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Revista Brasileira de Psicanálise
Print version ISSN 0486-641X
Rev. bras. psicanál vol.41 no.1 São Paulo Mar. 2007
TERCEIRA TÓPICA?
Notas sobre o relatório Brusset
Notas sobre el relatorio Brusset
Notes on Brussets report
Ana Maria Brias Silveira*
Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo
RESUMO
No relatório para o 66º Congresso de Psicanalistas de Língua Francesa, Bernard Brusset propõe que o estudo da metapsicologia dos vínculos e dos limites do self, tomando como ponto de partida a metapsicologia freudiana enriquecida pela contribuição de autores como Bion, Winnicott e A. Green, poderia levar à formulação de uma terceira tópica. Seria uma tópica primitiva, anterior às outras duas, que permitiria examinar melhor os casos de patologias não-neuróticas, caracterizados pela fragilidade do envelope narcísico, bem como avaliar esse trabalho na situação de análise, área de jogo, metaforização e apropriação de sentido entre os dois parceiros: analista e analisando.
Palavras-chave: Aparelho psíquico; Pulsão; Relação de objeto; Vínculos; tópica.
RESUMEN
En su relatorio para el 66o. Congreso de Psicoanalistas de Lengua Francesa, Bernard Brusset propone que el estudio de la metapsicología de los vínculos y de los límites del self, tomando como punto de partida la metapsicología freudiana enriquecida por la contribución de autores como Bion, Winnicott e A. Green, podría llevar a la formulación de una tercera tópica. Esta seria una tópica primitiva, anterior a las otras dos, que permitiría inclusive examinar mejor los casos de patologías no-neuróticas, caracterizadas por la fragilidad del envoltorio narcísico, bien como el trabajo con los mismos en la situación de análisis, área de juego, metaforización y apropiación de sentido dentro del par: analista y analizando.
Palabras clave: Aparato psíquico; Pulsión; Relación de objet; Vínculos; Tópica.
ABSTRACT
Bernard Brusset, in his report at the 66th French Language Psychoanalysts Conference, proposed that the study of metapsychology of bonding and of limits of the self, taking as a starting point the Freudian metapsychology enriched with the contribution of authors such as Bion, Winnicott and A. Green, could lead to the creation of a third topic. Th is would be a primitive topic, prior to the two others, which would also allow for a more thorough examination of non-neurotic pathology cases, characterized by the fragility of the narcissistic envelope, as well as the work with these in the analytical situation - play area, metaphorization and sense ownership between both partners: analyst and analysand.
Keywords: Psychic apparatus; Drive; Object relation; Bonds; Topic.
Com o intuito de dar conta da diversidade do funcionamento mental, já há algum tempo diversos autores vêm propondo uma terceira tópica.
No relatório Metapsicologia e terceira tópica?, em cujo título devemos notar uma interrogação, Bernard Brusset se propõe a construir um quadro com coerência própria, a partir do qual faria sentido a idéia de uma nova tópica. Tomando como ponto de partida a mobilidade e a complexidade que encontramos em nosso fazer clínico atual, Brusset se detém a examinar as questões enunciadas pela noção de relação de objeto em suas interações com o modelo da pulsão, buscando assim construir a fundamentação para uma teoria das organizações não-neuróticas. A terceira tópica proposta seria então um aspecto abrangente da metapsicologia dos vínculos e dos limites do self, ao deter-se no estudo do espaço entre gerado no encontro do self com seus objetos. Ao falar em limites do self, a referência não é apenas espacial, na verdade o essencial é o que se refere aos processos de transformação e simbolização que ocorrem nesse espaço.
André Green (2002) propôs extrair a tópica do ponto de vista metapsicológico clássico para dar à concepção de espaço psíquico seu pleno alcance e levar em conta suas novas categorias, como o espaço transicional:
Porque são as propriedades dos espaços que determinam em grande parte as propriedades dos objetos e as possibilidades de transformação [ ] a referência à tópica fez aparecer a necessidade de considerar a compatibilidade entre os estados de separação e de reunião, a natureza das relações eu-objeto, os registros de funcionamento do eu, o que se chama metapsicologia dos limites, e não somente dos espaços (p. 294).
