O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno do neurodesenvolvimento, caracterizado por: déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, interesses fixados e comportamentos repetitivos e estereotipados. Pessoas com TEA são diagnosticadas através da sintomatologia e níveis pelos quais ela é manifestada. São popularmente indicados desde níveis com graus mais severos (baixo funcionamento) aos menos severos (alto funcionamento) (American Psychiatric Association, 2014).
A vida adulta de pessoas com Autismo é algo que deve ser considerado, do ponto de vista de sua inserção social, por meio de oportunidades ao ensino superior e ao mercado de trabalho. Porém, vários autores ressaltam que esse período é marcado pelo isolamento social (Talarico et al., 2019; Zanon et al., 2017).
No entanto, os avanços nas terapias e no oferecimento de serviços de suporte permitem a inclusão deste público no mercado de trabalho, o que acarreta em qualidade de vida e possibilita que as pessoas com TEA exponham e desenvolvam as habilidades já adquiridas (Talarico et al., 2019). A inclusão laboral pode estar associada a uma melhor qualidade de vida. Fatores como independência financeira, satisfação pessoal, atingimento de metas e sobrevivência possibilitam, além disso, acesso à cultura, à educação e ao lazer; consequentemente, promovem integração social. Porém, outra vertente teóricometodológica relacionada à inclusão de autistas no mercado de trabalho pode estar relacionada aos déficits de desenvolvimento apresentadas, como a dificuldade em habilidades sociais. A complexidade do mercado de trabalho envolve dificuldades e descontinuidades, questões estruturais e culturais que criam obstáculos ao acesso do trabalho (Leopoldino & Coelho, 2017).
Nesse sentido, evidencia-se que toda pessoa que é inserida no mercado de trabalho busca nele manter-se, o que envolve múltiplos fatores, desde os relacionamentos interpessoais aos mecanismos de regulação da atividade, que é a relação entre a tarefa prescrita e a tarefa efetiva (Falzon, 2018). Cita-se, dentre os desafios de pessoas com TEA em relação ao mercado de trabalho, a dificuldade delas em conseguir emprego, manter-se nele e obter uma colocação compatível com a sua formação e expectativas (Leopoldino & Coelho, 2017).
É possível respaldar-se na legislação para que, mesmo diante de desafios, o primeiro passo para a inserção seja o direito garantido. Desse ponto de vista, a lei n° 13.146/15 estabelece diretrizes para a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho. No artigo 34 insere que: "A pessoa com deficiência tem direito ao trabalho de sua livre escolha e aceitação, em ambiente acessível e inclusivo, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas". Também é assegurado que o poder público ofereça serviços de habilitação e reabilitação profissional a pessoas com deficiência, seja no tocante à acessibilidade às terapias multiprofissionais ou à garantai de características ambientais adequadas ao indivíduo.
Outra lei mais específica é a de n° 12.764/12, na qual estão estabelecidas diretrizes de proteção à pessoa com TEA, enfatizando o direito ao mercado de trabalho. Frisa-se, especialmente, o artigo 2°, inciso V, no qual se estabelece que: "o estímulo à inserção da pessoa com transtorno do espectro autista no mercado de trabalho, observadas as peculiaridades da deficiência e as disposições da Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente)".
Salienta-se que, mesmo sendo inserido e recebendo tratamento adequado, ainda existem dificuldades devido às manifestações características do autismo, como os déficits nas habilidades sociais. Ambientes que não dão suporte e adaptação a essas pessoas, promovendo discriminações e perseguições dos colegas e chefes, são fatores que não contribuem para a inserção e permanência da pessoa com TEA no mercado de trabalho e isso também é disparador de problemas em saúde mental (Leopoldino & Coelho, 2017; Talarico et al., 2019).
Conforme Leopoldino e Coelho (2017), há uma grande escassez de estudos sobre essa temática. Citam alguns fatores que podem estar associados, tais como: a inexistência de grupos de pesquisa voltados a área, poucos exemplos brasileiros de instituições que abordam a inclusão de autistas no mercado de trabalho, restrições de financiamento e obstáculos na natureza metodológica.
