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Trivium - Estudos Interdisciplinares
versión On-line ISSN 2176-4891
Trivium vol.10 no.1 Rio de Janeiro enero/jun. 2018
https://doi.org/10.18379/2176-4891.2018v1p.24
ARTIGOS TEMÁTICOS
Leitura de um mal-estar na contemporaneidade: sexo, gênero e sexuação
A Reading of a malaise in contemporaneity: sex, gender and sexuation
Una lectura de un malestar en la contemporaneidad: sexo, género y sexuation
Claudia de Moraes RegoI; Carolina Costa MarcondesII
IDoutora em Psicanálise pela Pontifícia Universidade Católica - Rio. Coordenadora de Seminários de teoria e clínica psicanalítica na Letra Freudiana (Rio de Janeiro). Endereço: R. Marquês de São Vicente, 225 - Gávea, Rio de Janeiro - RJ. E-mail: cmrego@terra.com
IIMestranda do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Endereço: R. São Francisco Xavier, 524 - Sala 1006 A - Maracanã, Rio de Janeiro - RJ
RESUMO
Este artigo se propõe, partindo da leitura de O diário de um hermafrodita de Michel Foucault (1978/1983), a trabalhar duas operações: em primeiro lugar, a análise do que chamamos um mal-estar na contemporaneidade, criado pelo encontro do autor com as memórias de Herculine Barbin, um sujeito intersexo nascido em 1838; em segundo lugar, uma leitura psicanalítica das memórias de Herculine Barbin.
Palavras-chaves: HERMAFRODITISMO, ERRO, VERDADEIRO SEXO, VERDADEIRO GÊNERO, SEXUAÇÃO.
ABSTRACT
This article proposes, starting from the reading of Michel Foucault's book Herculine Barbin dite Alexina Birbin two operations: first, the analysis of what we call a malaise in contemporaneity, created by the encounter of the author with the memories of Herculine Barbin, an intersex subject born in 1838; second, a psychoanalytic reading of the memories of Herculine Barbin.
Keywords: HERMAPHRODITISM, ERROR, TRUE SEX, TRUE GENDER, TRUE SEXUATION.
RESUMEN
Este trabajo se propone, partiendo de la lectura de Herculine Barbin dite Alexina Birbin de Michel Foucault dos operaciones: en primer lugar, el análisis de lo que llamamos un malestar en la contemporaneidad, creado por el encuentro del autor con las memorias de Herculine Barbin, un sujeto intersexo nacido en 1838; en segundo lugar, una lectura psicoanalítica de las memorias de Herculine.
Palavras claves: HERMAFRODITISMO, ERROR, VERDADERO SEXO VERDADERO GÉNERO, SEXUACION
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"O verdadeiro, por mais exorbitante que seja, não ultrapassa às vezes todas as concepções do ideal?
As metamorfoses de Ovídio não estariam próximas disso?" (Foucault, M. 1978/1983)
O destino inglório que padeceu a publicação da pesquisa de Michel Foucault, em 1978, parece-nos bem representativo de um momento em que as relações de poder estavam em cheque - as agitações de 1968 -, mas as questões de gênero ainda não tinham adquirido a dimensão que têm hoje: um poder-fazer com o gênero relacionado às identidades trans. A militância trans junto a outros segmentos, como a academia e a defensoria pública, abriram caminho para a possibilidade de demandar uma identidade costurada ao gênero, no laço social. Recentemente, no dia 1º de março de 2018, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a retificação registral será feita cartorialmente e dispensa a intervenção cirúrgica como pré-requisito para a retificação de documentos civis. A identidade de gênero consolida-se, assim, como um direito. Em 1978, no entanto, o livro desapareceu de circulação, além de ter passado despercebido. Fez-se silêncio em torno dele. Como diz Lacan, "as ideias caminham pelas profundezas do gosto" e, em 2014, surgiu uma nova edição com o prefácio de Foucault, que, sintomaticamente, não fora publicado na primeira edição francesa, acrescido de um posfácio de Eric Fassin. O livro foi publicado no Brasil pela Francisco Alves em 1983, com tradução de Irley Franco e apenas com o prefácio de Foucault. Daí o interesse em fazer uma leitura desse importante mal-estar na história dos sujeitos sexuados.
Se a "anatomia é o destino" (Freud, 1912/1976), segundo Freud, e as identificações e a sexuação se decidem como consequências psíquicas da diferença anatômica entre os sexos, como pensar no indivíduo hermafrodita? Vale lembrar que etiologicamente o verdadeiro hermafrodita enquanto aquele que comporta o masculino e o feminino proporcionalmente não existe. Paradoxalmente, o "verdadeiro" hermafrodita seria o mítico.
Qual o panorama do hermafroditismo, hoje nomeado intersexo?