Ainda Green (1990):
O objeto da análise, no setting, não deve estar nem dentro do analisando nem dentro do analista, mas no espaço potencial do seu entre-dois, numa nova forma de reunião que permite acessar a metáfora do objeto, que nada mais é que o objeto do vínculo; nem meu nem teu: vínculo.
Quase todos os autores que abraçam a idéia de uma terceira tópica referem-se a Bion modelo da identificação projetiva criadora de vínculos e Winnicott espaço intermediário, atividade transicional, integração, personalização, realização , que têm em comum uma tópica si-objeto (soi-objet), interpretada em referência às relações precoces mãe-bebê. Referem-se também a Green: o objeto analítico, o trabalho do limite, o duplo limite. É necessário, então, reavaliar os modelos elaborados por esses autores, sobretudo no que diz respeito a algo que Freud não desenvolveu suficientemente: o papel das induções e das respostas do outro, do parceiro das inter-relações, na construção do objeto.
Bion, ao repensar o texto de Freud (de 1911) sobre os dois princípios do funcionamento mental, atribuiu ao objeto, em função das respostas dadas pela mãe às identifi cações projetivas da criança que em geral são criadoras de vínculo uma função organizadora, reguladora e elaborativa, ângulo que nem Freud nem Klein haviam considerado. Então o aparelho psíquico é em primeiro lugar produzido pelos vínculos e, ao mesmo tempo, produtor deles. A questão é a organização e a gênese dos vínculos e, por conseqüência, do aparelho mental também.
A terceira tópica, portanto, seria uma tópica primitiva, anterior às duas outras.
O aparelho psíquico e o objeto externo (inter-relação)
O aparelho psíquico, na conceituação inicial, constitui-se por diferentes inscrições compartimentadas das excitações recebidas. Trata das excitações que vêm da realidade exterior e do interior do organismo. As instâncias psíquicas consciente, inconsciente e pré-consciente são determinadas pelos modos de investimento dos traços mnésicos:
• representação de coisa
• representação de palavra
O funcionamento psíquico resultante é orientado pelos dois princípios do funcionamento mental. Porém o estatuto do objeto não é o mesmo na lógica primária e na lógica secundária:
• lógica primária: fantasia finalizada pela realização alucinatória do desejo
• lógica secundária: leva em conta o espaço e o tempo do outro e da realidade para construir o objeto do desejo
Portanto, é preciso distinguir dois planos:
• vínculo pulsão-objeto: este é, na teoria do inconsciente, o fundamento da metapsicologia
• vínculo sujeito-objeto: corresponde à tradição filosófica e ao pensamento habitual
Brusset considera que a gênese da organização psíquica supõe a ação da relação sujeito-objeto (b) sobre o sistema pulsão-objeto (a), uma vez que o aparelho psíquico é em primeiro lugar produzido pelos vínculos, ao mesmo tempo que é produtor destes. Já no determinismo psíquico (Freud) ocorre o contrário. Assim, se quisermos pensar na relação entre esses dois planos, precisaremos considerar as formações intermediárias que regem a economia das representações e a organização, o dinamismo, da conflitualidade intrapsíquica.
Certos modos de funcionamento psíquico, nas suas relações com a realidade exterior, fazem-se cada vez mais presentes nas patologias não-neuróticas, e isso demanda novas formulações técnicas e teóricas. Esses casos têm subjacente um primeiro modo de funcionamento psíquico e de relação com o outro, não aparente nas neuroses, sugerindo uma tópica primitiva, anterior às outras duas. Percebemos hoje que os casos-limite se caracterizam pela fragilidade do envelope narcísico (ego) e pela dependência dos objetos, aquém de sua representação. É acentuada a oscilação entre angústia de intrusão e de abandono, o que nos expõe a problemática do limite entre interior e exterior. A psicopatologia do corpo, sendo ao mesmo tempo si próprio e exterior, fornece as ilustrações clínicas concretas das relações entre interior e exterior. Chegamos então à complexidade da tópica do dentro e do fora.
