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Revista Psicopedagogia

versão impressa ISSN 0103-8486

Rev. psicopedag. vol.39 no.120 São Paulo set./dez. 2022

https://doi.org/10.51207/2179-4057.20220038 

ARTIGO ORIGINAL

 

Psicopedagogia para gente grande Atendimento psicopedagógico na idade madura

 

Psychopedagogy for grown-ups Psychopedagogical care in the mature age

 

 

Maria Katiana Veluk GutierrezI; Maria Rosa de Oliveira RoqueII

IGraduação em Fonoaudiologia - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP); Especialização em Psicopedagogia com Ana Maria Muñiz - Escola Argentina; Especialização em Terapia de Casal e Família - Espaço Delphos - RJ; Professora em cursos de Psicopedagogia no RJ; Presidente da ABPpRJ de 2014 a 2019; Diretora da ABPp Nacional de 2020 a 2022, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
IIPsicopedagoga - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ); Pedagoga - Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Pós-graduação em Especialização em Dificuldades de Aprendizagem - UERJ; Pós-graduação em Neurociência e Educação - CBIofMiam); Professora de Língua Portuguesa e Literaturas Brasileira e Portuguesa - Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Terapia de Família e Psicodrama (Espaço Delphos - RJ), Associada titular da ABPp-RJ; Conselheira da ABPp-RJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente estudo surgiu da observação, em nossa prática profissional, de que o adulto, para lidar com questões de aprendizagem, por diferentes motivos, pode se beneficiar de atendimento psicopedagógico. Para tanto, o levantamento de fontes, de leitura e análise bibliográfica possibilitou investigarmos as necessidades da fase madura, revisando paradigmas, suas características e peculiaridades. Ao longo do trabalho, ressaltamos o resgate e/ou fortalecimento da autonomia e autoria como personagens de grande valor, sempre tendo como alvo a qualidade de vida. O estudo nos leva, ainda, a pensar no seguinte questionamento proposto por vários autores: temos mais um estágio cognitivo além dos propostos por Piaget? Propomos também a intenção de pensar acerca das diferentes possibilidades do atendimento psicopedagógico, ampliando nosso olhar e nossa escuta.

Unitermos: Fase Madura. Revisão de Paradigmas. Autonomia. Autoria.


ABSTRACT

The present study arose from the observation, in our professional practice, that the adult, to deal with learning issues, for different reasons, can benefit from psychopedagogical care. Therefore, the survey of sources of reading and bibliographic analysis made it possible to investigate the needs of the mature phase, reviewing paradigms, their characteristics and peculiarities. Throughout the work, we emphasize the rescue and/or strengthening of autonomy and authorship as characters of great value, always having as a target the quality of life. The study also leads us to think about the following question proposed by several authors: do we have one more cognitive stage in addition to those proposed by Piaget? We also propose the intention of thinking about the different possibilities of psychopedagogical care, expanding our look and our listening.

Keywords: Mature Phase. Paradigms Review. Autonomy. Autorship.


 

 

Introdução

Refletindo sobre o trabalho psicopedagógico com profissionais da área, sentimos o desejo e a necessidade de explorarmos um campo da Psicopedagogia ainda pouco estudado - do adulto jovem à fase madura.

A Terapia Psicopedagógica tem crescido muito nos últimos 20 anos, tendo ampliado seu olhar e seu campo de atuação quanto às dificuldades e distúrbios de aprendizagem para além da criança/do adolescente.

O trabalho clínico da Psicopedagogia recebeu como parceiros o trabalho institucional nas áreas de educação e saúde: nas equipes gestoras, multiprofissionais, nos hospitais, nas coordenações.

Pensando nos problemas que surgem na fase adulta, relatados em nossos espaços clínicos, sensibilizamo-nos com a possibilidade psicopedagógica de prevenir e amenizar as mudanças que ocorrem nessa fase da vida.

As famílias, com suas características e necessidades próprias, influenciam nas dinâmicas biopsicossociais do indivíduo e ocasionam possíveis mudanças no ciclo vital, seja individual, seja familiar, podendo desestabilizar seu bem-estar nos aspectos afetivos, cognitivos, profissionais e sociais, que exigem adaptações muitas vezes não alcançadas espontaneamente. Em cada período, a Psicopedagogia pode trazer grandes benefícios ao trabalhar as expectativas, a revisão de paradigmas, resgate das competências, agregação de novos saberes e adaptação ao mundo digital.

Assim, este artigo pretende apresentar reflexões a respeito da Psicopedagogia para adultos e estimular os profissionais da área a ingressarem nesse universo.

