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Revista Polis e Psique

On-line version ISSN 2238-152X

Rev. Polis Psique vol.12 no.2 Porto Alegre  2022  Epub Oct 07, 2024

 

Editorial

Políticas públicas, juventudes e ontologia do presente

Public policies, youth and ontology of the presente

Políticas públicas, juventud y ontología del presente

Henrique Caetano Nardi1 

Neuza Maria de Fátima Guareschi2 

Giovana Barbieri Galeano3 

Adolfo Jesiel Siebra4 

Francisco Valberdan Pinheiro Montenegro5 

1Editor Chefe

2Editora Gerente

3Editora Assistente

4Editor Assistente

5Editor Assistente


Este segundo número de 2022 da Revista Polis e Psique aborda, fundamentalmente, três dos principais campos de atuação do campo psi na contemporaneidade, empreendendo um esforço por problematizá-los a partir da articulação ético-política entre a produção do conhecimento e a invenção de estratégias de intervenção.

O primeiro deles refere-se ao âmbito das políticas públicas de saúde. Um território que, embora muitas vezes tomado enquanto familiar sob variados aspectos, continua suscitando o interesse de diversos estudos sob os mais diferentes prismas analíticos. Isto talvez explique a razão pela qual os trabalhos que aqui se debruçam sobre essa temática optem por revisitar aparato institucional que dá forma a esse campo de práticas, procurando evidenciar como alguns dos seus elementos vem funcionando atualmente e, principalmente, os impactos que tais ações estão gerando na prática cotidiana dos profissionais. Desse modo, estes artigos nos recordam que “sempre existe algo a se fazer“ e, em última instância, corroborando Mendes (2013), “que o SUS não é um problema sem solução, mas uma solução com problemas. Mas a superação de seus problemas não será fácil, nem rápida, nem barata” (p. 33).

Não é por acaso, portanto, que o artigo que abre as discussões envolvendo algumas dessas nuances que perpassam o sistema de saúde brasileiro, nesta edição, cuja autoria é de Bruna Abbud da Silva e Marcos Adegas de Azambuja, se intitula “Caminhos do apoio institucional na Estratégia de Saúde da Família” e busca problematizar o Apoio Institucional (AI) como ferramenta para consolidação das práticas no Sistema Único de Saúde (SUS), a partir das práticas realizadas em um município do interior” do Rio Grande do Sul. Em suas conclusões, os autores observam que a ferramenta democratizou a relação entre trabalhadores e gestores, promovendo maior comunicação entre eles, constituindo-se como um aporte que priorizou, além dos saberes acadêmicos, o saber cotidiano dos atores envolvidos, dando voz às experiências destes em seus contextos sociais.

Em seguida, dando continuidade a esse tipo de enfoque, temos o artigo “Espaço da palavra com trabalhadores em Unidade Básica de Saúde”, de autoria de Marlize Paulo Silva, Lucy Leal Melo-Silva e Lucas Antonio Franco Ribeiro. Nele, os autores descrevem uma intervenção desenvolvida com 14 trabalhadores de um serviço de saúde pública. Os resultados mostraram os mecanismos de funcionamento institucional relacionados com as vivências de sofrimento que englobam a polivalência, competição, adoecimento, defesas e restrições do agir. A partir dos encontros analisados, o artigo aponta que a criação de um espaço de fala acerca das vivências e modos de subjetivação no trabalho permitiu o fortalecimento e a integração dos coletivos, a ressignificação do processo de adoecimento e a deliberação para algumas transformações do trabalho.

Finalizando esse primeiro bloco temático, apresentamos o trabalho de Juliana Kuster de Lima Maliska, Juliana da Rosa Marinho e Jana Gonçalves Zappe que assinam o artigo intitulado “Percursos de Cuidado na Atenção à Saúde Mental de Crianças”. Neste texto, as autoras explicitam os resultados de uma pesquisa qualitativa desenvolvida a partir de um estudo de casos múltiplos cujo objetivo foi compreender como se estabelece o percurso do cuidado na saúde mental da criança em contexto da atenção secundária. Foram identificadas dificuldades na comunicação e no compartilhamento dos casos entre os diferentes níveis de atenção e na construção de um Plano Terapêutico Singular (PTS). Com relação ao desligamento das crianças, observou-se mais encaminhamentos e desistências que processos de alta, resultado que necessita problematização tendo-se em vista a possibilidade de cronificação dos casos.

