A Inteligência Emocional (IE) “emotional intelligence” tem sido elencada como competência importante para os profissionais, em especial para osaos que ocupam cargos de liderança (Baczyńska & Thornton, 2017; Caruso & Salovey, 2007; George, 2000; Han et al., 2017). Nesse aspecto, desde 2016, o Fórum Econômico Mundial destaca em seu relatório, intitulado “O futuro do trabalho”, que a IE é uma habilidade relevante para os profissionais. A atualização desse relatório mundial, em outubro de 2020, apontou a IE entre as quinze competências a serem mais requisitadas nos profissionais até 2025, principalmente para líderes (World Economic Forum - WEF, 2020).
A primeira publicação científica sobre IE ocorreu em 1990, escrita por John Mayer e Peter Salovey, considerando o modelo psicométrico dos estudos da inteligência, que aborda capacidades e habilidades cognitivas (Roberts, Flores- Mendonza, et al., 2002). Esses pesquisadores propuseram a IE como a capacidade do indivíduo de perceber e regular emoções em si e nos outros e de utilizar as mesmas para se adaptar ao meio (Salovey & Mayer, 1990).
Atualmente, na versão mais recente desste modelo de IE, ela é compreendida como a capacidade cognitiva do indivíduo de perceber emoções, de acessá-las e gerá-las de forma a ajudar os processos de pensamento, a capacidade de compreender a emoção e a conhecê-la, e a capacidade de regular as emoções para promover o crescimento emocional e intelectual, sendo conhecido como modelo de Habilidades de IE (Mayer et al., 2016).
Em função do contexto organizacional considerado, a essa essa pesquisa utilizará a classificação dos modelos de IE do artigo de Wittmer e Hopkins (2018): Habilidade (apresentado no parágrafo anterior), Traço, Misto e Competências. O modelo de Traços de IE (Petrides, 2010; Petrides et al., 2007) é uma composição de autopercepções emocionais intimamente associados à personalidade do indivíduo e é composto por quatro elementos ou fatores principais: bem-estar, sociabilidade, autocontrole e emocionalidade.
No modelo Misto (Bar-On, 1997), assim chamado por compreender a IE e a Inteligência Social como sendo um mesmo construto e por incluir outros construtos como motivação, a IE é compreendida como a habilidade da pessoa de se adaptar às demandas sociais e emocionais do ambiente, abrangendo os fatores de autopercepção, autoexpressão, habilidades interpessoais, tomada de decisão e gerenciamento de estresse. Quanto ao modelo de Competências (Boyatzis & Goleman, 2002; 2014; Boyatzis et al., 2000), que compreende a IE como a capacidade de reconhecimento, motivação e gerenciamento dos próprios sentimentos e dos outros, foi criado para ser mais voltado ao ambiente de trabalho e é formado pelas habilidades de autoconsciência, autogerenciamento, consciência social e gestão de relacionamentos.
Esses quatro modelos estão presentes em pesquisas sobre IE no contexto organizacional, inclusive para verificar a relação entre IE e liderança. Alguns estudos têm destacado a relação positiva da IE e da liderança organizacional (Côté et al., 2010), mais especificamente a Liderança Transformacional, como os estudos de Khalili (2017) e Maamari e Majdalani (2017), os quais seguiram o modelo de Habilidades da IE e de Sivanathan e Fekken (2002), utilizando o modelo Misto. A Liderança Transformacional é um dos modelos mais estudados de liderança e que considera a pessoa que ocupa a posição de líder como alguém que inspira positivamente, promove o desenvolvimento intelectual, estimula o bem-estar, se preocupa com a realização e a autorrealização dos liderados (Bass, 1999).
Outro estilo de liderança similarmente pesquisado na literatura científica é o Transacional (Bass, 1990; Burns, 1978), que ocorre quando o líder incentiva o liderado na forma de recompensa contingente, em que o liderado recebe as instruções do que fazer para ser recompensado pelo esforço. O líder transacional assume um papel ativo mais voltado para correções de falhas ou até mesmo uma liderança passiva, aguardando o problema surgir ao invés de agir preventivamente (Bass, 1999). A relação entre IE e liderança transacional apresenta em trabalhos científicos direcionamentos diferentes na correlação,: há dados apontando relação significativa positiva (Maamari & Majdalani, 2017), significativa negativa (Leban & Zulauf, 2004) e não significativa (Maamari & Majdalani, 2017).
O desempenho do líder também é outra variável encontrada na literatura sobre IE e Liderança, investigando se líderes com melhor desenvolvimento da IE apresentam melhores desempenhos no trabalho. Nesse sentido, alguns trabalhos têm demonstrado que existe relação positiva entre estas variáveis (Bradberry & Su, 2006; Choudhary et al., 2017; Groves & Feyerherm, 2011).
Portanto, pesquisas de IE, além de demonstrar que esta é uma variável demandada para o perfil da liderança pelas organizações, têm apontado a sua relevância para esses cargos organizacionais. Porém, é necessário que se faça uma compilação e avaliação crítica mais detalhada dos estudos que abordaram essa temática para que haja maior sustentação empírica ao indicar a IE como variável importante a ser demandada em líderes. Assim, o objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão sistemática da literatura sobre investigar a relação de IE e aspectos de liderança no trabalho, resgatando artigos científicos desde 1990, quando se iniciaram os estudos com a IE.