A mesma ciência que serviu à insuportabilidade de não poder decidir dentro do binômio menino ou menina, emprestando suas grandes descobertas no campo da embriogênese e da endocrinologia às novas técnicas cirúrgicas, esta mesma ciência, determinou que os bebês nascidos com anatomia incerta fossem operados bem precocemente. A questão era essencialmente médica. Em outras palavras, tanto no caso dos bebês intersexo quanto dos transexuais(1), a ciência põe-se a serviço de corrigir a discrepância no primeiro caso, anatômica e no segundo, de gênero. Mantém-se assim a norma heterossexual cisgênera.
Os estudos recentes levados a cabo por biólogas feministas revelaram que em cada 1000 nascimentos, 4 têm anatomias com graus variáveis de incerteza. Esses estudos levaram a retificações das denominações. Novo significante surge: intersexo e cria-se a ISNA (Intersex Society of North America)(2). Esse grupo iniciou um amplo trabalho de levantamento de dados, numero de cirurgias, follow-up dos "pacientes", organizou os pais destas crianças oferecendo-lhes apoio, testemunhos, grupos de discussão e estabeleceu uma agenda de reivindicações no sentido de dar escuta e escolha a esses sujeitos. Além disso, ainda marcando o interesse da psicanálise na questão dos intersexos, surgiu, nos anos 1950, o conceito de gênero a partir exatamente do manejo dos bebês intersexuais. John Money era um psicólogo behaviorista e sexologista que entendia ser o gênero algo que se ensina e se aprende, em absolutamente nada dependente da biologia. Seria, portanto, perfeitamente controlável pelos aparatos sociais, sem nunca levar em conta o desejo e as identificações do sujeito, nem sua sexuação. O que Money intitula sexo psicológico, para diferenciar do sexo biológico, era aprendido(3).
Há em O diário de uma hermafrodita, um vetor que atravessou desde o tempo do prefácio de Foucault até o posfácio de Eric Fassin. O prefácio de Foucault intitula-se "O Verdadeiro sexo" e o posfácio "O verdadeiro gênero".
Foucault "sonha", em seu prefácio, com uma total liberdade para os sujeitos com seus corpos e prazeres. Há um ideal libertário. Algo como a sexualidade infantil polimorfa que não conheceria recalque. "Corpos e prazeres" prescindiriam de identidade, identificações e gêneros. Essa visão é bastante contraditória, pois é o próprio Foucault que entende que o sujeito se constitui assujeitado às relações de poder, podendo opor-se criativamente às mesmas. Já Fassin endossa a crítica de Butler a Foucault, segundo a qual não há sexualidade sem lei, não há sexo antes da lei, porque não há realidade natural pré-discursiva. Mas Fassin, além de historiar o destino do texto de Foucault, debruça-se sobre uma análise de porque Herculine teria renunciado à sua amada Sara, depois de ter sua designação civil corrigida para sexo masculino. Para ele, aí se mostrou seu "verdadeiro" gênero, lembrando que Abel (seu nome masculino) nunca mais se envolveu amorosamente com ninguém até seu suicídio. Propomos aqui que o que se revelou foi a sexuação, ou seja, a orientação de gozo.
O "verdadeiro" hermafrodita, o mítico, está em "As metamorfoses" de Ovídio. Na obra, Ovídio, poeta da Antiguidade Clássica, relata 282 metamorfoses diferentes. A metamorfose em Ovídio é apresentada como um evento sobrenatural que, contudo, apresenta uma espécie de continuidade com o natural. O ser que é metamorfoseado em animal, planta ou pedra não morre propriamente, permanece de alguma maneira neste outro. Em Ovídio, a metamorfose significa que a forma muda, mas mens manet, a mente permanece. Os deuses são os responsáveis pela metamorfose: interferem com os homens como forma de punir, opinar, salvar. Em alguns casos, a metamorfose pode precipitar-se em decorrência de um grande sofrimento. O outro da metamorfose participa, porém, do eu. O tema da metamorfose em Ovídio parece apontar para essa divisão entre o corpo e o eu. Em tal caso, o eu é sede de identidade. Algo dessa cisão aparece nos sujeitos primeiramente ditos e que posteriormente se dizem trans, de uma forma. Segundo Castel em "A Metamorfose Impensável" (Castel, 2003, p. 12), a metamorfose trans abala a razão. Sim, porque a questão do verdadeiro é uma questão filosófica, no nosso caso, o 'verdadeiro' sexo (Foucault) e o 'verdadeiro' gênero (Fassin). Castel é um filósofo que se aventura nas teorias sobre a transexualidade. Em suas palavras, um objeto bizarro no austero campo da filosofia das ciências. Propõe pensar a desrazão como o avesso da razão, do mesmo modo que Foucault: não haveria a razão sem a loucura, seu duplo negro ou sua sombra clara. Nada de Descartes, que exclui a loucura centrando o ser no "penso". O sujeito que pretende a metamorfose ou que, como Herculine, padece de uma, coloca sua razão a serviço de uma intuição exorbitante: não ter nascido no corpo certo. Segundo Castel, trata-se de uma verdade privada e não um delírio. A psicanálise, por sua vez, tem uma longa história de questões sobre a verdade. Desde Freud, com os conceitos de próton pseudos (Freud, 1950/1969, p. 463) e "realidade psíquica" (Freud, 1900/1969, pp. 651 e 658), a distinção entre verdade histórica e verdade fatual (Freud, 1923/1969, p. 179), e afirmações como "não há nada para o qual o ser humano esteja menos preparado do que a busca da verdade" (Freud, 1939, p. 22), passando por Lacan, ao afirmar que a verdade tem estrutura de ficção (Lacan, 1998, p. 822) e "a verdade é de fala e só pode ser meio dita" (Lacan, 2003, p. 454).
