A Psicologia do Esporte e da Atividade Física é uma área relativamente recente dentro da Psicologia, mas em amplo crescimento, carecendo ainda de pesquisas científicas (Peixoto, Nakano & Balbinotti, 2016). Um psicólogo do esporte e da atividade física pode atuar com a Psicologia em escolas de preparação de atletas, instituições sociais que tenham a prática de atividade física vinculada, academias, hospitais, clínicas, parques, praças, escolas de dança, entre tantos outros lugares possíveis, bastando haver praticantes de qualquer atividade física (Peixoto et al., 2016; Weinberg & Gould, 2014).
A dança, objeto de estudo desta pesquisa, é uma prática de atividade física que, em nível competitivo, exige altas cargas de treinamento físico, pouco tempo para descanso, cobranças por bons desempenhos em competições, além de distanciar o indivíduo de familiares e amigos (Guarino, 2015). Esse contexto é propício para o aparecimento de dor crônica e problemas psíquicos, que prejudicam a saúde e a qualidade de vida do bailarino (Cahalan et al., 2016; Jacobs, Hincapié & Cassidy, 2012; McEven & Young, 2011; Meereis, Teixeira, Pranke, Lemos & Mota, 2013; Wyon & Koutedakis, 2013).
Em bailarinos adolescentes, tem-se o problema agravado, devido aos fatores a seguir descritos. A adolescência é apontada como um período da vida particularmente estressante (Breinbauer & Maddaleno, 2008; Zimmer-Gembeck & Skinner, 2008). O estresse decorre provavelmente das mudanças físicas, psicológicas, cognitivas e sociais, características desse momento. Tais mudanças ocasionam o aumento do número e da variabilidade das experiências de vida e das demandas de diferentes ambientes (família, escola, grupo de pares).
Para evitar esses riscos, o coping – enfrentamento – tem sido estudado, sendo a Teoria Motivacional do Coping/Motivational Theory of Coping (MTC), elaborada por Ellen Skinner e colaboradores em 1994 e ainda atual, a mais recente ao analisar a historicidade das teorias de coping (Skinner, Edge, Altman, & Sherwood, 2003; Skinner & Welborn, 1994; Skinner & Zimmer-Gembeck, 2007, 2016). De acordo com a MTC, o constructo coping define-se por uma ação regulatória, em que se mobilizam, modulam, gerenciam e coordenam-se comportamento, emoção e atenção, ou mesmo não o fazem, sob estresse, em uma perspectiva desenvolvimentista e motivacional (Skinner & Welborn, 1994). Quanto ao desenvolvimento, ressalta-se que o processo é mutável ao longo da trajetória de vida, seguindo as fases desenvolvimentais, sendo influenciado por fatores genéticos, fisiológicos, psicológicos e sociais. Os episódios de coping atuam influenciando episódios subsequentes, a depender de seus resultados e das novas demandas quanto aos estressores (Skinner & Zimmer-Gembeck, 2009).
Em relação ao aspecto motivacional, os pesquisadores da TMC embasaram-se na Teoria da Autodeterminação/Self-Determination Theory de Deci e Ryan (1985). Conforme explicam Ramos, Enumo e Paula (2015), o entendimento nesta perspectiva é de que o coping engloba empenhos que a pessoa apresente para manter, restaurar ou reparar as Necessidades Psicológicas Básicas (NPB) de relacionamento, competência e autonomia. Após revisão da área, Skinner et al. (2003) propuseram uma estrutura hierárquica do coping, em que a base da estrutura é formada pelas ‘instâncias’ de coping, as quais são visíveis à observação, ou indiretamente, nas perguntas de instrumentos, por exemplo. Essas respostas são classificadas segundo seu propósito, funcionalmente, em categorias maiores, que compõem as ‘Estratégias de Enfrentamento’ [EE]. Estas são organizadas em categorias de alta ordem, que são as ‘famílias’ de coping, classificadas de acordo com sua relação com as NPBs e os processos adaptativos. A TMC propõe 12 ‘famílias’ de coping, sendo seis com desfechos adaptativos no médio e longo prazo, relacionadas à percepção de desafio às NPBs de: Relacionamento, com ‘autoconfiança’ e ‘busca de suporte’; Competência, com ‘solução de problemas’ e ‘busca de informações’; Autonomia, com ‘acomodação’ e ‘negociação’; e seis com defechos mal adaptativos, relacionados à percepção de ameaça às NPBs de: Relacionamento, com ‘delegação’ e ‘isolamento social’; Competência, com ‘desamparo’ e ‘fuga’; Autonomia, com ‘submissão’ e ‘oposição’ (Skinner et al., 2003; Skinner & Zimmer-Gembeck, 2007).
No caso da dança, um importante estressor que os bailarinos precisam enfrentar é a dor, já que pode ser percebido como uma ameaça às NPBs de autonomia, competência e relacionamento (Riggenbach, Goubert, Petegem & Amouroux, 2019). Sobre isso, Affaitati et al. (2011) afirmam que há várias intervenções psicossociais para o enfrentamento da dor, incluindo, entre outras, hipnose, relaxamento e terapia cognitiva-comportamental. As intervenções têm mostrado grau de eficácia, porém, úteis e específicas para uma intervenção em particular. Assim, ao se analisar um programa de intervenção do coping da dor, pode-se auxiliar outros bailarinos, caso o mesmo programa venha a ser reproduzido. Mostra-se, portanto, a relevância do presente estudo, cujo enfoque não é apenas a avaliação psicológica, mas, sim, uma intervenção que busque melhorar o enfrentamento de um estressor comum a bailarinos – a dor.
Em trabalhos interventivos merece destaque a atuação do mediador. Mediar significa situar-se entre o indivíduo mediado, neste caso, bailarinas, e os estímulos ambientais, visando modificar os últimos e levar a mudanças nos indivíduos, por meio de estratégias interativas (Dias, Enumo & Silveira, 2017). Com a Psicologia do Esporte e com trabalhos voltados para o coping da dor, não seria diferente.
Tratando-se de coping, o mediador deve contribuir para a ampliação do repertório de EE adaptativas por meio de: (a) envolvimento caloroso – expressar afeto e cuidado, aumentando a sensação do indivíduo de ser amado e pertencente a um determinado grupo, vinculado à necessidade básica de relacionamento; (b) fornecimento de estrutura – proporcionar um ambiente em que o contexto é estruturado, previsível, contingente e consistente, relacionado à necessidade básica de competência; (c) oferecimento de suporte para o desenvolvimento da autonomia – permitir liberdade de ação e expressão, encorajando-o a ver os estressores como desafios e não como ameaças, sem uso de coerção, vinculado à necessidade básica de autonomia (Skinner & Edge, 2002).