Método
Esta revisão foi proposta seguindo as orientações gerais do protocolo PRISMA - Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (McInnes et al., 2018) e das Diretrizes para condução e publicação de revisões sistemáticas em Psicologia (Carvalho et al., 2019). O levantamento de dados foi realizado entre o período de fevereiro e julho de 2020. Foram utilizadas as bases de busca nacionais da Biblioteca Virtual em Saúde - Psicologia (BVS-Psi), com as bases de dados da Portal de Periódicos Eletrônicos de Psicologia (PePSIC), da Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Scientific Electronic Library Online (Scielo), bem como na maior base de dados internacional da American Psychological Association (APA PsycINFO). Foram aplicadas as combinações entre os descritores em inglês “emotional intelligence AND leadership AND job” e “emotional intelligence AND leadership AND work” e seus respectivos termos em português: “inteligência emocional AND liderança AND trabalho”. A coleta de dados foi restrita aos artigos científicos.
Esse estudo foi conduzido em duas fases. Na primeira, foram pesquisados todos os artigos nos periódicos de 1990 a maio de 2020. Os artigos foram escolhidos a partir da análise dos títulos, resumos e palavras-chave nos idiomas em português, inglês e espanhol e, embasados nos critérios de inclusão e exclusão. Os critérios de inclusão definidos foram: 1) artigos dos últimos trinta anos (1990- maio/2020); 2) presença dos descritores no título, ou resumo, ou mesmo nas palavras- chaves; 3) artigos que objetivaram verificar a relação da IE e liderança no contexto organizacional; e 4) artigos em periódicos revisados por pares. Em relação aos critérios de exclusão foram delimitados os seguintes: 1) artigos que investigaram IE e liderança fora do contexto organizacional; 2) não objetivaram analisar a relação da IE e liderança; 3) indisponíveis para consulta na íntegra.
Na segunda fase, com o objetivo de buscar uma melhor qualidade na análise dos dados, foi realizado um comitê de planejamento e avaliação com os três pesquisadores/autores desse estudo, os quais atuaram também como juízes. Dois dos pesquisadores realizaram as mesmas buscas com base nos parâmetros descritos, que ocorreram de forma independente. A pesquisa inicial resultou em 202 estudos, dos quais 28 eram duplicados, ficando ao todo 174 artigos para uma primeira avaliação mais criteriosa por meio do título, do resumo e, quando necessário, do manuscrito completo.
Desse modo, as leituras dos artigos foram divididas aleatoriamente entre os dois autores que realizaram as buscas, sendo avaliados 87 artigos por um pesquisador e 87 pelo outro. Devido à divisão, foi realizada a checagem cruzada dos artigos entre os pesquisadores como procedimento adicional. O terceiro autor participou do planejamento da coleta de dados, da avaliação e da validação final de todos os artigos. A Figura 1 apresenta o fluxograma dos processos realizados para encontrar os artigos.
Considerando os critérios de inclusão e exclusão, essa análise inicial teve como resultado a identificação de 75 artigos que contemplavam os requisitos para comporem a análise final da revisão. A Figura 2 apresenta o processo seguido pelo protocolo PRISMA neste artigo.
Análise de Dados
Nesse estudo, para realizar a análise dos dados coletados foram elencadas categorias. A primeira referiu-se ao tipo de estudo, efetuando a separação de artigos teóricos e empíricos e, para cada uma, foram designadas categorias específicas. Na apresentação dos manuscritos teóricos – pesquisas que objetivam trazer conceitos, fundamentos e reconstruir teorias (Demo, 2000) – foram apontadas as seguintes categorias: tipo de revisão de literatura; período de publicação dos artigos; continentes e países em que as pesquisas foram realizadas; períodos publicados; modelos de IE utilizados nos estudos; perfis de liderança empregados e, por fim, a categoria da relação de IE e desempenho da liderança no trabalho. Com relação aos estudos empíricos, dedicados à prática, experimentação e na produção e análise de dados (Demo, 2000), foram elencadas: período de publicação; continentes e países; modelos de IE; perfis de liderança; relação de IE e desempenho da liderança no trabalho e por último, os testes de IE utilizados nos trabalhos.
Resultados
A primeira categoria analisada foi tipo de artigo: empírico ou teórico. Dos 75 artigos que compuseram a base final da revisão, 22 (29,33%) publicações foram de artigos teóricos e 53 (70,67%) empíricos.
Resultados dos Artigos Teóricos
Categorização dos Artigos Teóricos por Tipo de Revisão da Literatura
Os manuscritos foram identificados de acordo com a classificação apresentada pelo manual do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) em 2015, em revisão narrativa (27,27%; 6), integrativa (63,63%; 14) e sistemática (09,10%; 2) – um deles era meta-análise – (Universidade do Estado de São Paulo, 2015). Em uma das revisões sistemáticas encontradas, Pearson e colaboradores (2007) tiveram como objetivo estudar a relação entre a IE do líder e outros fatores (como a criatividade) dos liderados. O principal resultado encontrado foi que a IE do líder era uma capacidade facilitadora para a criatividade dos liderados. Já a meta-análise de Miao et al. (2016), mostrou que a IE dos liderados se relaciona positivamente com a satisfação no trabalho dos liderados. A presente pesquisa se distingue desses dois trabalhos citados, pois avaliou como a IE estava relacionada às variáveis dos líderes em si e não em como a IE dos líderes se relacionava às variáveis dos liderados. Além das características dos testes de IE utilizadas nos trabalhos científicos.
