Os problemas de comportamento em crianças produzem impactos negativos para o desenvolvimento, especialmente, para os aspectos psicossociais e escolares (Ferreira & Marturano, 2002). O repertório social de crianças com problemas de comportamento tem como consequência a dificuldade de manejo enfrentada pelos diversos cuidadores (Bochi, Friedrich & Pacheco, 2016). As crianças apresentam dificuldades na forma de interação com outras pessoas, o que pode desencadear disfunções na dinâmica social da família e da escola (Wielewicki, 2011). Por ser um distúrbio com consequências graves para a infância e com desdobramentos para as fases de desenvolvimento subsequentes, os problemas de comportamento na infância estimulam diversas pesquisas com a finalidade de investigar as variáveis que os influenciam ou que caracterizam os grupos clinicamente categorizados (Bornstein, Hahn & Haynes, 2010; Karim, Sharafat & Mahmud, 2014). Algumas variáveis têm sido frequentemente relacionadas ao padrão clínico de problemas de comportamento, entre elas, destacam-se as relações familiares (Weich, Patterson, Shaw & Stewart-Brown, 2009), saúde mental das mães e as condições socioeconômicas (Dishion & McMahon, 1998; Goodman et al., 2011; Weich, Patterson, Shaw & Stewart-Brown, 2009).
O objetivo deste estudo foi investigar, comparativamente, as características das famílias de crianças com e sem problemas de comportamento. A hipótese testada foi que as crianças com problemas de comportamento estão expostas a um ambiente familiar de baixo nível socioeconômico, com estilo parental negativo, baixa coesão na família, níveis altos de conflitos e mães com sintomas de ansiedade e/ou depressão.
A contribuição desse estudo foi verificar como essas variáveis podem caracterizar de forma mais precisa o perfil das famílias de crianças que têm problemas de comportamento. As relações familiares são abordadas em múltiplas dimensões e outras variáveis interferem na forma como os pais interagem com os filhos como, por exemplo, as habilidades sociais que podem explicar as dificuldades apresentadas pelos pais na comunicação e na expressão adequada das emoções positivas ou negativas (Casali-Robalinho, Del Prette & Del Prette, 2015; Sabbag & Bolsoni-Silva, 2015). As variáveis que fazem parte da hipótese deste estudo buscam contribuir na identificação do perfil familiar, comparando crianças com e sem problemas de comportamento.
Existem evidências sobre a relação entre o gênero, a cultura e o estilo parental empregado (Lansford et al., 2011), assim como evidências que marcam as variáveis ambientais como explicações mais consistentes para os problemas de comportamento do que os atributos dos indivíduos (Marturano & Elias, 2016), incluindo a saúde mental materna, como a presença de sintomas de ansiedade e depressão, que aumenta a frequência de punições físicas e reduz a monitoria positiva (Callender, Olson, Choe & Sameroff, 2012; Goodman & Garber, 2017; Villodas, Bagner & Thompson, 2018).
Os problemas de comportamento na infância podem ser divididos em duas principais categorias: externalizantes e internalizantes (Achenbach & Rescorla, 2001; Bolsoni-Silva & Del Prette, 2003). O perfil externalizante está relacionado à forma como a criança lida com o ambiente externo, sendo muito frequente a presença de comportamentos agressivos, quebras de regras e problemas com a socialização. Por outro lado, o perfil internalizante se caracteriza por um padrão de comportamentos disfuncionais mais silenciosos, com respostas sobre a forma como a criança percebe a si mesma, sendo frequentes comportamentos de queixas somáticas, ansiedade e depressão (Edwards, Rapee & Kennedy, 2010). Ambos os perfis são usualmente direcionados para o atendimento psicológico, sendo o mais frequente o externalizante, o que se constitui numa importante questão de saúde mental na infância (Lobo, Flach & Andretta, 2011; Raaijmakers, Posthumus, Van Hout, Van Engeland & Matthys, 2011).
As consequências relacionadas às alterações de comportamento são diversas, como baixo desempenho escolar, dificuldade de socialização e problemas de relacionamento na família. As crianças com problemas de comportamento podem apresentar baixo desempenho escolar e mais vulnerabilidade psicossocial, especialmente nas relações afetivas no ambiente familiar (D’Abreu & Marturano, 2011; Ferreira & Marturano, 2002; Wielewicki, 2011).
A relação entre problemas de comportamento e problemas escolares também foi investigada por Roeser e Eccles (2000), que observaram padrões de problemas comportamentais mais graves, tanto internalizantes quanto externalizantes, em crianças que apresentam baixo desempenho escolar. Outros estudos investigaram o perfil internalizante, sinalizando como esse padrão pode interferir na vida das crianças e suas famílias, especialmente nas dimensões da educação, das relações familiares e do desenvolvimento psicossocial (Assis, Avanci & Oliveira, 2009; Berkien, Louwerse, Verhulst & Van Der Ende, 2012). Os efeitos negativos que surgem na infância podem evoluir e agravar durante a adolescência e idade adulta, sendo um possível foco de políticas públicas voltadas para o atendimento dos problemas de comportamento na infância (Bayer et al., 2011; Prior, Smart, Sanson & Oberklaid, 2001; Roeser & Eccles, 2000).
