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Revista Psicologia Organizações e Trabalho
On-line version ISSN 1984-6657
Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.7 no.1 Florianópolis June 2007
ARTIGOS
Equilíbrio trabalho e família: os significados para os bancários
Work and family balance: the meanings for the bank workers
Graciela Sanjutá Soares FariaI; Alessandra RachidII
IProfessora da Fundação Educacional de Ituverava, Mestre, Universidade Federal de São Carlos. (gracielasanjuta@yahoo.com.br)
IIDocente da Universidade Federal de São Carlos, Doutora, Universidade Federal de São Carlos. (arachid@power.ufscar.br)
RESUMO
Neste trabalho, apresenta-se a nova configuração do trabalho e da família, os conflitos entre essas duas esferas para os bancários e as estratégias para enfrentálos, entre as quais a jornada reduzida. Para analisar essa questão, foram coletadas informações sobre os bancários, faixas salariais e jornada por gênero junto à base de dados da RAIS (Relação Anual de Informações Sociais) do Ministério do Trabalho, para o período de 1994 a 2002. Também foram realizadas entrevistas com bancários do interior do estado de São Paulo. Os principais achados mostraram a ampliação da participação feminina no setor bancário. A categoria passou por perdas salariais, mais intensas entre os bancários de jornada reduzida, que se concentram nas faixas salariais inferiores, em cargos de menor qualificação e com atividades mais repetitivas, ocupados, em sua maior parte, por mulheres. Observou-se que, em geral, o trabalho é a origem mais freqüente dos conflitos entre trabalho e família, e que são utilizadas diversas estratégias para amenizálos. Ajornada de 30 horas permite ter mais tempo livre para as atividades pessoais e familiares, mas é vista como uma etapa inicial da carreira, que deve ser abandonada por quem quer assumir cargos com maior responsabilidade e melhor remuneração.
Palavras-chave: trabalho; família; equilíbrio entre trabalho e família; gênero; jornada.
ABSTRACT
This paper presents the new configuration of work and family, the conflicts between work and family facing bank workers and the strategies to deal with them, like the part time work. The authors collected data about bank workers, their salaries, working time and gender from the RAIS (Annual List of Social Information) data base from 1994 to 2002. The authors also interviewed bank workers from small cities in the state of São Paulo. The main findings show that the percentage of female bank workers is increasing. The bank workers have faced salary losses, sharper for part-timers and to the women, and that they have lower wages, occupy positions related to repetitive tasks, with limited perspectives. The work causes conflicts more frequently in family than the opposite, and workers have used different strategies to manage them. We also found out that part-time work provides more free time for personal/family activities, but workers think that it is acceptable only in the beginning of the career, and it must be left when a worker wants to assume positions with more responsibility and better remuneration.
Keywords: labor; family; work and family balance; gender; working day.
1. Introdução
Pretende-se, neste estudo, discutir as mudanças na configuração das famílias e do trabalho decorrentes da ampliação da participação feminina na população economicamente ativa. Mais detidamente, procura-se entender os conflitos oriundos do conjunto de responsabilidades familiares e profissionais e as estratégias para minimizá-los, incluindo a jornada de trabalho de horas reduzidas. Esses temas são pouco explorados em estudos acadêmicos no Brasil.
Considerando-se que o número de horas dedicadas ao trabalho e o perfil dos trabalhadores de horas reduzidas são indicadores importantes para se compreender a questão da conciliação entre trabalho e família, como apontado por Hantrais e Letablier (1995), foram coletadas informações junto à base de dados da RAIS (Ministério do Trabalho e Emprego), referentes ao perfil de homens e mulheres que atuam no setor bancário e à sua jornada no Brasil e no estado de São Paulo, considerando o período de 1994 a 2002. Como são as próprias empresas que declaram ao Ministério as informações referentes a seus funcionários, podem ocorrer erros por desatenção ou simples omissão, gerando algumas distorções. Apesar disso, essa é a principal fonte de dados sobre emprego formal no país, freqüentemente utilizada em pesquisas acadêmicas.
Também foram realizadas entrevistas, a partir de roteiros semi-estruturados, com vinte e um bancários, de variadas cidades e bancos, que atuavam no interior do estado de São Paulo. Os entrevistados são citados no artigo com nomes fictícios, para preservar sua identidade. Além disso, 14 dos entrevistados, quatro em jornadas de 30 horas e 10 em jornadas de 40 horas, responderam a uma escala tipo Likert com 14 itens, cujo objetivo era de verificar a freqüência com que enfrentavam conflitos de trabalho com origem na família e de família com origem no trabalho. Esse instrumento foi construído e validado por Paschoal, Tamayo e Barham (2002).
Smith (1997) destaca a importância de se desenvolverem estudos com os quais se possam entender mais profundamente a experiência pessoal, os interesses subjetivos e como as aspirações dos trabalhadores são apoiadas ou oprimidas com as mudanças na estrutura de oportunidades no mundo do trabalho. Visou-se, ao entrevistar os bancários, a analisar suas percepções sobre o equilíbrio entre trabalho e família e a jornada de 30 horas. Vale lembrar que se discute a realidade de uma categoria profissional que sofreu, nas últimas décadas, grandes perdas relacionadas às mudanças decorrentes dos processos de privatização e aquisição, com uma expressiva redução do quadro de funcionários, a imposição de metas, além de problemas com horas extras.
