares. Podemos pensar ainda no emprego da ironia em nossas falas cotidianas, em que várias palavras podem ser empregadas para expressar o oposto de seu significado convencional.

Coutinho Jorge (2005) demonstra uma busca por parte dos linguistas modernos no sentido de resgatar, no próprio campo da linguística, a importância crucial da questão da "significação antitética" ressaltada por Freud a partir da Psicanálise. Essa discussão evidencia o fato de que as línguas são totalmente permeadas pela ambiguidade. Ao invés de acreditar tratar-se de mera coincidência, a existência de vários significantes correspondendo a significados diferentes, somos forçados a aceitar a existência de uma pluralidade de significados absolutamente heterogêneos sob um significante único.

A Pragmática adota a concepção wittgensteiniana de "jogo de linguagem", que consiste na totalidade da linguagem, palavras ou signos linguísticos, com as ações que a essas vêm entrelaçadas. Os diferentes jogos guardam semelhanças entre si, mas não têm uma raiz em comum que os identifique e os categorize dessa maneira, da mesma forma que não há algo que seja comum a todas as formas de linguagem, ou linguagens - no plural (Marcondes, 2008).

O uso da linguagem e as ações são inseparáveis, uma vez que a linguagem não descreve a realidade, mas promove algo nela (em diferentes contextos e com objetivos variados). Mesmo nos casos em que indica ostensivamente a realidade, a linguagem se encontra mediada pela cultura que ali se instaurou e pelos atores que participam daquele "jogo"; o significado da palavra se estabelece a partir das funções que essa desempenha na atividade coletiva dos indivíduos (Rodrigues Júnior, 2002).

Certeau (1980) afirma que o pesquisador científico, ao observar seu objeto de estudo de um ponto imparcial, enxerga muito menos que aquele pesquisador que percorre o campo de pesquisa e se emaranha na teia de relações com os objetos pesquisados. Tal como o observador que olha a cidade do alto de um prédio tem uma visão muito mais restrita do que aquele flâneur que percorre as ruas caminhando e apreciando os detalhes da paisagem urbana.

Recordamos-nos aqui das palavras do artista Vick Muniz, em seu documentário "Lixo Extraordinário" onde afirma que o Lixão de Gramacho é muito mais interessante visto de baixo, pois, vistas de cima, aquelas pessoas tão fascinantes parecem meras formigas.

Certeau aproveita esta distinção entre as diferentes formas de pesquisa para propor um paralelo entre a caminhada de um sujeito pelas ruas da cidade e as diversas facetas da enunciação linguística. A caminhada, como a enunciação, é um processo de apropriação do sistema topográfico (o caminhante se apropria do percurso e o falante da língua). Em ambas as realizações (sonora e motora) o intervalo entre as regras formais e o estilo próprio do autor (aquele que fala ou caminha) dão a conotação do que será o produto final: a linguagem ou a caminhada.

Tal como a imagem em movimento, a língua pode modificar e deslocar seu sentido para uma equivocidade. O objeto permanece não localizável no uso corrente verbal; é apenas uma ficção produzida por um uso particular; uso metalinguístico da ciência que se singulariza por essa distinção (Certeau, 1980).

O significado não é dado a priori por qualquer referência que seja, mas possui um caráter de indeterminação. O sujeito para a Pragmática é criado e moldado pela linguagem que o atravessa. Podemos pensar construtivamente em um sujeito datado, localizado e constituído por aquilo que se encontra ao seu redor.

Bem diferente da concepção objetivista de sujeito, que pretende encontrar características pré-existentes à ação do social. No entanto, cabe salientar que nem tudo é linguístico no campo de formação dos sujeitos. É preciso que se considerem algumas articulações entre o universo da linguagem e aquilo que Coutinho (1994) chamou de "não meramente linguístico", ou seja, existe algo no real que promove efeitos importantes na constituição dos sujeitos.

Outra questão abordada pela Pragmática diz respeito à diferença entre conceitos públicos e privados. Se todo conceito ganha sentido na medida em que é proferido e enquadra-se em determinado jogo de linguagem, na medida em que exista o social para contextualizálo, também não faz sentido pensar em alguma coisa da ordem da singularidade estrita, algo que seja "só meu".