Hermafrodito era filho de Hermes (ou Mercúrio) e Afrodite (ou Vênus). Representaria a fusão de dois sexos e não tem gênero definido. Extremamente bonito, transformou-se num ser andrógino quando se uniu à Salmacis, uma ninfa. Ovídio (2003) relata que Hermafrodito foi levado por ninfas até o monte Ida, montanha sagrada da Frígia (hoje Turquia). Quando fez 15 anos, viajou para Cária. Estava em um bosque quando encontrou Salmacis, uma ninfa, em sua humilde casa amarela na beira de um lago. Salmacis fica apaixonada pela beleza de Hermafrodito e tenta seduzi-lo, mas é rejeitada. Acreditando-se sozinho, Hermafrodito se despe e mergulha no lago. Salmacis sai de detrás de uma árvore e mergulha no lago enlaçando o jovem e beijando-o violentamente. Enquanto Hermafrodito tentava desvencilhar-se, Salmacis invoca os deuses, pedindo-lhes que nunca mais se separassem. Seu desejo foi atendido e, como frequentemente acontece com os deuses, a escuta é meio literal, desastrada (ou será irônica?): seus corpos foram misturados numa forma intersexual. Hermafrodito faz seu próprio voto, amaldiçoando o lago de forma que todo aquele que se banhasse ali seria igualmente metamorfoseado.
O mito de Hermafrodito, mais do que qualquer outra coisa, aponta para a impossibilidade de fazer um com o outro. Os deuses, atendendo à demanda de Salmacis, desastradamente, ou seja, não a atendendo, como um psicanalista: "Não quer se separar dele? Então vire um com ele!" Ora, o hermafroditismo aqui aparece como uma metamorfose sim, mas metáfora de uma impossibilidade. Além disso, mesmo antes da metamorfose já se observa certa inversão de atitudes; Salmacis é muito ativa e atirada e Hermafrodito é negaceador e recatado.
Mas há outro mito, o de Tirésias, que nos permite elaborar mais sobre o transicionar. Tirésias transita entre os gêneros sem transição de sexo. Vamos recordar. A partir de um ato fortuito, cai-lhe sobre os ombros a possibilidade de transitar entre homem e mulher. Nesse estado transicionado, adquire um saber que é objeto de respeito e interesse por parte dos deuses que o convocam a testemunhar e opinar. Qual é a questão? Entre Hera e Zeus, uma disputa sobre o valor do gozo: quem goza mais? Tirésias, por ter estado nos dois gêneros, deveria saber. Hera posiciona-se: acha que os homens gozam mais. Suponho que Zeus achasse o contrário, que as mulheres gozariam mais. Ambos parecem crer que há um gozo a mais do qual estão excluídos. Tirésias, com seu saber, impõe um revés a Hera que o pune com a cegueira. Esse saber sobre um gozo a mais demanda punição. Não pode ser dito. Um limite impõe-se ao saber. Quanto ao transicionar-se, gostaria de chamar a atenção para o ato gratuito que origina tudo, ao qual o sujeito está submetido sem querer nem saber, embora seja o agente. Parece-me uma indicação de um real que permanece opaco para o sujeito. Como se ser homem ou ser mulher fosse obra de um acaso. E será? Insondável?
Voltando à nossa questão, hoje a transição ou a transpectiva (Bourseul, 2016) (termo cunhado por V. Bourseul, em seu livro "Le sexe reinventé par le genre") que equivale ao próprio registro da pulsão freudiana, tem-se alocado em questões identitárias. A psicanálise aponta para a economia do gozo, abordada por Lacan nas fórmulas da sexuação (Lacan, 2001).
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Vamos agora proceder à nossa proposta: uma leitura psicanalítica do texto de Herculine Barbin.