O segundo bloco temático é composto, sobretudo, por artigos vinculados ao campo das políticas públicas de atenção às juventudes. Juventudes no plural, pois abordam diferentes contextos e experiências da juventude no contemporâneo brasileiro. No ano em que a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completou 32 anos, os artigos deste bloco temático assumem um papel fundamental ao pautar criticamente as atuais formas de atuação em áreas como as medidas socioeducativas e, ao mesmo tempo, reivindicar uma atuação ética e politicamente comprometida com os direitos das juventudes.

No artigo "Acolhimento psicológico infantojuvenil na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)", Carina Furlaneto Frazatto e Fernanda de Jesus Dalosso discutem a implantação da estratégia de acolhimento para crianças e adolescentes, protagonizada por três psicólogas, entre 2014 e 2018, em um município do norte do Paraná. Valendo-se do acolhimento em grupo, foi possível distinguir a demanda direcionada à Psicologia, traçar estratégias adequadas a cada caso e identificar outros profissionais e setores importantes para um cuidado integral. Com isso, extinguiu-se a fila de espera para atendimento psicológico, fornecendo-se uma resposta imediata a todos os casos e possibilitando desdobramentos, inclusive no âmbito da rede intersetorial.

Thays Cristhine da Costa Santos, Laura Cristina Eiras Coelho Soares e Raissa Natália Pereira Raimundo são autoras do artigo "Acolhimento Institucional de Adolescentes: uma intervenção psicossocial" no qual discutem uma intervenção psicossocial desenvolvida em instituição de acolhimento para adolescentes do sexo masculino com trajetória de vida nas ruas. As autoras concluíram que o despreparo dos integrantes da rede de assistência social e saúde, a insuficiência de políticas públicas voltadas para a juventude no município e outros fatores decorrentes dos discursos atribuídos aos adolescentes acolhidos, majoritariamente negros e pobres, remetem às situações de violências e de violações de direitos que têm implicações subjetivas, econômicas, políticas, sociais e culturais.

Stéphanie Strzykalski, Fernanda da Silva Von Porster, Dieine Mércia de Oliveira, Rose Gurski e Cláudia Maria Perrone são autoras do artigo "Contribuições psicanalíticas ao tema da responsabilização de adolescentes nas políticas socioeducativas" no qual problematizam, a partir da psicanálise, três dimensões: a jurídica, a subjetiva e a social. As autoras analisam que tal discussão é fundamental para que se criem ações socioeducativas de cunho crítico e emancipatório que sejam realmente capazes de impactar na diminuição da reincidência infracional na vida dos jovens.

Larissa Oliveira Kuhn e Anna Paula Uziel são autoras do artigo "Projeto de Vida em Planos Individuais de Atendimento no Contexto Socioeducativo". O artigo apresenta como o projeto de vida de adolescentes que cumprem medida socioeducativa de Liberdade Assistida (LA) é abordado no instrumento institucional Plano Individual de Atendimento – PIA. As autoras concluem que o PIA não é usado como base instrumental para o trabalho articulado a um projeto de vida dos adolescentes, mas é reduzido a um contrato firmado com eles no início do cumprimento da medida com registro de expectativas de futuro. Tal análise aponta para a necessidade de o PIA avançar de um campo de registro de expectativas de futuro para um de trabalho com o projeto de vida dos adolescentes.

Mariana Hintz Moraes, Maria Eduarda de Moraes Riva e Karine Vanessa Perez assinam o artigo "O Fardo da Segurança: uma Análise Institucional com bombeiros Militares" no qual discutem uma análise institucional realizada no Corpo de Bombeiros Militar de um município do Rio Grande do Sul. Dentre as análises realizadas, as autoras destacam a emergência de demandas relacionadas à identidade própria dos bombeiros militares, marcando uma diferença em relação aos policiais militares, bem como a necessidade de uma atenção mais sensível às questões institucionais. Além disso, as autoras enfatizam o anseio dos trabalhadores em relação a necessidade de um profissional da psicologia inserido no cotidiano do quartel militar, disponível para intervenções individuais e coletivas nas unidades de trabalho.