Em face dos grandes desafios que envolvem a inserção deste grupo na sociedade e no mercado de trabalho, questiona-se o que as pesquisas, nacionais e internacionais, tem identificado como os principais facilitadores e dificultadores do acesso e da permanência de pessoas com Transtorno do Espectro Autista no mercado de trabalho. Sendo assim, configura-se como objetivo levantar artigos que têm como objeto de estudo o acesso e a permanência de pessoas com autismo no mercado de trabalho.
Método
Essa pesquisa se trata de uma Revisão Integrativa (RI), de caráter exploratório e qualitativo. Esse tipo de estudo se fundamenta por seu rigor científico e se caracteriza como uma análise da literatura, o que possibilita uma síntese do estado da arte para encontrar as lacunas do conhecimento (Crossetti, 2012; Mendes et al., 2008).
Quanto aos procedimentos metodológicos da RI, verificou-se que na literatura são apresentadas diferenças no quantitativo de etapas e na forma de desenvolvimento. Nesse trabalho, foram adotados os procedimentos de Mendes et al. (2008) que relatam seis etapas para a concretização da pesquisa. São elas: (1) decisão do tema de pesquisa, objetivos hipótese e questão norteadora; (2) estabelecimento dos critérios de inclusão e busca dos artigos nas base de dados, (3) extração das informações e agrupamento em categorias, (4) análise dos resultados e análise crítica dos estudos, (5) interpretação dos resultados em discussão e propostas de estudos futuros e (6) síntese do conhecimento e descrição detalhada da revisão.
Diante da escolha da temática, os seguintes descritores foram calibrados no dia 05/06/2021 (Descritores em ciências da saúde - DeCS/MeSH): "Transtorno do Espectro Autista" AND "Mercado de Trabalho" OR "Autism Spectrum Disorder'' AND "Job Market" OR ""Trastorno del Espectro Autista" AND "Mercado de Trabajo". Prosseguiu-se com a escolha das bases de dados, a saber: Capes e Biblioteca integrada da UFPB. Salienta-se que se buscaram outras bases de dados, como Scielo, Medline e Pubmed. Porém, não foram encontrados artigos e, por isso, selecionaram-se as duas bases de dados descritas acima.
Os seguintes critérios de inclusão foram selecionados: artigos entre o período de janeiro de 2015 a maio de 2021; os artigos estarem nos idiomas português ou espanhol ou inglês; e serem relacionados à temática da pesquisa. Os de exclusão foram: artigos não disponíveis na íntegra, teses, dissertações e que não estejam relacionados à temática.
A partir dos critérios acima mencionados, realizou-se as buscas dos artigos que fizeram parte dessa revisão, nas bases de dados escolhidas, cujas etapas estão descritas na Figura 1. Além disso, os artigos foram analisados e descritos nos resultados através da frequência. Para o estabelecimento de categorias, foi realizada uma análise temática dos artigos, na qual foram estabelecidas três categorias para discussão.
Resultados e Discussão
Características dos Estudos
A partir da utilização dos descritores selecionados ("Transtorno do Espectro Autista" AND "Mercado de Trabalho" OR "Autism Spectrum Disorder" AND "Job Market" OR "Trastorno del Espectro Autista" AND "Mercado de Trabajo") foram encontrados os seguintes resultados: 83,51% (233) na Biblioteca Integrada da UFPB (BI-UFPB) e 16,49% (46) no Capes.
Diante do total de 279 artigos encontrados, foram selecionadas 16 publicações que atendiam aos critérios de inclusão da pesquisa, dentre essas 81,25% (13) na Biblioteca Integrada da UFPB (BI-UFPB), 12,5% (2) no Capes e 6,25% (1) nas duas concomitantes. Os artigos foram distribuídos da seguinte forma por ano: 12,5% (n = 2) em 2015, 12,5% (n = 2) em 2017, 31,25% (n = 5) em 2018, 25 % (n = 4) em 2019, 12,5% (n = 2) em 2020 6,25% (n = 1) em 2021. Tais resultados podem ser conferidos na Figura 2.

Nota. Fonte: dados da pesquisa. A porcentagem descrita na vertical significa a quantidade dos artigos que foram selecionados conforme o ano de publicação.
Figura 2 Quantidades de artigo por ano
Diante das análises pode se observar que o maior percentual de artigos foi publicado no ano de 2018 e a menor quantidade em 2021, não havendo quantitativo em 2016. Esses artigos foram selecionados conforme os critérios de inclusão estão descritos na Tabela 1.