Não se pretende, com isso, que não exista a singularidade, mas que essa também sofre a ação performativa da linguagem tão logo o sujeito é inserido no universo linguístico. O termo performativo é definido como a linguagem indissociada da ação sobre a realidade, ou seja, ao emitir um enunciado, o sujeito faz mais do que dizer algo; ele realiza uma ação (Marcondes, 2008). Tal conceito será fundamental para nossa discussão acerca do estatuto dos conceitos diagnósticos, uma vez que, independente de alicerçarem-se na perspectiva pragmática ou representacional, esses conceitos invariavelmente promovem ações na vida dos pacientes.

 

Sobre o diagnóstico em saúde mental

Vamos retornar ao tempo de Freud, Kraepelin e Bleuler, quando a Psiquiatria possuía caráter notadamente psicopatológico e fenomenológico, fruto das raízes filosóficas de seus precursores. Vale salientar que, desde o surgimento da Psiquiatria como prática, fato comumente remontado ao período da Revolução Francesa, no qual Pinel busca nas teorias botânicas inspiração para suas categorias de doença mental, os diagnósticos têm uma característica representacional e objetivista, na medida em que procuram descrever as anomalias subjacentes ao funcionamento do paciente.

Contudo, vários alienistas e psiquiatras desse período, inclusive Freud, foram fortemente influenciados pelas ideias da hermenêutica de Dilthey e valorizaram o discurso do paciente (sua história) como forma de aquisição de saber sobre a doença.

Entretanto, a eficácia terapêutica dos psicofármacos, à época, ainda não atingira níveis satisfatórios como aqueles alcançados a partir do final do século XX e a capacidade de descrição de sintomas não auxiliava muito os psiquiatras no combate às "formas de loucura" de seu tempo. Neste estado de coisas, alguns pensadores começaram a questionar a eficiência e a pertinência do saber psiquiátrico, como único discurso acerca do adoecimento psíquico.

A partir dessa lógica de pensamento, o próprio conceito de doença mental também passou a ser questionado. Schneider (1978) dirá que segundo a lógica cartesiana, o termo doença mental se constitui de um paradoxo. Uma vez que é "doença", pertencente à categoria da res extensa, não pode ser "mental", pois essa última pertence à categoria res cogito. Segundo Foucault (1998), a origem do termo "doença mental", induziu à assimilação dos processos "mentais" aos cerebrais ou neuronais. Vemos que as discussões sobre a aproximação entre a mente e o biológico já estavam presentes desde o início dessa prática, até mesmo desde Darwin.

As questões sobre a validade dos conceitos e das práticas psiquiátricas deram origem a um movimento que ficou conhecido como anti-psiquiatria, cujos principais expoentes foram exatamente Kurt Schneider, Ronald Laing, David Cooper e Thomas Szasz. Esse último, psiquiatra americano, chegou a afirmar em seu livro "Esquizofrenia: o símbolo sagrado da psiquiatria" que Bleuler e os grandes psiquiatras de seu tempo não descobriram as doenças pelas quais ficaram famosos; eles as inventaram!

De uma forma bem sutil os signos clínicos que estão na base das doenças mentais já existiam com outras nomenclaturas, e o estabelecimento dessas novas doenças "serve para dar ao psiquiatra o status de médico, ao sujeito que sofre a condição de paciente e à prisão onde este é encarcerado o nome de hospital" (Szasz, 1978, p. 16). O autor defende ainda que os critérios para definir as doenças mentais são éticos e sociais, e não critérios médicos (Szasz, 1978). Podemos então pensar que essa afirmação corrobora o pensamento de Wittgenstein de que os diagnósticos seriam não mais que formas de discurso, ou novos jogos de linguagem.

É fácil perceber que o panorama da Psiquiatria na segunda metade do século XX não estava muito favorável. E iria piorar ainda mais com alguns estudos feitos pela Universidade de Cambridge, que argumentavam que os diagnósticos em saúde mental não possuíam confiabilidade (Wing et al., 1974). Tais estudos mostravam que uma mesma constelação sintomática era diagnosticada de maneiras diferentes em diferentes partes do planeta.

