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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.22 no.3 Brasília jul./set. 2022  Epub 29-Nov-2024

https://doi.org/10.5935/rpot/2022.3.editorial 

Editorial

Formação e Exercício Profissional em Psicologia das Organizações e do Trabalho

Formación y Práctica Profesional en Psicologia Organizacional y del Trabajo

Roberto Moraes Cruz1 

Jairo Eduardo Borges-Andrade2 

Alexsandro Luiz De Andrade3 

Daniela Campos Bahia Moscon4 

Germano Gabriel Lima Esteves5 

João Viseu6 

Marcos Ricardo Datti Micheletto7 

Mª Inmaculada López Núñez8 

Mussa Abacar9 

Nádia Kienen10 

Sabrina Cavalcanti Barros11 

Janete Knapik12 

Simone Cassiano13 

Juliana Barreiros Porto14 

1Editor-Chefe, Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Brasil

2Editor Sênior, Universidade de Brasília (UnB), Brasil

3Editor Associado, Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Brasil

4Editora Associada, Universidade Federal da Bahia (UFBA), Brasil

5Editor Associado, Universidade de Rio Verde (UniRV), Brasil

6Editor Associado, Universidade de Évora, Portugal

7Editor Associado, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Brasil

8Editora Associada, Universidad Complutense de Madrid (UCM), Espanha

9Editor Associado, Universidade Rovuma (UniRovuma), Moçambique

10Editora Associada, Universidade Estadual de Londrina (UEL), Brasil

11Editora Associada, Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Brasil

12Editora Júnior, Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Brasil

13Editora Júnior, Universidade de Brasília (UnB), Brasil

14Presidente, Associação Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho (SBPOT), Brasil


Produzir conhecimentos científicos constitui um desafio permanente para o desenvolvimento teórico, metodológico e tecnológico da ciência. Por sua vez, disseminar esses conhecimentos na sociedade, por meio de processos formativos e da atuação profissional, é uma condição necessária e relevante ao desenvolvimento das profissões (Cruz et al., 2021).

Ciência e profissão são instituições sociais e históricas, que se tornaram indissociáveis, especialmente a partir do século XIX, com a disseminação do papel da racionalidade científica na compreensão da realidade e com os avanços técnicos e tecnológicos (Cupani, 2005). Ambas resultam de esforços individuais e coletivos em sistematizar conhecimentos, construir perspectivas de compreensão e estratégias na busca de soluções para os desafios humanos. Funcionam como componentes de uma “correia de transmissão”, uma frequentemente transferindo potência para a outra, embora inexista interdependência integral entre eles. Por exemplo, projetos de pesquisa podem estar fundamentados em problemas da prática profissional e esta pode ser beneficiada pelos achados desses projetos.

Há características marcantes de uma profissão e de seus profissionais. Uma profissão é essencialmente um conjunto de atividades, baseadas em um corpo sistemático de conhecimentos científicos, e de práticas aderentes a um código de ética (Sheehan, 1994). Ou, ainda, pode ser definida como um grupo ocupacional, organizado em corporações relativamente autônomas - em função de capacidade de autorregulamentação - e que presta serviço especializado à sociedade (Abbott & Meerabeau, 2020; Crompton, 1990). Profissionais, por sua vez, são orientados e motivados por premissas, ideais, métodos, padrões de conduta e obrigações sobre o que fazer, porque fazer, como fazer e quais resultados se espera alcançar em suas especialidades técnicas. Em função disso, assumem responsabilidades individuais - eventualmente multiprofissionais - em prover os melhores serviços, recursos e intervenções voltadas a demandas individuais, grupais e organizacionais.

As profissões se distinguem umas das outras pelo status de poder, legitimado pelo Estado e baseado em três pilares fundamentais: o monopólio de área do conhecimento especializada e institucionalizada, a autonomia técnica para o profissional decidir sobre o seu próprio trabalho e o credencialismo como via no acesso à profissão (Freidson, 1998, 2001). O poder das profissões reside em seu potencial de recrutar e formar pessoas, realizar treinamentos especializados e acreditações técnicas, assim como criar mecanismos de proteção à discricionaridade, legalidade e legitimidade do exercício profissional (Abbott & Meerabeau, 2020). Esse poder é continuamente desafiado pela consistência e eficácia dos conhecimentos, métodos e tecnologia utilizados nas práticas profissionais, assim como pela confiança depositada pela sociedade na conduta dos profissionais.