Período dos Estudos sobre Inteligência Emocional (IE) e Liderança no Contexto Organizacional
Os manuscritos teóricos (22) do presente estudo foram publicados entre os períodos de 2000 a 2018. A quantidade de artigos por período pode ser observada na Tabela 1.
Tabela 1 Distribuição de artigos teóricos por período
Período | Quantidade | % |
---|---|---|
1990 - 2000 | 1 | 4,55% |
2001 - 2005 | 3 | 13,64% |
2006 - 2010 | 10 | 45,45% |
2011 - 2015 | 3 | 13,64% |
2016 - 2018 | 5 | 22,73% |
Total | 22 | 100% |
As menores quantidades de artigos publicados se encontram na primeira década (1990 a 2000, 4,55%). Em contrapartida, a maior frequência de artigos foi de 2006 a 2010, sendo 10 (45,45%).
Países e Continentes em que Foram Realizados os Estudos de IE e Liderança Organizacional
Com o intuito de verificar em quais locais as pesquisas estão sendo conduzidas e para uma maior contextualização, os artigos também foram categorizados por países e continentes. No continente americano foram encontrados 11 artigos (50%) e no europeu 9 (40,90%). A Ásia e a Oceania tiveram a publicação de apenas um artigo, cada um, e, no continente africano, não foi identificada nenhuma produção científica. Em relação aos países, os Estados Unidos é o país que tem a maior quantidade de manuscritos teóricos, com onze (50%) (Brown & Moshavi, 2005; Cherniss, 2010; Dearborn, 2002; Feather, 2009; George, 2000; Gooty et al., 2010; Locke, 2005; Pearson et al., 2007; Rao, 2006; Riggio & Reichard, 2008; Walter & Cole, 2012). Na sequência, o Reino Unido, com cinco (22,75%) (Feather, 2009; Iszatt-White, 2009; Nightingale et al., 2018; Powell et al., 2015; Redmond & Dolan, 2016) e Noruega, com dois (9,10%) (Akerjordet & Severinsson, 2008; Glasø, 2008). Outros quatro países tiveram somente uma publicação cada (4,55%): Austrália (Pearson et al., 2007), Portugal (Lopes, 2016), Arábia Saudita (Alferaih, 2017) e Holanda (Heckemann et al., 2015).
Modelos de IE utilizados nas pesquisas sobre IE e liderança no contexto organizacional
Os artigos teóricos foram quantificados, conforme a classificação dos quatro modelos de IE descrito por Wittmer e Hopkins (2018). Desses estudos, uma parte (36,36%; 8) utilizou mais de um modelo de IE (Akerjordet & Severinsson, 2008; Alferaih, 2017; Brown & Moshavi, 2005; Cherniss, 2010; Feather, 2009; Locke, 2005; Lopes, 2016; Powell et al., 2015). O modelo de Habilidade de IE (Mayer et al., 1997; 2016) representou 36,36% (8) dos estudos (Feather, 2009; George, 2000; Glasø, 2008; Heckemann et al., 2015; Miao et al., 2016; Nightingale et al., 2018; Riggio & Reichard, 2008; Walter et al., 2012), e o modelo de Competências (Boyatzis et al., 2000; Boyatzis & Goleman, 2002; 2014) aparece com 27,27% (6) (Dearborn, 2002; Gooty et al., 2010; Iszatt-White, 2009; Pearson et al., 2007; Rao, 2006; Redmond & Dolan, 2016).
Relação de IE e Características da Liderança no Contexto Organizacional
Quanto à análise dos perfis de liderança mais presentes nos estudos e como se relacionavam com IE, foi constatado que a maioria não apresentava um perfil ou modelo especifico de liderança (18; 81,82%). As categorias de liderança organizacional que também apareceram nos artigos teóricos foram: Liderança Transformacional (2; 9,09%) (Alferaih, 2017; Brown & Moshavi, 2005), Liderança Efetiva (1; 4,55%) (George, 2000) e Liderança Informal (1; 4,55%) (Gooty et al., 2010).
Relação de IE e Desempenho da Liderança no Trabalho
Acerca da relação entre IE e desempenho do Líder, foram encontrados nove (40,91%) estudos (Akerjordet & Severinsson, 2008; Alferaih, 2017; Cherniss, 2010; Dearborn, 2002; Feather, 2009; George, 2000; Glasø, 2008; Lopes, 2016; Walter et al., 2012). Três (13,63%) desses utilizaram como referência o modelo de Habilidades de IE (George, 2000; Glasø, 2008; Walter et al., 2012), um (4,54%) o modelo de Competências (Dearborn, 2002) e cinco (22,72%) empregaram mais de um modelo de IE (Akerjordet & Severinsson, 2008; Alferaih, 2017; Cherniss, 2010; Feather, 2009; Lopes, 2016).
