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Revista Psicologia Organizações e Trabalho
versión On-line ISSN 1984-6657
Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.17 no.4 Brasília oct.-dic. 2017
https://doi.org/10.17652/rpot/2017.4.13736
Empreendedorismo no ensino superior: estudo psicométrico da escala oportunidades e recursos para empreender
Entrepreneurship in higher education: a psychometric study of the scale of opportunities and resources for entrepreneurship
El espíritu empresarial en la educación superior: estudio psicométrico de la escala de oportunidades y recursos para emprender
Pedro Miguel Santos Dinis ParreiraI; Carla Maria Santos de CarvalhoII; Lisete dos Santos MónicoII; Ana Sofia Marques de Oliveira Pereira SantosII
IEscola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal
IIUniversidade de Coimbra Portugal
RESUMO
O empreendedorismo pode ser definido como a tentativa de criar um novo projeto, gerar o próprio emprego ou expandir um negócio já existente. Apesar de existirem diversas escalas de empreendedorismo, a maioria reporta-se à avaliação efetuada por empresas. O presente estudo visa testar as propriedades psicométricas da escala Oportunidades e Recursos para Empreender em estudantes do Ensino Superior, centrando-se nos fatores que influenciam o comportamento empreendedor. A escala foi administrada a 6532 estudantes do ensino politécnico. Foi realizada uma análise fatorial exploratória com metade da amostra dividida aleatoriamente, tendo emergido quatro fatores: F1-Disponibilidade de Recursos, F2-Estabilidade do Negócio, F3-Instabilidade Económica e Política e F4-Oportunidades de Negócio. Com a segunda amostra realizou-se uma análise fatorial confirmatória, tendo apresentado bons índices de ajustamento. O estudo sustentou a robustez psicométrica do instrumento em análise, demonstrando que os fatores do meio são percebidos pelos estudantes como importantes variáveis promotoras do empreendedorismo em Portugal.
Palavras-chave: Empreendedorismo; Influências Empresariais; Fatores do Meio.
ABSTRACT
Entrepreneurship can be defined as an attempt to launch new projects, create self-employment opportunities, or expand existing businesses. There are multiple entrepreneurship measurement scales; however, most of them are aimed at corporate evaluation. This study intends to analyze the psychometric properties of the Opportunities and Resources for Entrepreneurship scale in a sample of university students, focusing on factors that influence entrepreneurial behaviors. The sample consisted of 6,532 polytechnic university students. The sample was randomly divided into two equal-sized groups. An exploratory factor analysis was run using one subgroup, from which four factors emerged: F1-Resource Availability, F2-Business Stability, F3-Economic and Political Instability, and F4-Business Opportunities. A confirmatory factor analysis was then done using the other subgroup, which showed acceptable goodness-of-fit levels. This study demonstrated the psychometric robustness of the instrument under analysis, as well as that students perceive environmental factors as important variables that promote entrepreneurship in Portugal.
Key words: Entrepreneurship; Business Influences; Environmental Factors.
RESUMEN
El emprendimiento empresarial puede definirse como el intento de crear un nuevo proyecto, generar empleo por cuenta propia o ampliar un negocio ya existente. Pese a que existen diversas escalas de emprendimiento empresarial, la mayoría se refiere a la evaluación efectuada por las empresas. El presente estudio tiene como objetivo probar las propiedades psicométricas de la escala Oportunidades y Recursos para emprender en estudiantes de la educación superior, focalizando en los factores que influyen en el comportamiento emprendedor. Se administró la escala a 6532 estudiantes de enseñanza superior politécnica. Se realizó un análisis factorial exploratorio, a partir del cual surgieron cuatro factores: F1-Disponibilidad de Recursos, F2-Estabilidad del Negocio, F3-Instabilidad Económica y Política, y F4-Oportunidades de Negocio. Con la segunda muestra se realizó un análisis factorial confirmatorio, el cual presentó buenos índices de ajuste. El estudio sostuvo la robustez psicométrica, y demostró que los estudiantes perciben las influencias ambientales como importantes variables que promueven el empredimiento empresarial en Portugal.
Palabras clave: Empredimiento empresarial; Influencias empresariales; Factores del medio.
Desde a origem do ensino do empreendedorismo, que remonta a 1947 na Harvard Business School, temos vindo a assistir a uma expansão da investigação do tema e da crescente participação dos próprios estudantes em programas de empreendedorismo (Lorz, Mueller, & Volery, 2013). Esse crescimento pode ser explicado por diversos fatores, tais como: a) reconhecimento por parte do governo da importância do empreendedorismo no desenvolvimento socioeconómico do país/sociedade (Mwasalwiba, 2010); b) maior investimento no ensino, quer através da criação de centros de empreendedorismo, quer da formação de formadores nesta área, quer ainda da estimulação da investigação neste âmbito (Klandt, 2004); c) e de um maior envolvimento dos estudantes em programas de empreendedorismo (Katz, 2003). Ora, o empreendedorismo enquanto motor de desenvolvimento, de criação de riqueza e de emprego, remete para a importância da educação e da criação de condições para o seu pleno desenvolvimento (Herrington & Kew, 2017; Kelley, Singer, & Herrinton, 2016; Parreira, Salgueiro-Oliveira, Castilho, Melo, Graveto, & Gomes, 2016).
O presente estudo enquadra-se no programa Poliempreende1 (Empreendedorismo no Ensino Politécnico Português), recorreu a uma amostra de estudantes do ensino superior politécnico português, para recolha de informação através de um questionário sobre as motivações pessoais e os fatores facilitadores do empreendedorismo (Pereira, 2001), centrando-se nos fatores que influenciam o comportamento empreendedor dos estudantes do ensino superior politécnico português.
Esta investigação tem por base o modelo conceptual Global Entrepreneurship Monitor (GEM) que salienta a existência de um conjunto de condições essenciais para fomentarem o empreendedorismo e que apelam à necessária conjugação da academia, do setor empresarial, do Governo e da sociedade civil, corporizado no modelo da Quadruple Helix (Herrington & Kew, 2017). Tal modelo valoriza as condições económicas, políticas, sociais e culturais no qual o empreendedor se insere, sendo por isso requerida a sua capacidade de avaliação das oportunidades e dos recursos disponíveis. É neste enquadramento que se inscreve a relevância da presente investigação, que pretende avaliar as propriedades psicométricas do instrumento usado, sustentando-se na necessidade de avaliarmos a perceção, por parte dos estudantes, dos fatores facilitadores do empreendedorismo, nomeadamente no que respeita à disponibilidade de recursos, e à perceção das oportunidades de negócio, sobretudo em cenários de instabilidade económica e política.