Neste artigo, inicialmente, é realizada uma análise da nova configuração do trabalho com a ampliação da participação feminina na PEA. Para compreender como esse fato ocorre na atividade estudada, apresenta-se o perfil dos bancários entre os anos de 1994 a 2002, considerando sua distribuição por gênero, a concentração de homens e mulheres em diferentes faixas salariais e nas diferentes jornadas de trabalho. Em seguida, são discutidas as transformações na esfera familiar e do trabalho, os conflitos entre trabalho e família e as estratégias para harmonização, dentre elas o trabalho de horas reduzidas.
2. A participação feminina no mercado de trabalho
Existem indicadores inquestionáveis do ininterrupto crescimento da participação das mulheres no mercado de trabalho em grande parte dos países, especialmente a partir da década de 70. No Brasil, desde a década de 50, momento em que ocorreu a intensificação do processo de industrialização, e mais intensamente a partir da década de 70, a porcentagem de mulheres em atividades remuneradas vem aumentando progressivamente, destacadamente na zona urbana (BRUSCHINI E LOMBARDI, 2003; COMISSÃO EUROPÉIA, 1997; MALUF E MOTT, 1998; SEGNINI, 1998). Conforme apresenta Segnini (1998), entre os anos de 1981 e 1989, houve um aumento de 48% na quantidade de mulheres que atuam no mercado de trabalho no Brasil, para um crescimento de 24% na quantidade de homens. Em 1990, a mulher ocupava aproximadamente 35% dos postos de trabalho (SEGNINI, 1998) e, em 2002, 42,5% (FIBGE, 2005).
Essa inserção significativa da mulher no mercado de trabalho encontra-se relacionada com uma conjuntura de reestruturação produtiva na qual, juntamente com a expansão da automação e das novas formas de organização do trabalho, aumentou a taxa de desemprego e o uso de formas alternativas de emprego, que se manifestam na terceirização da mão de obra, em empregos temporários e de horas reduzidas, dentre outros. Dentre os aspectos que têm contribuído para a ascensão da participação feminina, encontram-se o crescimento do seu nível de escolaridade, a necessidade de ampliação da renda familiar, a mudança nas crenças relativas ao trabalho feminino e a queda da taxa de fecundidade das mulheres (BRUSCHINI E LOMBARDI, 2003; SEGNINI, 1998).
Apesar do expressivo crescimento da participação das mulheres na PEA, evidencia-se uma disparidade de oportunidades entre os sexos e uma segregação no mercado de trabalho por gênero. Entre os países da União Européia, a diferença se explicita no total de 85 milhões de homens no mercado de trabalho para 60 milhões de mulheres (COMISSÃO EUROPÉIA, 1997). Existem também consideráveis evidências no sentido da predominância de certos grupos sociais, como mulheres com crianças, nos empregos temporários, de horas reduzidas e nas outras formas de trabalhos alternativos (FELSTEAD E JEWSON, 1990).
Constata-se, também, uma segregação dos postos de serviço por sexo, com maior participação das mulheres no setor de serviços. As características desse setor implicam limitações para os trabalhadores, destacando-se os baixos salários, a baixa sindicalização e a presença significativa do trabalho de horas reduzidas, o que justifica o destaque da presença de mulheres nesse setor, já que elas são mais susceptíveis às condições impostas pelo mercado de trabalho. Na América Latina, por exemplo, onde menos de 50% das mulheres que trabalham possuem empregos remunerados e reconhecidos legalmente, 71% delas se encontram no setor de serviços, apesar de representarem apenas 27% dos trabalhadores do setor (SEGNINI, 1998).
Segunda a autora, a ampliação do número de mulheres nesse setor pode ser atribuída não só ao fato de as demandas por esse tipo de trabalho se harmonizarem com as expectativas quanto ao gênero feminino - como, por exemplo, o não uso de força física e a segurança -, como também ao fato de as mulheres terem desenvolvido competências nas atividades do lar, compatíveis com as demandas desse setor, como, por exemplo, atender às pessoas. No entanto, essas competências não são devidamente valorizadas em termos financeiros.
Ao comparar a participação das mulheres no mercado de trabalho brasileiro com a dos homens até o início do terceiro milênio, Bruschini e Lombardi (2003) encontraram tendências como o aumento constante e intenso das mulheres no mercado de trabalho em empregos de baixa qualidade, em atividades específicas e já tradicionalmente femininas, nos chamados "guetos femininos", predominantemente em atividades informais e precárias. Notaram ainda a conquista de bons empregos apenas pelas mulheres com maior nível de escolaridade, mas com salários mais baixos, mesmo em empregos considerados de qualidade. Vale destacar, no entanto, que, a partir de 1995, prevaleceu uma tendência de homens e mulheres, no geral, passarem de faixas salariais inferiores para faixas salariais intermediárias e a ocorrência da redução da desigualdade salarial entre homens e mulheres (BRUSCHINI E LOMBARDI, 2003).
Com a finalidade de agregar informações sobre a situação de mulheres e homens no mercado de trabalho brasileiro, apresenta-se, na seqüência, a sua inserção no setor bancário.