A solução encontrada pela Psiquiatria foi romper com o paradigma da psicopatologia e adotar uma postura empirista que valorizasse exclusivamente as descrições nosotáxicas dos fenômenos clínicos. A partir desse ideal ganham força no campo da saúde mental os manuais de classificação diagnóstica, em especial o DSM-III, que foi lançado em 1980, posteriormente sucedido pelo DSM-IV e pela CID-10. Escondido sob o véu de um pretenso ateorismo, a perspectiva empirista e positivista passou a dominar os debates em Psiquiatria, relegando todas as demais formas de pensar o fenômeno psicopatológico à condição de excluídas do campo científico, e por consequência das pesquisas e financiamentos relativos à área de saúde mental (Pereira, 2000).

Como afirma Alberti (2006), com o advento do discurso capitalista no campo da ciência, já no século XIX ocorre um retorno da crença de uma representação da realidade para além dela mesma, ou seja, as representações psíquicas passam a ser buscadas nas imagens fornecidas pelos "novos brinquedos" da ciência capitalista (tomografias, ultrassonografias, ressonâncias magnéticas etc.).

Parece haver uma aposta de que todos os problemas que se relacionam com conflitos psíquicos poderão ser resolvidos com o avanço das neurociências, pois essas descobrirão os genes das redes neurais e tudo ficará bem, não obstante Freud já ter declarado no seu Projeto de 1891 que não existe uma relação biunívoca entre psiquismo e cérebro.

Duas questões precisam ser colocadas acerca da adoção da perspectiva representacional estrita para os diagnósticos em saúde mental. A primeira diz respeito à impossibilidade de se reduzir o fenômeno psicopatológico a um registro único, seja ele qual for. Pereira (2005) defende que diferentes critérios organizadores podem ser escolhidos para as diferentes entidades diagnósticas, devendo os transtornos ser definidos através dos melhores planos descritivos segundo cada caso.

O pluralismo explicativo é especialmente apropriado para a Psiquiatria, pois os transtornos psiquiátricos são influenciados por processos causais operando em diferentes níveis de abstração. No entanto, devemos levar em conta as evidências do papel central dos processos mentais subjetivos na etiologia dos transtornos psiquiátricos; no vasto corpo de provas que mostram a influência decisiva dos processos culturais sobre as doenças mentais; na necessidade de se estabelecer as formas de interação entre fatores genéticos e ambientais na constituição dos estados psicopatológicos e no caráter evidentemente histórico de importantes questões psiquiátricas, as quais não se deixariam reduzir a explicações estritamente biológicas (Pereira, 2005).

O conceito de causa pode ser elaborado para incluir etiologias não específicas. Isso porque as teorias etiológicas acerca das doenças podem ou não oferecer vantagens especiais, dependendo dos meios alternativos de diagnóstico e intervenções disponíveis. A

etiologia da psiquiatria, bem como em outros domínios, é parcialmente genética e envolve uma complexa rede de interação entre as causas, as quais permanecerão probabilísticas mesmo que sejam esclarecidas a nível molecular (Schaffner, 2002).

A segunda questão a ser colocada é o caráter contingente, político e circunstancial das categorias diagnósticas dos manuais de classificação. Um exemplo claro do que estamos falando ocorreu quando, na segunda revisão do DSM, constava a categoria diagnóstica "homossexualidade" como um transtorno mental. À época, ativistas gays invadiram o congresso anual da APA e protestaram contra os trabalhos que sustentavam o caráter patológico da homossexualidade. Tais protestos continuaram e terminaram por conseguir que o comportamento homossexual não mais fosse considerado como um transtorno mental. Esse episódio é bastante ilustrativo da fragilidade da maneira estritamente situacional de se tratar dos fenômenos ligados ao sofrimento psíquico.

A decisão quanto ao que uma determinada cultura considera ou não como patológico em termos de comportamento constitui apenas um reflexo do estado contemporâneo das discussões entre a ciência (e seus representantes) e a sociedade sobre o tema psicopatológico em questão. Enquanto isso, as classificações, supostamente científicas, mostram sua vulnerabilidade em face das questões de poder, de interesses econômicos e de influência da mídia (Pereira, 2000).