Os estudos são convergentes sobre a importância da identificação de possíveis preditores ou características das crianças, das famílias ou do ambiente, possibilitando a explicação dos desajustes comportamentais (Bolsoni-Silva & Loureiro, 2011; Edwards et al., 2010; Marin, Piccinini, Gonçalves & Tudge, 2012). As investigações sobre fatores que podem explicar os problemas de comportamento na infância podem direcionar melhor os procedimentos de avaliações, assim como o reconhecimento de grupos de risco com demanda para intervenções preventivas (Bolsoni-Silva, Levetti, Meireles & Marim, 2015). Considerando que os problemas de comportamento na infância demonstram ser sensíveis aos mecanismos de interação das variáveis idiossincráticas da criança com as variáveis ambientais, demonstrando a complexidade desse fenômeno, é possível presumir que os modelos que buscam explicar esse fenômeno considerando apenas o perfil da criança eliminam os aspectos bidirecionais no processo de desenvolvimento psicossocial (Goodman et al., 2011).
Entre as variáveis ambientais, as relações familiares e as variáveis socioeconômicas são mais frequentemente identificadas como aspectos relacionados à presença de problemas de comportamento (Reiss, 2013). Um dos componentes das relações familiares é o estilo parental, que foi definido como a forma que pais adotam para educar os filhos, envolvendo diversos aspectos da relação entre pais e filhos, como por exemplo, a forma de comunicação, mecanismos utilizados para a mudança de comportamento, estratégias educativas, qualidade e quantidade de atenção (Baumrind, 1971). As primeiras dimensões de estilo parental foram propostas por Baumrind (1971), diferenciando três tipos: autoritativo, democrático e permissivo. No presente estudo, o estilo parental será considerado uma categoria mais abrangente já definida por De Bem e Wagner (2006) como as formas utilizadas pelos pais para educar os filhos, expressando, assim, as reações que os pais têm com a criança com a finalidade de direcionar melhor seus comportamentos, sendo, portanto, um conjunto de práticas. O modelo apresentado por Gomide (2006) é constituído por práticas positivas: monitoria positiva, comportamento moral e cinco práticas negativas: negligência, punição inconsistente, disciplina relaxada, monitoria negativa e abuso físico. Esse modelo tem como foco a operacionalização de práticas educativas, permitindo a definição de atitudes que podem favorecer o fator socioemocional das crianças e as que podem prejudicar. O modelo teórico de estilo parental delimita aspectos da relação entre pais e filhos, evidenciando fatores determinantes para o desenvolvimento, sendo associado à manifestação ou não de distúrbios comportamentais (Alvarenga, Oliveira & Lins, 2012; Bayer et al., 2012; Weich et al., 2009).
As práticas educativas parentais parecem ser um importante fator explicativo dos problemas de comportamento na infância, principalmente as práticas negativas caracterizadas por uma baixa interação, geralmente presente quando os pais apresentam dificuldades com a comunicação, monitoria positiva e empatia (Bolsoni-Silva & Loureiro, 2011). O conjunto de práticas educativas constitui-se nos estilos parentais que representam um perfil de interação entre pais e filhos (Gomide, Salvo, Pinheiro & Sabbag, 2005). Os estilos e as práticas parentais são variáveis incluídas em estudos sobre os problemas de comportamento (Mondin, 2017; Pinquart & Kauser, 2018). No estudo de Karim et al. (2014), o estilo parental autoritativo explicou a regulação emocional de adolescentes, sendo que o tipo de família (nuclear ou estendida) e o sexo dos pais não contribuíram para o modelo. Nesse caso é importante ressaltar que a variável “tipo da família” não trata de características das relações familiares, mas do número de pessoas e do grau de parentesco. Os resultados desse estudo enfatizaram uma maior força preditiva das relações entre os membros da família do que das características estruturais, sendo que estilo parental autoritário foi um preditor significativo para a presença de problemas de comportamento em crianças e adolescentes.
Algumas variáveis do ambiente familiar têm sido consideradas como moderadoras do estilo parental, como nível socioeconômico (De Bem & Wagner, 2006) e estado emocional, como níveis de estresse e sintomas de depressão (Gomide, Salvo, Pinheiro & Sabbag, 2005). Entretanto, a investigação sobre problemas de comportamento na infância e o estilo e/ou prática parental tem sido mais direcionada para encontrar evidências sobre o poder explicativo da forma como pais educam os filhos e as consequências dessas interações sobre o repertório de comportamento das crianças (Toni & Hecaveí, 2014), entretanto, outras variáveis precisam ser consideradas, como a coesão e o clima familiar (Coe, Davies & Sturge-Apple, 2018).
As relações familiares estabelecidas durante a infância são precursoras para a saúde mental na idade adulta (Baumrind, 1971; Dessen & Szelbracikowski, 2004). No estudo de revisão desenvolvido por Weich et al. (2009) foram encontradas evidências que apontam as práticas de abuso e a negligência nas interações dos pais com os filhos como variáveis associadas à depressão na idade adulta. Em um estudo longitudinal, Bayer et al. (2012) verificaram a consistência de problemas de comportamento em crianças nos primeiros cinco anos de idade, sendo os principais preditores o estresse materno e a disciplina rígida. Mais especificamente, a forma de interação dos pais com as crianças tem sido considerada uma variável frequentemente relacionada com o desenvolvimento de comportamentos antissociais ou pró-sociais, demonstrando a importância desse aspecto das relações familiares (Macarini, Martins, Minetto & Vieira, 2010).