Com a primeira tópica, podemos pensar o jogo das representações de coisa e de palavra conforme a economia psíquica no modelo do sonho e do sintoma neurótico. Essa tópica mostrou-se, no entanto, monadista e solipsista, o que tornava difícil a teoria da transferência/ contratransferência. Com a segunda tópica temos os confl itos intrapsíquicos entre as instâncias ou no seio delas. Diz Brusset: Não é possível dar conta teoricamente dos estados- limite, patologias narcísicas, depressivas, psicossomáticas e aditivas, tendo como única referência a primeira e a segunda tópicas freudianas.
Atualmente, são da maior utilidade os modelos da identificação projetiva, atuação, somatização, transicionalidade, função continente e envelopes psíquicos. Winnicott, por exemplo, nos apresenta um modelo de aparelho psíquico diferente do freudiano, uma vez que se baseia num modelo psique-ambiente, e com isso passamos a falar em processo de subjetivação no lugar de aparelho psíquico. Com ele temos a tópica dos espaços psíquicos a partir do espaço transicional, cuja dimensão fenomenológica, por implicar a reciprocidade entre dois sujeitos, parece situá-la fora da metapsicologia. Essa teoria, como a de Bion, modifica o lugar dado à pulsão como conceito fundante do psiquismo, mas põe emposição central as noções freudianas de ligação e desligamento.
A terceira tópica está longe de desconsiderar as duas anteriores, bem como o ponto de vista dinâmico e econômico. Visa oferecer novas perspectivas ao examinar o que ocorre quando se constitui um espaço psíquico organizado análise no qual a conflitualidade intrapsíquica pode se expressar e simbolizar, levando em conta a dinâmica do casal analítico, o que inclui a idéia do interpsíquico.
O conceito de transferência, por exemplo, que foi se confundindo com o próprio processo do tratamento, pode ser considerado não só como o lugar em que as representações inconscientes do pulsional infantil e das defesas encontram para atualização e elaboração, mas também o lugar onde elas são produzidas, construídas, transformadas numa experiência nova compartilhada com o analista. Ela induz a emergência e o desenvolvimento de um sentido até ali inexistente, sentido encontrado/criado a partir de um trabalho identifi catório simultâneamente comum e repetitivo entre os dois parceiros: área de jogo, metaforização e apropriação do sentido. Podemos considerar que é assim que ocorre o processo de subjetivação, a psiquização.
Essas questões encontram articulações nos textos tardios de Freud, como Construções em análise, A divisão do ego no processo de defesa e Moisés e o monoteísmo. No entanto, é necessário ampliar e desenvolver aspectos potenciais inacabados da teorização freudiana:
• projeção: apresenta a questão das relações entre representação e percepção
• dupla polaridade do narcisismo e da objetalidade
• transicionalidade e utilização do objeto: segundo os dois princípios do funcionamento mental, tanto nos vínculos intersubjetivos como na situação intrapsíquica
Modelo da pulsão e relações de objeto
O modelo da pulsão funda a posição epistemológica específica da psicanálise como metapsicologia, em ruptura com as psicologias da consciência, fenomenologia etc. Com os debates em torno da questão pulsão versus relação de objeto, tivemos a substituição de:
• pulsão por relação de objeto
• aparelho psíquico por inter-relação ou interação
Há aqui uma série de riscos a examinar:
1. Simplificação excessiva do modelo interiorização/exteriorização, desconsiderando que, se o intrapsíquico resulta em parte da interiorização das relações interpessoais, temos necessariamente que considerar as operações transformacionais da simbolização e da subjetivação que tornam possível o intrapsíquico.
2. Pulsão/representação e relação de objeto/intersubjetividade correspondem a níveis epistemológicos diferentes, e a focalização de um desses elementos tende a limitar o lugar dos outros.
3. A redução e simplificação, bem como a idealização da noção de relação de objeto, tende a situá-la fora da sexualidade, fora da pulsão e do id, a serviço da observação direta e da psicologia genética (Green). Aqui, Green assinala o desaparecimento, entre os kleinianos, do uso do conceito prazer-desprazer e do sexual. Gozo, perversão, transgressão e subversão, assim como a clínica do vazio, tendem a ser ignorados.