O terceiro e último bloco temático agrega artigos profundamente comprometidos com um diagnóstico do presente em que vivemos. Com uma problematização dos modos pelos quais temos pensado, narrado e produzido o mundo em que vivemos, mas, ao mesmo tempo, apontando para outras possibilidades e experiências de reinvenção ética do presente. Afinal, como nos lembra Donna Haraway (2016, para. 6), sabemos que “narrativas contam narrativas, e que conceitos pensam conceitos".

Dolores Galindo, Renata Vilela Rodrigues, Morgana Moreira Moura e Walter Eller do Couto são autoras(es) do artigo "Às Amadoras e Amantes das Ciências". A partir de reflexões sobre objetividade nos estudos feministas, o texto argumenta sobre a importância de se reativar práticas de atenção e políticas de afeto que se abrem para o maravilhamento, o espanto e outros tipos de afetações acionados na produção do conhecimento científico. Os interesses das amantes das ciências são diferentes daqueles que produzem a objetividade moderna, voltam-se a saberes localizados e para o maravilhamento, abrem-se para a multiplicidade e para a construção de outros afetos, corpos, agenciamentos, subjetividades nos encontros com humanos e não-humanos, e na constituição de saberes situados.

Carolina Franco Brito, Maria Juracy Filgueiras Toneli e João Manuel de Oliveira são autoras(es) do artigo "Semicidadania Induzida: Neoliberalismo e Discursos Conservadores sobre Gênero no Brasil" em que discutem questões referentes ao cenário social e político brasileiro. Problematizam a universalidade de direitos e a produção de vulnerabilidades e exclusões a partir de uma perspectiva interseccional de corpos e experiências, entre eles, gênero, sexualidade, classe, raça, etnia. Essa situação se agrava com a ascensão de certos grupos e discursos, os quais discutimos três: conservadorismo, neopentecostalismo e neoliberalismo.

No relato de experiência intitulado "A Juventude e o Sistema Socioeducativo em uma Delegacia Especializada: (re)pensando diálogos", Amanda Christine Albuquerque Tavares, Barbara Damasco Jacques, Camila Maffioleti Cavaler, Adriano Beiras e Maíra Marchi Gomes problematizam as violações de direitos que fazem da violência um efeito normativo na vida desses adolescentes. Os resultados mostraram que, antes mesmo da infração, esses adolescentes já estavam expostos a múltiplas violências, seja pela família, seja pelo Estado.

O relato de experiência intitulado "Processos educativos e Economia Solidária: Relato de uma experiência" de autoria de Neiva de Assis e Lígia Rocha Cavalcante Feitosa evidenciam o processo de criação e fortalecimento de um grupo de artesãos e pequenos produtores por meio da economia solidária em São Francisco do Sul - SC. O público-alvo foi artesãos e pequenos produtores de alimentos e de produtos agrícolas da região e, por conseguinte, destinou-se aos moradores do município que puderam consumir produtos de forma solidária e ambientalmente responsável. Os principais resultados apontam para a importância de espaços de formação para artesãos, para a circulação de produtos e, principalmente, a experimentação de possibilidades de aprender e trabalhar coletivamente e de constituir-se subjetivamente.

Referências

Mendes, E. V. (2013). 25 anos do Sistema Único de Saúde: resultados e desafios. Estudos Avançados [online], 27 (78), 27-34. doi: 10.1590/S0103-40142013000200003 [ Links ]

Haraway, Donna. (2016). Antropoceno, Capitaloceno, Plantationoceno, Chthuluceno: fazendo parentes. Climacom, 3, (5). Recuperado de http://climacom.mudancasclimaticas.net.br/antropoceno-capitaloceno-plantationoceno-chthuluceno-fazendo-parentes/Links ]

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