Estas dimensões são vitais para uma avaliação criteriosa das ideias geradas na academia, que requerem avaliações do mercado através de ferramentas como sejam as análises SWOT (Forças [Strengths], Fraquezas [Weaknesses], Oportunidades [Opportunities] e Ameaças [Threats]). O termo PESTA, acrónico de análise das dimensões Política, Económica, Social, Tecnológica e Ambiental, permite uma análise antecipada dos fatores que poderão funcionar com facilitadores ou entraves ao sucesso da ideia de negócio gerada aquando da sua eventual entrada no mercado.
Apesar de existirem variadíssimas escalas neste domínio, como é exemplo a de Miller (1987), que avalia a orientação empreendedora, ou a escala sobre dinamismo ambiental, a maioria reporta-se à avaliação efetuada por parte de empresas. A escala de Brown, Davidsson e Wiklund (2001), sustentada na concetualização de Stevenson (1983), apesar de avaliar cinco fatores: (1) Orientação estratégica, (2) Orientação para os recursos, (3) Recompensa, (4) Orientação para o crescimento e (5) Cultura empreendedora, está mais vocacionada para empresas, ao invés de estudantes. Em suma, dado não se ter encontrado na literatura uma escala adequada para estudantes, considerámos adequado avaliar as propriedades psicométricas do instrumento previamente construído. Com este estudo, pretendemos contribuir para o processo de validação da escala de medida oportunidades e recursos para empreender, ao mesmo tempo que acreditamos contribuir para melhor compreender os fatores que influenciam o comportamento empreendedor dos estudantes.
De forma a enquadrar a investigação procedeu-se, em primeiro lugar, a uma revisão da literatura acerca dos conceitos, posteriormente analisaram-se e trataram-se os dados recolhidos, seguindo-se a análise e interpretação dos resultados obtidos, à luz das perspetivas referidas na revisão de literatura, apresentando as principais conclusões obtidas, e de algumas propostas de investigação futuras, não esquecendo as limitações encontradas.
O empreendedorismo
Para muitos autores (e.g., Cantillon, 1755; Parreira, Pereira, & Brito, 2011; Parreira, Pereira, Arreguy-Sena, Salgueiro, Gomes, & Marques, 2015; Sarkar, 2010) a noção de empreendedorismo deriva do francês entrepreneur que significa estar no mercado entre o fornecedor e o consumidor. Contudo, não parece existir consenso quanto à sua definição, o que para muitos autores constitui, desde logo, um entrave para o seu estudo (e.g., Nazir & Ramzan, 2012; Testas & Moreira, 2014). Quanto às suas origens, Sarkar (2010), Sexton e Landstrom (2000) referem que só no final dos anos 70 e inícios dos anos 80 se iniciou verdadeiramente a investigação do tema, de forma rigorosa, científica e sistemática.
Não obstante, para alguns autores (Global Entrepreneurship Monitor, 2010; Mustapha & Selvaraju, 2015; Nazir & Ramzan, 2012; Shah, Gao, & Mittal, 2015; Testas & Moreira, 2014), algumas noções como a criação, a inovação, o risco, o desenvolvimento de negócios geradores de emprego, riqueza e desenvolvimento económico, são alguns dos aspetos associadas ao empreendedorismo comummente aceites pelos autores. Assim, para muitos o empreendedorismo é algo que contribui para uma estrutura económica saudável e rica, caracterizada por um desenvolvimento social e cultural associado a elevados níveis de bem-estar (Coduras, Saiz-Álvarez, & Ruiz, 2016; Herrington & Kew, 2017; Saiz-Álvarez, Coduras, & Cuervo-Arango, 2013).
Segundo o GEM (2010), o empreendedorismo define-se como "qualquer tentativa de criação de um novo negócio ou nova iniciativa, tal como emprego próprio, uma nova organização empresarial ou a expansão de um negócio por parte de um indivíduo, de uma equipa de indivíduos, ou de negócios estabelecidos" (p.3).
No relatório GEM (2017) o empreendedor é identificado através do seu comportamento proativo, inovador e de assunção de risco, integrado na especificidade do contexto económico político, cultural e social no qual se insere (Herrington & Kew, 2017). Daí que o empreendedor seja reconhecido pela capacidade em assumir riscos e transformar situações ambíguas em oportunidades de negócio, de forma a obter sucesso (Bucha, 2009; Duarte & Esperança, 2012). Segundo Duarte e Esperança (2012), o empreendedor, para além de procurar novas soluções, é capaz de aplicar estratégias competitivas e de liderar e motivar as suas equipas através de uma atitude de desafio e superação. Neste sentido, o empreendedorismo surge muitas vezes associado às características da personalidade do empreendedor (e.g., Bucha, 2009; Parreira et al., 2011; Raposo, Paço, & Ferreira, 2008; Sarkar, 2010; Rauch & Frese, 2007). Para Shah, Gao e Mittal (2015), a capacidade de empreender é influenciada não só pelas características individuais ou de personalidade, como também pelo meio em que o sujeito se insere, e pelas oportunidades e recursos disponíveis (Herrington & Kew, 2017). Assim, aspetos como a educação, a cultura, o meio e as experiências de vida são capazes de influenciar o comportamento empreendedor (Volkmann, 2004), sendo possível desenvolver estas características (Herrington & Kew, 2017; Testas & Moreira, 2014).
Parreira et al. (2011) defendem que os traços de personalidade mais salientes no comportamento empreendedor são a abertura à experiência e a capacidade de inovar, a personalidade pró-ativa, a tolerância ao stresse, a extroversão e a amabilidade. No entanto, não existe consenso aparente relativamente a este respeito. Por exemplo, Ferreira, Santos e Serra (2010) defendem que o empreendedorismo não é algo inato nem intrínseco, sendo as atitudes e os comportamentos aquelas que definem verdadeiramente um empreendedor.