Quando escrevemos Foucault/Barbin, percebemos ecos de outros casos: Freud/Schreber, ou Delay/Gide. Recordemos as circunstâncias: Freud (1969) se debruça, enquanto analista, sobre as memórias de Schreber reconhecendo ali um depoimento verídico acerca do delírio. Jean Delay, psiquiatra e escritor, membro da Academia Francesa de Letras, escreve uma alentada biografia de André Gide a partir de seus diários e Lacan, seu contemporâneo, lendo Delay e Gide, escreve "Jeunesse de Gide ou a letra e o desejo" (Lacan, 1998), em que aborda a obra e a vida de Gide a partir da psicanálise.
Aqui, temos as memórias de Herculine Barbin descobertas por Foucault, sua iniciativa de publicá-las e seu prefácio. Nossa abordagem do caso Barbin/Foucault busca historicizar o mal-estar sobre o corpo de Herculine desde 1978, ano da publicação das memórias de Barbin, até 2014 quando, uma nova edição, com o prefácio de Foucault e um posfácio de Eric Fassin, foi lançada. Trata-se de uma abordagem da trajetória, do século XX ao século XXI, das questões acerca da sexualidade, identificações e sexuação, pensadas com conceitos psicanalíticos como o mal-estar na civilização, resto da renúncia pulsional, que se atualiza em momentos diferentes da História, e a máxima lacaniana 'A relação sexual é impossível'.
Foucault é um historiador atravessado pela questão de como as relações de poder (pensamos aqui na relação ao Outro lacaniano) submete os sujeitos e como estes vêm a se opor criativamente a esse assujeitamento, especificamente nas questões das sexualidades. Mas não só neste ângulo: Foucault pretendia incluir as memórias de Barbin junto à confissão de Pierre Rivière na sua "Vida dos Homens Infames" (Foucault,2003). Os homens infames são exatamente aqueles insurgentes que só se fazem notórios, quando isso acontece, por sua situação de transgressão às normas. Mas não chegou a fazê-lo.
Algumas palavras sobre as escritas autobiográficas se fazem necessárias. É claro que o esforço de fazer um relato sobre si, na maior parte dos casos, implica uma fantasia de dizer toda a verdade ou da parte do leitor, saber do mais íntimo de quem relata. Mas, como a psicanálise revelou, o sujeito não pode dizer tudo de si porque é um sujeito dividido. Há um saber não sabido que pode atravessar o texto autobiográfico. Nossa pergunta é: qual o estatuto desta 'escuta' da escrita de um sujeito, pretensão do psicanalista, que não é apenas uma leitura do escrito? É claro que este analista como qualquer sujeito, está atravessado por sua circunstância histórica, como foi o caso com Freud e Lacan. Em nosso caso, há um lapso de 1978 até 2018, trinta e nove anos marcados por grandes inquietações na cultura: 1968, na França e em outros lugares, a primeira onda feminista, libertária, a que se seguiram outras; o fortalecimento do discurso do capitalista, em sua "estranha cópula" (Lacan, 2003) com o discurso da ciência, tudo isso determinado pelo final da Segunda Guerra Mundial e pela declaração universal dos Direitos do Homem em 1948.
Enfim, será possível tentar uma escuta deste sujeito que escreveu em 1860? É o que nos propomos, com as balizas do prefácio de Foucault em 1978 e do posfácio de Fassin em 2014, que marcou, em nosso entender, o levantamento de um recalcamento que submergira o texto de Foucault e a própria fortuna das memórias de Barbin.
A bússola desta análise será a questão da sexuação do sujeito, através do conceito de héteros de Lacan, citado em O Aturdito (Lacan, 2003). O outro, héteros, é o diferente. É o sexo, é o encontro do sujeito com o Real do sexo.
Herculine escreve aos 25 anos. Cometerá suicídio aos 30. Seu relato inicia marcando o seu fim próximo, "o termo fatal de minha existência" (Foucaut, 1983/1978, p. 13), não vislumbra outro desfecho. Escreve no feminino, "fria, tímida, solitária" (p.13). Conta que aos sete anos foi levada por sua mãe para um antigo hospício que, parcialmente desativado, funcionava como um abrigo para órfãos e doentes e era dirigido por freiras. "Deliciosa calma" (p. 13) é o significante de um gozo que irá se repetir várias vezes. Escreve que foi objeto de atenções especiais: "me sentia objeto de uma atenção quase respeitosa" (p. 14). Atribui isso ao fato de não ser órfã. Era privilegiada e invejada por ter mãe. A madre superiora, por sua vez, é descrita com adjetivos arrebatados: "grandeza, majestade, autoridade" (p. 16). "Fiquei sob a égide de uma atenção que me orgulhava e fazia feliz" (p. 17). Em outros momentos: "todos me adoravam [...] me consideravam bem-dotada" (p. 17). Pareceria que sua diferença (ter mãe) era alvo de grande consideração. E sua diferença corporal não é mencionada. Esta inflação egoica manter-se-á ao longo do texto, apesar das dificuldades e dos lutos que atravessa. Nessa época, começa a desenvolver o gosto pela leitura à qual atribui o poder de a distrair de tristezas profundas. Eclode sua primeira paixão amorosa: Lea, uma menina que não é bonita e tem uma doença grave. Lea e Herculine identificam-se neste ponto, pois também Herculine era doente, "objeto de cuidados constantes" (p. 19). "Eu era sua escrava, seu cão fiel e agradecido" (p. 19). Foge à noite para o dormitório de Lea, mas é pega e seriamente admoestada. Como em outras ocasiões futuras, torna-se desafiante e insistente.