Em situações estressantes para um bailarino, como nos episódios de dor, é difícil manter ações organizadas e adaptativas, pois o estressor causa, muitas vezes, bloqueios às capacidades pessoais e às NPBs (Riggenbach et al., 2019). Nesse contexto, a atuação do mediador ou corregulador do coping pode ser fundamental para que o indivíduo restabeleça suas capacidades pessoais de enfrentamento (Skinner & Edge, 2002). Portanto, avaliar também a atuação do mediador se faz importante e justifica a sua avaliação, pois pode auxiliar ou dificultar a aquisição de novas formas de enfrentamento da dor.
Assim, o presente estudo objetivou descrever o ‘Programa de Intervenção no Enfrentamento da Dor em Bailarinos’ - PIEDOR - Bailarinos - e analisar a mediação do pesquisador segundo critérios de mediação básicos para a promoção do coping/enfrentamento adaptativo.
Método
Participantes e fontes de dados
Os dados analisados neste estudo derivam de oito sessões gravadas em áudio e vídeo feitas de uma intervenção psicológica realizada por uma pesquisadora, que atuou como mediadora de 14 bailarinas da modalidade jazz, com idade entre 12 e 17 anos (Med =14; EP = 1,26). Estas foram selecionadas por conveniência, pelo fato de serem consideradas ‘padrão-ouro’ (competem em nível nacional e internacional, com diversas premiações). Ensaiavam em média 4h30min nos dias de semana e mais duas horas aos sábados, mais as aulas extras que muitas fazem (ballet clássico e contemporâneo, hip hop etc.). Dançavam em média há sete anos e competiam, em média, há quatro anos.
As bailarinas, por meio do autorrelato obtido pelo Diário da Dor, apresentavam dores constantes em diversas partes do corpo, sendo as mais citadas: área posterior do quadril, coluna lombar, virilha, nuca, abdômen, cintura escapular e área posterior da coxa. As dores não eram provenientes de lesões, doenças ou causas externas, mas em decorrência de excesso de treinamento físico e pouca recuperação, o que acaba sendo frequente em bailarinos profissionais (Silva & Enumo, 2016).
A pesquisadora e experimentadora, aqui denominada de mediadora (M), cuja mediação foi avaliada, tem graduação em Educação Física e em Psicologia, mestrado em Educação Física, doutorado e pós-doutorado em Psicologia. Além disso, foi professora de dança e coreógrafa por dez anos, além de bailarina por 22 anos. A M não tinha contato prévio com as bailarinas antes da pesquisa, apenas contato com a diretora da escola, a professora e a ensaiadora do grupo.
Instrumentos e Programa de Intervenção
Para a análise da mediação do experimentador, foi aplicado o ‘Instrumento de Observação do Padrão de Interação do Mediador em Situação de Grupo’ (IOPIM), adaptado de Ramos (2012), a partir dos critérios de mediação de Skinner e Edge (2002). É composto por 23 itens (exemplos: “item 1. Mediador produz uma mensagem clara ao grupo, com objetivo de engajá-lo na sessão”; “item 22. Os objetivos da sessão e a seleção dos materiais promovem o envolvimento ativo dos participantes”), respondidos em escala de quatro pontos (1 = “nenhuma evidência”; 2 = “evidência em nível crescente”; 3 = “evidência em nível moderado”; 4 = “evidência em nível elevado”). Contém também quatro questões abertas: (a) resumo das interações do mediador; (b) resumo do ambiente de intervenção; (c) descreva a participação dos bailarinos e responsividade; (d) recomendações.
As categorias de avaliação do mediador (M) são: Critério A – Envolvimento caloroso - nove questões sobre a forma de ter e manter a atenção dos participantes, se possui um tom de voz e gestos acolhedores e se envolve os participantes; Critério B – Fornecimento de estrutura - sete questões sobre se mediador dá suporte para a participação das pessoas, se explica em níveis de dificuldades para ampliar e favorecer o aprendizado, comunica-se de forma clara e deixa claros os objetivos das tarefas; Critério C – Suporte para o desenvolvimento da autonomia - sete questões sobre como o mediador associa experiências passadas ao vivido no presente, envolve os participantes, faz perguntas aos mesmos e deixa o processo mais ativo, proporcionando o desenvolvimento da autorregulação. Calcularam-se as médias das notas dos juízes para cada um dos critérios, por sessão. Quanto mais próximo da pontuação 4 (‘evidência em nível elevado’), melhor o desempenho de M, de acordo com os juízes.
As gravações analisadas neste estudo foram feitas no ‘Programa de Intervenção no Enfrentamento da Dor em Bailarinos’ – PIEDOR - Bailarinos (Silva & Enumo, 2017; 2020), resumido neste tópico. Este programa é um protótipo, aplicado com um delineamento quase-experimental, com medidas em pré-teste e pós-teste (Silva & Enumo, 2017; 2020).
Durante as sessões do PIEDOR - Bailarinos (Silva & Enumo, 2017), foram utilizados os seguintes instrumentos:
a) Folhetos de Psicoeducação
Foram especialmente elaborados três folhetos. O primeiro, em formato de história em quadrinhos, com o objetivo de servir de psicoeducação sobre o próprio PIEDOR - Bailarinos, explicando o que é Psicologia do esporte, treino de imaginação, por exemplo. O segundo folheto contém as famílias de coping e as EEs específicas do contexto de dor, para que as bailarinas se acostumem com as nomenclaturas e conceitos da área. O terceiro folheto apresenta as emoções comuns na dança e como melhorá-las, sendo utilizado na devolutiva do programa.
b) Questionário Subjetivo de Avaliação da Capacidade Imaginativa (Gould, Damarjian & Greenleaf, 2011)
É um instrumento qualitativo, em que os participantes respondem de forma aberta, porém dirigida, sobre a qualidade da imaginação, após exercícios de imaginação sobre dançar sozinho, dançar com o grupo e dançar em um festival, visando avaliar a capacidade imaginativa do participante. A bailarina assinala se a imagem é vívida, controlável, se a percepção é interna, externa ou as duas, se percebe a sensação de fazer tal movimento, se há controle sobre a imagem, além de poder fazer comentários. Foi a primeira vez em que o instrumento foi utilizado com bailarinos adolescentes brasileiros; entretanto, foi a única opção de avaliação qualitativa da capacidade imaginativa encontrada pelos pesquisadores.
c) Questionário para Imaginação na Dança (Martens, 1987; adaptado por Vealey & Greenleaf, 1998, para atletas; adaptado livremente pelos pesquisadores para bailarinos)
É destinado a medir a capacidade para perceber cada um dos cinco sentidos envolvidos na imaginação, além de vários estados emocionais e de humor. Contém 12 questões que são respondidas após uma prática de imaginação, voltadas para identificação das dificuldades ao utilizar os cinco sentidos. O instrumento é dividido em três etapas – a primeira imaginação de uma prática de dança individual, a segunda de uma prática grupal e a terceira em um festival de dança. As bailarinas respondem a cada item após a condução da imaginação feita pela M e podem assinalar sua resposta em escala tipo Likert. Para cada parte do instrumento, existem perguntas correspondentes às dimensões visual, auditiva, cinestésica e emocional da imaginação. A pontuação é dada pela soma de cada critério e pela soma total que representa a capacidade imaginativa.