Resultados dos Artigos Empíricos
Períodos dos Estudos sobre IE e Liderança no Contexto Organizacional
Para investigar quantos artigos empíricos foram publicados, uma análise da frequência e porcentagem dos estudos foi realizada por período. A apresentação dos artigos por quinquênio foi escolhida para uma melhor organização e a distribuição por período indicou que a maior frequência de artigos publicados sobre IE e liderança no trabalho foi de 2011 a 2015, sendo 24 (45,28%) artigos (Bratton et al., 2011; Butler et al., 2014; Cavazotte et al., 2012; Chang et al., 2012; A. S.-y. Chen et al., 2015; Z. Chen et al., 2012; Cheng et al., 2012; Esfahani & Soflu, 2013; Fazlani et al., 2012; Foster & Roche, 2014; Gonzaga & Monteiro, 2011; Gregory & Levy 2011; Groves & Feyerherm, 2011; Johnson & Stern, 2014; Jordan & Troth, 2011; Kafetsios et al., 2011; Lam & O’Higgins, 2012; Lindebaum & Cassell, 2012; Newman et al., 2015; Schmid & Darioly, 2014; Schraub et al., 2014; Troth & Gyetvey, 2014; Vidyarthi et al., 2014; Yuan et al., 2012). Os resultados dos demais períodos podem ser observados na Tabela 2.
Países e Continentes em que Foram Realizados os Estudos de IE e Liderança Organizacional
Em relação aos países que foram realizadas as pesquisas sobre IE e liderança organizacional, os Estados Unidos aparecem com 14 (26,42%) dos artigos publicados (Boyatzis et al., 2017; Bradberry & Su, 2006; Bratton et al., 2011; Butler et al., 2014; Chang et al., 2012; Gregory & Levy, 2011; Groves & Feyerherm, 2011; Han, Kim, & Kang, 2017; Harper, 2015; Johnson & Stern, 2014; Koman & Wolff, 2008; Leban & Zulauf, 2004; Sosik & Megerian, 1999; Van Oosten et al., 2019), seguidos da Austrália com seis (11,32%) (Jordan & Troth, 2011; Li et al., 2016; Newman et al., 2015; Palmer et al., 2001; Semadar et al., 2006; Troth & Gyetvey, 2014), da China com cinco (9,43%) (Z. Chen et al., 2012; Cheng et al., 2012; Lam & O’Higgins, 2012; Leung, 2005; Wong & Law, 2002), do Reino Unido com quatro (7,55%) (Dulewicz & Higgs, 1999; Lindebaum & Cartwright, 2010; Lindebaum & Cassell, 2012; Neil, Wagstaff, Weller, & Lewis (2016) e Taiwan com três (5,66%) (A. S.-y. Chen et al., 2015; Wang & Huang, 2009; Yuan et al., 2012). Outros países somaram apenas dois estudos publicados cada um: Brasil (Cavazotte et al., 2012; Gonzaga, & Monteiro, 2011), Canadá (Lucas, Laschinger, & Wong, 2008); Sivanathan & Fekken, 2002), Índia (Choudhary et al., 2017; Vidyarthi et al., 2014), Irã (Esfahani & Soflu, 2013; Khalili, 2017) e Paquistão (Fazlani et al., 2012; Shariq, Mukhtar & Anwar 2019). Onze países tiveram somente uma publicação (Alemanha, Bélgica, Finlândia, Grécia, Hong Kong, Irlanda, Líbano, Malásia, Polônia, Portugal e Suíça). A Tabela 3 apresenta a distribuição por continente.
Modelos de IE Utilizados nas Pesquisas sobre IE e Liderança no Contexto Organizacional
Foram identificados artigos que consideraram cada um dos quatro modelos de IE citados por Wittmer e Hopkins (2018), artigos que apresentaram mais de um modelo de IE e dois artigos que não mencionaram nenhum dos quatro modelos de IE. Nesses dois estudos, não fica elucidado qual modelo os autores seguiram na aplicação do trabalho de fato, apenas comentam na introdução sobre o livro de Goleman (1995) e, no caso do texto de Leung (2005), também é abordado o modelo de Habilidades. Contudo, apesar das citações, faltam maiores argumentos nos procedimentos ou na conclusão que justifiquem incluir esses dois artigos como um dos quatro modelos propostos por Wittmer e Hopkins (2018).
O modelo de Habilidade de IE (Mayer et al., 1997; 2016) foi o modelo teórico mais utilizado nas pesquisas empíricas, se destacando em 58,49% (31) (Baczyńska & Thornton, 2017; Cavazotte et al., 2012; A. S.-y. Chen et al., 2015; Z. Chen et al., 2012; Cheng et al., 2012; Choudhary et al., 2017; Gonzaga & Monteiro, 2011; Gregory & Levy (2011); Groves & Feyerherm, 2011; Han et al., 2017; Harper, 2015; Jordan & Troth, 2011; Kafetsios et al., 2011; Khalili, 2017; Lam & O’Higgins, 2012; Lan, Wong, Jiang & Mao, 2017; Leban & Zulauf, 2004; Li, Gupta, Loon, & Casimir, 2016; Lindebaum & Cartwright, 2010; Lindebaum & Cassell, 2012; Maamari & Majdalani, 2017; Neil et al., 2016; Palmer et al., 2001; Schmid & Darioly, 2014; Schraub et al., 2014; Shariq et al., 2019; Troth & Gyetvey, 2014; Vidyarthi et al., 2014; Wang & Huang 2009; Wong & Law, 2002; Yuan et al., 2012) dos estudos, o modelo de Competências (Boyatzis et al., 2000; Boyatzis & Goleman, 2002; 2014) está representado em 15,09% (8) (Boyatzis et al., 2017; Butler et al., 2014; Dulewicz & Higgs, 1999; Fazlani et al., 2012; Johnson & Stern, 2014; Koman & Wolff, 2008; Lucas et al., 2008; Van Oosten, McBride-Walker, & Taylor, 2019) dos estudos, o modelo Misto (Bar-on, 1997) aparece com 13,21% (7) (Bratton et al., 2011; Chang et al., 2012; Dries & Pepermans, 2007; Rego et al., 2007; Semadar, Robins, & Ferris, 2006; Sivanathan & Fekken; 2002; Sosik & Megerian, 1999), o modelo de Traço (Petrides, 2010; Petrides et al., 2007) em 5,66% (3) (Clarke & Mahadi, 2017; Esfahani & Soflu, 2013; Salminen & Ravaja, 2017) dos artigos. Em 3,77% (2) (Bradberry & Su, 2006; Foster & Roche, 2014) dos estudos foram utilizados mais de um modelo de IE.