4. Qual a relação da experiência intersubjetiva com os valores do prazer/desprazer?
5. Não podemos esquecer que pulsão, além da referência ao somático, evoca a potencialidade subversiva e transgressiva da sexualidade e da violência, e não apenas o ponto mais frágil da organização psíquica. Pulsão é definida pela exigência de trabalho do psiquismo e pelas ligações com o soma, e também, podemos acrescentar, pelos traços mnésicos das experiências corporais e das trocas com o outro na situação antropológica fundamental (Laplanche).
6. As relações de objeto estão por definição em dupla ligação:
a) com o pulsional;
b) com os vínculos interpessoais e a intersubjetividade, o que corresponde a níveis epistemológicos diferentes. Daí o caráter híbrido e as derivações a que esse conceito conduz.
Não podemos esquecer que Freud concebeu as relações entre as instâncias psíquicas conforme o modelo das relações entre pessoas intersubjetivas , ao mesmo tempo que muitas vezes transgrediu os princípios de sua teoria para considerar o que não podia ser inteiramente reduzido à teoria das pulsões. Freud definiu a pulsão como conceito-limite entre psique-soma, e, neste contexto, limite também implica zona de processos. Assim, com relação à pulsão, podemos pensar em duas dimensões:
a) uma dimensão da ligação psique-soma como origem da conflitualidade intrapsíquica;
b) uma dimensão interpsíquica como componente inconsciente da intersubjetividade.
É preciso, portanto, considerar as relações variáveis e flutuantes dessas duas dimensões sem ignorar as diferenças epistemológicas dos modelos e conceitos que elas implicam, entre os quais principalmente a representação, o vínculo e a ligação-desligamento.
Precisamos de um modelo, a construção teórica de um mundo interno, para poder pensar as relações do sujeito com ele mesmo e com os outros, mas não podemos nos esquecer de que o intrapsíquico é heterogêneo e só parcialmente acessível. A experiência interpsíquica, pelo fato de ser condição originária do ser, pode se mostrar na experiência intersubjetiva, porém apenas mediante certas condições de simbolização e subjetivação. Caso isso não exista, ela se manifestará em atuações, somatizações, adições, projeções ou delírios.
Para Winnicott, a constituição da pulsão é secundária à relação primária psiqueambiente; o mesmo ocorre com o objeto, uma vez que ele é investido antes de ser percebido. Considera-se que a pulsão é organizada pelas respostas que o ambiente dá às manifestações instintuais da criança. Assim, temos pulsão de vida, destrutividade ou inibição pulsional dependendo da qualidade das respostas do ambiente.
Na situação clínica, o squiggle oferece uma ilustração da prática analítica em duplo, enquanto a idéia de transicionalidade verbal leva a um novo modelo de análise: a interinfl uência como interindução de pensar age como aparelho de transformação, de ligação e de criação de vínculos na relação intersubjetiva, tornando possível uma atividade perceptiva construtiva, criativa, na qual a figuração psíquica está incluída e é elaborativa. Veremos no exemplo clínico de Christine uma situação em que os processos primários de deslocamento e condensação, desconectados de processos secundários, regem certas percepções excluindo a simbolização, isto é, a elaboração e a integração.
A intersubjetividade
Brusset faz uma ressalva à teoria da intersubjetividade, pois ela implica a reciprocidade entre dois sujeitos, situando-se, portanto, na experiência consciente e pré-consciente, não levando em conta a lógica do inconsciente pulsional, da confl itualidade intrapsíquica e da transferência.
Lacan, por sua vez, escreveu: Enquanto ficarmos no registro analítico precisamos admitir a intersubjetividade na sua origem (1975). Ele valorizou a relação do sujeito ao outro, e não do sujeito ao sujeito. Aqui o desejo é concebido a partir de uma falta fundamental, como busca da identidade através do enigma do desejo do outro, sendo fiel portanto à lógica do inconsciente. Lacan critica a teoria da relação de objeto, bem como a ilusão psicológica da relação sujeito a sujeito, introduzindo a tríade real, simbólico e imaginário.
Porém Brusset critica também a posição de Lacan e conclui que a intersubjetividade que interessa à psicanálise está em relação com a intrasubjetividade, mas há menos ambigüidade quando falamos do interpsíquico do que quando falamos do intersubjetivo.