d) Diário de dor e de medicação (Silva & Enumo, 2016)
Elaborado para a pesquisa, ou seja, com características específicas para a dança, com base em diários de dor voltados para dor de cabeça6, bem como um programa de controle da dor clinicamente comprovado (Caudill, 1998). Este instrumento foi utilizado para poder avaliar, qualitativamente, quais as atividades em que os bailarinos sentem mais dor, e qual o comportamento deles em relação à medicalização. Deve ser preenchido quando a pessoa sente algum tipo de dor. Para cada dia assinalado, a pessoa responde a perguntas: presença de doença que agrava ou justifica a dor, frequência da dor, intensidade da dor por meio da Escala de Faces Revisada (Hicks, Von Bayer, Spafford, Von Koloar & Goodenough, 2001), tipo de atividade física praticada e sua duração, local da dor, uso de medicação.
e) Jogo do Coping da Dor para Bailarinos (Silva & Enumo, 2019, 2020)
Adaptado especificamente para este estudo, com base no Jogo de Coping da Dor (Oliveira, Paula & Enumo, 2017). É um jogo de tabuleiro, aplicado em grupo, com situações reais da dança, com objetivo de discutir sobre as EEs da dor utilizadas pelas bailarinas. Quem responder às situações com EEs adaptativas ganha cartões “coragem” e “coração”, que servem como reforçadores, e quem responder com EE mal adaptativas perde estas mesmas cartas. No fim, ganha quem apresentar o maior número de cartas “coração” e “coragem”. Existem diferentes tipos de cartas – cartas de enfrentamento, que são azuis e apresentam uma situação específica e uma resposta, sendo que a mesma pode ser adaptativa ou mal adaptativa; cartas neutras, amarelas, são cartas utilizadas para a distração; nas cartas dilemas, na cor laranja, é apresentada uma situação problema e duas possibilidades de resolução, uma adaptativa e outra mal adaptativa, sendo que a bailarina escolherá qual mais combina com o que ela iria fazer; e cartas desafios, vermelhas, que dizem respeito a uma situação complexa, cuja resposta precisa ser debatida em grupo.
f) Questionário de satisfação do usuário
Adaptado de Ramos (2012), o instrumento conta com cinco perguntas fechadas e duas abertas, discursivas, para avaliar o quanto as bailarinas ficaram satisfeitas com os procedimentos realizados – avaliação e intervenção –, bem como para verificar o que lhes foi mais útil, o que pode ser empregado no cotidiano de treinamentos e o que não foi possível ser feito. Este questionário contém cinco questões respondidas em escala tipo Likert, cujas respostas variam de acordo com a pergunta. Foram atribuídos valores na sequência das respostas. Por exemplo, para a pergunta 1, “Ao participar do Programa de Intervenção no Enfrentamento da Dor em Bailarinos (PIEDOR - Bailarinos), acho que aprendi sobre o que é treinamento de imaginação e como utilizá-lo no meu dia a dia”, as respostas poderiam ser: 1 = nada, 2 = muito pouco, 3 = alguma coisa, 4 = várias coisas, 5 = muitas coisas. Esse modelo seguiu para as outras questões em escala tipo Likert. Além disso, o instrumento contém duas questões discursivas, cujas respostas foram transcritas na íntegra e analisadas pontualmente. Todos os resultados foram tabulados em planilha de Excel, para posterior análise descritiva.
O ‘Programa de Intervenção no Enfrentamento da Dor em Bailarinos’ – PIEDOR -Bailarinos foi baseado nas propostas de Caudill (1998), Gould, Damarjian e Greenleaf (2011) e de Stefanello (2007) para intervenção em atletas e pessoas com dor crônica. O programa de intervenção é organizado em oito sessões, com duração aproximada de 45 minutos cada, uma vez por semana. Seu objetivo geral é que o bailarino adquira, por meio da imaginação, EEs da dor mais adaptativas, em longo prazo. Está composto por atividades, como imaginação de situações na dança, imaginação da dor, reestruturação cognitiva e relaxamento. As sessões se estruturam da seguinte forma:
Tabela 1 Atividades do Programa de Intervenção no Enfrentamento da Dor em Bailarinos – PIEDOR – Bailarinos
Sessão PIEDOR-Bailarinos | Atividades |
---|---|
1 |
Aplicação do folheto psicoeducativo. Entrega e explicação do Diário da Dor. Avaliação da capacidade imaginativa. |
2 |
Relaxamento céfalo-caudal. Imaginação - contexto fora da dança com atenção aos cinco sentidos; transposição para plateia de um teatro se vendo dançar (imaginação externa). Compartilhamento. |
3 |
Relaxamento céfalo-caudal. Imaginação – uma aula de dança com atenção aos cinco sentidos; ir a um teatro e fazer a observação do seu ambiente; colocar o figurino, fazer maquiagem e se perceber em um festival e notar a reação da plateia; voltar para a escola de dança. Compartilhamento. |
4 |
Relaxamento céfalo-caudal. Imaginação – movimento da dança, realizando com perfeição; passo que não conseguem fazer; apoiam-se nos colegas para executar corretamente e ficar sem dor (Busca de Suporte) e buscam informações sobre o que havia de errado (Busca de Informações); movimentos apresentados em um palco. Compartilhamento. |
5 |
Relaxamento, buscando relaxar partes dolorosas do corpo. Imaginação – uma forma para a dor e percepção dos sentidos envolvidos; modificando o formato para a dor e sua cor, textura. Psicoeducação sobre as famílias de coping e Estratégias de Enfrentamento (EE) por meio dos cartões de enfrentamento. Questionamentos sobre as famílias de coping e EEs utilizadas por elas. |
6 | Aplicação do Jogo do Coping da Dor para Bailarinos. |
7 |
Relaxamento breve. Imaginação – situações da dança usando EEs adaptativas. Pensar em três objetivos par melhorar as EEs adaptativas, três barreiras para elas e três formas de superar essas barreiras. |
8 |
Pós-teste da capacidade imaginativa. Compartilhamento. |
Procedimentos e Análise de Dados
Os aspectos éticos foram seguidos conforme Resolução 466/2012 e autorização do Comitê de Ética para Pesquisa com Seres Humanos da universidade, sob parecer nº 783.537; CAAE: 23756113.3.0000.5481. As bailarinas participaram após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelos pais e a assinatura por elas próprias do Termo de Assentimento.