Testes Psicológicos de IE Utilizados nas Pesquisas Envolvendo Liderança no Contexto do Trabalho
Foram identificadas 45 (84,90%) pesquisas que utilizaram testes para medir a IE e dentro dessas Fforam encontrados 15 (28,30%) quinze testes psicológicos de IE utilizados nos artigos. O Wong and Law Emotional Intelligence Scale (WLEIS) (Wong & Law, 2002) e o Mayer-Salovey-Caruso Emotional Intelligence Test (MSCEIT) foram os mais usados, respectivamente 19 (42,22%) (Cavazotte et al, 2012; A. S.-y Chen et al., 2015; Z. Chen et al., 2012; Cheng et al., 2012; Gregory & Levy, 2011; Groves & Feyerherm, 2011; Han et al., 2017; Harper, 2015; Kafetsios et al., 2011; Khalili, 2017; Lam & O’Higgins (2012); Lan et al., 2017; Li et al., 2016; Lindebaum & Cartwright, 2010; Maamari & Majdalani (2017); Neil et al. (2016); Shariq et al., 2019; Troth & Gyetvey, 2014; Wang & Huang, 2009; Wong & Law, 2002) e 5 vezes (11,11%) (Bradberry & Su, 2006; Choudhary et al., 2017; Foster & Roche, 2014; Gonzaga & Monteiro, 2011; Leban & Zulauf, 2004) nas pesquisas que utilizaram testes específicos de IE (45). Em relação ao formato dos testes, o MSCEIT e o Diagnostic Analysis of Nonverbal Accuracy – Adult Faces (DANVA-AF-2; Nowicki & Duke, 1994) eram de desempenho (contendo resposta certas e erradas), os outros 13 instrumentos eram de autorrelato.
Considerando os modelos teóricos da IE, 66,67% (30) das pesquisas que apresentaram testes específicos de IE seguiram o modelo de Habilidade, enquanto seis (13,33%) optaram pelo modelo Misto, cinco (11,11%) o modelo de Competências, dois (4,44%) o modelo de Traço de IE e dois (4,44%) não utilizaram nenhum dos quatro modelos de IE. Dos 15 testes, quatro (26,66%) são específicos para o ambiente de trabalho, mas foram utilizados apenas em sete (13,20%) pesquisas. Sete (13,21%) estudos não apresentaram instrumentos específicos de IE (i.e., que foram desenvolvidos para avaliar a IE diretamente).
Relação de IE e Perfis de Liderança no Contexto Organizacional
Ao analisar quais perfis de liderança estavam mais presentes nos artigos e como se relacionavam com IE, foi observado que a maioria não apresentava um perfil ou modelo específico de liderança (30; 56,60%). A Liderança Transformacional (17; 32,08%) é o perfil ou modelo de liderança que mais aparece nos estudos, seguida da Liderança Transacional (5; 9,43%). A Tabela 4 apresenta os resultados das correlações entre IE e os dois perfis de liderança.
Tabela 4 Relação Entre IE, Liderança Transformacional e Liderança Transacional
Autores | N (líderes) | Transformacional (r) | Transacional (r) | Teste de IE |
---|---|---|---|---|
Sosik & Megerian (1999) | 63 | 0,02 a 0,10 | N.Inst | |
Palmer e colaboradores (2001) | 43 | 0,13 e 0,26 | -0,07 e -0,13 | Inst5 |
Sivanathan & Fekken (2002) | 13 | 0,40** | -0,03 | Inst2 |
Leban & Zulauf (2004) | 24 | 0,35* a 0,42* | -0,38* a -0,36* | Inst3 |
Wang & Huang (2009) | 51 | 0,26* | Inst1 | |
Gregory & Levy (2011) | 155 | 0,57** | Inst1 | |
Bratton e colaboradores (2011) | 146 | 0,37* | Inst2 | |
Bratton e colaboradores (2011) | 146 | 0,06 | Inst2 | |
Yuan e colaboradores (2012) | 180 | 0,09* e 0,34** | Inst4 | |
Cavazotte e colaboradores (2012) | 134 | 0,22* | Inst1 | |
Lam & O'Higgins (2012) | 50 | 0,23** | Inst1 | |
Esfahani & Soflu (2013) | 47 | 0,61** | Inst6 | |
Foster & Roche (2014) | 208 | 0,27** | -0,13 | Inst2 |
Foster & Roche (2014) | 208 | 0,38*** | -0,05 | Inst3 |
A. S.-y. Chen et al. (2015) | 41 | 0,30** | Inst1 | |
Neil et al. (2016) | 14 | 0,5 a 0,15 | Inst4 | |
Maamari & Majdalani (2017) | 258 | 0,37*** | 0,24*** | Inst1 |
Khalili (2017) | n.a. | 0,33** | Inst1 |
Nota. * p < 0,05; ** p < 0,01; *** p < 0,001; Inst1 = WLEIS (Wong et al., 2002); Inst2 = EQ-i (Bar-On, 1997); Inst3 = MSCEIT (Mayer et al., 2002); Inst4 = WEIS (Wong et al., 2004); Inst5 = TMMS (Salovey et al., 1995); Inst6 = TEIQue (Petrides, 2001; Petrides et al., 2007); N.Inst = Não utilizou instrumento específico de IE.; n.a. = não-especificado.