2.1. A participação feminina no setor bancário brasileiro
No setor bancário, apesar de uma redução no número total de trabalhadores, percebe-se um aumento da participação feminina. Em decorrência disso, o setor bancário é apelidado, em alguns contextos, de "gueto rosa", "gueto do emprego feminino" ou "pink collar". No Brasil, a feminização do trabalho bancário ocorreu simultaneamente ao processo de difusão da informatização e das mudanças na organização do trabalho, especialmente a partir da década de 70. Segnini, (1998), ao estudar um banco estatal, observou que a porcentagem de mulheres aumentou de 40% para 46% entre os anos de 1987 e 1993. As mulheres passaram a ser contratadas pelos bancos privados e podiam prestar concurso nos bancos públicos em um momento de multiplicação de postos de trabalho, o que envolvia operações simplificadas e repetitivas que os sistemas informatizados passaram a exigir.
As mulheres encontram-se mais inseridas em postos de níveis hierárquicos inferiores, em trabalhos de horas reduzidas, predominantemente em funções de menores salários nas agências, em detrimento dos departamentos1. Contudo, sua participação aumentou, na década de 80, em cargos de maior nível de responsabilidade, dentre esses, postos diretivos e técnico-profissionais.
Em um banco estatal pesquisado pela autora, havia um número maior de mulheres que trabalhavam na jornada de 30 horas semanais, sem serem comissionadas2 , em comparação ao número de homens. As mulheres recebiam 20% a menos que um colega de trabalho homem, com o mesmo tempo de serviço na empresa. No banco estudado, 85% das mulheres e 79% dos homens encontravam-se nas agências. Entre as mulheres, 88% eram escriturárias, não comissionadas, e trabalhavam em arranjo de horas reduzidas. Dentre os homens, 66% não era comissionado. Partindo desses resultados, a pesquisadora questionou se o crescimento significativo do número de mulheres no setor bancário significa realmente mudança nas relações de gênero, ou se ainda persiste a divisão sexual em conformidade com hierarquização e poder, com as mulheres ocupando posições mais desfavorecidas. Outra reflexão proposta pela autora é se a feminização do mercado de trabalho não foi uma estratégia do empregador para racionalização do trabalho e redução de custos com pessoal.
Os resultados encontrados na pesquisa da RAIS confirmaram a ampliação da participação feminina no setor bancário, que passou de 41,4%, em 1994, para 45,7%, em 2002, como pode ser visto no Gráfico 1. Seguindo a mesma tendência, no estado de São Paulo, a participação das mulheres passou de 45,6% em 1994 para 49,5% em 2002.
O aumento da participação feminina é notável, com mulheres que ocupam, hoje, quase metade dos cargos do setor bancário brasileiro e do estado de São Paulo. Contudo, questiona-se se as condições oferecidas às mulheres, nesse setor, são as mesmas oferecidas aos homens, no que diz respeito a salário, oportunidade de crescimento profissional e jornada de trabalho. Neste momento, propõe-se uma discussão das faixas salariais por gênero, de forma a analisar qualitativamente a inserção das mulheres.
Como evidenciam os Gráficos 2 e 3, a porcentagem de homens no setor bancário do Brasil, na faixa salarial de 0 a 5 salários mínimos, passou de 8,5% em 1994 para 14% em 2002, e a de mulheres, de 9,5% para 21,5%. Na faixa salarial de 5,01 a 10 salários mínimos, a porcentagem de homens passou de 24,5% para 29,5%, e a de mulheres, de 34,5% para 37,5%. Na faixa de 15,01 a 20 salários mínimos, percebeu-se uma mudança inexpressiva, tanto para os homens quanto para as mulheres, e, na faixa superior de 20,01 ou mais, a redução de 34% para 24,5%, no caso dos homens, e de 22,5% para 11%, no caso das mulheres. Apesar de o poder aquisitivo do salário mínimo variar muito de ano para ano, essas observações se reforçam quando se faz sua conversão para o dólar, pois o valor do salário mínimo em dólares também decresceu nesse período (cerca de US$ 83 em 1994, US$ 107,5 em 1998 e US$5 6,5 em 2002).
Nos dados para o estado de São Paulo, observa-se que prevaleceu a mesma tendência. A porcentagem de homens na faixa salarial de 0 a 5 salários mínimos aumentou de 10% para 12,5%, e a de mulheres, de 10,5% para 18,5. Na faixa de 15,01 a 20 salários mínimos, a mudança foi pouco significativa. Já para a categoria superior, percebeu-se a diminuição de 31% para 28,5% na porcentagem de homens e de 18,5% para 12,5% na de mulheres.
Percebeu-se o impacto maior das perdas salariais para as mulheres, com a ocorrência de um aumento mais intensivo das mulheres nas faixas salariais mais baixas e uma diminuição nas mais altas, especialmente no contexto do Brasil, se comparado ao estado de São Paulo.
Discute-se, agora, a divisão por gênero nas jornadas de 30 horas e 40 horas. Segnini (1998) observou que a porcentagem de mulheres que trabalham em horas reduzidas, 83%, supera a de homens, 57%, no banco estatal que pesquisou. Percebeu, também, que essa jornada é tida por muitos bancários como mais adequada para pessoas que estudam e, principalmente, para as mulheres com filhos.