As sessões de intervenção foram gravadas com uma máquina filmadora apoiada em tripé, e, posteriormente, realizou-se a transcrição das oito sessões de intervenção. A transcrição e os arquivos de vídeo foram enviados a três juízes especialistas na área da Psicologia e com aprofundado conhecimento na MTC – uma doutora e duas doutorandas em Psicologia, com experiência de 12, 9 e 16 anos na área, respectivamente. Os juízes, após treinamento piloto, avaliaram os comportamentos durante as sessões por meio do ‘Instrumento de Observação do Padrão de Interação do Mediador em Situação de Grupo a partir dos critérios de mediação de Skinner e Edge’ (2002).
Resultados
Primeiramente, serão apresentados os dados da intervenção, sessão a sessão e, na sequência, são apresentados os resultados gerais da mediação do experimentador. Os trechos citados no texto, e apresentados nesta etapa de resultados, foram provenientes das anotações dos próprios juízes, que assinalaram os trechos como forma de compreensão do que estavam mencionando na análise.
Na S1, a primeira atividade foi imaginar-se em três situações: dançando sozinho, em grupo e em um festival. A maioria dos participantes relatou não ter tido grandes dificuldades para imaginar. No final da intervenção, M vinculou o treino de imaginação com a dor: deu explicações fisiológicas, de maneira resumida e acessível, de como a imaginação pode reduzir a dor. Explicou que EE como a distração pode ser adaptativa e o quanto a catastrofização se torna prejudicial; proporcionou estímulo à autonomia, com falas para que percebessem o corpo durante o ensaio e utilizassem de imaginação outra situação que não a dor.
A análise dos juízes sobre a mediação da S1 mostra que o Critério B foi mais atendido pela M (M = 3,69), e que o Critério A teve a menor pontuação (M = 2,72), seguido do Critério C (M = 2,83) (Tabela 3).
A S2 teve parte inicial de relaxamento (céfalo-caudal) e, após a imaginação. Nesta sessão, foram utilizados os sentidos visão, cinestesia, audição, olfato, além de emoções e sensações (exemplo: perceber se a imagem que tinham de si era interna ou externa, com cores ou não). No momento de compartilhamento da experiência, duas bailarinas relataram que achavam ter dormido (bailarina = B) - B12 e B15, e todas se perceberam mais relaxadas do que antes. B5 relatou dificuldade para relaxar no começo devido a vários pensamentos e ao intenso barulho externo à sala, mas que depois das consignas dadas conseguiu relaxar.
Os lugares imaginados pelas bailarinas que compartilharam suas experiências se resumiram a shopping (B5, B7) e praia (B3, B11, B13). Quando questionadas sobre como se sentiram, B13 e B1 afirmaram “ter sido bom”, enquanto B5 disse que não, porque as imagens apareciam, mas não eram o que desejava - demonstrando que a perda de 'controle a incomodou. É interessante perceber o quanto o bailarino precisa sentir controle da situação, o que pode ser denominado de necessidade psicológica básica de autonomia.
M prossegue questionando se elas conseguiriam se imaginar em um lugar/contexto diferente, caso sentissem dor. B13 e B3 dizem que sim, e B2 diz que acha que não conseguiria fazer na aula, mas que em casa, talvez, o mesmo relatado por B15. Em oposição, B5 disse que já utiliza essa técnica quando faz abdominal: “Eu estou lá fazendo abdominal... nunca consigo fazer o tanto que a professora quer... aí começo a pensar em outras coisas e aí eu vou, sabe... aí eu consigo fazer porque me distraio” [B5].
Com isso é possível notar que mesmo sem saber a funcionalidade, algumas já utilizavam EEs adaptativas, cabendo a M reforçar esses comportamentos positivos, o que foi feito, acrescendo-se ainda a importância da respiração, para aumentar a concentração, relaxar o corpo e diminuir a dor. Em concordância, B7 afirmou: “Eu vou tentar, estou com muita dor aqui (apontando para a lombar), agora eu respirei bem fundo assim, aí eu senti que meu corpo relaxou bem mais”. Assim como relatos de melhora no desempenho ao se alongar devido à respiração: “Eu estava fazendo alongamento, e aí parei, respirei e foi uau!” (fazendo movimento com as mãos como se tivesse alongado bastante) [B5].
Não sei, mas a gente estava lá em Joinville, estava se aquecendo e tal, e a ensaiadora falou para a gente respirar fundo e relaxar, e ela foi levantando algumas pernas e tal, e foi bem mais [B2].
Considerando que a ensaiadora é uma figura de sucesso (bailarina premiada em competições internacionais) próxima às participantes, os comportamentos dela podem servir para modelação comportamental. M encerrou falando novamente sobre a importância da imaginação.
Os juízes classificaram que, na S2, o Critério C apresentou a melhor pontuação, ou seja, a M proporcionou suporte para a autonomia (M = 3,00); porém, o Critério A apresentou a menor pontuação (M = 2,51), seguido do Critério B (M = 2,90) (Tabela 3).
A S3 iniciou com M, lembrando-os de anotarem no Diário da Dor quando estivessem com dor, seguindo com o relaxamento e o treino de imaginação. Ao compartilhar, B2, B6 e B15 relataram ter dormido. Em contrapartida, B1 afirmou ter sentido dificuldade porque não conseguia se concentrar; B12 reclamou de dificuldades no início por causa do frio intenso. M perguntou como estavam sentindo o corpo ao fazer a imaginação, e todas afirmaram estar mais relaxadas e ter se sentido bem, com exceção da B1, que ficou chateada devido a pensamentos que a impediram de imaginar com qualidade. Encerrou-se com M relembrando-as de preencherem o Diário da Dor.
A análise sobre a mediação durante a S3 mostrou que o Critério A apresentou a melhor pontuação (M = 2,77), mostrando que M priorizou o envolvimento caloroso com as bailarinas; já o pior resultado foi para o Critério C (M = 2,38), seguido do Critério B (M = 2,76); porém, é válido observar que a diferença do Critério B para o A foi mínima (Tabela 3).
No início da S4, M questionou-as sobre as dores. B12 disse estar com dor no tornozelo e B2 com dor na lombar. M lembrou-as de registrar os pontos doloridos no diário. B1 comentou que contou para a mãe sobre o Diário da Dor e que quando reclama com ela sobre a dor, a mãe a lembra de anotar. Buscando focar no assunto da dor e na sessão de intervenção, M perguntou se elas haviam usado a imaginação quando estiveram com dor. B2 e B7 afirmaram que sim, enquanto B12 afirmou ter tentado imaginar durante a aula, mas não conseguiu. Afirmaram que buscam técnicas alternativas para enfrentar a dor – massagem, gelo, entre outras.