Sobre as evidências do poder explicativo das interações familiares sobre os problemas de comportamento, além dos estilos parentais, têm sido identificadas as seguintes variáveis: coesão, afetividade e estrutura familiar (Bolsoni-Silva & Marturano, 2010; Borsa, Sousa & Bandeira, 2011). Essas variáveis são consideradas como preditoras da regulação emocional de crianças e adolescentes (Prior et al., 2001).
As relações familiares podem ser investigadas, utilizando dimensões que qualificam quão boa é a interação entre os membros. O clima familiar é uma das dimensões que permite medir a qualidade emocional das relações intrafamiliares, sendo o clima familiar positivo associado com menos problemas de comportamento em crianças e adolescentes (Finke et al., 2002). Na pesquisa desenvolvida por Teodoro, Hess, Saraiva e Cardoso (2014), os altos níveis de conflitos voltados para a presença excessiva de críticas entre os membros, solução de problemas por meio de brigas, alta frequência de zombarias, desentendimentos, além de rigidez e inflexibilidade de poder na família se correlacionaram diretamente com problemas de comportamento em adolescentes.
No estudo de Freitas, Siquara e Cardoso (2013), foi demonstrado que as crianças que possuíam um maior nível de afetividade e coesão estavam menos sujeitas aos problemas de comportamentos. Outra evidência encontrada nesse estudo foi que um ambiente familiar pouco estável e com conflitos entre seus membros pode provocar, principalmente, o aumento de estados de ansiedade e depressão. Dessa forma, os resultados sobre as relações familiares e o comportamento emocional foram convergentes, demonstrando como as interações no ambiente familiar sofrem influência do estado emocional dos seus membros. A associação entre estado emocional depressivo e o estresse das mães com problemas de comportamento na infância tem sido identificada por diversas pesquisas (Connel & Goodman, 2002; Forehand et al., 2012; Goodman & Garber, 2017).
A associação entre a depressão materna e os problemas de comportamento tanto internalizante quanto externalizante tem sido considerada bem estabelecida. Estudos de meta-análise demonstraram evidências sobre a relação entre a depressão materna e os problemas de comportamento na infância (Connel & Goodman, 2002; Goodman et al., 2011). Alguns indicadores de saúde mental materna, como os sintomas de ansiedade, depressão e estresse, podem interferir no desenvolvimento de comportamentos socialmente apropriados ou não (Rodrigues & Nogueira, 2016). As relações familiares possuem um conjunto mais amplo de variáveis (afetividade, conflito, hierarquia, coesão), que, muitas vezes, estão relacionadas às práticas parentais ou tipos de estrutura familiar. O estudo de Dessen e Szelbracikowski (2004), por exemplo, demonstrou que os problemas de comportamento estavam mais presentes em famílias recasadas (mãe e padrasto) do que em famílias que tinham como pais os genitores. Apesar de existirem estudos que consideram tais variáveis, é possível observar que uma das lacunas é a melhor operacionalização das medidas sobre as relações familiares, assim como a inclusão da saúde mental das mães e o estilo parental.
Por meio deste estudo comparativo é possível caracterizar melhor o ambiente de crianças que fazem parte do grupo que apresenta problemas de comportamento. Os sintomas emocionais das mães podem interferir na forma como elas lidam com o comportamento dos filhos e o engajamento em estilos parentais disfuncionais caraterizados pela ameaça, agressividade ou negligência (Forehand et al., 2012).
Outro conjunto de variáveis que tem sido considerado como um fator de influência para problemas de comportamento na infância refere-se às características socioeconômicas da família (Avanci, Assis, Oliveira & Pires, 2009; Bandeira, Rocha, Freitas, Del Prette & Del Prette, 2006; Carmo & Alvarenga, 2012). Entre as características socioeconômicas, variáveis como a escolaridade dos pais e a renda familiar são destacadas, sendo que quanto maior a renda e a escolaridade, melhor o perfil comportamental das crianças (Knutson, Degarmo, Koeppl & Reid, 2005). A influência das condições socioeconômicas sobre o desenvolvimento de crianças e adolescentes foi demonstrada por estudos que analisaram as variáveis ambientais (Bradley, Caldwell & Rock, 1988). Entretanto, modelos mais atuais direcionaram a investigação das variáveis ambientais para as relações familiares (Marturano & Elias, 2016; Sabbag & Bolsoni-Silva, 2015; Villodas, Bagner & Thompson, 2018).
O objetivo do presente estudo foi investigar as diferenças apresentadas pelos grupos de crianças com e sem problemas de comportamento, focando em variáveis ambientais, tais como variáveis socioeconômicas, relações familiares, sintomas de depressão e ansiedade das mães e estilos parentais.