Na maioria das vezes (14; 82,35%), as correlações entre IE e Liderança Transformacional deram resultados significativos e positivos, enquanto que os resultados para as correlações entre Liderança Transacional e IE foram mais variados, com três (60%) estudos apresentando relações sem significância estatística (Foster & Roche, 2014; Palmer et al., 2001; Sivanathan & Fekken, 2002), um (20%) com relação positiva (Maamari & Majdalani, 2017) e um (20%) negativa (Leban & Zulauf, 2004). O artigo de Lindebaum e Cartwright (2010) não está presente na Tabela 4, pois não correlaciona a IE com a Liderança Transformacional de forma direta, apenas correlaciona os níveis de IE de liderados e líderes, entre outras correlações.
Relação de IE e desempenho da liderança no trabalho e nos relacionamentos
Sobre a relação entre IE e desempenho do Líder, onze estudos foram encontrados. A Tabela 5 apresenta os resultados encontrados nestes estudos, quais testes psicológicos foram utilizados e qual a amostra de cada um.
Tabela 5 Relação Entre IE e Desempenho no Trabalho
Estudo | N (líderes) | IE total ou fatores | Des. Líder (r) | Teste de IE |
---|---|---|---|---|
Sosik & Megerian (1999) | 63 | Autoconsciência privada | -0,29* | N.Inst |
Sosik & Megerian (1999) | 63 | Automonitoramento | -0,24* | N.Inst |
Bradberry & Su (2006) | 212 | Escore Total IE de Autorrelato | 0,59*** | Inst7 |
Bradberry & Su (2006) | 212 | Escore total de IE Habilidades | 0,003 | Inst3 |
Semadar et al. (2006) | 136 | Escore total de IE | 0,25** | Inst11 |
Groves & Feyerherm (2011) | 99 | Escore total de IE | 0,01 | Inst1 |
Cavazotte et al. (2012) | 134 | Escore total de IE | 0,29** | Inst1 |
Lam, & O'Higgins (2012) | 50 | Inst4 | ||
Troth & Gyetvey (2014) | 149 | Escore total de IE | 0,48** | Inst1 |
Neil et al. (2016) | 14 | Uso das Emoções | 0,46** | Inst4 |
Neil et al. (2016) | 14 | Emoção em Si; Emoção no outro; Regulação Emocional | 0,18; 0,00; 0,17 | Inst4 |
Baczyńska & Thornton (2017) | 163 | Escore total de IE | -0,09 a 0,08 | Inst8 |
Clarke & Mahadi (2017) | 203 | Escore total de IE | 0,44** | Inst10 |
Choudhary et al. (2017) | 65 | Escore total de IE | 0,57** | Inst3 |
Van Oosten et al. (2019) | 85 | Escore total de IE | 0,38** | Inst9 |
Nota. * p < 0,05; ** p < 0,01; *** p < 0,001; Des. Líder = Escore de inteligência emocional do Líder em relação ao desempenho do líder; Inst1 = WLEIS (Wong et al., 2002); Inst3 = MSCEIT (Mayer et al., 2002); Inst4 = WEIS (Wong et al., 2004); Inst7 = The Emotional Intelligence Appraisal (Bradberry & Greaves, 2003); Inst8 = Kwestionariusz Inteligencji Emocjonalnej; Inst9 = ESCI (Boyatzis & Goleman, 2002; 2014); Inst10 = Assessing Emotions Scale (Schutte, Malouff, & Bhullar, 2009; Schutte et al., 1998); Inst11 = SUEIT (Palmer & Stough, 2001).
Sobre a relação da IE e o desempenho dos Líderes, dois resultados foram negativos (r = -0,29 e -0,24) quando ocorreu o uso de fatores da IE como a autoconsciência privada e o automonitoramento (Sosik & Megerian, 1999). Quatro resultados não foram significativos, sendo que três deles avaliaram a IE por meio de testes de autorrelato e um por teste de desempenho máximo, com respostas certas e erradas. Oito resultados foram positivos e significativos, variando de r = 0,25 a 0,59.
Discussão
A partir do crescente interesse acadêmico pelo tema, relacionado ao contexto do trabalho, é possível observar que também no meio organizacional têm surgido demandas aos profissionais relacionadas a este construto e a importância da IE como competência para o trabalho (WEF, 2020; Baczyńska & Thornton, 2017; Caruso & Salovey, 2007; George, 2000; Han & Kang, 2017). Esse aumento das pesquisas pode sugerir a sustentação empírica do construto, o seu fortalecimento como um construto psicológico robusto e a verificação de sua importância para as relações no trabalho. Além disso, esses achados tendem a contribuir para que a IE seja uma variável cada vez mais requerida no meio organizacional, contexto este em que a IE esteve presente e ganhou credibilidade ou status, mesmo antes da sua devida comprovação científica (Dantas & Noronha, 2006) e atualmente já se tem maior sustentação empírica (Lopes, 2016; Maamari & Majdalani, 2017).