A insígnia diagnóstica tem também efeitos importantes na dinâmica de vida dos pacientes, tanto no real dos laudos de aposentadoria e invalidez como no imaginário compartilhado das famílias e grupos sociais nos quais o paciente circula. Cherry (2000) alerta que conceitos de doença mental não descrevem meramente características naturais ou avaliam estados. Dentro de determinados contextos, ele são coletivamente performativos. Isso significa dizer que o diagnóstico pode redefinir a realidade médica e social do indivíduo. É a ação através da palavra da qual trata a Pragmática. Esse poder, atribuído ao diagnóstico, se deve à legitimidade do discurso da ciência como representante da verdade. Depreende-se disso que as ciências humanas, em especial a Psicologia, têm um papel formador e regulador da subjetividade nas sociedades atuais.

Pereira (2007) afirma ainda que o diagnóstico psiquiátrico, além de um instrumento técnico com usos e limites específicos, termina por constituir um elemento organizador do imaginário do indivíduo, de sua identidade e especialmente da forma de conceber o mal do qual esse padece. Nesse sentido, é importante que a clínica possa revelar o caráter contingente, convencional e muitas vezes político das categorias diagnósticas e sua impossibilidade de fornecer a última (e única) palavra sobre o sujeito.

Vieira (2001) define três razões para o uso do diagnóstico: para que exista comunicação e troca de informações, para que seja possível obter uma opinião coerente que atribua um relativo poder ao que se analisa e para orientar a ação e o manejo da análise. Afirma ainda que, por mais que se busque a preservação da singularidade, a atribuição de um diagnóstico é necessariamente a atribuição de um juízo de valor, que incorpora o sujeito a uma classe. Percebemos que no diagnóstico há sempre um aspecto de objetivação do sujeito que consolida o peso do eu em detrimento da flutuação subjetiva. Ao se delimitar uma classe através das semelhanças ou diferenças de traços, criam-se grupos de semelhanças e diferenças, que, ainda que reúnam semelhantes, produzirão uma gama enorme de excluídos.

 

Por uma concepção não objetivista

Pode-se pensar, então, que a ideia de as alterações mentais portarem um estatuto de "doença" se constituiu gradualmente na Psiquiatria, não estando totalmente clara nas proposições de seus fundadores. Somente com Kraepelin consolida-se de forma definitiva a vocação nosológica da psicopatologia; o grande sistematizador da psicopatologia trata de discernir sob bases clínicas as diversas formas de "doença mental", as quais teriam o mesmo estatuto das doenças físicas tratadas pela Medicina (Pereira, 1998).

Assim, o termo "psicopatologia", fortemente marcado por suas raízes psiquiátricas, evoca a disciplina encarregada da descrição sistemática das formas clínicas e dos mecanismos patogênicos das "doenças mentais". Nessa perspectiva, ela estaria fundamentada na observação e na classificação dos fenômenos psicopatológicos, esses concebidos como realidades consistentes em si mesmas e apresentando regularidades que permitem generalizações através de um processo de indução.

Outra questão que se coloca na clínica diz respeito à localização, simbólica e imaginária, do Outro, como referência de vida para o sujeito. Tenório e Rocha (2006) afirmam que as modernas classificações psiquiátricas, ao excluírem a diferenciação entre neurose e psicose, optando pela descrição dos signos clínicos em termos de uma negatividade ou prejuízo do paciente, terminaram por apagar o traço singular de "invenção" do sujeito na utilização de sua loucura para manter um mínimo de concatenação em sua vida.

Perde-se, com isso, a chance valiosa de enxergar ordem e coerência na desordem psíquica da psicose. Ironicamente, o termo disorder (original em inglês do termo transtorno) vem eclipsar a verdadeira desordem mental que conta tantas coisas importantes sobre o seu possuidor. É preciso localizar o arranjo que singulariza aquela psicose no seu tempo e desenvolvimento específicos, para assim localizar a posição (lugar) do sujeito na sua loucura.

A adoção por parte dos manuais de diagnóstico psiquiátrico da expressão disorder "transtorno mental" visa a colocar em suspenso a questão ontológica do objeto da Psiquiatria (Pereira, 2005). Trata-se, portanto, de categorias convencionais e não de tipos naturais, realidades em si. Ou seja, propõe uma desconstrução da linguagem representacional através da desontologização dos conceitos, esses passando a se constituir em uma perspectiva múltipla: histórica, social e política.