Materiais e Método
Participantes
Os participantes do estudo foram 202 crianças com idades entre 6 e 11 anos (M = 8,5 anos; DP = 1,70), de ambos os sexos, sendo estudantes do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental de escolas públicas e privadas da cidade de Vitória da Conquista e suas respectivas mães. Apesar de terem sido convidados, o comparecimento dos pais foi inexpressivo, inviabilizando a análise dos dados para a figura paterna. As crianças foram incluídas na amostra por critérios de conveniência, a partir do interesse e consentimento dos responsáveis.
A identificação do grupo de crianças com problemas de comportamento foi realizada, utilizando os pontos de corte para grupo clínico do Inventário de Comportamentos de Crianças e Adolescentes 6-11 anos - Child Behavior Checklist (CBCL) (Achenbach & Rescorla, 2001), considerando a pontuação total da escala. Os casos limítrofes foram incluídos no grupo de crianças sem problemas de comportamento.
A amostra de crianças foi constituída de 55,4% (112) do sexo masculino e 44,6% (90) do sexo feminino. A escolaridade foi distribuída em 14,4% (29) do primeiro, 23,2% (47) do segundo, 21,8% (44) do terceiro, 20,8% (42) do quarto e 19,8% (40) do quinto ano do Ensino Fundamental. Quanto ao tipo de escola, 77,2% (156) eram estudantes de escola pública e 22,8% (46) de escola particular.
A amostra das mães tinha idade variando entre 21 e 56 anos. O estado civil variou entre 40,1% (81) solteiras e 46,1% (93) casadas, sendo que os outros 13,8% (28) distribuíram-se entre viúva, união estável e divorciada.
Os critérios de exclusão foram: (a) crianças que possuíam diagnóstico de algum transtorno do desenvolvimento; (b) quando o respondente era o pai da criança. Para o primeiro critério foram excluídas da amostra três crianças e para o segundo, seis crianças.
Instrumentos
Inventário de Comportamentos de Crianças e Adolescentes 6-11 anos - Child Behavior Checklist (CBCL) (Achenbach & Rescorla, 2001)
O CBCL é um questionário que avalia a competência social e os problemas de comportamento em indivíduos de 6 a 11 anos, a partir de informações fornecidas pelos pais. Essa versão é composta por 138 itens, sendo 118 para problemas de comportamento e 20 para a competência social. Os itens do questionário listam comportamentos desejáveis e inadequados e, para cada um deles, o respondente deve marcar a frequência com que esses comportamentos ocorrem, variando de 0 a 2. Nesse estudo foi utilizado apenas o escore total para problemas de comportamento, considerando a classificação para o perfil clínico e não clínico. O estudo psicométrico do CBCL apresenta alto coeficiente de fidedignidade (alfa de Cronbach = 0,95). As cargas fatoriais foram bastante satisfatórias, sendo a menor 0,51 confirmando a validade do instrumento (Rocha et al., 2013).
Inventário de Estilos Parentais (IEP) (Gomide, 2006)
O IEP possui 42 itens e avalia o estilo parental e sete práticas educativas: (a) monitoria positiva e (b) comportamento moral, e cinco práticas educativas negativas: (a) punição inconsistente, (b) negligência, (c) punição relaxada, (d) monitoria negativa e (e) abuso físico. O instrumento atende aos critérios psicométricos de validade de construto com resultado de análise fatorial que correspondem ao modelo teórico e cargas fatoriais altas. A fidedignidade do instrumento também apresenta índices satisfatórios obtidos utilizando o alfa de Cronbach, que variou de 0,47 a 0,82.
Inventário do Clima Familiar (ICF) (Teodoro et al., 2014; Teodoro, Allgayer & Land, 2009)
Por meio de 22 itens objetivos respondidos a partir de uma escala likert, o ICF avalia a percepção do clima familiar, as dinâmicas existentes nos relacionamentos intra e extrafamiliar. O instrumento possui quatro fatores: Apoio, Coesão, Conflito e Hierarquia. O fator Apoio apresenta itens que descrevem o suporte emocional e material dado e recebido pelos membros da família. O fator Coesão avalia o vínculo emocional existente entre os membros da família. O Conflito é outro fator e avalia a relação agressiva e conflituosa existente entre os membros da família. O quarto fator é chamado Hierarquia e avalia o nível de controle e poder no sistema familiar, medindo a imposição de poder. O nível de fidedignidade do ICF para a percepção das mães variou entre 0,60 a 0,89.
Escalas Beck - Inventário de Depressão (BDI) (Cunha, 2001)
Consiste em um questionário de autorrelato, de múltipla escolha que avalia sintomas depressivos. Esta escala é composta por 21 itens com alternativas que vão de 0 a 3, sendo o escore máximo de 63 e o mínimo de 0. A escala é utilizada tanto em sujeitos não psiquiátricos como em pacientes psiquiátricos, na faixa etária de 17 a 80 anos de idade. O estudo psicométrico do instrumento está descrito no manual, sendo a fidedignidade analisada por meio do alfa de Cronbach, que variou de 0,70 a 0,82 para diferentes amostras não clínicas, sendo que na técnica de teste-reteste a correlação foi de 0,95.