Alguns autores (e.g., Rauch & Frese, 2007) efetuaram uma revisão da literatura sobre a relação entre os traços de personalidade (caracterizados a partir do instrumento Big Five) e o empreendedorismo, e constataram quão abundante era a investigação sobre este tópico. Por exemplo, a meta-análise levada a cabo por Rauch e Frese (2007) tinha por objetivo averiguar em que medida estes traços de personalidade poderiam ser vistos como mediadores de uma possível influência genética na tendência para ser empreendedor. Os resultados encontrados nesta meta-análise sugerem os seguintes traços de personalidade relacionados com o comportamento empreendedor: a necessidade de realização, a auto-eficácia, a inovação, a tolerância ao stresse, a necessidade de autonomia, a dominância e a personalidade pró-ativa.
Na revisão de literatura encetada, constatou-se que várias são as perspetivas encontradas neste domínio, apontando para uma dupla influência das características de personalidade e do meio no comportamento empreendedor. O próprio modelo GEM (2016 e 2017) apela também à importância do contexto social, cultural e político (influências do meio) para além das características da personalidade, como importantes condicionantes do empreendedorismo (Herrington & Kew, 2017; Kelley, Singer, & Herrinton, 2016). Na mesma ótica, Bucha (2009) refere que o empreendedorismo, enquanto tema complexo, deve ser estudado de forma integrada, pelo que esta multiplicidade de perspetivas representa uma mais-valia para o seu estudo, ao invés de um entrave à investigação.
Dada a complexidade da ação empreendedora e o seu impacto positivo no desenvolvimento de um país, o envolvimento de diferentes stakeholders neste processo revela-se fundamental no suporte e na implementação de novos projetos empreendedores (Carayannis, 2014). É neste sentido que o modelo da Quadruple Helix se torna crucial, dado apelar à conjugação da ação de vários stakeholders para o sucesso do empreendedor, nomeadamente da academia, do tecido empresarial, do governo e da sociedade (Herrington & Kew, 2017). Neste contexto, o estudo do empreendedorismo pressupõe uma análise dos vários fatores condicionantes, quer internos como as características de personalidade e as motivações internas, quer externos como a disponibilidade de recursos, de oportunidades, apoios, formação, legislação, políticas e níveis de desemprego (Carayannis, 2014; Shah, Gao, & Mittal, 2015).
Influências do meio
A forma como o fator ambiental influencia o desempenho empreendedor tem sido amplamente estudada (e.g., Borges, Mondo, & Machado, 2016; Taylor, 2006) contribuindo com informação relevante para criar condições favoráveis para o desenvolvimento do empreendedorismo no mercado (Borges et al., 2016). De acordo com estes últimos autores, o meio pode ser descrito como um conjunto de fatores exógenos que criam condições para o desenvolvimento de atividades empresariais. Assim, as instituições, regulamentos, leis, políticas, conhecimentos e redes são agentes que influenciam a atividade empreendedora. Kuratko e Hodgetts (2001) referem que o ambiente se reporta a conjunto de oportunidades externas à organização e que a influenciam. Segundo Timmons, Zacharakis e Spinelli (2004) o empreendedorismo, enquanto processo social dinâmico, resulta da interação entre o empreendedor, a equipa, a oportunidade, a ideia e os recursos disponíveis.
Pereira (2001) e Bygrave (2003), por sua vez, sustentam que, ao falar em ambiente, deve ter-se em consideração a disponibilidade de recursos, a existência de mão-de-obra qualificada, a acessibilidade a fornecedores, aos mercados e aos clientes, as influências governamentais, o poder de compra, as condições da zona de implementação e o nível da base industrial. Borges, Mondo e Machado (2016) salientam também a importância da cultura, tal como do meio, enquanto fatores capazes de impulsionar ou restringir o empreendedorismo. Nesse sentido, referem que a análise do ambiente deve compreender, entre outros, aspetos económicos, de infraestrutura e políticos. Nesta perspetiva Nayab (2011), aponta como principais influências do meio as de natureza social e cultural, como as políticas governamentais, as económicas e a disponibilidade de recursos. As influências de natureza social e cultural dizem respeito à organização social, às atitudes sociais face ao negócio (Shapero, 1984) e às crenças que têm impacto nos comportamentos e nas atitudes dos indivíduos (Parreira et al., 2011).
As mudanças demográficas e as mudanças resultantes de estilos de vida são igualmente consideradas influências do meio. No âmbito social destacam-se as redes sociais em que o indivíduo está inserido e que influenciam a atividade empreendedora (Aldrich & Zimmer, 1986; Parreira et al., 2011). Para estes autores, quanto às influências de natureza política, patentes nas ideologias disseminadas pelo Estado, existe uma tendência para, quanto mais liberal este for, maior a sua visão do empreendedorismo como vertente estratégica e de desenvolvimento da sociedade. Dado que as políticas têm carácter instável e temporário, sendo ora capazes de encorajar ora de desencorajar o empreendedorismo, são necessários outros apoios, tais como financiamento, desburocratização e criação de infraestruturas, de modo a facilitar e fomentar o empreendedorismo.
Para além da influência política, e embora relacionado com esta, a organização da economia, o poder de compra e os níveis de confiança na economia de uma determinada sociedade assinalam os fatores de natureza económica. Daí que o desenvolvimento económico da sociedade tenha impacto na criação de oportunidades. Com efeito, é em períodos de maior recessão que surgem grandes oportunidades de negócio (Parreira et al., 2011; Parreira et al., 2015). Nesse sentido, alguns autores (e.g., Friedlander & Pickle, 1968; Shapero, 1984) já em décadas passadas referiam que um cli-ma de apoio se revela essencial para o desenvolvimento de novos negócios (Shapero, 1984), assim como a existência de clientes para o produto ou serviço criados (Friedlander & Pickle, 1968).
A disponibilidade de recursos é também considerada como outro importante fator. A este nível destaca-se a existência de recursos financeiros, humanos, materiais e físicos. Os recursos humanos reportam-se à equipa e à sua confiança, os quais permitem a concretização do negócio. Igualmente influentes na criação do negócio são os recursos materiais disponíveis para os processos produtivos, assim como os recursos físicos (Parreira et al., 2011).