Ao analisar a evolução do trabalho de horas reduzidas por gênero, pôde-se verificar que, para todos os anos considerados, existe uma porcentagem maior de mulheres nesse esquema, tanto no Brasil quanto no estado de São Paulo, como pode ser visto nos Gráficos 4 e 5.
A porcentagem de mulheres nesse esquema, no entanto, reduziu-se de 65% para 48,5% no Brasil e de 52% para 37% em São Paulo. A participação dos homens reduziu-se de 55,5% para 42% no Brasil, e de 40% para 30% em São Paulo.
Percebe-se que tem ocorrido uma redução do número de bancários nesse arranjo, mantendo-se uma maior participação feminina, mas com uma leve tendência de aproximação entre os gêneros. Ainda que exista um número significativo de trabalhadores em jornada de 30 horas e que o número de mulheres nesse esquema supere o de homens, encontrou-se maior concentração de mulheres que trabalham 40 horas semanais, diferentemente do que foi observado por Jinkings (2002) na década de 90, quando a maior parte das bancárias trabalhava 30 horas.
Neste momento, passa-se a analisar as mudanças familiares e no trabalho.
3. Mulheres e homens: relações de família e de trabalho
A inserção da mulher no mercado de trabalho tem coincidido com as transformações demográficas referentes à população e às famílias brasileiras, sobretudo nas cidades e regiões mais desenvolvidas. A taxa de fecundidade das mulheres brasileiras passou de 5,8 filhos, em 1970, para 2,3 filhos, em 1999, o que também provocou a redução do tamanho das famílias que, nas proximidades do ano 2000, passaram a ter 3,4 membros, em média. As famílias chefiadas por mulheres têm aumentado continuamente, chegando a atingir 26% de todas as famílias brasileiras em 1998, principalmente entre os estratos mais pobres e de raça preta ou parda (BRUSCHINI E LOMBARDI, 2003).
Encontram-se, também, mudanças no perfil das trabalhadoras, que, até os anos 70, eram majoritariamente jovens, solteiras, sem filhos, e passaram a ser mais velhas, casadas e mães a partir da década de 80. Aporcentagem de mulheres que trabalhavam e eram casadas passou de 37,6%, em 1990, para 51,3%, em 1998. Essa predominância de mulheres casadas e com filhos no mercado de trabalho sugere que as responsabilidades do lar dificultam, mas não impedem, a sua inserção, criando uma nova realidade de responsabilidades familiares e de trabalho para homens e mulheres, o que pode gerar conflitos de trabalho e família.
A expansão da participação feminina e a predominância de mulheres casadas e com filhos no mercado de trabalho têm impacto sobre a identidade feminina e masculina, conduzindo homens e mulheres a repensarem seus papéis, atitudes e comportamentos referentes à família e ao trabalho. Ocorreram mudanças relativas ao papel atribuído a homens e mulheres, com a identidade feminina gradativamente mais atrelada ao trabalho remunerado e a masculina, à família. Até a década de 70, a esfera privada, do lar, juntamente com as tarefas domésticas e cuidados com os membros da família, eram eminentemente do domínio das mulheres, ao passo que a esfera pública, do trabalho, juntamente com o papel de provedor, pertencia aos homens. Com a expansão da participação feminina no mercado de trabalho, também passou a ser demandado dela que contribuísse no orçamento doméstico e apresentasse bom desempenho no trabalho. Dos homens passou-se a solicitar um maior envolvimento com a família e com as atividades familiares. Assim, homens e mulheres ficaram inseridos em um contexto que impõe a ambos papéis familiares e de trabalho, ou seja, a ter "múltiplos papéis" (BRUSCHINI E LOMBARDI, 2003; DINIZ, 1999; GOLDANI, 1994).
As mulheres apresentam dificuldades em relação a essa nova realidade de múltiplos papéis, com a família e o mundo do trabalho, em conjunto, impedindo, muitas vezes, de se dedicarem ao trabalho como gostariam, ou as inserindo em empregos de menor qualidade. A maior responsabilidade com as atividades domésticas, os cuidados com os filhos e de outros familiares ainda pertencem principalmente às mulheres, além de a existência de filhos pequenos muitas vezes comprometer sua manutenção no mercado de trabalho (COOPER E LEWIS, 2000; THOMPSON E WALKER, 1989). Em 1998, a porcentagem de mulheres em atividades remuneradas com filhos de até dois anos era 47%, e com filhos entre dois e quatro anos, 54%, bem menor se comparada à de mães com filhos maiores de quatro anos, que era aproximadamente de 63% (BRUSCHINI E LOMBARDI, 2003).
É comum as mulheres que trabalham fora se sentirem culpadas quando enfrentam problemas relacionados aos cuidados com os filhos ou à manutenção do matrimônio. Enfrentam, ainda, problemas que envolvem o desempenho nas atividades domésticas, sendo, muitas vezes, criticadas pela sua má execução. Contudo, o trabalho remunerado expande as possibilidades de as mulheres terem contato social, experimentarem sensações de eficácia e efetuarem suas próprias escolhas, propiciando sentimentos autonomia, utilidade e auto-realização. Isso pode colaborar para que elas, uma vez mais confiantes, desempenhem seus papéis familiares com maior eficácia (DINIZ, 1999; MC BRIDE, 1990).