Escalas Beck - Inventário de Ansiedade (BAI) (Cunha, 2001)
O BAI avalia como o indivíduo tem se sentido na última semana, verificando sintomas comuns de ansiedade (como sudorese e sentimentos de angústia). Esta escala é composta por 21 itens que correspondem a sintomas comuns de ansiedade, com o escore máximo de 63 e o mínimo de0. A escala é utilizada tanto em sujeitos não psiquiátricos como em pacientes psiquiátricos, a partir da faixa etária de 17 a 80 anos de idade. O estudo psicométrico da BAI está descrito no manual do instrumento, sendo a fidedignidade analisada por meio do alfa de Cronbach com coeficiente variando de 0,71 a 0,92 para amostras não clínicas, sendo que na técnica de teste-reteste a correlação foi de 0,75.
Critério de Classificação Econômica Brasil (CCEB) - (ABEP, 2010)
O instrumento permite estimar o poder de compra dos indivíduos e famílias urbanas, a partir do levantamento de características domiciliares (presença e quantidade de alguns itens domiciliares de conforto e grau de escolaridade do cuidador principal). O CCEB atribui pontos em função de cada característica domiciliar e realiza a soma destes pontos. A partir dos pontos é feita uma correspondência entre as faixas de pontuação do critério e dos estratos de classificação econômica definidos por A1, A2, B1, B2, C1, C2, D e E.
Ficha de Dados Socioeconômicos
A ficha foi criada com o intuito de coletar informações sobre o sujeito, como por exemplo: nome, idade e escolaridade da criança; nome, profissão, escolaridade e estado civil do respondente; número de pessoas na família, entre outras informações necessárias que complementam a avaliação socioeconômica para a pesquisa.
Procedimentos
Coleta de dados: após aprovação do projeto no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal da Bahia, foram realizadas as reuniões com as escolas participantes para esclarecer os propósitos da pesquisa e para o agendamento de reuniões com os pais. Na reunião com os pais a pesquisa foi apresentada e os pais que concordaram receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para a assinatura. Em seguida, foi realizada a aplicação dos instrumentos sob a forma de entrevistas individuais para homogeneizar a aplicação, evitando assim possíveis dificuldades com a leitura ou compreensão dos itens. A aplicação dos questionários com as mães durou 60 minutos. A coleta de dados foi realizada em salas da escola com membros da equipe de pesquisa, psicólogos e estudantes de psicologia devidamente treinados.
Análise dos dados: os dados foram analisados de acordo com a hipótese de comparação de grupos definidos a priori, crianças com e sem problemas de comportamento segundo o ponto de corte do CBCL. Para isso, foram utilizadas as ferramentas comparativas, teste t de Student com nível de significância de 0,05. Para a análise de dados do presente estudo, foi utilizado o software SSPS versão 18.
Considerações Éticas
O parecer de apreciação da pesquisa é o CAAE 12373713.3.0000.5556 emitido pelo comitê de ética do Instituto Multidisciplinar em Saúde. Além das exigências estabelecidas pelo Ministério da Saúde sobre a ética em pesquisa como seres humanos, o manejo ético considerou os seguintes passos: os pais foram informados sob a possibilidade de desistir da participação sem nenhum prejuízo para eles ou para a criança; foi esclarecido que não haveria nenhum ganho financeiro com a participação; durante a coleta os pais respondiam aos questionários em um ambiente reservado para garantir o sigilo das informações que, posteriormente, foram armazenadas na sala do grupo de pesquisa Núcleo de Investigações Neuropsicológicas da Infância e da Adolescência.
Resultados
Os resultados foram obtidos por meio da comparação de dois grupos (clínico e não clínico). Para as medidas socioeconômicas não foram encontradas diferenças significativas. Esse resultado mostra uma homogeneidade entre os grupos, considerado o perfil socioeconômico (ver Tabela 1).
Tabela 1 Comparação das medidas sociodemográficas entre o grupo clínico e não clínico.
Amostra | Clínico | Não clínico | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Variáveis | Média | DP | Média | DP | Média | DP | T | P |
Escore do CCEB | 17,01 | ,63 | 14,3 | ,1 | 17,3 | ,7 | 2,3 | ,31 |
Número de filhos | 2,81 | ,76 | 2,8 | ,8 | 2,8 | ,7 | ,48 | ,96 |
Número de pessoas na família | 4,72 | ,71 | 4,2 | ,5 | 4,8 | ,6 | 1,58 | ,124 |
Escolaridade da mãe | 9,43 | ,79 | 8,92 | ,9 | 9,26 | ,9 | 1,15 | ,260 |
Idade da mãe | 36,10 | ,77 | 35,9 | ,3 | 36,0 | ,5 | ,490 | ,628 |
Nota: Nota: CCEB – Critério de Classificação Econômica Brasil; DP – Desvio Padrão; p – valor da significância; t – valor do Teste t; p<0,05.