Nossa proposta, então, passa pela assunção desse caráter político e situacional das insígnias diagnósticas, abrindo mão de tentar estabelecer uma relação direta (ponto a ponto) com a realidade, localizando na cultura a origem dessas manifestações e reconhecendo seu caráter processual e dialético.

Para tanto, nos serviremos da noção de causalidade psíquica, sobre a qual tratamos em outra oportunidade (Campos et al., 2010) e tão bem se coaduna com o ideal deste trabalho. Essa noção de causalidade psíquica pressupõe que o sujeito seja a unidade das causas, portanto, não incita à identificação de causas isoláveis, externas ou internas, que se descolem do próprio sujeito. O termo tem como referência a subjetividade (manifestação do sujeito) e compreende a relação de causalidade como marcada, ao mesmo tempo, pelo corpo pulsional e pela cultura. Ou seja, não existe, para a psicanálise, uma causa única, isolável, objetivável para o sofrimento psíquico; ela é processual e subjetiva, e inscreve-se na interação entre o corpo pulsional e a cultura. Por essa razão, não há como investigar os transtornos sem o trabalho com o sujeito que está imerso na cultura.

Gori (2004) aponta o perigo da paixão pela causalidade; uma perspectiva de cientificismo objetivante, de naturalização do humano, que pretende identificar uma causa palpável, possível de ser isolada, paixão de encontrar uma razão lógica para o sofrimento, que, não entendido, causa mais sofrimento e angústia. No esforço de buscar uma causa, ou na ilusão de a termos encontrado, esquecemos o principal, que é a dimensão simbólica do sintoma; dimensão significante, que advém do fato de se tratar de um sujeito em conflito consigo mesmo.

O sofrimento psíquico é a expressão do conflito entre o corpo pulsional e o ser de linguagem e cultura. Para acolher o sofrimento, a postura freudiana é a de abandono da paixão pela causalidade e o enfoque no sujeito (Campos et al., 2010). Devemos conceber também que os objetos de satisfação dos impulsos libidinais existem na e pela cultura. A cultura é a referência central do processo de humanização. É nas interações entre organismo interno e social que nos constituímos como sujeitos (Vilhena et al., 2011).

Percebe-se, assim, que a nomeação do fenômeno tem uma vertente imaginária (ela confere uma roupagem ao sujeito), simbólica (ela o identifica, o distingue) e real (ela toca seu circuito de gozo). Seus efeitos estão na dependência direta desse vislumbre de real, e podem conduzir a uma nova maneira de dar sentido ao sintoma (Vieira, 2001).

Lacan (1953) compreende o sintoma como sendo estruturado tal qual a linguagem, uma vez que é determinado simbolicamente. A chamada regra da associação livre, segundo a qual o analisando é convidado a dizer tudo o que lhe ocorrer, abstendo-se de qualquer seleção ou crítica, baseia-se precisamente no fato de que a associação produzida pelo sujeito em análise não é nada livre, mas ao contrário, sobejamente determinada. Pois o sintoma, no sentido lato do termo, é o resultante que expressa um conflito psíquico ao modo de uma formação de compromisso entre o desejo e as defesas, ou seja, o sintoma fala (Coutinho Jorge, 2005).

Para admitir um sintoma na psicopatologia psicanalítica, seja ele neurótico ou não, Freud exige o mínimo de sobredeterminação, constituído por um duplo sentido, símbolo de um conflito passado, para-além de sua função, num conflito presente não menos simbólico. Se ele nos ensinou a acompanhar, no texto das associações livres, a ramificação ascendente dessa linhagem simbólica, para nela detectar, nos pontos em que as formas verbais se cruzam novamente, os nós de sua estrutura, já está perfeitamente claro que o sintoma se resolve por inteiro numa análise linguajeira, por ser ele mesmo estruturado como uma linguagem, por ser a linguagem cuja fala deve ser libertada (Lacan, 1953).

Alguns pensadores franceses que trabalharam com a questão da linguagem em nosso século, como Derrida e o próprio Lacan, foram influenciados pelo estruturalismo e pelas ideias de Ferdinand de Saussure, ao ponto de ficarem conhecidos como "pós-estruturalistas". No entanto, fizeram críticas pesadas a algumas concepções saussurianas, como a noção de significado transcendental a todas as culturas e a relação direta entre significante e significado.