Para tanto, estabelecemos os seguintes objetivos:

Objetivos gerais:

Promover reflexões e ações para assegurar ao adulto qualidade de vida, mediante a capacitação, participação e satisfação integral de suas necessidades, estimulando suas competências nos âmbitos emocional, cognitivo, social e profissional.

Ampliar o olhar sobre o atendimento psicopedagógico ao adulto, atendendo suas necessidades singulares, ainda não muito contempladas em suas questões com a aprendizagem.

Objetivos específicos:

Identificar a necessidade e os benefícios da importância do atendimento para o adulto.

Reconhecer as peculiaridades do atendimento psicopedagógico a adultos.

Mostrar o desenvolvimento e a adequação do indivíduo na sua completude, como ser biopsicossocial.

Propor recursos que facilitem a prevenção, redução e elaboração de alternativas para as dificuldades existentes.

Reconhecer a importância do autoconhecimento como fator fundamental para perceber seus interesses e suas necessidades.

Ressaltar o papel da autoria e autonomia como peças indispensáveis para o atendimento.

Incluir os Ciclos de Vida na leitura de situações do cotidiano e nos vários papéis exercidos pelo indivíduo.

Estágio formal, uma das etapas do desenvolvimento

A dúvida é um dos nomes da inteligência.

- Jorge Luis Borges

Assim como este maravilhoso poeta, outros autores nos fornecem conceitos de inteligência conforme sua veia teórica ou filosófica, no entanto, como este documento se norteia pela Psicopedagogia, a definição de Piaget (citado em Dolle, 2000) deve ser retomada, embora de forma resumida: "a inteligência humana é uma das formas de adaptação assumidas pela vida em sua evolução" (p. 57), cuja "função é a de estruturar o universo como o organismo estrutura o meio imediato" (p. 57).

Para que a adaptação ocorra, a inteligência se constrói e se desenvolve na interação da criança com o outro, com o mundo, na relação dinâmica e indissociável sujeito-objeto. Nesta construção cognitiva dois processos invariáveis atuam de forma interdependente, ou seja, um não existe sem o outro: assimilação - um processo funcional de integração de elementos novos a esquemas já construídos - e acomodação - a modificação da estrutura pela pressão do meio -, cujo equilíbrio resulta na adaptação, no desenvolvimento cognitivo.

Piaget (citado em Wadsworth, 2001) ainda afirma que o desenvolvimento é um processo contínuo, com mudanças evolutivas de acordo com a estimulação do meio e o ritmo individual, divididas em quatro períodos: sensório-motor (até dois anos), pré-operatório (de 2 a 7/8 anos), operatório concreto (de 7/8 a 11/12 anos) e formal (a partir dos 12 anos). As etapas acontecem numa sequência invariável e progressiva, em que cada uma reconstrói as conquistas da anterior, numa evolução em forma de espiral.

No primeiro, período de muitas aquisições, fundam-se os alicerces para as próximas etapas, numa evolução gradativa e complexa da adaptação do indivíduo ao meio, centrada no corpo, nos reflexos (sucção, preensão e movimentos oculares), com a função semiótica ainda não presente, partindo da não diferenciação à crescente organização da realidade, através da percepção.

Com esta inteligência prática se desenvolvendo, mantendo-se e se transformando, entram simultaneamente em ação as operações - "as ações interiorizadas (ou interiorizáveis) reversíveis" (Dolle, 2000, p. 79) -, resultando nos estágios pré-operatório e operatório concreto, com o privilégio do aspecto operativo do conhecimento, no qual o sujeito não apenas contempla o real, mas atua sobre ele e o representa.

No primeiro, dominado pelo egocentrismo, impera o simbolismo e o pensamento figurativo, em que a imagem mental substitui o objeto, representa-o por várias expressões, como a imitação diferida, o jogo simbólico, o desenho, a imagem mental e a linguagem, representação em sentido estrito. Já no segundo, em um "continuum em espiral" (Wadsworth, 2001, p. 103), a visão perceptiva do mundo dá lugar a processos de pensamento lógico (operações) aplicados a problemas reais (concretos) no presente imediato, com o aperfeiçoamento dos conceitos de causalidade, de espaço, de tempo e de velocidade e em que o infralógico e o lógico-matemático se constroem, porém ainda na coexistência com o figurativo. É neste nível que a reversibilidade, consequência da interiorização e principal característica das operações, é alcançada, uma vez que seu pensamento se descentra, desenvolvendo as operações de classificação e seriação, essenciais para o conceito de número. Também se percebe a redução do egocentrismo, tendo em vista que a criança começa a assumir o ponto de vista do outro, a compreender melhor leis, regras e linguagem, além de organizar seu pensamento, exercendo a função comunicativa de qualquer natureza, ou seja, a criança, progressivamente, se torna um ser social e autônomo.