Para a comparação entre o perfil comportamental das crianças participantes foram utilizados os escores brutos do CBCL e comparados com os resultados descritivos de amostras brasileiras, para garantir maior proximidade cultural (Rescorla et al., 2012; Rocha et al., 2013). O grupo clínico apresentou pontuação média de 96,52 pontos (DP = 17,72) no escore total de problemas de comportamento e 27,57 pontos (DP = 7,35) no escore da subescala internalizante e externalizante, média 27,43 (DP = 7,41). Segundo o estudo de Rocha et al. (2013), os escores médios para o grupo clínico foram: 62,88 pontos (DP = 32,10) para o escore total de problemas de comportamento; 16,19 (DP = 9,50) para a escala internalizante; e 17,81 (DP = 11,92) para externalizante. No grupo não clínico, a média encontrada para a pontuação no escore total de problemas de comportamento foi de 34,00 (DP = 17,60) e de 10,40 (DP = 6,75) no escore de problemas internalizantes, e na escala externalizante o escore médio foi de 8,57 (DP = 5,86). Os resultados descritivos para o grupo não clínico no estudo de Rocha et al. (2013) foram: 43,34 pontos (DP = 32,10) para o escore total de problemas de comportamento; 11,43 (DP = 7,53) para a escala internalizante; 12,35 (DP = 8,82) para externalizante.
Foram encontradas diferenças estatisticamente significativas para a comparação entre as características psicológicas das famílias de crianças do grupo clínico e não clínico em problemas de comportamento. As mães das crianças do grupo clínico apresentaram mais sintomas de depressão e ansiedade do que as mães de crianças do grupo não clínico, sendo que a diferença foi estatisticamente significativa. Além disso, os escores médios apresentados pelas mães de crianças do grupo clínico foram acima dos pontos de corte do BAI (escore de corte para ansiedade moderada 20-30 pontos, amostra brasileira não clínica) e do BDI (escore de corte para depressão leve 12-19 pontos, amostra brasileira não clínica) e demonstrando características clínicas para o perfil emocional das mães.
Apesar de não apresentar diferenças significativas em relação ao escore do clima familiar total, é importante verificar que este apresentou maiores escores médio para o grupo clínico, isso porque as dimensões apoio e hierarquia tiveram escores médios mais altos do que no grupo não clínico. Porém, para o fator coesão as mães do grupo clínico apresentaram escore médio menor do que as mães de crianças do grupo não clínico. Na Tabela 2 está descrito o resultado da avaliação da percepção do clima familiar, sendo que a única dimensão que mostrou diferença significativa foi a hierarquia, com maiores escores para o grupo clínico do que para o grupo não clínico.
Tabela 2 Comparação do perfil psicológico gráficas das famílias dos grupos de criança clínico e não clínico
Clínico | Não clínico | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
Variáveis | Média | DP | Média | DP | T | P |
BAI | 20,4 | 12,6 | 9,6 | 8,7 | -4,005 | ,000 |
BDI | 17,3 | 9,8 | 10,3 | 10,1 | -3,230 | ,003 |
IEP TOTAL | -3,6 | 5,7 | 3,8 | 7,6 | 4,317 | ,000 |
IEP PN | 24,3 | 5,3 | 17,4 | 7,1 | -4,559 | ,000 |
ICF TOTAL | 69,2 | 13,0 | 64,8 | 12,1 | -1,536 | ,136 |
ICF Coesão | 17,6 | 5,6 | 19,2 | 5,5 | 1,297 | ,205 |
ICF Apoio | 18,1 | 3,9 | 17,8 | 4,3 | -,405 | ,688 |
ICF Hierarquia | 21,0 | 5,2 | 17,4 | 5,2 | -3,153 | ,004 |
ICF Conflito | 12,5 | 5,1 | 10,5 | 4,5 | -1,839 | ,077 |
Nota: BAI – Inventário Beck de Ansiedade; BDI – Inventário Beck de Depressão; IEP – Inventário de Estilos Parentais; IEP PN – Práticas Negativas; ICF – Inventário de Clima Familiar; DP – Desvio Padrão; p – valor da significância; t – valor do Teste t, p<0,05;
Para o estilo parental total foi encontrada diferença significativa na comparação das médias obtidas nos escores do Inventário de Estilo Parental (IEP), sendo que as mães de crianças do grupo clínico obtiveram escore médio significativamente menor do que as mães de crianças no grupo não clínico. O escore estilo parental total foi superior para o grupo não clínico do que para o grupo clínico, sendo a diferença estatisticamente significativa. Na comparação dos escores médios para a dimensão das práticas negativas, foram encontradas diferenças significativas. Em relação às práticas negativas, as mães de crianças do grupo clínico apresentaram escores significativamente maiores do que do grupo não clínico (ver Tabela 2).
Discussão
O presente estudo teve como objetivo comparar variáveis ambientais como relações familiares, saúde mental das mães e características socioeconômicas de grupos de crianças, com e sem problemas de comportamento. Os problemas de comportamento estão relacionados com as falhas da regulação emocional que podem surgir nas fases iniciais do desenvolvimento, persistindo até a idade adulta, sendo a influência das variáveis ambientais um dos seus determinantes (Carmo & Alvarenga, 2012; Chorpita, Brown & Barlow, 2016). As consequências de um repertório comportamental caracterizado por distúrbios refletem em limitações no desenvolvimento socioemocional, no desempenho escolar, e consolidam repertórios comportamentais que podem gerar agravos no futuro como dependência química, sexualidade precoce e psicopatologias (Chorpita et al., 2016).