Foi realizado o treino de imaginação, e na sequência, o compartilhamento. Ao relatarem o que vivenciaram, B3 e B7 disseram ter dormido. M perguntou se elas percebiam o quanto estavam cansadas, e o grupo afirmou perceber que isso realmente ocorria. B1, ao contrário das sessões anteriores, disse que dessa vez “foi mais fácil de imaginar” porque estava mais relaxada. B2, em acordo, disse que estava bem porque conseguiu relaxar. Além disso, B2 e B7 elogiaram a voz de M como sendo suave e capaz de acalmá-las.
Quando questionadas se conseguiram imaginar algo, B1, B2, B12 e B13 disseram que sim, como segue nos exemplos: “Parece que você está fazendo” [B12]. “Parece que você morre e volta! [...] Porque tudo ao redor some... mas não aconteceu nada!” [B2].
As bailarinas B1, B12 e B13 disseram ter conseguido perceber a movimentação feita, mas B1 ressaltou que não conseguiu realizar o movimento com perfeição. Já B13 relatou sua felicidade em conseguir imaginar fazendo o movimento corretamente, já que nunca o fez certo. Por fim, como já haviam mencionado em sessões anteriores, B2 e B13 se imaginaram estando sozinhas todo o tempo.
A análise dos juízes sobre a mediação durante a S4 de intervenção mostrou que o Critério B foi o melhor avaliado (M = 2,57), o que indica que M deu uma estrutura necessária para estimular a competência das bailarinas; enquanto o critério pior avaliado foi C (M = 2,38), seguido do A (M = 2,44) (Tabela 3).
A S5 iniciou com M, explicando que naquele dia fariam duas atividades. B2, demonstrando-se próxima de M, comparou seu próprio pé com o de B15, como tendo um bom formato para dança. A simples colocação demonstra identificações, proximidade e segurança para expressar que foram estabelecidas entre M e bailarinas.
M perguntou quem estava com dor naquele dia, e B11, B13 e B15 levantaram a mão, enquanto B1 dizia: “Acho que hoje a sala inteira está com dor”. Na sequência, B2 levantou a mão dizendo que também estava com dor (de cabeça), B15 apontou para a dor posterior de coxa e costas, B13 disse estar com dor nas costas e nádegas e B1 com dor nas nádegas. M então disse que a intervenção poderia ajudá-las com as dores, solicitando silêncio e dando início ao treino de imaginação.
As bailarinas imaginaram um formato para sua dor e depois a modificaram. Após o processo, questionadas se conseguiram fazer a dor passar, B12, B13 e B7 disseram que conseguiram, e B7 ressaltou que foi bom imaginar que a dor estava passando. B7 disse que no dia anterior estava com muita dor na panturrilha, porque se esforçou muito e não fez um alongamento correto, e tentou esquecê-la se distraindo com outras atividades. M comentou sobre a distração como uma EE adaptativa e o quanto o alongamento era importante, para que se liberasse ácido lático do organismo, explicando de forma simplificada o funcionamento psicofisiológico da dor. Após isso, deu-se a segunda parte da intervenção com apresentação das EEs e famílias de coping e questionamentos sobre quais dessas as bailarinas utilizavam para enfrentar a dor.
Os juízes classificaram que, na S5, o Critério B obteve a maior pontuação (M = 3,66); já o Critério A foi o que apresentou a pior pontuação (M = 3,03), seguido do Critério B (M = 3,14) (Tabela 3).
A S6 iniciou com M explicando o funcionamento do jogo de tabuleiro. As bailarinas perguntaram como ganhariam o jogo, sem se importarem muito com o passo a passo, mostrando a competitividade evidenciada durante toda a sessão: desapontamento intenso com “perder” e torcida para o erro do outro. Remete-se à própria estrutura da dança, relacionada à competitividade “a qualquer custo”, mesmo que signifique o mal-estar de outros ou a própria dor. É possível que esse ambiente desenvolva um repertório amplo de EE para o estressor ‘competição’, assim, autorregulam-se comportamentos, emoções e orientações motivacionais dependendo do contexto (função do coping).
Nas cartas com objetivo de distração (amarelas), elas se entusiasmaram, participando ativamente. As cartas de cor laranja (dilema) foram bastante discutidas, sendo que as bailarinas verbalizaram alternativas de EEs pessoais, para além das descritas nas cartas. Observaram o quanto era possível executar as EEs adaptativas e quão benéficas seriam. Uma carta laranja que chamou a atenção foi:
Quando chego na sala de aula de dança percebo que meus colegas estão comentando que eu não sei dançar e por isso me machuquei. Ouvindo isso eu: a) explico aos colegas que a dor faz parte da dança e sinto que vai ficar tudo bem; b) me afasto por não poder contar com ninguém e penso em me vingar dos meus colegas porque eles não são compreensivos com minha dor.
O interessante aqui foram algumas respostas como, por exemplo: B15 que afirmou que não se vingaria; ou B6 que disse que na dança não se tem colegas, e sim, amigos, e que, portanto, iria explicar que está com dor. O grupo todo concordou e, no fim, B2 concluiu dizendo que a dor faz parte da dança e que ela vem, mas passa. Também chamou a atenção: “Sinto que o ensaio foi cansativo e sinto-me exausta e com dor, a minha opção para o dia é a seguinte: (a) falto o ensaio; (b) planejar minhas atividades diárias para que eu não sobrecarregue meu corpo e não sinta dor”. As respostas foram unânimes, sendo que ninguém falta ao ensaio mesmo estando com dor e ninguém planeja atividades para o dia visando diminuir a dor, o que é um fato preocupante.
As cartas vermelhas (desafio) foram intensamente discutidas, sendo que os cartões de enfrentamento utilizados na sessão anterior e dispostos ao lado do tabuleiro ajudaram nesse processo. Isso mostrou engajamento das participantes com a temática e a percepção de sua importância.
Observando o desenvolvimento da sessão, é interessante utilizar o jogo de tabuleiro por duas sessões seguidas, e não apenas uma, como foi feito. Possivelmente, o efeito psicoeducativo seria potencializado e novas EEs poderiam ser discutidas.
A análise sobre a mediação na S6 de intervenção mostrou que o Critério C teve a melhor pontuação (M = 3,38); enquanto o Critério A teve a pior pontuação (M = 3,04), seguido Critério B (M = 3,20) (Tabela 3).