Enquanto neste período o pensamento se submete ao real, no quinto e último da perspectiva piagetiana é "a subordinação do real ao plano do possível ..." (Piaget, s.d./1972, p. 2), na formulação de hipóteses verbais e dedução de suas consequências possíveis, inaugurando uma espécie de estrutura de pensamento, marcado pela lógica combinatória e proporcionalidade: destaca-se, então, o raciocínio hipotético-dedutivo, que não elabora mais apenas sobre o real, mas sobre hipóteses e teorias acerca do passado, do presente e do futuro; raciocínio que "implica deduzir conclusões de premissas que são hipóteses em vez de deduzir de fatos que o sujeito tenha realmente verificado" (Wadsworth, 2001, p. 127).

Durante este estágio o adolescente se torna introspectivo, refletindo sobre seus pensamentos e sentimentos - pensamento reflexivo-abstrato -, responsável pela construção do conhecimento lógico-matemático. Ao longo da construção desta aparelhagem cognitiva, o adolescente passa por uma fase de egocentrismo introspectivo, como Anna Lacombe nos esclareceu em palestra da ABPp-RJ (comunicação pessoal, 2018): uma fase inicial, na qual se sente superpoderoso para lidar com as perdas (o luto da infância, por exemplo), pensa sobre o pensar; lê a realidade sob hipóteses e teorias possibilitadas pelo pensamento abstrato. Aos poucos, tenta adaptar suas ideias à realidade ao ingressar no mundo do trabalho ou da formação profissional e ao intensificar relações sociais, culturais. Nesta fase, então, o pensamento formal atinge seu equilíbrio após o desenvolvimento, a incorporação e ampliação das operações formais e abstratas.

... a lógica do adolescente é um sistema complexo, porém coerente, que é relativamente diferente da lógica da criança, e constitui a essência da lógica dos adultos cultos e ainda proporciona a base para as formas elementares do pensamento científico. (Piaget, s.d./1972, p. 3)

Pensamento do adulto e do adolescente: iguais ou diferentes?

Se a lógica do adolescente é diferente da lógica da criança, podem adulto e adolescente apresentar pensamentos diversos, embora, segundo Piaget (s.d./1972) pertençam ao mesmo estágio? Se o conhecimento é construído durante as interações do indivíduo com o mundo e o adulto lhes dá continuidade, e até as intensifica, certamente se constituirão diferenças entre seus pensamentos. Atingido esse patamar, do pensamento abstrato, o adolescente o usa de forma diferente porque a adolescência é um desenvolvimento também físico, na qual não existe uma lógica abstrata, assim como nem todo adulto atinge plenamente o formal, apesar de apresentar competência social.

Embora ambos se aproximem do pensamento hipotético-dedutivo expresso em proposições e construções lógicas, o adolescente o usa na tentativa de transformar o real, de subordiná-lo às suas ideologias. O jovem está em busca de sua escolha profissional, ainda em construção de identidade; já o adulto se encontra há algum tempo na guerra diária não só pela sobrevivência, mas também pela especialização e pelo aprimoramento profissional, constituindo família, totalmente imerso no real, em intensa interação. Desta forma, ambos se veem em conflito, ideal X real, todavia, sob perspectivas diferentes: um com uma visão idealizada, com um caminho a percorrer; o outro com a realidade em primeiro plano, convivendo com suas contradições, incertezas e com um caminho em curso.

... progressiva substituição da resolução de problemas (actividade dominante, segundo esta autora, do pensamento do adolescente) pela capacidade de descoberta e formulação de questões sobre si mesmo e sobre a vida (actividade constante e distintiva do pensamento do adulto). (Marchand, 2002, p. 193)