Os resultados do presente estudo foram suficientes para testar a hipótese de diferença do perfil das famílias de crianças com ou sem problemas de comportamento. As diferenças foram significativas para as variáveis do estado emocional das mães e relações familiares, mensurados a partir das escalas Beck, estilos parentais e hierarquia no ambiente familiar. Em relação às variáveis socioeconômicas investigadas (renda, número de filhos na família, número de pessoas na família, escolaridade da mãe), não foram encontradas diferenças entre os grupos, sendo o perfil de ambos muito semelhante, inviabilizando essa análise. Esse resultado refuta a hipótese inicial de que o grupo clínico apresentaria piores condições socioeconômicas especialmente para as variáveis, renda, escolaridade da mãe e número de pessoas na família. Os dois grupos investigados não apresentaram diferenças para essas variáveis. Esse resultado negativo é um sinalizador que a amostra investigada demonstra pouca variância para os aspectos socioeconômicos. Assim, para o presente estudo, o nível socioeconômico não foi discriminante entre os grupos.
Em relação ao perfil emocional das famílias, os resultados indicaram que crianças com problemas de comportamento tinham famílias com características emocionais negativas e com padrões de relacionamentos caracterizados por relações de poder. Esse resultado reforça a importância das relações familiares e os estilos parentais como variáveis que devem fazer parte dos procedimentos de avaliação e intervenções psicológicas quando a criança apresentar problemas de comportamento. Os problemas de comportamento externalizantes apresentados precocemente foram explicados por baixa relação afetiva por parte dos pais e rejeição dos pares, tendo como consequência a emergência de comportamentos agressivos, desordens do humor, ideação suicida na adolescência (Okado & Bierman, 2015). Os sintomas de ansiedade e depressão dos pais vêm também sendo considerados como parte da explicação dos problemas de comportamento. No estudo de Xu, Neece e Parker (2014), a depressão materna mostrou influência sobre a presença de problemas de comportamento. Outros estudos dentro desta linha encontraram resultados semelhantes, como por exemplo, Chung et al. (2013) realizaram um estudo transcultural no qual se identificou maior nível de estresse para mães coreanas do que americanas, porém as mães coreanas relataram menos problemas de comportamento nas crianças. Assim, a relação entre estresse das mães e os problemas de comportamento não é diretamente estabelecida e pode variar de acordo com dimensões culturais. Evidências sobre o efeito do estresse materno sobre a representação da família realizada pela criança mostraram que a exposição às emoções negativas da mãe desencadeia representações familiares mais conflituosas e menos afetivas (Yoo, Popp & Robinson, 2014).
A literatura demonstra a importância do estilo parental para o perfil comportamental das crianças (Bolsoni-Silva & Loureiro, 2011; Marin et al., 2012). As práticas parentais dos pais em relação aos seus filhos são decisivas na promoção de comportamentos socialmente adequados, porém, as famílias frequentemente estimulam comportamentos inadequados por meio de disciplina inconsistente, pouca interação positiva, pouco monitoramento e supervisão insuficiente das atividades (Bolsoni-Silva & Marturano, 2002). A qualidade da interação entre pais e filhos influencia no desenvolvimento de problemas de comportamentos do tipo externalizantes ou internalizantes (Marin et al. 2012; Mendes, Mari, Singer, Barros & Mello, 2009). As diferenças dos padrões de interação entre pais e filhos tornam importante a categorização das práticas educativas e estilos parentais, principalmente no sentido de compreender os efeitos das interações parentais sobre o desenvolvimento de crianças e adolescentes. Dentro dessa categorização, o estilo parental autoritativo tem sido indicado como o mais adequado, sendo associado com maior frequência à competência social, assertividade e comportamentos independentes da criança (Cecconello, Antoni & Koller, 2003).
Além do estilo parental, as interações familiares expressas a partir de dimensões como afetividade, conflitos, hierarquia e comunicação têm relação com o desenvolvimento de habilidades sociais e perfil comportamental de crianças e adolescentes (Stasiak, Weber & Tucunduva, 2014; Teodoro et al., 2014). Segundo Dessen e Szelbracikowski (2004), os conflitos presentes na família aumentam o estresse, gerando relações parentais deficientes em qualidade e frequência, aumentando a gravidade dos problemas de comportamento em crianças que apresentam o perfil externalizante. Muitas vezes, os conflitos entre pais e filhos resultam em punições físicas, o que aumenta o efeito dos conflitos e reduz a afetividade das relações, resultado encontrado no estudo de meta-análise realizado por Gershoff e Grogan-Kaylor (2016).
Outro resultado que mostrou diferença significativa entre o grupo de crianças com e sem problemas comportamentais foi o estado emocional das mães. Os escores altos de sintomas de ansiedade e depressão para mães de crianças com problemas de comportamento foram identificados também em outros estudos (Soltis, Davidson, Moreland, Felton & Dumas, 2015; Vallotton, Harewood, Froyen, Brophy-Herb & Ayoub, 2016). No estudo de Sabbag e Bolsoni-Silva (2011) foi verificada a relação entre as habilidades sociais das mães, suas práticas educativas e os problemas de comportamento de adolescentes, demonstrando que as mães que apresentavam menores escores para habilidades sociais tinham mais práticas educativas negativas e adolescentes com comportamentos desviantes.