A S7 foi composta por relaxamento e imaginação de situações relacionadas ao uso das famílias de coping adaptativas, seguida de compartilhamento das experiências individuais. Algumas bailarinas relataram ter dormido (B4, B7, B12). Do que foi dito, o mais evidente foi o fato de as bailarinas evitarem negociar com a professora por treinos mais leves, porque sabem que serão malvistas e prejudicadas. Assim, a negociação, que teoricamente é uma EE adaptativa, neste contexto assume uma função psicológica mal adaptativa, pois as consequências decorrentes da negociação são piores ao não negociar. Outro fato interessante foi que a principal busca por suporte relatada se dirigiu aos pais e amigos da dança, sendo que há uma diferença entre as meninas que têm mães bailarinas ou ex-bailarinas (B2, B3, B12). As filhas das últimas relataram receber maior suporte e compreensão quanto à dança competitiva do que as das primeiras.
Na segunda atividade, criar barreiras para utilização do coping adaptativo e sua posterior solução, foi possível perceber que M criou contexto para a autonomia das bailarinas, mostrando que elas podem identificar o que é possível ser executado, dentro de suas possibilidades.
A família de coping mais citada nos objetivos foi ‘Solução de Problemas’, seguida de ‘Busca de Informação’, ‘Busca de Suporte’, ‘Acomodação’ e ‘Negociação’. A barreira mais citada foi falta de tempo, seguida de esquecimento, medo, informações erradas, falta de compreensão de outras pessoas, preguiça, ruminação, método alternativo sem eficácia, não alongar após ensaio, vergonha para negociar e excesso de treino. A solução mais citada foi programar melhor o tempo/organizar a rotina, seguido de colocar um lembrete ou despertador, procurar fontes confiáveis de informação, negociar, pedir ajuda para outra pessoa, dormir/descansar mais, distração, não ter medo, empenhar-se mais para encontrar métodos alternativos, alongar, automassagem e enfrentar a vergonha. O que se destacou dessa sessão foi a vergonha em negociar, como sendo uma espécie de baixa autoeficácia, além de dificuldade de relacionamento, baixa autopercepção de competência e autonomia; o medo de não dançar, o que afeta diretamente a competência e a autonomia; além da falta de tempo para resolver os problemas, sendo necessária uma melhor periodização dos treinamentos físicos e técnicos.
A mediação feita na S7 foi analisada pelos juízes tendo o Critério C com a maior pontuação (M = 3,28) e logo atrás os Critérios A e B empatados (M = 3,00) (Tabela 3).
Na S8, realizou-se uma reavaliação da capacidade imaginativa. Houve um compartilhamento sobre como perceberam a intervenção no todo. B12 e B15 disseram que pensaram que a intervenção não seria psicológica, mas, sim, corporal. Indicaram satisfação, como citado por B3: “Foi bom! [...] Eu não sinto mais dor. Depois do que você deu, eu não sinto mais nada. Porque agora eu acho que o psicológico faz parte”. Ou por B2: “Foi bom, eu gostei bastante”.
Analisando a S8, percebe-se que foi muito rápida, tendo em vista a necessidade de avaliação pós-teste. Isso possivelmente atrapalhou os resultados, principalmente os referentes à capacidade imaginativa, mas foi necessário, porque era o tempo disponível. A análise da mediação da S8 apontou que o Critério B apresentou a maior pontuação (M = 3,04); o Critério A obteve a menor pontuação (M = 2,80), seguido do Critério C (M = 3,00) (Tabela 3).
Por meio do Diário da Dor (DD) e dos relatos das bailarinas ao longo da intervenção, constatou-se que elas utilizavam com mais frequência EEs mal adaptativas, por exemplo, catastrofização da dor, tomar remédio sem prescrição médica (DD = 15,38%) ou simplesmente reclamar. Após a intervenção, elas passaram a utilizar mais EEs adaptativas, como distração (DD = 39,56%), alongamento, buscar métodos alternativos para melhorar a dor e compartilhar com as amigas de dança; assim como reduziram a frequência do uso de EEs mal adaptativas.
Após a computação de todas as notas dadas pelos juízes, as médias foram agrupadas na Tabela 2, que apresenta os resultados para cada sessão do PIEDOR - Bailarinos.
Tabela 2 Média das notas dos juízes no Instrumento de Observação do Padrão de Interação do Mediador em Situação de Grupo (IOPIM) nas sessões do PIEDOR - Bailarinos
Sessão IOPIM (itens) | S1 | S2 | S3 | S4 | S5 | S6 | S7 | S8 | Média |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
1 | 4,00 | 3,33 | 2,67 | 3,00 | 3,67 | 2,33 | 2,67 | 3,33 | 3,12 |
2 | 4,00 | 3,00 | 4,00 | 2,00 | 3,33 | 4,00 | 3,00 | 3,67 | 3,37 |
3 | 3,50 | 2,00 | 2,50 | 2,33 | 2,67 | 4,00 | 2,67 | 3,33 | 2,87 |
4 | 4,00 | 2,67 | 3,33 | 3,00 | 3,67 | 3,50 | 3,00 | 3,50 | 3,33 |
5 | 3,67 | 2,67 | 3,67 | 3,33 | 4,00 | 3,00 | 3,67 | 3,00 | 3,38 |
6 | 3,33 | 3,00 | 3,33 | 3,00 | 3,33 | 3,33 | 3,67 | 3,33 | 3,29 |
7 | 3,00 | 3,00 | 2,00 | 2,00 | 3,00 | 3,67 | 3,67 | 2,67 | 2,88 |
8 | 4,00 | 3,67 | 3,00 | 3,00 | 3,67 | 3,67 | 3,67 | 3,67 | 3,54 |
9 | 3,00 | 3,33 | 2,67 | 3,00 | 3,33 | 3,67 | 3,33 | 3,00 | 3,17 |
10 | 1,67 | 2,67 | 1,67 | 2,00 | 2,67 | 3,00 | 3,33 | 1,50 | 2,31 |
11 | 3,67 | 2,67 | 2,00 | 1,67 | 3,33 | 2,33 | 2,00 | 2,00 | 2,46 |
12 | 3,67 | 3,00 | 2,67 | 2,67 | 4,00 | 3,33 | 3,00 | 3,00 | 3,17 |
13 | 1,67 | 3,67 | 3,33 | 2,67 | 3,00 | 3,67 | 3,00 | 2,67 | 2,96 |
14 | 3,33 | 2,67 | 2,50 | 2,67 | 3,50 | 3,67 | 3,00 | 3,00 | 3,04 |
15 | 2,33 | 2,67 | 3,00 | 2,00 | 3,00 | 3,00 | 3,00 | 3,33 | 2,79 |
16 | 2,00 | 2,00 | 1,67 | 2,33 | 1,67 | 2,67 | 2,33 | 3,00 | 2,21 |
17 | 3,00 | 2,33 | 2,67 | 2,33 | 2,67 | 3,33 | 2,67 | 2,00 | 2,62 |
18 | 1,67 | 2,00 | 3,00 | 2,67 | 3,67 | 4,00 | 3,00 | 2,33 | 2,79 |
19 | 3,00 | 3,00 | 1,67 | 2,00 | 2,67 | 3,00 | 2,67 | 2,33 | 2,54 |
20 | 2,00 | 1,67 | 2,00 | 2,33 | 3,33 | 2,33 | 3,00 | 2,67 | 2,42 |
21 | 2,67 | 3,33 | 2,67 | 2,67 | 3,33 | 3,67 | 3,67 | 3,67 | 3,21 |
22 | 4,00 | 3,00 | 3,00 | 2,00 | 4,00 | 4,00 | 3,67 | 3,33 | 3,37 |
23 | 2,67 | 2,67 | 2,00 | 2,67 | 3,00 | 3,67 | 3,67 | 3,33 | 2,96 |
Média | 3,04 | 2,78 | 2,65 | 2,49 | 3,24 | 3,34 | 3,10 | 2,94 | 2,95 |
Na Tabela 2, observa-se que o item 8. ‘Mediador promove pensamentos que associam o conteúdo a experiências futuras’ teve pontuação maior (M = 3,54), seguido do item 5. ‘Mediador usa voz, gestos e movimentos para vivenciar a apresentação dos conteúdos da sessão’ (M = 3,38) e do item 2. ‘Mediador consegue com sucesso manter a atenção do grupo ao longo da sessão’ e item 22. ‘Os objetivos da sessão e a seleção dos materiais promovem o envolvimento ativo dos participantes’ (ambos itens com M = 3,37). É possível perceber também que o item 16. ‘Mediador faz observações sobre a participação, incluindo feedback sobre como estão (ou não) participando da sessão de grupo’ obteve a menor pontuação (M = 2,21), seguido do item 10. ‘Mediador compartilha seus próprios pensamentos ou experiências relevantes para os objetivos da sessão’ (M = 2,31) e do item 20. ‘Mediador oferece oportunidade aos participantes para reconhecer e sintetizar suas experiências de aprendizagem no grupo’ (M = 2,42).