Arrivé (in Coutinho Jorge, 2005), afirma que Lacan se inspirou no pensamento de Saussure e se pergunta se podemos ver na definição lacaniana do Outro, como "tesouro do significante", um eco intencional da noção de "tesouro da língua" mencionada por Saussure. Para Lacan, a língua é um instrumento fundamental de evocação, forma peculiar de mensagem cujo princípio é regido pelo aparelho psíquico, crença próxima a de Saussure de que a língua é fundamental para o processo de comunicação (Coutinho Jorge, 2005).

Não desejamos afirmar que a Psicanálise possui o mesmo objeto de estudo que a Linguística. A Psicanálise é um sistema significante baseado na língua, mas essa língua é regida por uma lógica específica, a lógica do inconsciente, a qual atribui valores diferentes aos signos, de acordo com os destinos que a pulsão pode tomar na vida do sujeito.

Parece-nos ser precisamente em relação à teoria do valor do signo que Saussure "recusou-se" a dar sua maior contribuição, enquanto linguista, à clínica psicanalítica. A noção de Saussure (2008 [1915]) de valor afirma que os elementos que compõem o signo são interdependentes entre si, e que o signo não pode ser isolado do sistema do qual faz parte e do qual é igualmente interdependente. Afirma que cada elemento de um sistema é aquilo que os outros elementos não são.

Na página 136 do Curso de Linguística Geral, Saussure afirma que "o signo é pura diferença e pura negatividade". No entanto, duas páginas adiante, volta atrás em sua posição e afirma a positividade do signo. Afirmar a positividade do signo é validar a concepção representacional de linguagem, acreditando que determinado rótulo realmente represente a verdade acerca de um sinal ou sintoma.

Essa sutil diferença entre positividade e negatividade do signo linguístico marca toda a discussão que estamos tendo neste artigo, pois não existiria uma clínica que se baseia na subjetividade sem a presença de signos equívocos. Ou seja, sem que determinado signo clínico precise necessariamente de um contexto que lhe dê significação.

Afirmamos ainda que a finalidade da análise para Lacan é que o paciente saiba lidar com o seu sintoma, uma vez que não encontramos a verdade, mas sim a variedade do sintoma, ou seja, a singularidade do sintoma de cada um (Fuks, 2006). Ou, nas palavras de Wittgenstein, poderíamos dizer que o objetivo é que o sujeito aprenda as regras de seu próprio jogo. E concordamos com Quinet (2003), quando afirma que o analista não desvela inteiramente a verdade do sintoma, não porque essa esteja recalcada, mas sim por ser impossível dizer toda a verdade.

Lacan (1958) afirma que a autonomia da questão dialética na clínica ficou desconhecida desde o princípio dessa prática. Ele parte da ideia do "mal entendido fundamental", ou seja, aquilo que em determinado contexto pode ser compreendido como um signo de ausência de afetividade, por exemplo, em contexto diverso será o contrário. Podemos ir mais longe e afirmar que, mesmo quando o sujeito fala sobre determinado sintoma, não se tem a garantia de que aquilo que ele fala pode ser tomado como verdade. Quando muito, essa é a verdade do sujeito, pois não existe verdade na clínica, tanto menos rótulos que a expressem.

Quando Freud (1912) escreveu "Totem e Tabu" sua pretensão era aplicar o ponto de vista das descobertas psicanalíticas ao campo da Psicologia Social. Trata-se de um estudo sobre a vida mental e os processos psíquicos que a norteiam, realizado a partir de um ponto de vista contextualizador. Freud reafirmou a importância de se pensar o homem historicamente, no cerne de seu meio ambiente cultural, atravessado pelas vicissitudes do tempo e do espaço que constituem sua realidade psíquica (Vilhena e Santos, 2000). É baseado nessa perspectiva que defendemos uma abordagem não objetivista de compreensão dos fenômenos clínicos. Sem o compromisso com a identificação (ou descoberta) da realidade, mas comprometidos intimamente com o respeito ao sujeito e com todo o peso de sua constituição. E, claro, enquanto clínicos que somos, interessados na sua melhora, seja ela qual for.

 

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Submetido: 29/07/2011
Aceito: 16/11/2011