Não obstante o reconhecimento do impacto positivo do empreendedorismo na inovação, na criação de emprego, na produtividade e na economia, persistem, contudo, algumas dificuldades na sua promoção (Sarkar, 2010). Enquanto processo socialmente construído, está sujeito à influência de vários stakeholders e vários fatores: academia, setor empresarial, Governo, sociedade civil (Herrington & Kew, 2017; Sousa, 2014), a cultura, o meio e a educação (Bucha, 2009; Sarkar, 2010).
A aversão ao risco e à incerteza e o receio de falhar, o desconhecimento dos apoios e incentivos, o clima económico desfavorável, a carga burocrática associada à criação de uma empresa e a escassez de disciplinas de empreendedorismo no ensino, constituem fortes obstáculos ao empreendedorismo (e.g., Bucha, 2009; Comissão das Comunidades Europeias, 2003; Duarte & Esperança, 2012; Ferreira, Santos, & Serra, 2010).
No entanto, para Nijkamp (2003), as motivações pessoais, os fatores psicológicos, o ambiente social e a cultura externa de negócios, representam alguns dos fatores facilitadores do empreendedorismo. E de acordo com Shapero (1984), fatores como o desemprego, a disposição para agir, a credibilidade e a disponibilidade de recursos desempenham um importante papel de alavancagem do empreendedorismo. Deste modo, a valorização do empreendedorismo (Nijkamp, 2003), assim como as mudanças no mercado de trabalho, nas estruturas institucionais e governamentais e na tecnologia, e as alterações sociodemográficas são fatores que podem promover o empreendedorismo (Baumol, 1990). Diversos estudos (e.g., Aldrich, 2000; Knorr, Alvarez, & Urbano, 2013) têm sido realizados neste âmbito evidenciando contributos para a melhoria das condições do meio empreendedor. Por exemplo, para Knorr et al. (2013), a criatividade, a assunção de riscos e a independência, aumentam a probabilidade de alguém criar um negócio próprio. Por sua vez, Urbano e Alvarez (2014) sugerem que a menor burocratização na constituição de uma empresa, a importância atribuída pelos mídia para os novos negócios, as melhores competências e os conhecimentos empresariais e um menor receio do insucesso, são fatores suscetíveis de contribuírem para um aumento da probabilidade de vir a ser empreendedor. Já os estudos conduzidos por Kibler e Kautonen (2016) sugerem a influência das normas morais na sociedade sobre o empreendedorismo, sendo que quanto maior a perceção do grau de legitimidade moral, maior a probabilidade de criar um negócio. Por outro lado, Qian e Miao (2016) referem que fatores pessoais como o medo de arriscar podem influenciar negativamente o empreendedorismo. No entanto, o aumento do conhecimento e a existência de uma cultura promotora da autonomia reduzem o medo de arriscar e, consequentemente, encorajam a atividade empreendedora. Segundo Parreira et al. (2011), a nível nacional, os empreendedores destacam oito fatores da influência do meio: (1) Expectativa de lucro, (2) Predisposição para a procura de incentivos, (3) Facilidade de fornecimento, (4) Facilidade de criar uma estrutura, (5) Aproveitar insucessos de outras empresas, (6) Facilidade em identificar os clientes (7) Apoio familiar e facilidade na criação de uma empresa, (8) Facilidade em identificar e conhecer a concorrência.
Por tudo o que foi referido, fica patente a ideia de que ao nível do empreendedorismo, a análise dos fatores do meio permite assinalar que as condições criadas são suscetíveis de terem impacto no presente e no futuro. Além destes fatores, a educação promovida pela academia e as características pessoais, têm um importante papel na promoção do empreendedorismo. Com efeito, segundo Borges et al. (2016), a compreensão destas influências é relevante para a realização de melhorias substanciais na academia e nos cursos, de forma a impulsionar o empreendedorismo e, consequentemente, a economia.
Neste sentido, reforçamos a importância para o desenvolvimento de estudos neste âmbito, iniciados pela criação e validação de instrumentos adequados a estes objetivos. As investigações prévias realizadas por Parreira et al., em 2011, e posteriormente por Parreira et al., em 2015, têm vindo a destacar-se nesta área, pretendendo dar resposta à questão: qual o potencial empreendedor do estudante do Ensino Superior Politécnico e que fatores influenciam esse potencial?, tendo por base o projeto Poliempreende.
Alguns estudos prévios
De facto, podemos citar uma série de investigações que apelam à importância das novas oportunidade de negócios e de realização (Foss, Lyngsie, & Zahra, 2015). A importância da experiência laboral é também evidenciada nos estudos de Moog, Werner, Houweling e Backes-Gellner (2015). Colombatto e Melnik (2007) demonstraram a relação entre a experiência de trabalho inicial e o potencial empreendedor. A formação em empreendedorismo e a experiência empresarial anterior também surgem como aspetos importantes para o sucesso, segundo Saiz-Álvarez, Cuervo-Arango e Coduras (2013). Os estudos GEM realizados por Coduras, Levie, Kelley, Saeundsson e Schøtt (2008) evidenciaram uma correlação positiva entre a formação e o treino em empreendedorismo e o interesse pelo empreendedorismo, como opção profissional.
Os estudos de Piperopoulos e Dimov (2015) assinalam a importância da formação académica em empreendedorismo com uma orientação mais prática, ao invés de teórica. Com efeito, os autores encontraram resultados que sustentam a ideia de que, perante formações mais teóricas, os níveis de auto-eficácia dos estudantes estavam associados a baixos níveis de intensão empreendedora. Por sua vez, em formações de cariz mais prático, a relação atrás referida foi inversa, i.e., níveis elevados de auto-eficácia dos estudantes estavam associados a níveis elevados de intensão em empreender. Chen et al. (2015) assinalam ainda a importância da figura do mentor na melhoria da satisfação dos estudantes com o curso e no aumento da eficácia de aprendizagem dos estudantes. Ainda neste âmbito, e respeitante à perceção de oportunidades e sua relação com o empreendedorismo, Krueger e Dickson (1994), sugerem que os empreendedores tendem a perceber as oportunidades de forma diferente, comparativamente aos não empreendedores, considerando-se os primeiros mais competentes, e com uma maior auto-eficácia ou confiança. Simon, Houghton e Aquino (2000), os empreendedores tendem a evidenciar um maior nível de confiança nas suas competências, comparativamente aos não empreendedores. Dando continuidade à referida investigação e integrando parte da equipa inicial do projeto, este estudo tem como objetivo efetuar uma análise das características psicométricas da escala oportunidades e recursos para empreender. Considera-se, pois, essencial analisar as propriedades psicométricas da escala influências do meio no comportamento empreendedor, para a realidade portuguesa para podermos prosseguir com estudos neste domínio, quer em diferentes populações e culturas (e.g., ensino universitário; outros países). A construção destas medidas, devidamente validadas, culturalmente adaptadas, contribuirá para avaliar o desenvolvimento de programas de intervenção que visam satisfazer as necessidades dos estudantes e da academia e superar as dificuldades a este nível, bem como contribuir para a melhoria dos programas e/ou criação de novos programas/curriculum nas instituições de ensino, mais adaptados à realidade e às expectativas dos formandos.