Também para os homens, a nova configuração do trabalho gerou muitas mudanças, tanto de ordem prática, quanto em seus papéis e sua identidade. Eles já não são os únicos provedores, compartilhando essa tarefa tão valorizada socialmente com as mulheres, além de serem convidados a participar das pouco valorizadas tarefas domésticas (THOMPSON E WALKER, 1989). Por outro lado, o valor atribuído à família tem aumentado (DINIZ, 1999).
Essa nova realidade significou um impacto cada vez maior na esfera familiar e do trabalho, afetando a identidade e a vida tanto das mulheres quanto dos homens e propiciando um contexto favorável à emergência de conflitos entre trabalho e família, o que é tratado a seguir.
4. Conflitos entre trabalho e família
Os trabalhadores que possuem demandas de trabalho e responsabilidades familiares significativas normalmente enfrentam conflitos, sendo levados ao estresse em níveis de moderado a alto (BARNETT E GAREIS, 2000; ZEDECK E MOSIER, 1990). Os trabalhadores que mais sofrem esses conflitos entre o trabalho e a família são as mulheres com filhos pequenos e os casais com dupla carreira, em que o homem e a mulher trabalham em jornada integral (DINIZ, 1996; FARIA, 2002).
Os conflitos entre trabalho e família podem ser de sobreposição e (ou) de sobrecarga. Os conflitos por sobreposição são enfrentados quando duas atividades importantes de diferentes esferas, do trabalho ou da família, ocorrem ao mesmo tempo. Quando, por exemplo, o indivíduo tem uma viagem de trabalho que coincide com o dia e horário de um evento comemorativo de apresentação de um filho (COOPER E LEWIS, 2000; FARIA, 2002; GOTTLIEB, KELLOWAY E BARHAM, 1998; THOMPSON E BUNDERSON, 2001).
Os conflitos por sobrecarga aparecem quando as atividades de trabalho, somadas às pessoais e familiares, vão além do limite tolerado pelo indivíduo, provocando uma sensação de exaustão, ou quando existe "transbordamento" dos problemas, preocupações ou responsabilidades de uma esfera para a outra.
Tanto os conflitos de sobreposição quanto os de sobrecarga podem ter origem na família ou no trabalho. Um "conflito de família com trabalho" ocorre quando a origem ou o agente que desperta o conflito está na família. Fala-se "em conflito de trabalho com família" quando as situações de origem ou o agente que suscita o conflito está no trabalho (COOPER E LEWIS, 2000; FARIA, 2002; GOTTLIEB, KELLOWAYE BARHAM, 1998).
Thompson e Bunderson (2001) sugerem que os conflitos de trabalho e família não devem ser abordados somente no aspecto quantitativo, ligado ao tempo disponível para as atividades pessoais ou familiares, mas deve-se considerar a vertente qualitativa, ou seja, as considerações emocionais e o sentido atribuído pelo indivíduo ao tempo disponível e aos conflitos enfrentados. Os autores questionam se é preferível estar com a família por meia hora em harmonia ou por duas horas em situação de nervoso.
Até certo nível, esses conflitos podem ser benéficos, já que, à medida que o indivíduo tem de fazer escolhas importantes, ele se define, desenvolve sua identidade e constrói seus significados. No entanto, quando persistem ao longo do tempo e não há como liberá-los, tais conflitos podem gerar comprometimentos para o indivíduo e para as empresas. Para o indivíduo, a ocorrência de níveis médio ou alto de estresse pode, com o tempo, reduzir o desempenho profissional, deteriorar seus relacionamentos pessoais, familiares e profissionais, podendo até causar problemas como desordens alimentares, angústia e depressão (BYSTRONSKI, LASSANCE E SEIBACH,1989). Para as organizações, os prejuízos com os problemas de motivação e satisfação dos funcionários também são preocupantes, pois podem causar falta de energia, absenteísmo, maior rotatividade, dificuldades de concentração e problemas interpessoais (COOPER E LEWIS, 2000; GOTTLIEB, KELLOWAY E BARHAM, 1998; KUGELMASS,1996).
Os bancários entrevistados para esta pesquisa foram indagados acerca das dificuldades enfrentadas na conciliação da vida pessoal e familiar com o trabalho. Aanálise de suas respostas é apresentada a seguir.
4.1 Conflitos entre trabalho e família: o caso dos bancários
Uma porcentagem significativa (33,33%) das dificuldades de conciliação das esferas pessoais e familiares com a do trabalho estava relacionada à falta de tempo disponível para atividades como: praticar atividades físicas, visitar familiares, passear com a família, dentre outros (ver Tabela 1). Apareceu repetidamente (18, 52%) a distância da família, pois alguns trabalhavam em uma cidade diferente do local onde moravam o cônjuge e os filhos, e o cansaço que sentem após o expediente de trabalho, o que os impede de usufruir seu tempo livre (11,11%).