Tabela 1 Descrição dos artigos (n = 16)
N° | Título | Autor / Ano | País | Base de Dados | Modalidade de Estudo | Amostra | Objetivo |
---|---|---|---|---|---|---|---|
1 | The Costs and Benefits of Employing na Adult with Autism Spectrum Disorder: A Systematic Review | Jacob et al. (2015) | Estados Unidos | BI-UFPB | Revisão Sistemática | 11 artigos | Examinar os custos, benefícios e a relação custo-benefício de empregar adultos com ASD, de uma perspectiva social e da perspectiva dos empregadores. |
2 | Vocational Rehabilitation Service Patterns and Outcomes for Individuals with Autism of Different Ages | Chen et al. (2015) | Estados Unidos | BI-UFPB | Pesquisa Quantitativa | 5.681 Pessoas com TEA divididas em três grupos: (1) 2718 "jovens em Transição" que tinham 18 anos ou menos; (2) 2162 "jovens adultos de transição'' que tinham entre 19 e 25 anos; e (3) 801 '' adultos'' com 26 anos ou mais. | Investigar os padrões de serviço e fatores relacionados aos resultados de emprego de indivíduos com TEA em diferentes grupos etários |
3 | O processo de Inclusão de Autistas no Mercado de Trabalho | Leopoldino e Coelho (2017) | Brasil | BI-UFPB | Revisão de Literatura | --------- | Apresentar o panorama do processo inclusivo de autistas no mercado de trabalho. |
4 | Predictors of employment status among adults with Autism Spectrum Disorder | Ohl et al. (2017) | Estados Unidos | BI-UFPB | Quantitativa e Correlacional | 254 adultos com TEA | Examinar as características e histórias de emprego de empregados e adultos desempregados com TEA e os fatores que contribuíram para o seu status de emprego. |
5 | Employers' perspectives regarding reasonable accommodations for employees with autism spectrum disorder | Nitzan e Schreuer (2018) | Israel | BI-UFPB | Estudo fenomenológico qualitativo | 11 Adultos Autistas | Aprender com os empregadores que experimentaram o emprego bemsucedido de pessoas com TEA. |
6 | Education and employment status of adults with autism spectrum disorders in Germany - a cross-sectional-survey | Frank et al. (2018) | Alemanha | BI-UFPB | Transversal | 428 pessoas com TEA maiores de 18 anos | Examinar a situação do emprego, o tipo de ocupação e o emprego inadequado em uma amostra de adultos com diagnóstico clínico, em sua maioria, com diagnóstico tardio e provavelmente não deficientes intelectuais com TEA na Alemanha. |
7 | Evaluating the Effectiveness of an Autism-Specific Workplace Tool for Employers: A Randomised Controlled Trial | Scott et al. (2018) | Austrália | CAPES | Experimental | 84 Adultos com TEA | Avaliar a eficácia da Integrated Employment Success Tool (IEST™) em melhorar a autoeficácia dos empregadores na modificação do local de trabalho para indivíduos no espectro do autismo. |
8 | Differential vocational rehabilitation service patterns and outcomes for transition-age youth with autism | Kaya et al. (2018) | Estados Unidos | BI-UFPB | Correlacional e quantitativa | 3.243 clientes de Reabilitação Vocacional (RV) com autismo, entre 19 e 25 anos, desempregados. | Investigar a relação entre variáveis demográficas, serviços de Reabilitação Vocacional (RV) e resultados de emprego para jovens com autismo. |
9 | Teaching an Adult With Autism Spectrum Disorder to Use an Activity Schedule During | Sances et al. (2018) | Estados Unidos | BI-UFPB | Experimental (Delineamento de reversão A-B1-B2-A) | Um homem diagnosticado com TEA | Investigar até que ponto um cronograma de atividades aumentou a realização de tarefas apícolas independentes em um adulto com TEA. |
10 | Políticas Públicas e o Transtorno do Espectro Autista | Sargento e Lopes (2019) | Brasil | BI-UFPB | Revisão de literatura, pesquisa qualitativa | ---------- | Analisar e identificar as estratégias de inclusão das pessoas com autismo no mercado de trabalho. |
11 | Utilização da realidade virtual como ferramenta para indivíduos com Transtorno do Espectro Autista no Mercado de Trabalho: Uma revisão sistemática | Monteiro e Adamatti (2019) | Brasil | BI-UFPB | Revisão Sistemática | 06 artigos | Analisar os trabalhos que vêm sendo realizados na área e quais as vantagens e desvantagens da utilização desta tecnologia para auxiliar essa população específica |