Os Estados Unidos é são o país com predominância de investigações, haja vista que o país pode ser considerado o berço da IE, pois os autores pioneiros (John Mayer e Peter Salovey) são norte-americanos, desenvolveram seus estudos no próprio país e ainda continuam suas pesquisas. Também é importante denotar que os Estados Unidos é um país que incentiva a pesquisa, com seu forte investimento de recursos financeiros e educacionais para a ciência. Além disso, outros pesquisadores surgiram no país com interesse na temática da IE. Um bom exemplo que pode ser mencionado é David Caruso, que ajudou a fomentar o modelo de Habilidades de IE, com suas quatro facetas, realizando pesquisas, publicando artigos com os criadores do termo - John Mayer e Peter Salovey - (Mayer et al., 2002, 2016), bem como escreveu um livro sobre IE e Liderança no contexto organizacional, com realização de estudos neste contexto (Caruso & Salovey, 2007).
Contudo, ao observar a distribuição geográfica por continente, observa-se que, somados os estudos da Europa e Ásia, as porcentagens de estudos equivalem a 52% (39) de todas as pesquisas realizadas sobre IE e liderança no contexto organizacional. Tal resultado indica uma maior distribuição das pesquisas da temática de IE com a de liderança neste contexto entre os continentes americano, europeu e asiático. Existe uma escassez de estudos na África, na qual nenhum artigo foi encontrado.
Ao longo de três décadas de pesquisas de IE, modelos de abordagem do construto foram surgindo em busca de propor uma melhor compreensão e, até mesmo, viabilizando perspectivas diferentes sobre a IE, com propostas de instrumentos de avaliação variados. Dessa forma, para analisar uma pesquisa sobre um determinado construto, é de suma importância identificar qual modelo de compreensão foi adotado, bem como o teste utilizado, pois os dados obtidos trazem informações de aspectos diferentes da IE.
O modelo com mais aparições na pesquisa foi o de Habilidades de Mayer e colaboradores (1997; 2016). Como já pontuado, esse resultado pode se dar por serem esses os criadores do termo “Inteligência Emocional” e terem continuado a realização de pesquisas até o presente momento (Mayer et al., 2016). Outro ponto que merece destaque é que os autores também foram pioneiros na criação de testes de avaliação da IE com o desenvolvimento do Multifactor Emotional Intelligence Scale (MEIS) (Mayer, Caruso, & Salovey, 1999), precursor do MSCEIT (Mayer et al., 2002), altamente comercializado (O’Connor, Hill, Kaya, & Martin, 2019). Nesse sentido, é possível que as pesquisas neste contexto tenham optado por utilizar o teste de IE mais disponível no momento, ou o com mais facilidade de acesso pelo fato de que este também está disponível em outras línguas, com testes de validade (O’Connor et al., 2019). Portanto, pode-se sugerir que a questão de se disponibilizar bons instrumentos de avaliação, pode potencializar pesquisas de um determinado modelo.
O segundo modelo que mais apareceu teve três vezes menos artigos, o modelo de Competências (Boyatzis et al., 2000; Boyatzis & Goleman, 2002; 2014). Este resultado é diferente do encontrado na literatura recente (Hodzic et al., 2018) que não distingue um contexto específico e sim aborda a população geral, apontando que os dois modelos mais estudados de IE são o de Habilidades (Mayer et al., 1997; 2016) e o de Traços (Petrides, 2010; Petrides et al., 2007).
Nessa pesquisa, apenas dois estudos teóricos, nenhum empírico, tiveram como referência somente a IE de Traços. Esse dado mostra que a IE de Traços não tem sido tão utilizada nas investigações que relacionam à liderança no contexto do trabalho. Quanto ao modelo de Competência, foi verificada uma frequência bem menor do que os estudos com o modelo de Habilidades. Esse dado pode ter sido obtido pela popularização do livro de Daniel Goleman (1995) no meio organizacional. Outrossim, o modelo de Competências foi criado especificamente para o contexto organizacional. Como os dois modelos de IE mais utilizados no meio acadêmico são os Habilidades e Traços (Hodzic et al., 2018), pesquisas futuras poderiam investigar se no ambiente organizacional de modo geral, há uma tendência de estudos com o modelo de Competências ou apenas para a relação com a liderança.
Sobre os testes psicológicos de IE utilizados, os resultados apontam aumento do uso e variabilidade de testes de IE nas pesquisas da referida temática, no entanto os testes específicos ainda são poucos em quantidade e em uso. Diante disso, verifica-se a necessidade da construção de testes psicológicos de IE para o ambiente do trabalho contextualizados para a função da liderança e a elaboração de mais pesquisas nessa temática. Em especial no Brasil, não há testes específicos de IE para o contexto organizacional e somente há um teste de IE para a população geral e que pode ser utilizado na prática da psicologia, a Bateria Online de Inteligência Emocional- BOLIE (Miguel, 2021).