Apresenta-se, a seguir, a fala de um dos bancários, que exemplifica a emergência de conflitos decorrentes da falta de tempo e do cansaço:
Não posso dizer que não tenho dificuldades, porque todo mundo tem. Uma das dificuldades é a falta de tempo para ficar mais com a família e a outra dificuldade é que, quando resta um tempo, estou [com] muito cansaço acumulado. Gostaria de ter a individualidade um pouco, mas isso nem sempre é possível. Mas minha vida é boa sim. Só tem um lado ruim: o cansaço e a falta de tempo. Do resto está tudo bem. (Eduardo)
Através da análise das respostas à escala de interação entre trabalho e família, notou-se que o trabalho gerava mais freqüentemente conflitos nas famílias dos bancários do que o inverso, como se pode observar na Tabela 2. Há aqueles que enfrentavam problemas de trabalho com família "várias vezes" e de família com trabalho, no máximo, "raramente".
Ao serem questionados sobre o impacto do trabalho sobre a vida pessoal e familiar, as situações mais citadas foram: o impedimento de participar, por falta de tempo, de atividades da vida pessoal (25%) e com os familiares (20,83%) e a dificuldade de se desligarem do trabalho e de não levarem problemas do trabalho para a família (20,32%), como pode ser visto na Tabela 3.
A fala a seguir mostra o desgaste após o dia de trabalho:
Fico sem paciência pelo serviço ser estressante. Quando chego em casa, não quero ouvir barulho, muita conversa e, em uma casa onde moram sete pessoas, não tem como não ter barulho. (Vivian)
Durante as entrevistas, os bancários foram solicitados a comentarem os conflitos com origem na família. Dos seis entrevistados que responderam a essa questão, quatro admitiram ocorrer interferência da família sobre o trabalho. Segundo eles, o impacto se dava em situações em que tinham de socorrer os filhos durante o expediente, ao estarem preocupados com os problemas de casa durante o expediente. ou quando iam para o banco irritados por problemas familiares e não tinham paciência com os colegas. Como uma bancária relata:
Acontece de ter problemas familiares, com irmão, devido à falta de paciência e, com isso, têm aqueles dias que já vou trabalhar nervosa, acabo não tendo paciência com meus companheiros de trabalho. (Vivian)
Quanto à emergência dos conflitos por sobrecarga, 14 dos 15 respondentes disseram já terem se sentido sobrecarregados com a soma das atividades de trabalho com as pessoais e familiares. Os bancários mencionaram variadas sensações de sobrecarga. Dois se referiram à pressão e às metas como os aspectos mais desgastantes, em relação à jornada de trabalho, que ocupa até um papel secundário. Dois comentaram que é tanta coisa para fazer, que até adoecem e que há dias tão exaustivos, que ficam com dificuldade de concentração e dores de cabeça à noite. Dois dos bancários nessa situação também falaram que chegam tão cansados em casa, que não conseguem fazer mais nada, ou não querem falar com ninguém. Um bancário falou da dificuldade enfrentada quando se juntam os seus problemas pessoais com os dos clientes, descarregados nele. Outro assumia se sentir sobrecarregado, mas agradecia por isso, já que tinha um emprego. Afala de um bancário exemplifica uma das situações mais citadas como geradora de sobrecarga, que é a pressão no trabalho e as metas de produtividade:
Acho que o que sobrecarrega mais é a pressão do trabalho. O trabalho do banco é estressante, desgastante. Não é nem tanto a jornada de trabalho, a própria pressão [é] que sobrecarrega, como as metas, metas de venda, verificar se o atendimento está funcionando em ordem e isto, dentro do banco, é medido estatisticamente. Verificar por quanto tempo um terminal fica inoperante, quais são as causas, a satisfação dos clientes. (Edson)
Apesar de os conflitos entre trabalho e família terem aparecido neste estudo com uma freqüência relativamente baixa, eles têm um impacto muito negativo, pois podem gerar mal estar entre os membros da família e, ao longo do tempo, desgastar as relações familiares. Os conflitos de família com trabalho podem gerar prejuízos para a organização e para o funcionário, especialmente em se tratando de atividades que demandam o atendimento ao público ou alta concentração, como é freqüente no setor bancário.
Considerando a existência de prejuízos relacionados aos conflitos entre trabalho e família, mostra-se relevante compreender o que pode ser feito para minimizá-los, tema do item a seguir.
5. Estratégias para o equilíbrio trabalho e família
Frente aos prejuízos gerados pelos conflitos de trabalho e família, o funcionário pode usar estratégias individuais, valendo-se de seus próprios recursos emocionais e do apoio social da família ou comunidade (COOPER E LEWIS, 2000; GOTTLIEB, KELLOWAY E BARHAM, 1998; KUGELMASS, 1996). Como recursos próprios, o trabalhador dispõe de aspectos cognitivos e comportamentais que podem auxiliá-lo. Os recursos cognitivos incluem a revisão de suas crenças, pensamentos e atitudes, especialmente, aquelas relacionadas ao gênero. Exemplos de estratégias cognitivas seriam: o indivíduo falar para si mesmo que deve levar as coisas um dia de cada vez, tentar procurar sempre o lado positivo nas situações difíceis, diminuir as exigências em relação às atividades domésticas. As estratégias comportamentais envolvem agir de forma a proporcionar condições favoráveis para lidar com os conflitos, como estruturar o tempo cuidadosamente e gerenciar algumas responsabilidades familiares enquanto estiver no trabalho. Essa divisão das estratégias individuais em comportamentais e cognitivas é mais didática, já que, muitas vezes, elas se misturam (FARIA, 2002).