Chega o momento da primeira comunhão que é descrita como "o momento de dizer adeus às castas emoções da adolescência" (p. 21). Naquele dia, cai uma forte tempestade que marca essa passagem. Volta para a casa onde sua mãe trabalhava para o Sr. de M. Lá ocupa as funções de camareira da jovem filha do Sr. e leitora deste último. Faz muitos comentários sobre a beleza do corpo da jovem, pois como camareira veste-a diariamente. É chamada de Camille que, em francês, é um nome epiceno. Sente muitas dores não específicas e é levada ao médico pela primeira vez. A ausência de "inquietudes" (p. 26) (menstruação) preocupa e as dores são atribuídas a isso.
Descreve-se nesta fase como "séria e reflexiva" (p. 26) e muito informada sobre vários assuntos. Adquire o hábito de ler até tarde da noite. Entre outros, lê as Metamorfoses de Ovídio. Na verdade, ao longo do texto, faz três referências às Metamorfoses, sem referir-se ao mito do hermafrodito. Na primeira referência, Herculine diz: "Confesso que fiquei particularmente transtornada com a leitura das metamorfoses de Ovídio. Quem as conhece pode ter uma ideia do que significam. Este achado tinha para mim uma singularidade que a continuação de minha história provará" (p. 26). Em outra ocasião: "O verdadeiro, por mais exorbitante que seja, não ultrapassa às vezes todas as concepções do ideal? As metamorfoses de Ovídio não estariam próximas disso?" (p. 26).
Aos dezessete anos, ingressa na escola normal. Escreve sobre o encontro com as colegas: "Algo de instintivo se revelava em mim parecendo me impedir de entrar naquele santuário de virgindade" (p. 32) e mais adiante: "Ficava instintivamente envergonhada diante da enorme distância que fisicamente nos separava" (p. 33). Os significantes instintivo e instintivamente envergonhada parecem referir-se aqui a uma percepção vaga de uma diferença corporal que surpreendentemente ainda não fora percebida ou mencionada, nem tampouco registrada por ninguém, incluindo sua mãe, as freiras nem o próprio médico. Há uma tomada de consciência de algo que se dá pelo encontro com o outro e não antes disso. "A hora de levantar era um suplício para mim. Não queria que me vissem e tentava me esconder" (p. 33). Herculine faz então uma apresentação de si aos dezessete anos:
"Justamente na idade em que se desenvolvem todas as graças femininas, meu andar e minhas formas não eram harmoniosas. Minha pele, doentiamente pálida, denotava um estado de sofrimento habitual. Meus traços visivelmente duros não passavam despercebidos. Uma leve penugem que aumentava a cada dia cobria o lábio superior e uma parte das bochechas. Compreende-se que esta particularidade suscitasse gracejos os quais eu tentava evitar usando a tesoura ao modo de uma navalha... tudo em mim chamava a atenção e eu me apercebia disso todos os dias. Apesar disso, era amada por minhas professoras e companheiras e a esse amor eu correspondia. Nasci para amar... esta situação infeliz não tardou a provocar reprovações e a me tornar objeto de uma vigilância que eu afrontava abertamente" (p. 33). Nessa ocasião, uma segunda paixão eclodira e despertara várias admoestações das professoras e da madre diretora, mas Herculine repetia a atitude desafiadora de antes.