Também foi possível observar a predominância de testes de IE no formato de autorrelato nas pesquisas que relacionam a liderança no contexto do trabalho. Embora não haja um consenso teórico sobre como os itens de IE devem ser avaliados (Haag et al., 2021; Mayer et al., 2016; Schlegel & Mortillaro, 2019), é possível inferir que ter testes com variados formatos de pontuação pode ser bem plausível, pois formatos diferentes podem acessar dados distintos. Tal discrepância entre testes de autorrelato e de desempenho de IE, pode se dar pela dificuldade latente de se desenvolver itens que abordem características cognitivas e emocionais (Roberts et al., 2008). Além disso, nesta pesquisa o MSCEIT não foi o instrumento mais utilizado, diferente do que afirma Schlegel & Mortillaro (2019) sobre pesquisa de IE no contexto organizacional. A facilidade de aplicação e interpretação dos resultados do WLEIS (Wong & Law, 2002), podem ter contribuído para que ele fosse o teste mais utilizado.
Sobre a relação entre IE e liderança, observou-se um conjunto de dados que sustentam a importância dessa associação. Para um melhor entendimento dessa relação, decidiu-se verificar os resultados por tipo de liderança. Referente a Liderança Transformacional, esse tipo considera o líder como alguém que inspira positivamente, promove o desenvolvimento intelectual, estimula o bem-estar, a realização e autorrealização dos liderados (Bass, 1999), então o esperado são correlações positivas com a IE (Gregory & Levy, 2011; Khalili, 2017; Maamari & Majdalani, 2017), o que foi observado nesta revisão.
Os resultados sobre a relação de IE e Liderança Transacional que assume um papel mais passivo, ou seja, voltado para correções depois que falhas acontecem, não apresentaram dados congruentes. Ao observar o tipo de teste utilizado para avaliar a relação de IE e Liderança Transacional, nota-se que o único resultado significativo e negativo foi obtido quando um teste de IE de desempenho máximo (MSCEIT) foi utilizado. As análises que não apresentaram relação significativa ou foram positivas utilizaram testes de autorrelato, estes mais suscetíveis à desejabilidade social (Grubb III & McDaniel, 2007), além de que nem todas as pessoas possuem acurácia suficiente para responderem sobre si mesmas (Côté, 2014).
De um modo geral, nesta pesquisa, os resultados indicaram uma quantidade de correlações bem maior entre IE e Liderança Transformacional em comparação com a Transacional. Pesquisas futuras poderiam investigar de forma mais abrangente a incongruência encontrada para os estudos de IE e Liderança Transacional, abordando, inclusive, se há diferenças significativas entre as formas de se avaliar os dois tipos de liderança.
O desempenho do líder em relação à IE foi algo também investigado nesta pesquisa e os resultados, na sua maioria, sugeriram que existe correlação positiva entre estas variáveis, conforme previsto na literatura (Bradberry & Su, 2006; Choudhary et al., 2017; Groves & Feyerherm, 2011). Das pesquisas que investigaram tal relação, apenas duas utilizaram testes de IE avaliados com o formato de desempenho máximo – MSCEIT –, sendo que em uma delas a relação foi significativamente positiva e na outra não houve significância. Dos estudos que utilizaram testes de IE de autorrelato para avaliar a relação de IE e desempenho, a maioria apresentou relação significativa positiva. Isso indica que a IE, além de se correlacionar com um estilo de liderança que inspira positivamente e promover o desenvolvimento intelectual, também contribui de forma favorável para o desempenho profissional do líder.
Outro item importante para ser abordado é a falta de estudos no Brasil, pois foram encontrados apenas dois. Um dos artigos investigou os efeitos da inteligência, traços de personalidade e inteligência emocional na liderança transformacional e no desempenho efetivo dos líderes em uma grande empresa brasileira no setor de energia (Cavazotte et al., 2012). Os resultados indicaram correlações positivas utilizando para a avaliação da IE o WLEIS (teste de autorrelato). O outro estudo, Gonzaga e Monteiro (2011), verificou as relações entre a IE e a Qualidade de Vida em um grupo de gestores brasileiros em cargos de liderança utilizando o teste MSCEIT (desempenho) e obtendo um resultado de correlação positiva entre os fenômenos.
Pesquisas sobre IE e Liderança no contexto organizacional para população brasileira são necessárias para verificar se os dados favoráveis da relação entre essas variáveis ocorrerão, bem como entender o perfil dos líderes brasileiros em relação à IE. Essas informações são relevantes, uma vez que, no cenário nacional, a IE também é uma variável a ser requisitada pelas organizações nos perfis profissiográficos, em especial dos líderes, como alguns estudos internacionais demonstraram. Os estudos poderão embasar empiricamente a importância dessa demanda no contexto organizacional brasileiro.
Considerações Finais
Esse trabalho contribuiu para uma maior elucidação sobre como se dá a relação entre a IE e características da liderança no contexto organizacional ao revisar sistematicamente as pesquisas dos últimos 30 anos dessa temática. Outrossim, os resultados deste estudo corroboraram com a importância da IE na liderança, inclusive o seu impacto no desempenho dos líderes e também a necessidade de terem mais estudos no Brasil (apenas dois trabalhos foram encontrados) a fim de verificar se esses mesmos resultados seriam encontrados.
Buscas na maior base de dados internacional da Psicologia foram realizadas neste estudo – American Psychological Association (APA PsycINFO). Contudo, outras bases podem ser utilizadas em pesquisas futuras, bem como banco de teses e dissertações. Além disso, foram utilizados descritores apenas em inglês e português, o que pode limitar as buscas artigos em outros idiomas. Outros estudos também podem investigar sobre como são as pesquisas que envolvem intervenção de IE para líderes e a eficácia dessas intervenções.