No âmbito das estratégias de apoio social, o indivíduo pode encontrar ajuda na família e na comunidade, tanto através do apoio emocional, sendo ouvido e acolhido, bem como através da ajuda prática, que pode acontecer através do pagamento por serviços, como os de babá, empregada doméstica, faxineira, comida semipronta, restaurantes, transporte para crianças. Outras vezes, a ajuda pode ocorrer gratuitamente, quando algum familiar, por exemplo, dispõe-se a ajudar no cuidado das crianças ou nas tarefas domésticas (FARIA, 2002). Outra forma de apoio social constitui-se daquelas propiciadas pelo poder público, entre as quais a Comissão Européia (1997) destaca: oportunidades de formação profissional, oferta de instituições que auxiliem no cuidado dos filhos, de idosos e de indivíduos com necessidades especiais e ajuda com transporte.
As organizações também têm um papel expressivo na disponibilização de estratégias para o equilíbrio entre trabalho e família, já que as rotinas de trabalho podem amenizar ou intensificar os conflitos. Uma das estratégias organizacionais mais apontadas é a introdução de arranjos alternativos de horário e de lugar de trabalho. Existem estudos que apontam a opção por esses arranjos como uma forma de melhorar a conciliação do trabalho com a família, evitando-se uma série de custos na vida pessoal, familiar e profissional do funcionário (COOPER E LEWIS, 2000; FRIEDMAN, 1990; GOTTLIEB, KELLOWAY E BARHAM, 1998; KUGELMASS, 1996). Sobre o trabalho de horas reduzidas, pesquisadores apontam que ele pode proporcionar condições potencialmente favoráveis, em se pensando que os funcionários trabalhariam um número menor de horas, dispondo de mais tempo para vida pessoal e familiar (FAST E FREDERICK, 1996; BARNETT E GAREIS, 2000).
Cooper e Lewis (2000), além de enfatizarem os arranjos alternativos, apontam com estratégias a oferta de treinamentos sobre equilíbrio entre trabalho e família e o gerenciamento de estresse, a redução da jornada de trabalho com paralela redução salarial por um período específico, a licença para o afastamento por períodos determinados (para estudos ou para cuidar de parentes doentes), os grupos de apoio para mães e pais que passaram pela licença maternidade e paternidade, respectivamente, e a permissão de interrupção da carreira por alguns anos, com a possibilidade de não perder a posição.
Ao serem solicitados a falar das estratégias usadas para conciliar as responsabilidades pessoais e familiares com o trabalho, os bancários mencionaram estratégias bem variadas, como pode ser visto na Tabela 4. Dentre as estratégias relatadas, destacaram-se as cognitivas e comportamentais. Dentre as cognitivas, que envolvem mudança de pensamentos e crenças, apareceu: desligar-se de uma esfera ao adentrar a outra. Entre as comportamentais, praticar atividades físicas e a ilustrada pela fala a seguir:
[Tenho] que aproveitar todo o tempo pra minha mulher e meus filhos. Uma coisa que eu faço é ir pro sítio, mexer com animais, fugir de [outras] pessoas. (Vagner)
As estratégias de apoio social citadas foram usar o serviço de empregada doméstica e contar com a ajuda do cônjuge para resolver problemas familiares. Não foi citado nenhum apoio proveniente de políticas públicas, como creche ou atendimento pelo SUS.
Ao serem questionados sobre estratégias organizacionais, os bancários enfocaram como as mais efetivas a promoção de atividades de lazer pelos bancos (29,16%) e o aumento do quadro de bancários (20,83%), como pode ser visto na Tabela 5.
Apareceram comentários sobre a redução da jornada (12,5%), em um dos casos referindo-se a de todas as categorias profissionais, a partir de uma política pública. Como questão de particular interesse de pesquisa, essa foi investigada com profundidade para averiguar seu significado para os bancários, o que é analisado a seguir.
5.1. A jornada reduzida como estratégia de conciliação
Nesta investigação, tanto os bancários de 30 horas, quanto os de 40 horas consideraram a jornada de 30 horas mais favorável para atender às demandas pessoais e familiares (65,62%) e apontaram o equilíbrio entre trabalho e família como a maior vantagem dessa jornada. Relataram que ela permite dormir, descansar, fazer atividades físicas, estudar, passear com a família, cuidar dos filhos e procurar profissionais da saúde (ver Tabela 6).
Um dos entrevistados relatou as vantagens da jornada de 30 horas da seguinte forma:
Os de seis [horas] podima fazer isso aí, chegar em casa e ainda fazer alguma coisa. Agora, os de oito horas não tinham tempo nem de ver televisão, quase. Nem jornal você via. É difícil. Não tinha horário de saída. (João Pedro)
Em se tratando das rotinas de trabalho, os entrevistados comentaram que a jornada de 30 horas colabora para o menor estresse no trabalho (9,37%), implica menor responsabilidade (9,37%), amplia a qualidade de vida (6,25%), reduz a sobrecarga (3,12%), é menos cansativa (3,12%) e proporciona um melhor desempenho (3,12%). Por outro lado, mencionaram algumas desvantagens relacionadas ao salário inferior, ao ritmo de trabalho mais acelerado, às atividades serem repetitivas e às menores oportunidades de qualificação, apresentadas na Tabela 7. O ritmo mais acelerado de trabalho pode ter um impacto negativo para a saúde, o que pode potencializar o surgimento de doenças. O salário inferior pode dificultar o acesso às estratégias de ordem prática para conciliar o trabalho e a família, tais como: contratação de empregada doméstica, faxineira, encanador, jardineiro, compra de comida semipronta e comer fora. As dificuldades relacionadas à qualificação e ascensão profissional podem trazer uma sensação de estar sendo pouco aproveitado, de monotonia e de estar estagnado profissionalmente, podendo até abalar seu sentimento de eficácia e auto-estima.