Nesse contexto, é importante compreender o papel da Psicologia como área do conhecimento humano, reconhecida como ciência, aplicada como profissão regulamentada e integrada ao imaginário social como um instrumento de compreensão do comportamento humano em diferentes contextos (Malvezzi, 2021). Afirmar, portanto, que a Psicologia é uma ciência e profissão, nesse caso, acentua a legítima e necessária interlocução entre uma área do conhecimento científico e um campo de intervenção profissional, com diferentes especialidades e finalidades, valorizada por um público interno (psicólogos/as) e externo (usuários dos seus serviços profissionais). Decorre dessa relação, a organização de uma comunidade acadêmica, orientada para os processos de pesquisa, ensino e intervenção profissional, e a institucionalização social da profissão e de suas especialidades, por meio de regulamentações do exercício profissional (Cruz, 2016).

No âmbito da Psicologia das Organizações e do Trabalho (POT), esse desafio não é diferente. Compreender e intervir no âmbito do trabalho e das organizações, com base no corpus de conhecimentos e de práticas desenvolvidos na Psicologia e nas ciências afins, é um compromisso científico e ético. Cientistas e profissionais, que atuam nessa área e especialidade, fazem parte de uma comunidade que deve contribuir e zelar pela qualidade dos conhecimentos produzidos e disponibilizados à sociedade. Esse é o contexto em que se delineiam os desafios da formação de profissionais que pretendem atuar ou atuam no campo da POT.

De uma maneira geral, o objetivo principal da formação profissional, seja ela básica ou continuada, realizada essencialmente em instituições de ensino/capacitação especializadas, é promover o desenvolvimento de competências científicas e profissionais entre os aprendentes de uma profissão e de suas respectivas especialidades (Cruz, 2016). Formar pessoas para atuar profissionalmente no campo da POT é uma atividade complexa, que envolve, basicamente: 1) compreender o papel científico e relevância social dos conhecimentos científicos e tecnologias produzidas em POT; 2) demonstrar interesse em compartilhá-las e integrá-las aos processos de ensino e no desenvolvimento de habilidades das pessoas; 3) zelar por sua efetiva aplicação, tendo em vista os contextos de trabalho/organizacionais, as finalidades da intervenção, as práticas regulamentadas e as responsabilidades técnicas e éticas associadas à prestação de serviços profissionais.

No Brasil, uma formação profissional em POT deve contemplar um conjunto de competências técnicas fundamentais ao exercício profissional, tendo em vista os principais campos da POT: a Psicologia do Trabalho, a Psicologia das Organizações, a Psicologia e Gestão de Pessoas, o Ensino e a Pesquisa em POT. No escopo geral dessas competências, se incluem: a) Analisar necessidades e/ou demandas de clientes/usuários e determinar os objetivos da intervenção; b) Planejar a avaliação, avaliar e diagnosticar condições individuais, grupais, organizacionais relevantes à intervenção; c) Definir estratégias, selecionar e construir método e técnicas necessárias à intervenção; d) Identificar, preparar e conduzir intervenções consideradas apropriadas ao alcance dos objetivos, com base no desenvolvimento de atividades e os resultados obtidos; e) Estabelecer a adequação da intervenção realizada à solução do problema inicial; f) Fornecer feedback para clientes/usuários da prestação de serviço (SBPOT, 2020).

No desenvolvimento e aperfeiçoamento dessas competências em POT é relevante considerar as relações entre conhecimentos e problemas práticos oriundos do mundo do trabalho e das organizações (Rodríguez, 2017). É um processo de integração entre teoria-prática e reflexão-ação, de descoberta e absorção de conhecimentos oriundos do estado da arte (produção científica atualizada) e da experiência (pessoal ou supervisionada), de desenvolvimento de habilidades de comunicação verbal e escrita, de uso de recursos técnicos, de identificação com ideais e valores profissionais no enfrentamento de demandas concretas (Arboleda & de Arboleda, 2012; Iñesta, 2006; Sierra-Barón, Mora, Quintero, & Santofimio, 2020).

Entre os desafios contemporâneos à formação profissional em POT, permanece a necessidade de integração entre conhecimentos científicos e capacidade de resposta às demandas das pessoas e das organizações, que produza a maior quantidade de benefícios possíveis para os envolvidos. Esse processo pode ser aperfeiçoado com base no desenvolvimento do pensamento estratégico, de habilidades técnicas, capacidade de interlocução interdisciplinar e versatilidade para enfrentar problemas complexos. Esses aspectos assinalam a busca por uma atuação profissional qualificada, sempre que for possível e eticamente desejável.

A Revista Psicologia: Organizações e Trabalho (rPOT), desde o início deste século, tem se constituído em um mecanismo de interlocução entre ciência e práticas profissionais em POT, por meio da avaliação da qualidade do conhecimento produzido e de sua difusão na comunidade. A expectativa é continuar contribuindo com o fluxo constante de informações científicas e técnicas qualificadas, buscando contribuir no processo formativo e no exercício profissional em POT.

Referências

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