Coyne e Thompson (2011) evidenciaram depressão nas mães e problemas de comportamento na infância apresentam maior prevalência para o tipo internalizante. Evidências semelhantes também foram demonstradas no estudo de Alvarenga et al. (2012). Os resultados encontrados demonstraram a importância do estado emocional das mães para os problemas de comportamento das crianças. A dificuldade de lidar com as crianças com comportamentos difíceis pode provocar ou agravar a presença de emoções negativas, associadas com a depressão e ansiedade. Esse, portanto, pode ser um fenômeno que possui mecanismos cíclicos de manutenção, gerando uma retroalimentação positiva em que os problemas de comportamento tendem a se agravar, o que pode influenciar negativamente na saúde mental materna. As intervenções direcionadas para as crianças com problemas de comportamento devem considerar a vulnerabilidade emocional das mães, incluindo-as nos procedimentos de intervenção. Essas intervenções são voltadas apenas para a crianças podem não ser tão efetivas, pois a presença de padrões de ansiedade e/ou depressão deve diminuir de acordo com a qualidade do ambiente que a criança está inserida.
Os pais com pouca habilidade social, muitas vezes, podem utilizar práticas mais coercitivas, contribuindo para o aumento de comportamentos agressivos da criança (Carmo & Alvarenga, 2012). As práticas coercitivas são constituídas de foco da punição, das situações humilhantes, da maior valorização do comportamento agressivo e das reações aversivas. Porém, considera-se relevante a presença de reciprocidade entre as ações de pais e filhos, gerando uma cadeia de difícil interrupção, incluindo a transmissão intergeracional (Marin et al., 2013). A falta de habilidade dos pais no manejo educativo das crianças pode ser desencadeada por um modelo de transmissão intergeracional ou mesmo de influências culturais. Entretanto, fatores como o estresse, a presença de sintomas de ansiedade e depressão podem ter um efeito sobre a capacidade dos pais de serem mais positivos e utilizarem práticas educativas mais consistentes com o bem-estar da criança. Estudos evidenciam a necessidade de treinos de habilidades sociais e/ou práticas educativas para os pais (Carmo & Alvarenga, 2012; Pinheiro, Haase, Amarante, Prette & Del Prette, 2006). É possível considerar que tais intervenções aumentam a segurança e a efetividade das estratégias parentais e, portanto, podem favorecer o estado emocional das mães, assim comodiminuir os problemas de comportamento apresentados pelas crianças.
Os resultados encontrados ampliam a visão sobre as características ambientais de crianças com problemas de comportamento, direcionando melhor sobre quais são os fatores que devem fazer parte das intervenções, para crianças com problemas de comportamento. Contudo, a análise de variáveis ambientais precisa considerar o quanto elas podem estar relacionadas entre si, amplificando o efeito sobre o comportamento das crianças. Para isso, estudos com amostragens e análises estatísticas mais robustas são necessários.
Considerações Finais
O presente estudo possibilitou comparar as características socioeconômicas, as relações familiares e a saúde mental materna em grupos de crianças com e sem problemas de comportamento. Os resultados encontrados evidenciaram que as famílias do grupo de crianças com problemas de comportamento apresentam diferenças significativas em relação ao estado emocional das mães, tanto em depressão quanto em ansiedade. Diferenças significativas também foram encontradas em relação aos estilos parentais negativos e ao estabelecimento de relações de poder e hierarquia na dinâmica familiar.
Os resultados encontrados ainda são limitados, carecendo de estratégias mais sofisticadas de análise de dados que possam demonstrar os efeitos de interação entre as variáveis investigadas, tendo em vista estabelecer relações de causa e efeito. Além disso, a amostra utiliza como dados a percepção das mães sobre o comportamento da criança, fazendo-se necessários estudos incluindo a percepção dos pais sobre o comportamento dos seus filhos, assim como do estado emocional desse grupo. Realizar comparações com a percepção dos pais seria um recurso a ser utilizado para solucionar esse problema. Também são importantes medidas de comportamento que não sejam apenas a percepção dos pais, considerando que pais estressados e/ou com sintomas de ansiedade e depressão podem apresentar uma percepção negativa do comportamento de seus filhos.
Apesar das limitações apontadas, o estudo contribui para a identificação de variáveis significativamente diferentes entre o grupo com problemas de comportamento. A diversidade de comportamentos no período da infância e a relevância clínica dos problemas comportamentais aumentam a importância de estudos como este. A partir dos resultados encontrados é possível delinear um perfil ainda que preliminar de características familiares e, portanto, ambientais relacionadas ao perfil clínico para problemas de comportamento. Essa necessidade já tinha sido identificada no estudo de Dessen e Torres (2002), sugerindo a relevância de tais pesquisas para a atuação profissional da Psicologia, em especial para a fundamentação de intervenções mais preventivas.
Assim, a identificação de diferenças no perfil das famílias, de grupos clínicos e não clínicos para os problemas de comportamento auxilia na prevenção e nas intervenções. Por se tratar de um fenômeno que não atinge apenas a criança, as intervenções devem ser direcionadas para os fatores associados como as relações familiares e o estado emocional das mães. As consequências que o comportamento clinicamente alterado pode desencadear, como por exemplo, os problemas escolares, também devem ser consideradas.