A Tabela 3 apresenta a média de nota dos juízes para cada sessão da intervenção, porém, baseando-se nos critérios de análise, conforme as NPBs que fundamentam a MTC.
Tabela 3 Resultados da análise de mediação nas sessões do PIEDOR - Bailarinos segundo os critérios de mediação
Critérios de mediação | Critério A Envolvimento caloroso (NPB de Relacionamento) | Critério B Fornecimento de estrutura (NPB de Competência) | Critério C Suporte para o Desenvolvimento da Autonomia (NPB de Autonomia) | |
---|---|---|---|---|
Critérios de mediação Sessão | Média | |||
1 | 2,72 | 3,69 | 2,83 | 3,08 |
2 | 2,51 | 2,90 | 3,00 | 2,80 |
3 | 2,77 | 2,76 | 2,38 | 2,64 |
4 | 2,44 | 2,57 | 2,38 | 2,46 |
5 | 3,03 | 3,66 | 3,14 | 3,28 |
6 | 3,04 | 3,20 | 3,38 | 3,21 |
7 | 3,00 | 3,00 | 3,28 | 3,09 |
8 | 2,80 | 3,04 | 3,00 | 2,95 |
Média | 2,79 | 3,10 | 2,92 | 2,95 |
Nota: Média dos juízes observadores = [(Nota Juiz A + Nota Juiz B + Nota Juiz C)/3]; NPB = necessidade psicológica básica.
Percebe-se na Tabela 3 que as sessões melhor avaliadas foram: S5, na qual foi feito um treino de imaginação específico da dor além da psicoeducação sobre as EEs da dor; a S7, que realizou um treino de imaginação sobre as EEs da dor além do momento de reflexão sobre quais EEs adaptativas poderiam utilizar, barreiras para que isso aconteça e possíveis soluções para superar essas barreiras; e a S6 – Jogo da Dor. O Critério B – Fornecimento de Estrutura (relacionado à NPB de Competência) foi o que em média recebeu a melhor pontuação e o Critério A – Envolvimento Caloroso (NPB de Relacionamento) foi o que obteve a menor pontuação.
Discussão
Este estudo objetivou descrever o Programa de Intervenção no Enfrentamento da Dor em Bailarinos – PIEDOR - Bailarinos. Em relação à intervenção, alguns dados se destacam, como, por exemplo, o fato de que, com relaxamento muito profundo, as bailarinas dormiam. A mediadora trouxe essa ocorrência para reflexão no grupo sobre cansaço e cargas de treinamento. Ajustando o tempo e a profundidade do relaxamento, esse problema foi parcialmente solucionado, sendo que em poucos momentos algumas bailarinas cochilaram. Em treinos de imaginação, é importante haver avaliação, reavaliações periódicas, e se necessário, ajustes, sendo o medidor flexível nesse sentido (Gould et al., 2011).
Frisando novamente que são adolescentes, é possível que sessões com menor duração fossem mais bem executadas, como por exemplo, duas vezes na semana, do que uma vez por semana e com longas sessões, como ocorreu. Isso facilitaria uma maior concentração no momento presente e na atividade realizada. Além disso, foi possível perceber que, quanto maior a concentração das bailarinas, melhor eram imaginadas as cenas. Autores como Kuan, Morris, Kueh e Terry (2018) explicam que a imaginação, quando precedida de relaxamento, garante melhor vivacidade das cenas imaginadas, tendo em vista que o adequado relaxamento evitará que outras imagens interrompam a cena criada.
Os materiais utilizados na intervenção foram avaliados pelos juízes como muito adequados para a identificação das bailarinas com os personagens das histórias, para auxiliar nas sessões de psicoeducação, para compreender processos psicológicos envolvidos e as melhores EEs a serem utilizadas. Essa avaliação pode ser confirmada pelo fato de as sessões psicológicas melhor avaliadas terem sido aquelas que utilizaram materiais extras e que atraíram melhor a atenção das adolescentes. O Jogo de Coping da Dor para Bailarinos, por exemplo, poderia ter sido aplicado em duas sessões, ao invés de uma, e contribuído para uma maior discussão das EEs. Por ser uma situação simulada e lúdica, o jogo permitiu que as bailarinas revelassem seu lado competitivo, inclusive mostrando sentimentos, como a raiva, que é pouco aceita socialmente.
Uma EE considerada adaptativa é a distração, e uma das formas de se obter distração é por meio do uso de elementos lúdicos. Jogos, por exemplo, são bastante utilizados em contextos hospitalares, porém, na maioria das vezes, apenas para crianças (Motta & Enumo, 2010). O jogo utilizado no PIEDOR - Bailarinos foi baseado no jogo desenvolvido por Oliveira et al. (2017), em contexto de EE da dor de crianças com anemia falciforme. Percebe-se que, independentemente do contexto, o jogo pode servir como material psicoeducativo, desenvolver EEs adaptativas, assim como ele por si só ser considerado uma EE adaptativa (distração).