Método
Os dados da amostra (Tabela 1) foram recolhidos por questionário junto dos estudantes do ensino superior politécnico português associadas ao programa Poliempreende.
Portugal tem vindo a combater o défice em cultura empreendedora associado a um comportamento da população portuguesa avesso ao risco e à aposta na inovação (Parreira et al., 2011). Neste sentido, muitas instituições de ensino superior têm vindo a manifestar uma crescente preocupação com esta matéria, lançando, concursos e oferecendo formação em empreendedorismo. O programa Poliempreende é um Concurso de Empreendedorismo que iniciou um interessante percurso de crescimento e consolidação, no âmbito do qual se constituiu a amostra do presente estudo, composta por 6532 estudantes das 17 instituições de ensino superior politécnico português associadas ao programa.
Atendendo ao objetivo do programa Poliempreende (promover o espírito empreendedor nas comunidades académicas, disponibilizando formação em sessões temáticas- oficinas de empreendedorismo, concursos de ideias de negócio e a apresentação de planos de negócio) foi necessário, num primeiro momento, auscultar a opinião dos estudantes acerca das oportunidades e de recursos para empreender.
Participantes
A amostra foi constituída por conveniência e estratificada por área de curso (saúde, gestão, tecnologias e ciências sociais) e anos das licenciaturas em cada instituição, bem como por género, condição perante o ensino, estado civil e existência de familiares empresários.
Preconizou-se a recolha de 40 questionários por cada ano de licenciatura de cada uma das áreas referidas, obtendo-se uma amostra de 6532 estudantes, com uma média de idades de 22 anos, sendo a idade mínima e máxima, respetivamente, de 17 e 59 anos.
Instrumentos
Procedeu-se a uma divisão aleatória da amostra em duas, contendo a Amostra 1 50% dos casos cujas respostas foram sujeitas a uma análise fatorial exploratória (AFE) e a Amostra 2 os restantes 50% dos casos, tendo sido realizada a análise fatorial confirmatória (AFC). A caracterização de ambas as amostras consta na Tabela 1.
Procedimentos de coleta e análise de dados
A recolha de dados foi efetuada com recurso ao método do inquérito por questionário auto-administrado com vista a operacionalizar os objetivos do estudo (Parreira et al., 2011).
O questionário intitulado "motivações pessoais e fatores facilitadores do empreendedorismo" foi criado por um painel de cinco experts de diferentes áreas. O seu desenvolvimento teve por base as escalas sobre os motivos para a criação de empresas, as influências sociais e do meio e os apoios para a criação de empresas. Estas escalas tiveram em consideração o trabalho desenvolvido pela Society for Associated Researchers on International Entrepreneurship (SARIE) e no qual contribuíram diversos teóricos reputados (e.g., Baumol, 1990; Shapero & Sokol, 1982). Foram ainda considerados os motivos empresariais de McClelland (1961), os trabalhos de Pereira (2001) no âmbito das representações sociais dos empresários, bem como as questões pertinentes relativas às instituições e ao projeto Poliempreende.
Pereira (2001) havia já realizado um estudo piloto do questionário intitulado "motivações pessoais e fatores facilitadores do empreendedorismo", composto por 22 itens da escala oportunidades e recursos para empreender, embora com ligeiras adaptações. Aos respondentes foi solicitado que, aos 22 itens do questionário, através de escala de likert de cinco pontos (1= pouco importante/influente a 5= muito importante/influente).
As questões de natureza sociodemográfica presentes no questionário solicitavam informação sobre o sexo, área e ano do curso frequentado pelo estudante, condição perante o ensino (se estudante ou trabalhador-estudante), estado civil e instituto onde estudava.
Os questionários foram distribuídos aos coordenadores do concurso Poliempreende responsáveis pela recolha em cada instituição. Por sua vez estes distribuíam os questionários coletivamente em sala de aula durante o ano letivo, sendo o tempo médio de resposta de aproximadamente 20 minutos. Cada responsável esteve presente nas sessões, respondendo a todas as questões solicitadas pelos estudantes no decurso do preenchimento do questionário. Foram cumpridos os pressupostos éticos de uma investigação, designadamente, a informação sobre a natureza do estudo, o consentimento informado e o anonimato das respostas. Os estudantes foram também informados de que poderiam desistir de responder ao questionário a qualquer momento, caso assim o desejassem.
Foram eliminados os respondentes com mais de 10% de não-respostas. Os restantes missing-values, todos MCAR, foram substituídos pelo método series mean. Previamente à realização das análises fatoriais exploratória e confirmatória, averiguou-se a distribuição dos itens pelas cinco opções de resposta. As frequências relativas confirmaram que os itens se distribuem por todas as opções de resposta da escala, nenhuma opção absorvendo significativamente mais de 50% de respostas.
A AFE realizou-se através de uma Análise em Componentes Principais (ACP) com o programa SPSS (IBM, v. 22.0) com 50% da amostra (N = 3266), aleatoriamente distribuída (comando rv. Uniform; cf. Amostra 1 no Tabela 1). Testaram-se os pressupostos de uma correta ACP através da dimensão da amostra, da normalidade e linearidade das variáveis, bem como dos valores extremos outliers, fatorabilidade do R e adequação amostral (Tabachnick & Fidell, 2013). Optámos por utilizar o método de rotação Varimax, dado que pretendemos obter fatores tão distintos quanto possível.