À ocasião de uma viagem com colegas e professoras à T., localidade a beira-mar, Herculine não participa dos banhos de mar: "Só sei que contra a minha vontade, um sentimento de pudor me obrigava a não participar e ferir o olhar das amigas e das freiras" (p. 35). À noite, arma-se uma forte tempestade (a segunda) que marca também um novo tempo lógico. Essa tempestade já encontra uma Herculine em pânico, tomada por um pavor desconhecido. Um raio cai muito próximo: apavorada, Herculine corre para a cama da madre que a acolhe e a faz ver que está nua: "Apaziguado o primeiro momento de pavor, a irmã H. me fez observar docemente o estado de nudez em que me encontrava. Eu não imaginava, mas compreendi imediatamente. Uma sensação estranha dominou-me inteiramente e me encheu de vergonha... Uma desordem total reinava em minhas ideias. Minha imaginação ficava cada vez mais confusa com a lembrança das emoções despertadas em mim e comecei a me reprovar como se fosse um crime o que senti" (p. 37). Gostaria assinalar aqui esta passagem: "eu não imaginava, mas compreendi imediatamente". Mais uma vez, é pelo olhar do outro que Herculine se descobre diferente. Não imaginar é não ver, não ter imagem. Mais uma vez há vergonha na constatação de sua diferença. A "sensação estranha que a dominou completamente" (p. 37) é indicativa de um gozo intenso, não mediado, que provoca culpa.
Herculine forma-se em primeiro lugar na escola normal. Deixa a escola e volta para casa com maus pressentimentos: "Não estaria eu deixando para trás desses muros a paz, aquela deliciosa calma inalterável que faz uma consciência tranquila? Não teria eu que lutar no mundo contra inimigos de todos os gêneros? E como sairia desta luta?" (p. 44) Neste momento, sabendo-se menina, mas diferente e sabendo de seus desejos eróticos e também que estes são mal vistos e reprimidos no convento e depois na escola normal, Herculine sente "uma aflição medonha".
O Sr. de M. arranja-lhe um emprego como professora em um internato para meninas. Tem dezenove anos e ocupará a função de professora adjunta, junto a Sara.
No novo emprego, Herculine é chamada de Camille. Sara tem dezoito anos Descreve-a assim: "Não havia nada nela que pudesse atrair o olhar... sua altura era abaixo da média e seu corpo, para o olhar de certos observadores, talvez fosse um pouco forte demais" (p. 47). Ela e Sara passam a dormir em dormitório contíguo ao das internas. Eclode a paixão. Essas passagens são relatadas de forma intensamente gozosa: "Vencida enfim por seus pedidos, eu saía docemente, mas antes a apertava muitas vezes em meu peito. O que eu sentia por Sara não era amizade, era uma verdadeira paixão!" (p. 51).
Neste período, as dores, que às vezes apresentava, tiveram um recrudescimento. Tornam-se "intoleráveis, inomináveis" (Barbin, 1978, p. 53). "Feliz com este pretexto... pedi à minha amiga que viesse dividir o leito comigo. Ela aceitou... fiquei louca de alegria. Meu Deus! Fui eu a culpada e devo me acusar de ter cometido um crime? Não, não... esse erro não foi meu, mas uma fatalidade a que não pude resistir!!! Sara me pertencia agora!! Ela era minha!! O que na ordem natural das coisas deveria ter-nos separado, acabou por nos unir!!" (p. 54). Esta frase é bastante enigmática: a ordem natural das coisas seria que meninas não se apaixonam nem fazem sexo? Ou que, sendo Herculine do sexo masculino, não lhes seria permitido dormir no mesmo dormitório?
Passa-se um ano. A situação vai ficando insustentável. Todos comentam, há constrangimento e um início de maledicência com as alunas. Herculine escreve: "Obviamente eu percebia que o futuro era sombrio. Seria preciso mais cedo ou mais tarde, romper com um gênero de vida que não era mais o meu... Pois bem, submeto-me ao julgamento da posteridade que me lerá. Terei eu sido culpado e criminoso porque um erro grosseiro me deu um lugar num mundo que não deveria ter sido o meu?" (p. 54). É a primeira vez que Herculine refere a si no masculino e parece ter sido levado a isso pela ideia de erro que também faz sua primeira aparição. Deve então procurar o confessor que é quem tem na terra o lugar de Deus; sim, porque o erro é do criador; o sujeito não se implica em sua identidade de gênero, foi criado por Deus assim, e sua mãe o criou no erro. Ao mesmo tempo, responsabiliza-se: "Onde encontrar forças para dizer ao mundo que eu usurpara um lugar e um título interditado pelas leis divinas e humanas?" (p. 54), talvez se referindo agora ao lugar de amante de Sara.
Herculine procura um confessor: "Não foi pena o que inspirei nele, mas horror, um horror vingativo. Ao invés de palavras de paz, suas palavras foram de injúria e desprezo... Cheguei lá profundamente humilhada e saí com o coração ainda mais ferido" (p. 56).
Ao fim do ano letivo, Herculine de férias em casa, recolhe-se a um retiro espiritual e tenta de novo uma confissão. Percebe-se que todo o saber sobre sua existência está depositado nas mãos da Igreja. Herculine espera que este suposto saber defina o seu destino. "Fiz dele meu juiz" (p. 62). O padre não sabia o que dizer e pediu dois dias para dar-lhe seu conselho. Finalmente sugeriu-lhe retirar-se do mundo e tornar-se uma religiosa, "mas não revele nunca a confissão que me fez, pois um convento de mulheres não a admitiria" (p. 63). Herculine volta para o colégio para reassumir suas funções, insatisfeita com o conselho.