Além da análise em relação à intervenção, este estudo também objetivou analisar a mediação do pesquisador segundo critérios de mediação básicos para a promoção do coping adaptativo. A análise realizada por juízes demonstrou que a mediadora foi clara nos comandos, porém, nem sempre explicou os objetivos de cada atividade. Isso pode ter comprometido a motivação das bailarinas em realizar determinadas atividades. Considerando que são adolescentes e que apresentam dificuldades para focalizar em apenas uma atividade, este apontamento deve ser levado em consideração. Autores como Gould et al. (2011) afirmam que principalmente para atividades de imaginação, os atletas precisam saber claramente os objetivos das tarefas que serão desenvolvidas para que haja um maior engajamento.
Os juízes apontaram também o fato de a mediadora, que era bailarina, quase nunca dar exemplos pessoais sobre o tema. A utilização de modelos pessoais auxilia na modelação e na aprendizagem. Autores como Spessato e Valentini (2013) afirmam que a demonstração, as dicas verbais e a imagem mental são estratégias que facilitam e promovem a aprendizagem em bailarinos. Esses aspectos são importantes não apenas considerando a mediadora, mas também a ensaiadora, que, por ser um símbolo de bailarina no Brasil, tendo ganhado premiações, serve como um excelente modelo para as bailarinas adolescentes. Esses mesmos autores afirmam que o perfil do modelo trará alterações diretas para as aulas de dança, como afirma a Teoria Social Cognitiva, em que a atenção dos alunos aumenta durante a aprendizagem quando o modelo possui alto nível de competência, reconhecimento social e é mais velho (Bandura, Jefery & Bachicha, 1974).
Foi possível perceber que, no início da intervenção, as bailarinas utilizavam com mais frequência EEs mal adaptativas, como por exemplo, catastrofização da dor, tomar remédio sem prescrição médica ou simplesmente reclamar; mas, com as sessões interventivas, elas passaram a relatar o uso de EEs adaptativas, como distração, alongamento, buscar métodos alternativos para melhorar a dor e compartilhar com as amigas de dança (busca de suporte), além de reduzir a utilização das EEs mal adaptativas. Isso se deu pela atuação da mediadora ao ensinar EEs adaptativas, estimular sua utilização, acolher as EEs já utilizadas por elas, mas demonstrar que poderiam alterá-las, enfatizando o uso da autonomia para fazê-lo antes, durante e após as aulas de dança e ensaios. Em pesquisa com mães de bebês prematuros, também utilizando a ‘Teoria Motivacional do Coping’, Ramos, Enumo e Paula (2017) também perceberam que o papel do mediador foi fundamental para tornar as EEs mais adaptativas, convergindo com os resultados da presente pesquisa.
Em relação à necessidade psicológica básica de Relacionamento, as bailarinas apresentaram bom relacionamento com as colegas de grupo de dança, em uma espécie de convívio solidário, compartilhando suas experiências e sentimentos. Contudo, não têm essa relação com os professores, ensaiadores e pais, que não foram bailarinos e médicos. Isso ocorre porque essas figuras representam uma ameaça à permanência na dança, já que, se compartilharem com essas pessoas que sentem dor, podem ser retiradas da dança, excluídas da coreografia ou ficarem um tempo sem dançar. Diversas pesquisas demonstram que muitos bailarinos continuam a competir, mesmo com dor e lesionados, para manter o status com o professor, por medo de perder sua posição dentro da companhia, e pelo fato de uma lesão poder implicar em prejuízo econômico, social, com consequências psicológicas (Byhring & Bo, 2002; Tarr & Thomas, 2011).
A autonomia é, geralmente, pouco observada nos bailarinos, em especial nos adolescentes. A coreografia é rígida e precisa ser executada com perfeição, não tendo oportunidades para atuar como quiser, inclusive sendo punidas com mais ensaios se cometem erros. Além disso, como já mencionado, dependem dos pais e do médico para continuar dançando, e esse é um aspecto bastante preocupante, pois a dor, quando não tratada, fica crônica, pode gerar lesão e interromper a atividade por tempo indeterminado (Bolling & Pinheiro, 2010).
Por fim, a NPB de competência fica comprometida quando se está com dor, já que pode reduzir o desempenho físico. Esse fato é tido com grande ameaça pelas bailarinas, pois podem perder sua vaga no grupo de dança. Em revisão sistemática da literatura, Meereis et al. (2013) constataram que sintomas dolorosos, que não são devidamente tratados, ocasionam lesões sérias, que afastam o bailarino da dança, o que compromete sua competência na atividade.
Com isso, percebe-se que a intervenção ajudou a fortalecer os aspectos positivos, resgatar a autoconfiança e autoeficácia das bailarinas, mostrando que outras EEs mais adaptativas são possíveis. A postura da mediadora foi fundamental, pois promoveu o desenvolvimento de aspectos comportamentais e emocionais relevantes, antes não observados, pois faziam uso somente de treinos físico e técnico.
Considerações Finais
Por meio do ‘Programa de Intervenção no Enfrentamento da Dor em Bailarinos’ – PIEDOR - Bailarinos, as bailarinas aprenderam a utilizar estratégias de enfrentamento adaptativas, reduzindo assim a frequência e a intensidade das dores. O processo de imaginação promoveu um maior conhecimento sobre o corpo, além de aumentar a autoconfiança para imaginar sem o auxílio da mediadora, desenvolvendo assim a autonomia. A postura da mediadora foi fundamental para essas mudanças. Alguns comportamentos da mediadora podem ser alterados, como apontado pelos juízes; mas, considerando a pontuação obtida pela mediadora, pode-se considerar que foi organizado um ambiente acolhedor, priorizando a competência e autonomia das bailarinas.
É válido ressaltar que o presente estudo apresenta algumas limitações. Tem-se o fato de os instrumentos de avaliação terem sido utilizados pela primeira vez com bailarinos, tendo em vista o caráter inédito do trabalho apresentado. Além disso, a intervenção foi aplicada em um único grupo e com um número pequeno de participantes, justamente por ter sido a primeira aplicação da intervenção. Assim, sugerem-se novos estudos visando à replicação do PIEDOR - Bailarinos, buscando-se testar sua eficiência e sua validade.
Percebem-se as possibilidades de atuação na área de Psicologia do Esporte e da Atividade Física. Sugerem-se estudos que atentem para as especificidades, como a modalidade praticada, diferentes populações e também a faixa etária, já que foi possível observar que a fase de desenvolvimento interfere no repertório de estratégias de enfrentamento. Para isso, os profissionais devem ter formação para garantir que as necessidades psicológicas básicas sejam asseguradas, e os psicólogos devem ser os mediadores de intervenções visando ao desenvolvimento de um processo de enfrentamento do estresse mais adaptativo.