Outra diferença a ser apontada dentro do estágio formal é o ritmo do desenvolvimento conforme seu meio, ocasionando atraso e/ou lentificação para atingir o nível formal devido à frequência, intensidade e diversidade das experiências. Como cada ciclo de vida determina interesses, atividades e necessidades específicas, o raciocínio formal pode vir a ser utilizado em maior ou menor grau, conforme as possibilidades e o ambiente favoráveis ou não. Incorporado o pensamento formal, cabe ao sujeito adolescente-vindo-a-tornar-se-adulto ampliá-lo, tendo em vista as mudanças constantes e progressivas que ocorrem devido aos novos papéis assumidos, à especialização profissional e ao ingresso no mercado de trabalho, diferenciando-se gradativamente dos primeiros anos de adolescência. Por conseguinte, conforme a história individual, a experiência social e seus valores (alguns substituídos, outros adquiridos e outros excluídos), o raciocínio formal pode não ser posto em prática, visto que nem todos os adolescentes e adultos desenvolvem plenamente as operações formais, como Piaget (s.d./1972) cita em seu texto Evolução Intelectual da Adolescência à Vida Adulta: "em princípio, todos os indivíduos normais são capazes de chegar ao nível das estruturas formais na condição de que o meio social e a experiência adquirida proporcionem ao sujeito alimento cognitivo e estimulação intelectual necessários para cada construção" (p. 4).

Em face de tamanha mudança em que o pensamento absoluto da adolescência evolui em complexidade, marcado pela lógica dialética e pelo relativismo do conhecimento, impulsionando o desenvolvimento de competências e habilidades específicas mediante experiências e exigências sociais intensas, vários autores levantam a hipótese de um quinto nível cognitivo, o pós-formal. Será?

 

O pensamento do adulto: novo estágio?

Se as coisas são inatingíveis, ora! Não é motivo para não querê-las. Que tristes seriam os caminhos se não fora a presença distante das estrelas.

- Mário Quintana, Caderno H.

Novo estágio?

Vários autores discordam de Piaget (citado em Marchand, 2002) quando este afirma que o Estádio1 Formal é terminal, que não haveria mais nenhuma alteração, que não existem outros níveis posteriores. Embora admita que, após a adolescência, as estruturas formais são mais solicitadas em virtude das exigências profissionais e de vida, ocasionando diferenças cada vez mais intensas entre os indivíduos maduros, a lógica do adolescente permanece como a essência da lógica dos adultos.

Devido a estas diferenças, vários teóricos questionam: o desenvolvimento cognitivo se completa na vida adulta? Acreditam que, se a vida adulta é marcada pela expansão das experiências sociais e profissionais, a cognição não permanece estacionada, continua a se desenvolver, exigindo novas competências, revelando-se mais complexa que a lógica adolescente, sendo possível a existência de um quinto estágio, o pós-formal. No entanto, alguns autores não defendem esta possibilidade, mas uma evolução horizontal, paralela ao pensamento formal, já que "eles [os sujeitos normais] atingem este estágio em diferentes áreas de acordo com suas aptidões e suas especializações profissionais (estudos avançados ou diferentes tipos de aprendizagem para as várias profissões)" (Piaget, s.d./1972, p. 5).

Já Helena Marchand (2002), da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, nos informa que o conceito de estágio "pressupõe sim, a organização e transformação das ações do nível anterior, sendo essas organizações caracterizadas por serem novas (no sentido em que não podem ser realizadas em níveis inferiores de acções) e efectuadas de um modo não arbitrário" (p. 198).

Alguns autores propuseram "tarefas específicas para avaliar o pensamento do adulto, foram feitas descrições do pensamento do adulto em que diversas dimensões - cognitivas, subjetivas, intuitivas, imaginativas, interpessoais - se encontravam integradas" (Marchand, 2002. p. 192), a fim de consolidar a existência do quinto estádio, típico da idade madura, destacando-se duas correntes: a relativista de Jan Sinnot e Bruner e a dialética de Hegel e Riegel (Marchand, 2002). Pelo primeiro modelo a cognição do adulto constaria de "verdades diferentes e incompatíveis [que] são aceites e integradas pelo sujeito, sem que este sinta necessidade de procurar e encontrar uma verdade única" (Marchand, 2002. p. 193). No dialético,

... o desenvolvimento consiste em mudanças contínuas e constantes em que as contradições seriam o motor dos progressos, não existindo, contrariamente ao postulado por Piaget, níveis estáveis de equilíbrio. A seu ver, a estabilidade e o equilíbrio ocorreriam se a tarefa de desenvolvimento algum dia estivesse completa, mas tal não acontece. (Marchand, 2002, p. 192)

Marchand (2002) ressalta ainda que o pensamento do adulto vive com as contradições, aceitando-as como tais: "É a interacção dialética entre equilíbrio e desequilíbrio que torna o desenvolvimento possível" (p. 192).