12 | A Confict of Interests: A Motivational Perspective on Special Interests and Employment Success of Adults with ASD | Goldfarb et al. (2019) | Israel | BI-UFPB/CAPES | Reflexão teórica | ----------- | Não descreveu objetivo. |
13 | Training Car Wash Skills to Chinese Adolescents With Intellectual Disability and Autism Spectrum Disorder in the Community | Lee et al. (2019) | China | BI-UFPB | Experimental (sonda múltipla em quatro tarefas) | 03 adolescentes na faixa etária de 16 a 19 anos | Avaliar os efeitos da modelagem de vídeo e análise de tarefa visual na aquisição, manutenção e engajamento de lavagem de carros para três adolescentes chineses com deficiência intelectual e transtorno do espectro do autismo. |
14 | Autism and Employment: Implications for Employers and Adults with ASD | Solomon (2020) | Estados Unidos | BI-UFPB | Revisão de literatura | ------------ | Não descreveu objetivo. |
15 | A descriptive, qualitative study of the challenges that individuals with autismo spectrum disorder experience when transitioning from skills training programs into the open labor Market in cape town, South Africa | Soeker (2020) | África | BI-UFPB | Pesquisa exploratória, descritiva e qualitativa | 10 participantes, diagnosticados com TEA, e trabalhando no mercado de trabalho aberto, bem como 05 informantes-chave, que trabalharam com indivíduos autistas. | Explorar as experiências e percepções de indivíduos que vivem com TEA, em relação à transição de um programa de treinamento de habilidades para trabalhar no mercado de trabalho aberto. |
16 | Inclusão pelo trabalho: participação de um indivíduo com Síndrome de Asperger em atividade de uma instituição de ensino | Melo et al. (2021) | Brasil | CAPES | Pesquisa exploratória, qualitativa, estudo de caso | 01 aluno regular da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) da cidade de Bambuí/MG e participa desde 2017 de um programa especial de capacitação em ferramentas de informática no próprio laboratório da instituição. | Apresentar como foi a participação de um indivíduo com Síndrome de Asperger em um ambiente real de trabalho durante a execução de diversas atividades |
Diante da tabela 1, pode-se identificar que a maioria dos estudos encontrados eram do tipo pesquisa de campo (n = 11; 68,75%), os demais foram estudos de cunho teórico abrangendo a revisão de literatura, revisão sistemática e reflexão teórica (n = 5; 31,25%). Também foi possível identificar que 37,5% dos estudos pertenciam ao contexto Estadunidense, 25% ao contexto brasileiro, 12,5% Israelense, 6,25 % na Alemanha, Austrália, China e África.
A partir da análise temática dos artigos dessa revisão, três categorias foram encontradas e discutidas a seguir: Empregabilidade de pessoas com TEA; Dificuldades na inclusão de pessoas com TEA no Mercado de Trabalho; e Suportes para a efetiva inclusão de pessoas com TEA no Mercado de Trabalho.
Empregabilidade de Pessoas com TEA
Dentre os artigos elegidos na presente pesquisa, foram levantadas algumas questões sobre a empregabilidade da pessoa com TEA, como o que o trabalho representa para as pessoas com TEA; variáveis associadas ao trabalho e, também, foram levantados fatores preditivos a empregabilidade.
O trabalho, antes considerado como fundamental na constituição da identidade e dignidade de um indivíduo, que transformou sua realidade em uma nova oportunidade de sociabilidade, passa a ser considerado uma narrativa instrumental e um bem de consumo, no qual o indivíduo deve ser produtivo e eficiente (Sargento & Lopes, 2019). No entanto, existe concordância na literatura que, para a pessoa com TEA, o trabalho tornou-se um meio de transformação que gera autonomia, independência e identidade (Jacob et al., 2015; Sargento & Lopes, 2019). Além disso, Jacob et al. (2015) argumentam, em seu estudo de revisão sistemática, que o emprego passa a ser considerado e analisado como um custo-benefício nos casos de adultos com TEA, já que esse grupo requer um processo de reabilitação profissional que implica investimentos financeiros altos para a empresa e que parece compensar, visto que eles têm chances de se tornarem empregados.