As dores voltam com uma intensidade tal que o médico é chamado. Temos aqui a entrada em cena, pela segunda vez, do saber médico. Essa consulta é de fato muito exemplar de um momento de mudança na relação entre as instituições de saber-poder que instituíam o normativo da época: "As respostas que eu dava para suas perguntas eram para ele, enigmáticas... mas ele continuava a perguntar... eu o ouvia suspirar... exclamações quase inaudíveis escapavam de sua boca 'meu Deus, será que isso é possível!?'" (p. 67). Ele aprofunda o exame e encontra o que procurava". O relato que o médico faz é descrito como "frases entrecortadas" e Herculine escreve que a mãe de Sara, presente à consulta, "não compreendeu absolutamente nada" (p. 68) e diante da sugestão de que Herculine deveria ser afastada da casa, expulsa o médico, furiosa. Em todo caso, proíbe-as de dormirem juntas.
Chegam de novo as férias e as despedidas de Sara são tristes. "Parti sem contar-lhe meus planos" (p. 73). Na casa do Sr. de M. com sua mãe, pressionado a se explicar sobre o que estava acontecendo, Herculine procura outro confessor que se propõe a falar com um médico: "...me entenderei com ele sobre o que fazer" (p. 75). Herculine comparece ao consultório com sua mãe. Após um minucioso exame, "a ciência inclinou-se convencida... era necessário agora levar a julgamento a retificação de meu estado civil" (p. 76). Herculine volta ao colégio para se despedir de Sara: "É chegada a hora de nos separarmos" (p. 77).
Depois de se colocar sob os desígnios de Deus e em seguida, da ciência, Herculine submete-se à lei jurídica. "Tudo estava feito. A partir de agora, o estado civil me obrigaria a fazer parte daquela metade da raça humana que chamamos de sexo forte... eu iria deixar para trás um passado delicioso para entrar na arena, armado apenas de minha fraqueza e de minha profunda inexperiência dos homens e das coisas!" (p. 85) e de fato, embora o estado civil obrigasse, Herculine jamais conseguiu adaptar-se ao mundo dos homens. Arrependeu-se amargamente do que considerara seu imperioso dever. "Pobre insensato que fui, eu tinha a felicidade, a verdadeira felicidade nas mãos e fui deliberadamente sacrificá-la a um tolo medo" (p. 85). Vai para Paris à espera de um emprego na estrada de ferro que nunca se concretiza. Passa fome, não consegue emprego. Sua escrita torna-se dramática. Suas tentativas de aproximação de mulheres não são bem-sucedidas: "Não há entre as mulheres desprezíveis que me sorriram ou beijaram, uma que não tenha recuado de vergonha em meus braços, como se tocasse um verme... passei por todas sem tocá-las" (p. 92). Sem qualquer identificação com os homens, Herculine/Abel desenvolve um discurso a partir de uma natureza "angelical, imaterial, virginal": "Homem! Não enlameei meus lábios com perjúrios nem meu corpo com hediondas cópulas... Minha natureza angelical paira por sobre todas as vossas inumeráveis misérias, pois me dissestes que não há lugar para mim em vossa estreita esfera... mas eu, eu que esmigalhastes com os pés, eu vos dominarei com toda a superioridade de minha natureza imaterial, virginal..." (p. 92) Lacan, em O Aturdito, faz esta transição do héteros para o éterno, etéreo. O héteros eteriza-se ou sehetairiza - neologismo que se compõe dos elementos: éter, o eterno e Hetaira, figura da mulher sensual e propõe, no lado direito das fórmulas da sexuação, o empuxo à mulher. Abel, não conseguindo sustentação fálica, embora convocado a isso, precipita-se no lado do não todo. Sem o pezinho na ordem fálica, torna-se todo h-etéreo. Sem identificação com o lugar fálico, Abel reencontra-se na pureza e na virginalidade dos tempos de monossexualidade no convento com as freiras e as colegas, apesar das roupas de homem e do nome retificado.
Deste lugar terceiro, Herculine tece alguns comentários preciosos sobre o gozo dos homens e das mulheres, como Tirésias. Escreve Abel/Herculine: "A experiência real que adquiri do coração das mulheres me coloca acima de certas críticas célebres... Dumas Filho, entre outros, tentou em vão rasgar este véu mas só o conseguiu pela metade, pois aos olhos dos profanos, ele é impenetrável. Faltava-lhe a palavra mágica para penetrar no santuário" (p. 98). Para Abel, isso não deve ser lamentado, pois: "Da minha parte estou moralmente convencido de que há nisso, não só uma impossibilidade, mas uma necessidade indispensável, um limite que seria perigoso para o homem ultrapassar. Suas faculdades se opõem a isso, sua felicidade depende disso" (Barbin, p. 98). Além da impressionante intuição sobre a impossibilidade da relação sexual, Abel traz-nos uma acurada descrição dos contornos do gozo fálico.