Quanto à jornada de 40 horas, 11 dos bancários apontaram como as principais vantagens a remuneração, dez a possibilidade de ascensão profissional, três o melhor desempenho e dois o maior reconhecimento obtido. Como desvantagens, sete comentaram sobre o menor tempo para as atividades pessoais e familiares, seis, o maior estresse no trabalho, um, a maior responsabilidade no trabalho e outro, a dificuldade de ter acesso ao comércio. No comentário a seguir, o bancário expressou as vantagens e as desvantagens:
Desvantagens, é o seguinte: oito horas são oito horas. Tem que entrar mais cedo. Você, num cargo de oito horas [...] tem mais responsabilidades. Você é cobrado mais. Não que o pessoal de seis horas seja menos cobrado. A responsabilidade é um pouco menor do pessoal do caixa [e] escriturário. O de seis horas tem uma remuneração menor, então, se você é pai de família [...] tem que se controlar mais, tem que se conter mais. O padrão de vida é um pouquinho mais baixo. (Giuliano)
Os bancários de 30 horas têm perdas financeiras e de ascensão profissional; já os de 40 têm suas possibilidades de equilíbrio entre trabalho e família diminuídas. Dessa forma, haveria um trade off.
Encontrou-se, como pode ser observado no Gráfico 6, que, dentre os bancários de 30 horas, 33,33% prefere a jornada de 40 horas e 50% a jornada de 30 horas. Dentre os de 40 horas, 60% preferem a jornada de 40 horas, 13,33%, a de 30 horas e 6,66% disse que dependia do aspecto considerado.
Observa-se que, nos dois casos, os bancários preferem a própria jornada. Entre os de 40 horas, isso pode ocorrer devido à impossibilidade de passar para 30h, já que isso implicaria um declínio profissional. Cada categoria também pode estar reforçando a situação atual, de forma a não entrar em conflito e manter sua sensação de eficácia.
6. Considerações finais
Neste artigo, apresentou-se a relação entre a entrada da mulher no mercado de trabalho e as mudanças conseqüentes na configuração do trabalho e da família, a emergência dos conflitos entre essas duas esferas, assim como possíveis estratégias para minimizá-los. A entrada da mulher no mercado de trabalho foi significativa nas últimas décadas, com destaque no setor de serviços e na atividade bancária, onde as mulheres ocupam quase metade das vagas, concentrando-se mais em funções de jornada de 30 horas, com salários inferiores.
Homens e mulheres ficaram imersos em uma realidade que demanda sua atuação tanto na esfera familiar, quanto na do trabalho. Notou-se, ao estudar os bancários, que eles enfrentam conflitos entre trabalho e família, com os prejuízos que esses conflitos geram. Entre as estratégias usadas para enfrentar tais conflitos, destacam-se as cognitivas, comportamentais e aquelas de apoio social. No âmbito das organizações, ainda existem limites ao uso de estratégias para o equilíbrio entre trabalho e família, entre os quais se inclui a cultura bancária, que não favorece o uso da jornada de 30 horas com esse fim.
A jornada de 30 horas foi associada pelos bancários à promoção do equilíbrio entre trabalho e família. As suas desvantagens percebidas foram o ritmo mais intenso de trabalho, atividades mais repetitivas, perdas financeiras e em termos de ascensão profissional. Esses fatores foram determinantes na preferência pela jornada de 40 horas. As rotinas dos bancários, nessa jornada de 30 horas, e os seus deveres fazem com que ela não se mostre, na prática, favorável à conciliação.
Seria enriquecedor ampliar este estudo, comparando-se variados grupos de bancários na análise dos conflitos de trabalho e família e das estratégias de manejo. Dentre as comparações que poderiam ser feitas, sugere-se entre bancários com e sem filhos, residentes em cidades de diferentes tamanhos, solteiros e casados, com cônjuges que trabalham fora e que não trabalham e em diferentes níveis hierárquicos.
Referências
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1 Nas agências, localizam-se os bancários diretamente relacionados com as atividades-fim do banco, como caixas, escriturários e gerentes operacionais. Nos departamentos, atuam os bancários com funções técnicas e os idealizadores da gestão dos bancos.
2 As funções não comissionadas são aquelas em que os bancários só recebem seu salário-base, quase sempre de 30 horas. As funções comissionadas, normalmente, de 40 horas semanais, são aquelas nas quais os bancários recebem um valor adicional pela sua produtividade e cumprimento de metas estabelecidas, tais como: venda de seguro, abertura de contas, etc.