Realocar adultos com TEA no mercado de trabalho deve constituir uma política pública, que contemple atividades como:
(a) preparar os indivíduos para desenvolver suas habilidades sociais e vocacionais, permitindo oportunidades de empregabilidade e autonomia a esses profissionais;
(b) o encaminhamento dessas pessoas para o mercado de trabalho, no qual torne-se possível reconhecer as potencialidades;
(c) o ajuste do ambiente laboral, para que sejam disponibilizados suportes materiais e apoio psicossocial; e
(d) acompanhar o processo que ocorre entre pessoas com TEA, entidades empregadoras, formadoras e encaminhadoras, cujo objetivo é aprimorar a eficiência e a qualidade das práticas adotadas na inclusão dos profissionais com TEA no mercado de trabalho (Leopoldino & Coelho, 2017; Ohl et al., 2017).
A empregabilidade também foi uma variável associada ao diagnóstico da pessoa com TEA. Nesse sentido, Ohl et al. (2017) verificaram que um fator que implicou na contratação de pessoas com TEA foi a divulgação do diagnóstico, tendo em vista que aqueles que o fizeram tiveram três vezes mais chances de serem empregados. Uma variável convergente com os resultados dos estudos anteriores é o diagnóstico tardio de pessoas com TEA, tendo em vista que apesar das qualificações formais, esses adultos estavam em desvantagem no mercado de trabalho alemão, principalmente no tocante às taxas de desemprego, aposentadoria precoce e educação excessiva (Frank et al., 2018). Esse fato pode ser explicado porque as pessoas que divulgaram seu diagnóstico ou tiveram diagnóstico precoce, tiveram mais chances de serem incluídas na reabilitação vocacional, tendo um tratamento adequado, no ambiente de trabalho, conforme o diagnóstico.
Alguns fatores preditivos no tocante a empregabilidade de pessoas com TEA foram encontrados na literatura. Os autores Ohl et al. (2017) e Kaya et al. (2018) concordaram que o nível de escolaridade alto foi fator preditivo significativo ao status de emprego adquirido. Vale ressaltar que, conforme Chen, Sung e Pi (2015), pessoas com TEA em idade de transição (18 anos ou menos) tiveram condições de emprego mais pobres ao serem comparadas com aqueles em idade adulta (26 anos ou mais). Nesse caso, pessoas com TEA em idade de transição teriam uma escolaridade menor e, por isso, um consequente status de emprego menor.
Fatores preditivos, como gênero masculino e estar em menor período no serviço de reabilitação vocacional, também foram associados positivamente ao fato de ser bemsucedidos no emprego (Kaya et al., 2018). No entanto, aqueles que permaneceram por um longo período na reabilitação vocacional e receberam benefícios em dinheiro tinham menor probabilidade de serem bem-sucedidos nos empregos. O fato de algumas pessoas com TEA passarem menos tempo no serviço de reabilitação, provavelmente, implicou na evolução de habilidades para permanecerem no trabalho.
Dificuldades na Inclusão de Pessoas com TEA no Mercado de Trabalho
Dentre os artigos verificados, na presente pesquisa, sobre a inclusão de adultos de adultos com TEA no mercado de trabalho, foram identificadas várias barreiras ou dificuldades na prática inclusiva. Dentre elas, existem as dificuldades para sanar a falta de conhecimento sobre as características do TEA e para a remoção das barreiras existentes no ambiente de trabalho e na implementação de acompanhamento para com os adultos com TEA. Em relação a esse último fator, há a necessidade de ações dos empregadores diante das necessidades dos funcionários e das motivações para aprender soluções para os desafios (Nitzan & Schreuer, 2018). Essas barreiras podem ser: (a) as percepções dos empregadores sobre os empregados, relativas a um trabalho malsucedido e/ou até de uma dependência dos adultos com TEA; (b) as motivações para contratar um funcionário, com base na valorização do benefício e do valor representativo para o ambiente e os colegas de trabalho; e (c) a acessibilidade do ambiente que são significativas para integração dessa população, (d) ao preconceito dos empregadores, (e) a falta de preparo vocacional das pessoas com autismo, (f) a ineficácia das cotas para pessoas com deficiência e (g) a ausência de incentivos (Leopoldino & Coelho, 2017, Nitzan & Schreuer, 2018).