Os espaços psíquicos e os vínculos. Projeção/introjeção, indiferenciação primária e limites do eu
Vimos inicialmente com Green que o vínculo supõe o entre-dois, o que liga, junta: nem um nem outro separadamente. Está implícita aqui a noção de espaços, os espaços da indiferenciação primária e dos limites do eu, bem como a noção de processos, notadamente projeção/introjeção, assim como representação, simbolização etc.
Em psicanálise, o vínculo da palavra é objetal e/ou narcísico, identificatório, passional ou perverso, tributário de fixações aos estágios iniciais do desenvolvimento libidinal, e na situação analítica caracteriza a transferência. Situa-se, na metapsicologia, em referência ao pulsional e à noção freudiana de ligação desligamento.
Para Bion tem um sentido forte: descreve uma vivência emocional na qual duas pessoas ou duas partes de uma pessoa estão em inter-relação. As emoções de amor, raiva e conhecimento estão sempre presentes quando há vínculo. Bion inclui esses três tipos de vínculo como fundamento de suas teorias, assim como a noção de ataques contra os vínculos:
O vínculo é a capacidade de o analista introjetar as identificações projetivas do paciente. Os ataques contra os vínculos são sinônimo, portanto, dos ataques contra a tranqüilidade da mente do analista, e na origem, da mãe.
Assim, metapsicologicamente situados, para Bion os vínculos se distinguem das relações interpessoais; o que conta no vínculo são seus componentes inconscientes. Para ele, a diferença tópica dos elementos beta e alfa resulta logicamente da diferença entre a atividade psíquica da criança/mãe ou do paciente/analista. A função alfa fornece um novo modelo de ação do psicanalista. Aqui, a tópica do vínculo é fundadora e redefine as pulsões e os pensamentos nas suas relações com as emoções e com as experiências corporais primárias.
Partindo da idéia de um estado inicial de indiferenciação indivíduo-ambiente, poderíamos considerar a pulsão como causa e efeito de uma primeira elaboração psíquica, de uma primeira organização em que a pulsão se torna secundária às etapas que antecedem o sensório-motor, a emoção confundida com as sensações e as impressões sensoriais nos primeiros vínculos de amor, ódio e conhecimento. O pulsional pode ser então considerado como uma qualidade dos vínculos de amor, ódio e conhecimento.
A projeção apresenta a questão das relações entre a representação e a percepção, o alucinatório e o figurável. Desde a metapsicologia de 1915, em que os mecanismos de projeção/introjeção determinavam a distinção eu/não-eu, e portanto o sentido de realidade, passando pela projeção animista e pelo curto-circuito tópico do delírio, chegamos, com Bion, à identificação projetiva, criadora de vínculos que desloca os limites entre o eu e o outro, o mundo interno e o mundo externo.
Esses conceitos são importantes para entender não só o que ocorre na psicose, mas também em patologias freqüentes na atualidade, como as adições, anorexia e funcionamentos em exterioridade, nos quais se tenta atenuar a ausência de introjeções estruturantes do narcisismo com a atuação no corpo, que funciona como uma espécie de substituição do aparelho psíquico.
Precisaremos considerar a pluralidade dos níveis tópicos e das operações de simbolização que a transicionalidade winnicottiana nos oferece como um modelo aberto, se quisermos teorizar as figurações através de sintomas e de objetos construídos no intercâmbio psicanalítico sem nos prender ao modelo das relações de objeto com os impasses lógica da fenomenologia existencial que esse modelo implica nessas situações.
Para finalizar, podemos considerar que a terceira tópica propõe em análise que o que está em primeiro plano é o espaço analítico entre o si-mesmo (paciente) e o objeto (analista) cujos limites são processos de transformação e simbolização. E é a partir daqui que tomam sentido os pontos de vista dinâmico e econômico.
Referências
Green, A. (1990). Folie privée (psychanalyse des cas-limites). Paris: Gallimard. [ Links ]
____ (2002). Idées directrices pour une psychanalyse contemporaine. Paris: PUF. [ Links ]
Lacan, J. (1994). Le Seminaire. Livre IV: La Relation d´objet. Paris: Seuil. (Trabalho original publicado em 1956-1957.) [ Links ]
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