Estamos perto do final. Sem emprego, solitário, namora a morte, passeia no cemitério Père Lachaise. Surge a possibilidade de emprego num navio. Abel 'embarca' na viagem, mas nas vésperas de embarcar, a viagem é outra. Suas últimas palavras: "Não sei que estranha cegueira me fez sustentar até o fim este papel absurdo. Talvez aquela sede do desconhecido, tão natural nos homens" (p. 105). Mas esse papel absurdo foi, no entanto, buscado por Herculine. No tempo em que ninguém queria saber da verdade, nem a mãe de Sara, nem o médico nem o padre, ela, Herculine, nas palavras de Fassin, impôs sua verdade ao mundo. Para Foucault e Butler, Herculine foi forçada a mudar de sexo. Mas, de fato, foi Herculine que levou tenazmente sua busca do verdadeiro ao desfecho. Em suas palavras, "A ciência curvou-se convencida" e mais adiante: "Eu o provoquei". Este desejo de verdade revela Herculine agente de seu destino, buscando corrigir seu 'verdadeiro sexo'. Mas o eu não é senhor em sua casa, e Herculine percebe que se havia enganado: "Agora era tarde. Fui levada pelo impulso de um dever a ser cumprido" (p. 77). A meu ver, a escrita das memórias é uma tentativa de se entender consigo mesma, um falar sobre si mesma. Segundo Fassin, Herculine descobre seu verdadeiro gênero, que é masculino e feminino, "verdadeiramente hermafrodita". Mas o fato é que, como Abel, podendo sustentar uma relação heterossexual, afasta-se de Sara. Como homem, Herculine torna-se assexual e desliza para a imaterialidade de um héteros heterezaido, abandonando a posição subjetiva de uma menina com jeito de menino que amava meninas. Empuxo à mulher?
E se imaginássemos Herculine vivendo hoje em 2017? Certamente, ousaria perguntar-se: qual sexo/gênero quero chamar de meu? Faria laço social? Encontraria na internet um significante com o qual se identificaria?
Fazendo uso dos três tempos da sexuação propostos por G. Morel, teríamos que no tempo 1, designação sexo feminino; no tempo 2, tempo do discurso sexual: criada como menina na família, e mais tarde no orfanato e na escola normal entre outras meninas e freiras; no tempo 3, é o gozo que traz as questões e demanda uma orientação, uma interpretação do gozo. Seu corpo nunca é falado nem questionado nem por Herculine nem por ninguém, aí incluindo-se sua mãe. Totalmente alheia ao falo e à castração e a qualquer semblante seja a mascarada fálica ou a exibição viril, Herculine inicia seu périplo pelos discursos em busca de uma submissão à ordem fálica. Apresentando-se com suas insígnias: estudiosa, inteligente, trabalhadora e com amplo reconhecimento social, dirige-se ao discurso religioso que por três vezes se mostra furado: o primeiro é descartado por seu discurso de ódio; o segundo lhe recomenda entrar para o convento escondendo seu problema das freiras; o terceiro apela para o discurso médico. As consultas são uma pantomima caricata e o terceiro médico constata o "erro" no reconhecimento do sexo. Herculine volta-se então ao Outro que poderíamos denominar como o discurso jurídico para "corrigir o erro" e chegar a seu "verdadeiro sexo". Isto feito, vestido de homem e chamando-se Abel, descobre o "seu" erro e arrepende-se tarde demais. Parece que a irrupção do que Lacan chama um-pai sem razão precipitou Herculine no empuxo à mulher. Chamada à ordem fálica, precipitou-se no assintótico?
Sim, porque como Morel observou há empuxo à mulher nas mulheres também. A idealização de seu amor por Sara e finalmente, a heterização que implicaria, em Schreber, a extinção do sujeito. Mas aqui, resultou na extinção do sujeito no real.
Notas
(1) Quanto às identidades trans referimo-nos aqui ao início da conceitualização de transexualidade, onde está representava essencialmente uma recusa da imagem corporal baseada na convicção de pertencer a outro gênero. Os médicos escutam/tratam a demanda como uma demanda cirúrgica.
(2) Ver o texto "Hermaphrodites with atitude". (Cheryl, 2017)
(3) Vale lembrar do trabalho de Robert Stoller, nesta mesma época sobre a conceitualização da transexualidade.
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Recebido em: 20/10/2017
Aprovado em: 05/02/2018