Dentre as dificuldades encontradas para inserção no Mercado de Trabalho está o preconceito dos empregadores, que dificulta o acesso dos adultos com TEA às empresas, impedindo o reconhecimento da capacidade dos profissionais que apresentam autismo, assim como a percepção exacerbada de inconveniências e potenciais incorridos na hora da contratação (Leopoldino & Coelho, 2017). Vale ressaltar que uma das principais dificuldades enfrentadas pela pessoa com TEA é a estigmatização, que aumenta a ansiedade de retorno ao trabalho (Soeker, 2020).
A falta de vagas de boa qualidade é outro contraponto que desestimula o ingresso ao mercado de trabalho das pessoas com deficiência. Nos casos de pessoas com TEA, o acesso costuma ser limitado a empregos sub-remunerados, com menos carga horária e sem possibilidade de crescimento (Leopoldino & Coelho, 2017; Ohl et al., 2017).
Existem fatores importantes no ambiente de trabalho que inibem ou facilitam a inclusão de pessoas com TEA no mercado de trabalho, tais como características pessoais, acessibilidade do local de trabalho no contexto da organização, clima de gestão e justiça. Além disso, existem muitas dificuldades e preconceitos no tocante ao ingresso do mercado de trabalho e ao desenvolvimento da autonomia de forma plena (Melo et al., 2021; Nitzan & Schreuer, 2018).
Suportes para a Efetiva Inclusão de Pessoas com TEA no Mercado de Trabalho
Dentre os artigos verificados, na presente pesquisa, que tratam dos suportes para a efetiva inclusão de pessoas com TEA no mercado de trabalho, foram identificadas leis que resguardam o processo inclusivo e direcionamentos para uma efetiva prática inclusiva.
A inclusão da pessoa com TEA no mercado de trabalho está fundamentada na Lei n° 8.213/91 (Lei das Cotas), a qual prevê de 2% a 5% das vagas para pessoas com deficiências nas empresas com 100 ou mais empregados. Também a Lei n° 12.764/12, denominada popularmente de Lei Berenice Piana e específica para a pessoa com TEA no Brasil, assegura o acesso e o estímulo à inserção da pessoa com TEA ao mercado de trabalho, considerando suas peculiaridades.
Outra política inclusiva é a Lei n° 13.146/2015, mais conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência ou Lei Brasileira da Inclusão (LBI), na qual está prevista que a pessoa com deficiência tem direito ao acesso e inclusão no mercado de trabalho, com livre escolha e salários iguais. Também é assegurado que o poder público ofereça serviços de habilitação profissional a pessoas com deficiência. No caso da pessoa com TEA, poderia ser através do acesso as terapias multiprofissionais.
Para a efetivação do processo inclusivo de pessoas com TEA e amenização das barreiras encontradas, Leopoldino e Coelho (2017) elencam quatro dimensões de políticas públicas, que são importantes de serem instauradas, tais como: preparação para atuação profissional, incentivo a contratação, fomentação à produção cientifica, e aquisição de informações precisas sobre a questão.
Para superar alguns entraves, pode-se explorar as habilidades das pessoas com TEA, visto que parte desse grupo tem facilidades na realização de funções repetitivas e na memorização de detalhes (Leopoldino & Coelho, 2017). Salienta-se que é importante considerar o nível de autismo e o tipo de emprego que pode se relacionar com as suas habilidades (Kaya et al., 2018).
Soeker (2020) sugere que seria importante um sistema de apoio mais forte no ambiente de trabalho, aumentando o conhecimento sobre as características da pessoa com TEA entre os empregadores e os colegas de trabalho. Um fator de adaptação poderia ser programas de reabilitação profissional de boa qualidade.