As AFCs foram realizadas com o "software AMOS", v. 22 (Arbuckle, 2010), com a segunda metade da amostra aleatoriamente distribuída (cf. Amostra 2 no Tabela 1). Recorreu-se ao método de estimação da máxima verosimilhança Maximum Likelihood. A fiabilidade compósita e a variância média extraída para cada fator foram analisadas como descrito em Fornell e Larcker (1981). A presença de outliers foi avaliada pela distância quadrada de Mahalanobis (Tabachnick & Fidell, 2013), não tendo sido encontrados valores considerados relevantes. A normalidade das variáveis foi analisada pelos coeficientes de assimetria (Sk) e de curtose (Ku). Nenhuma das variáveis apresentou valores de Sk e Ku que pudessem indicar violações da distribuição normal, sendo que |Sk| < 1.5 e |Kuunivariada| < 2.
A qualidade do ajustamento global dos modelos fatoriais foi feita pelos índices de NFI (Normed of fit index; bom ajustamento >.80; Schumacker & Lomax 1996), SRMR (Standardized Root Mean Square Residual; ajustamento apropriado <.08; Brown 2006), TLI (Tucker-Lewis Index; ajustamento apropriado >.90; Brown, 2006), CFI (Comparative fit index; bom ajustamento >.90; Bentler 1990), RMSEA (Root Mean Square Error of Approximation; bom ajustamento <.05, ajustamento aceitável <.08; Kline, 2011; Schumacker & Lomax 1996; Marôco, 2011) e X2/gl (ajustamento aceitável < 5; bom ajustamento < 2; Marôco, 2011; Schumacker & Lomax, 1996).
O aperfeiçoamento do ajustamento do modelo foi avaliado pelos índices de modificação (IM; Bollen, 1986). Seguimos a sugestão de Arbuckle (2010), que indica analisar os IM através da sua significação estatística, considerando o valor de α = .05. Outro critério utilizado centrou-se em Marôco (2011), que aconselha ser mais seguro modificar os parâmetros com IM superiores a 11 (p < .001).
A fidedignidade foi avaliada através do cálculo do coeficiente alpha de Cronbach (Nunnally 1978). Seguimos a indicação de Hair, Black, Babin e Anderson (2010), que referem coeficientes de consistência interna superiores a .70 para indicar adequada convergência e consistência interna. Entre outros autores, Hill e Hill (2012) apontam o valor de .80 como indicador de uma boa consistência interna.
Resultados
Análise fatorial exploratória
Tal como referido anteriormente, realizou-se uma AFE com 50% da amostra aleatoriamente distribuída. Atendendo aos critérios propostos em termos de dimensão da amostra (Bryman & Cramer, 1993; Gorsuch, 1983), é necessário um mínimo de 100 participantes por análise e uma razão de cinco sujeitos por item. A razão encontrada para a escala sobre oportunidades e recursos para empreender é de 148 participantes por cada item.
Todos os requisitos necessários a uma interpretação fiável da ACP foram cumpridos. Verificou-se que a matriz de intercorrelações difere da matriz de identidade, na medida em que o teste de Bartlett indica um c2 (231) = 33518.22, p < .001, e a amostragem revelou-se adequada, já que o valor obtido para a medida de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) foi superior a .70 (obteve-se um valor de KMO = .921). Tanto o critério eigenvalue superior à unidade como o scree plot indicaram a retenção de quatro fatores, responsáveis por 60.37% da variância total.
O primeiro fator extraído - disponibilidade de recursos - explica 22.38% do total da variância e agrega os itens referentes aos recursos necessários ao empreendedorismo, tais como a disponibilidade de mão-de-obra qualificada, equipamentos, recursos humanos e financeiros. O segundo fator - estabilidade do negócio - explica 19.77% e envolve itens referentes às vendas, lucros, existência de clientes e de incentivos. O terceiro fator -instabilidade económica e política - explica 10.73% da variância total e engloba itens relativos à existência de negócios falidos no setor e área de residência, bem como as características de mercado e a estabilidade política. Por último, o quarto fator - oportunidades de negócio - explica 7.50% da variância e agrega os itens relativos a existência de negócios no setor e área de residência. As saturações fatoriais e as comunalidades de cada um dos fatores são expostas no Tabela 2 e encontram-se dispostas por ordem decrescente. Todos os itens saturam o respetivo fator acima de .45 (Tabachnick & Fidell, 2013).
O coeficiente de consistência interna alpha de Cronbach apresentou um valor indicativo de uma excelente fiabilidade, α =.903. A consistência interna dos fatores 1 a 3 é igualmente boa, já que superior a .80 (Nunnally, 1978). O fator 4 evidenciou igualmente consistência com um alpha de Cronbach considerado aceitável (Nunally, 1978).
Análise fatorial confirmatória
A AFC foi realizada com base na segunda metade da amostra aleatoriamente distribuída. Previamente testaram-se os modelos com um, dois e três fatores, tendo todos apresentado pior ajustamento (cf. Tabela 3, modelos de um a três fatores). O modelo de quatro fatores de primeira ordem mostrou-se melhor ajustado relativamente ao modelo de segunda ordem (cf. Tabela 3, modelos de quatro fatores). Assim, elegemos o modelo tetrafatorial de primeira ordem, confirmando a estrutura fatorial obtida na AFE com a Amostra 1 (cf. Tabela 2), com índices de ajustamento classificados como bons atendendo ao NFI = .876 (Schumacker & Lomax, 1996) e ao SRMR = .056 (Brow, 2006) e aceitáveis considerando os índices TLI = .864 (Brown, 2006), CFI = .881 (Bentler, 1990) e RMSEA = .078 (Kline, 2011; Marôco, 2011; Schumacker & Lomax, 1996). Os coeficientes de regressão estandardizados variaram entre .42 e .89.