Algumas ferramentas foram encontradas como forma de suporte, sendo uma delas a realidade virtual que gera independência na pessoa com TEA em contexto de trabalho, embora com pesquisas ainda incipientes (Monteiro & Adamatti, 2019). Outra é a Ferramenta Integrada de Sucesso do Emprego (IEST™), eficaz para uma boa confiança e o conhecimento dos empregadores na modificação do ambiente de trabalho da pessoa com TEA, mas que precisa ser melhor investigada em grupos maiores de empregadores com pouca ou nenhuma experiência anterior (Scott et al., 2018). Além dessas ferramentas práticas, os horários de atividade implicaram no aumento da independência em diversas tarefas realizadas, resultando em um uma porcentagem maior de etapas concluídas corretamente. No entanto, os autores ressaltam que ocorreram limitações que implicaram na confiabilidade do estudo (Sances et al., 2018). Com isso, outros estudos se fazem necessários e que considerem as variáveis abordadas.
Vale enfatizar uma prática de inclusão de pessoas com TEA no mercado de trabalho: treinamento de adolescentes chineses para aquisição, manutenção e generalização de habilidades para a função de lavagem de carros, utilizando-se dos princípios da Análise do Comportamento, cujo procedimento é a videomodelação. Nesse procedimento foram encontradas muitas respostas independentes nas tarefas para todos os participantes e um alto nível de engajamento pós treinamento em dois dos três participantes (Lee et al., 2019).
Outra abordagem teórica encontrada para utilização na inclusão da pessoa com TEA foi a teoria da autodeterminação da motivação. Salienta-se que não tem pesquisa de aplicação na área, mas inferências de que pode dar certo com esse público. Tendo em vista que eles têm interesses especiais e essa teoria se associa aos interesses especiais com o emprego remunerado, considerando uma perspectiva da motivação extrínseca. Nesse sentido, o que define a autodeterminação são os diversos tipos de motivação extrínseca (Goldfarb et al., 2019).
Considerações Finais
O objetivo geral desse estudo foi levantar artigos que têm como objeto de estudo o acesso e a permanência de pessoas com autismo no mercado de trabalho. De modo geral, foram encontrados estudos que explicitaram o que significa o acesso ao emprego e variáveis que influenciavam esse acesso, assim como foram encontrados fatores (dificuldades e suportes) que influenciavam a permanência da pessoa com TEA no mercado de trabalho.
No tocante à primeira categoria (Empregabilidade de pessoas com TEA), os principais aspectos encontrados foram: (1) para a pessoa com Autismo, o trabalho tornou-se um meio de transformação que gera autonomia, independência e identidade; (2) um diagnóstico esclarecido influencia na oportunidade de uma reabilitação vocacional no ambiente de trabalho; (3) a escolaridade alta influencia o alto status de emprego e (4) o período de tempo na reabilitação vocacional influencia a permanência no emprego. No tocante à segunda categoria (Dificuldades na inclusão de pessoas com TEA no Mercado de Trabalho), as seguintes barreiras foram encontradas: (1) a falta de conhecimento sobre as características do TEA, (2) as percepções dos empregadores sobre os empregados, advindas de um trabalho malsucedido; (3) a falta de preparo vocacional das pessoas com autismo, (4) a ineficácia das cotas para pessoas com deficiência e (5) a ausência de incentivos. Já na terceira categoria (Suportes para a efetiva inclusão de pessoas com TEA no Mercado de Trabalho), as principais perspectivas encontradas foram: (1) a inserção de um sistema de apoio mais forte no ambiente de trabalho, (2) aumentar o conhecimento sobre as características da pessoa com TEA e (3) manter a qualidade no programa de reabilitação profissional.
Diante disso, pode-se dizer que essa revisão sistemática contribuiu para a compreensão sobre a inserção e a permanência de pessoas com TEA no mercado de trabalho. As principais limitações desse estudo foram os escassos estudos com delineamentos mais robustos e que demonstrem de forma prática a intervenção para inclusão da pessoa com TEA no mercado de trabalho, assim como a variedade de termos relacionada ao TEA.
Com isso, sugere-se pesquisas futuras com delineamentos mais robustos, outros estudos de revisão sistematizada com a ampliação dos termos, visto que existe uma ampla variação de terminologias relacionadas ao TEA, como por exemplo, termos como Asperger e Autismo. Além disso, são necessárias mais pesquisas de campo que enfatizem princípios práticos para a intervenção da pessoa com TEA conforme o nível de gravidade e que sejam passíveis de generalização. Também serão importante estudos futuros sobre a aplicação prática de suportes a pessoas com TEA no mercado de trabalho assim como estudos que ressaltem os serviços de habilitação e reabilitação profissional oferecidos a pessoas com TEA.