Com base nos índices de modificação superiores a 100 correlacionaram-se os erros associados às variáveis observadas dos fatores Disponibilidade de recursos e Estabilidade do negócio (cf. Figura 1). A análise aos índices de modificação teve sempre por base a ponderação interpretativa com o referencial teórico de partida. A covariação entre os erros evidencia erros de medição sistemáticos e não aleatórios podendo, no caso da presente investigação, resultar de construção frásica semelhante, do posicionamento sequencial no instrumento, embora também não se possam descurar as características específicas dos respondentes (Aish & Jöreskog, 1990). No entanto, após análise do conteúdo dos itens cujos índices de modificação remeteram para associações entre as proporções de variância não explicada, parece-nos que o motivo mais plausível consiste em alguma redundância semântica (e.g., itens 9-As vendas do sector pretendido serem estáveis e 10-As margens de lucro no sector pretendido serem estáveis) ou itens cujo conteúdo está implícito noutros itens (e.g., itens 2-Disponibilidade de mão de obra especializada e 1-Disponibilidade de mão de obra especializada em novas tecnologias). Após correlação dos erros a qualidade do ajustamento do modelo melhorou consideravelmente, todos os índices mostrando um bom ajustamento (cf. índices de ajustamento do modelo 2 no Tabela 3).
A consistência interna da escala na segunda amostra foi igualmente estimada pelo coeficiente de alpha de Cronbach. Os fatores F1, F2 e F3 mostraram uma boa consistência interna e o F4 uma consistência interna aceitável (Tabela 4).
Os índices de fidedignidade composta foram também bons (Tabela 4), visto serem superiores a .70 (Hair, Anderson, Tatham, & Black, 2008). Na variância média extraída, todos os fatores se situarem acima de .50, coeficiente igual ou acima do qual, segundo Bagozzi e Yi (1988), se considera um valor aceitável para a variância extraída, indicando a presença de validade convergente entre os itens de cada fator. Atendendo ao quadrado dos coeficientes de correlação, verificamos que estamos em presença de validade discriminante, dado que a proporção de variância extraída de cada fator supera o quadrado das correlações (R2) entre cada par de fatores (Fornell & Larcker, 1981).
A correlação mais forte encontrada foi de .669 entre o fator "disponibilidade de recursos" (F1) e o fator "estabilidade do negócio" (F2). Entre o fator "disponibilidade de recursos" (F1) e os fatores "instabilidade económica e política" (F3) e "oportunidades de negócio" (F4) as correlações encontradas foram de .148 e .255, respetivamente. Por sua vez, a correlação entre F2 e F3 foi de .210, e de .397 entre F2 e F4. A correlação entre F3 e F4 foi de .413. Quanto à média dos quatro fatores, foi de 3.86, 3.82, 2.96 e 3.29, respetivamente.
Discussão
Da revisão de literatura encetada sobre a temática em discussão sobressai a importância do empreendedorismo como motor do crescimento e prosperidade económica, social e tecnológica dos países (Herrington & Kew, 2017; Parreira et al., 2016).
A avaliação do ambiente para procurar oportunidades e recursos para empreender é cada vez mais valorizada, daí a importância em estarem disponíveis (e adaptados e validados para as populações em estudo) instrumentos que espelhem estas dimensões.
Apesar de existirem diversas escalas de empreendedorismo, a maioria reporta-se à avaliação efetuada por empresas. Assim, e tal como referido no início, o presente estudo visou testar as propriedades psicométricas da escala Oportunidades e Recursos para Empreender em estudantes do Ensino Superior Politécnico Português, centrando-se nos fatores do meio que influenciam o comportamento empreendedor, constituindo, uma mais-valia para a área e para o domínio investigado. Com efeito, aprofundar o conhecimento sobre o comportamento empreendedor dos estudantes, por um lado, e mapear as suas perceções quanto às oportunidades e recursos do meio ao seu dispor para empreenderem, por outro lado, permite gerar conhecimento fulcral para delinear estratégias políticas e de ensino que aproximem a academia da realidade dos estudantes e, simultaneamente, contribua para melhorar o emprego e a economia de um país.
A estrutura conceptual do GEM (2017) ao retratar as características multifacetadas do empreendedorismo, reconhece o comportamento pró-ativo, inovador e responsivo ao risco sempre em interação com contexto económico, político, cultural e social que representam as "National Framework Conditions (NFCs)" (Herrington, & Kew, 2017: 14), daí a importância da sua avaliação através de instrumentos. O GEM ao destacar a importância do meio ambiente onde o empreendedor atua, apela à academia para a capacitação dos indivíduos de competências necessárias para identificarem e aproveitar as oportunidades empresariais, daí que sejam necessários instrumentos válidos e fiáveis para avaliarem tais competências. Assim, a identificação de apoios, recursos e oportunidades revelam-se importantes dado contribuírem para melhorar o perfil de competências dos estudantes ao mesmo tempo que avaliam a perceção dos estudantes acerca do ambiente. A identificação de tais oportunidades, condições e capacidades permitem dar origem a um novo negócio, sendo a intensidade do dinamismo dos negócios determinante para o crescimento económico. Tendo em consideração a importância destas condições, consideradas como estruturantes e mediadoras da inovação e crescimento económico, torna-se essencial avaliá-las. Esta investigação contribuirá para impulsionar o empreendedorismo e possibilitará o aperfeiçoamento das condições por parte dos governos e instituições.
De acordo com o modelo do GEM (2017), no que concerne aos fatores do meio envolvente que têm impacto no empreendedorismo, os incentivos, a disponibilidade de políticas e de programas de apoio, a disponibilidade de recursos, a estabilidade do mercado, assim como a perceção de oportunidades no mercado, inscrevem-se dentro dos NFCs. Uma visão global das influências no empreendedorismo torna-se vantajosa, uma vez que capta a complexidade do processo inscrito no conjunto de diferentes fatores, agentes e contextos (GEM, 2017). Aliás reforça-se que o recentemente aprimorado modelo GEM (2017), tal como apresentado no relatório de 2016/2017, assinala que o empreendedorismo faz parte de um sistema de feedback complexo ao reconhecer que o empreendedorismo pode mediar o efeito- condições estruturais nacionais (NFCs) na criação de novos empregos e na nova criação de valor económico ou social. A atividade empreendedora surge como resultado da interação da perceção individual de uma oportunidade e capacidade (motivação e habilidades) para atuar, tendo em conta as diferentes condições percebidas do respetivo ambiente no qual o indivíduo se insere, daí a importância em avaliar tais dimensões. Como tal, a criação de instrumentos de medida que permitam medir em concreto as influências sociais e do meio é desejável. A identificação de lacunas ao nível das condições proporcionadas pelas diversas entidades permite identificar melhorias e, consequentemente, potenciar as intenções empreendedoras. Paralelamente, a criação de instrumentos de medida contribui para dar ênfase à importância do empreendedorismo, quer na comunidade científica, quer na comunidade empresarial.
Dada a inexistência, em Portugal, de instrumentos de medida que meçam especificamente as oportunidades e os recursos necessários para empreender, nomeadamente alguns fatores do meio envolvente e as influências empresariais no comportamento empreendedor dos estudantes (e potenciais futuros empreendedores), é de realçar a importância do desenvolvimento de investigações nesta área, nomeadamente na validação das características psicométricas de instrumentos como o apresentado nesta investigação.
No que respeita às limitações, assinala-se o desequilíbrio entre estudantes com experiência profissional (apenas 19% dos estudantes eram trabalhadores estudantes) contrastando como 81% de estudantes sem qualquer experiência profissional, dado estarmos a avaliar as oportunidades e recursos percebidos no meio ambiente por parte dos estudantes.
É também limitação desta investigação o não controlo da experiência prévia na construção de um plano de negócios que exige uma análise do mercado com recurso a ferramentas para efetuar análise SWOT e/ou análise PESTA, aspetos estes espelhados no questionário. Dado que na nossa amostra não controlámos em que medida os estudantes já experienciaram tal análise, poderemos considerar este aspeto como algo a incluir em investigações futuras. Ter em conta a origem (cultura) dos estudantes é um outro ponto importante a considerar em futuras investigações, bem como efectuar estudos comparativos entre países com diferentes tradições culturais de empreendedorismo.
Acresce referir que, presentemente, em Portugal assiste-se a uma democratização do empreendedorismo nas academias. Esta é fomentada através da participação dos estudantes em concursos (de que é exemplo o programa Poliempreende, recentemente transformado em programa de promoção do empreendedorismo PIN-Poli Entrepreneurship Innovation Network), onde os estudantes têm oportunidade de apresentar ideias de negócio, sendo exigida a apresentação de informação e evidências relativas à análise do mercado. Embora lentamente, constatamos um crescimento da oferta formativa nas academias, seja através da frequência por parte dos estudantes de unidades curriculares que versam sobre o empreendedorismo, seja através da participação em fóruns, conferências, cursos ou outras ações de formação que, transversalmente, apelam para este exercício de efetuarem uma análise do mercado para avaliação das oportunidades do meio, dimensão esta vital para uma avaliação da qualidade e aceitação das ideias geradas na academia por parte do mercado. No entanto, nem todos os estudantes alvo desta investigação participaram neste projeto PIN, sendo por isso uma limitação da presente investigação.
Em termos de resultados, a análise estatística dos dados revelou um bom ajustamento do modelo preconizado, sendo o modelo tetra-fatorial de primeira ordem o mais adequado na medição das influências do meio no empreendedorismo. O presente estudo sustenta a robustez psicométrica do instrumento em análise. No entanto, a especificidade da amostra, composta somente por estudantes do ensino superior politécnico português, a recolha de dados por meio de questionário e o tipo de estudo cross-sectional, ao invés de longitudinal, apresentam-se como limitações da presente investigação. Assinala-se também que a investigação neste domínio com o presente instrumento deve ser complementada com recurso a outros instrumentos que incidam sobre as características internas e sociodemográficas dos estudantes, visando captar as diferentes dimensões do conceito de empreendedorismo. A escala deve, futuramente, ser administrada a amostras de profissionais, testando se a estrutura tetra-fatorial se mantém. Estudos psicométricos futuros devem, ainda, incorporar as validades convergente, discriminante e preditiva da escala.
Em síntese, o presente artigo assume-se com um contributo válido na avaliação dos fatores do meio na promoção do empreendedorismo e que possibilitará, conjuntamente com outros instrumentos de medida dos fatores condicionantes do empreendedorismo, obter uma visão integrada deste complexo processo (de empreender com sucesso). Paralelamente, a validação de instrumentos de medida poderá contribuir para a sua replicação noutros países e, consequentemente, contribuir para o desenvolvimento do empreendedorismo à escala global, inscrevendo-se dentro da estratégia do GEM - fornecer à academia, aos educadores, aos políticos e aos profissionais das diferentes áreas do conhecimento, informações relevantes e atualizadas sobre a natureza multidimensional do empreendedorismo. Só assim a academia poderá desenvolver programas mais adaptados às necessidades e expectativas dos estudantes e incluir nos seus planos de cursos disciplinas ligadas ao empreendedorismo que permitam desenvolver o seu potencial empreendedor e fomentar a criação do seu próprio emprego, independentemente da área científica.
Em suma, com este estudo era também nossa intenção apelar ao reconhecimento da importância do empreendedorismo no desenvolvimento socioeconómico do país, alertando para a necessidade de um maior investimento no ensino (através de centros de empreendedorismo, de formadores e de investigação neste âmbito), e ainda de um maior envolvimento dos estudantes em programas de empreendedorismo. Tal como referido, o empreendedorismo enquanto motor de desenvolvimento, de riqueza e de criação de emprego remete para a importância da educação e da criação de condições para o seu desenvolvimento (Herrington & Kew, 2017; Kelley, Singer, & Herrinton, 2016; Parreira et al., 2016).
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Endereço para correspondência:
Pedro Miguel Santos Dinis Parreira
Rua dos Depósitos nº 87
3045-293, Ameal, Coimbra, Portugal
E-mail: parreira@esenfc.pt
Recebido em: 25/04/2017
Primeira decisão editorial em: 07/07/2017
Versão final em: 06/08/2017
Aceito em: 22/09/2017
1 Ao nível da promoção do empreendedorismo no ensino superior politécnico português, o projeto Poliempreende é um dos programas com maior destaque ao nível do ensino superior. Envolvendo todos os institutos politécnicos visa a promoção do espírito empreendedor nas comunidades académicas, através da realização de oficinas de empreendedorismo, de concursos de ideias de negócio e da apresentação de planos de negócio. Este programa mantém-se em expansão e pretende ser uma referência no empreendedorismo nacional (Parreira, Pereira, & Brito, 2011).