Uma outra autora, Patricia Kennedy Arlin (citada em Marchand, 2002), da Faculdade de Chicago, acrescenta que no quinto estágio as operações formais são utilizadas de forma diferenciada, revelando-se pela progressiva substituição da "resolução de problemas" pela "descoberta de problemas", nem sempre presentes no pensamento do adolescente, porém pertencentes ao pensamento operatório formal/do adulto. Na "descoberta de problemas" o adulto questiona a si mesmo, sobre sua profissão e os eventos nos quais se envolve, exigindo a "coordenação de múltiplas fontes e sistemas de referências" (Marchand, 2002, p. 193). O que é chamado de problema, ou dificuldade, ou desafio depende do olhar do indivíduo, da sua trajetória e de seu contexto.

Os questionamentos continuam sem chegar a uma conclusão até o momento. Não foram definidas as tarefas para confirmar ou não a existência de um quinto estádio e para avaliar o pensamento do adulto. O mesmo ocorre com relação à exata descrição da natureza do pensamento pós-formal tamanha a complexidade percebida diante da variedade de teorias e de experiências particulares, das diferenças de personalidade, de educação, de classe social, de faixa etária, de ambiente cultural...

Portanto, neste documento, diante desta inconclusividade, não abordaremos a terminologia de quinto estágio, ou estágio pós-formal, limitando-nos a descrever o pensamento do adulto, ou cognição do adulto, ressaltando a sua inclusão no formal piagetiano.

 

O pensamento do adulto

A maturidade me permite olhar com menos ilusões, aceitar com menos sofrimento, entender com mais tranquilidade, querer com mais doçura.

- Lya Luft

Acredita-se que a vida adulta é uma etapa de estabilidade, sem disponibilidade para mudanças, ou seja, para novas aprendizagens. No entanto, houve mudança de pensamento com relação ao processo de maturação do indivíduo, percebendo-o em constante dinamismo, devido às questões do dia a dia, às exigências, entre elas sociais e profissionais, que implicam novas competências. Professor e Doutor Rui Manuel Moura (1999), da Faculdade de Coimbra, se refere à vida adulta como um processo de maturação dividido em ciclos de vida, nos quais ocorrem transições e transformações, com ampliação da percepção da realidade, criatividade e autonomia/autoria.

Os desafios desta fase, a mais longa do desenvolvimento humano, nos apresentam mudanças de várias ordens (nos papéis, nas configurações familiares, nas relações interpessoais, na relação espaço-tempo, na era digital), já que o mundo está em constante transformação e determinando novos comportamentos e novas habilidades para a resolução de problemas, ou seja, é esperado um aparato cognitivo compatível com as demandas. A fim de enfrentar essas necessidades e atender tanto às próprias expectativas e às do outro, o adulto precisa se dispor a explorar suas competências, sua criatividade, autoria/autonomia, assim como, apesar de já possuir um repertório de experiências para resolução de problemas - expertise -, a perceber que o aprender faz parte de toda nossa existência:

Em verdade, aprendemos sempre, a cada dia, a cada instante, a vida toda. Não existe lugar, tempo ou idade para se aprender. "Em todas as idades, em toda esfera social, nós aprendemos." Aprendemos desde que nascemos. Segundo Visca, em seu esquema evolutivo da aprendizagem, esta começa a se manifestar desde as primeiras relações vinculares entre a mãe e a criança e vai se estendendo pela família, pela comunidade, pela escola até a vida adulta e continua existindo sempre. (Pereira, 2009, p. 265)

Assim, a aprendizagem é um processo fundamental para a construção do ser humano, responsável por impulsionar seu desenvolvimento, através de suas experiências sociais, dos papéis desempenhados, isto é, aprendizado e desenvolvimento são indissociáveis, como nos reforça Vygotsky (citado em Rego, 1995):

... o desenvolvimento do sujeito humano se dá a partir das constantes interações com o meio social em que vive, já que as formas psicológicas mais sofisticadas emergem da vida social. Assim o desenvolvimento do psiquismo humano é sempre mediado pelo outro (outras pessoas do grupo cultural), que indica, delimita e atribui significados à realidade. (pp. 60-61)

Vygotsky (citado em Oliveira, 1997) define ainda aprendizagem como "o processo pelo qual o indivíduo adquire informações, habilidades, atitudes, valores, etc. a partir do seu contato com a realidade, o meio ambiente, as outras pessoas" (p. 57).

Piaget (1964/1999), numa abordagem interacionista, defende a interação entre o sujeito e o objeto, numa relação recíproca, em que o sujeito atua sobre o ambiente, assimilando e acomodando os estímulos, cujo resultado é o processo do desenvolvimento:

... uma construção contínua, comparável à edificação de um grande prédio que, à medida que se acrescenta algo, ficará mais sólido, ou à montagem de um mecanismo delicado, cujas fases gradativas de ajustamento conduziriam a uma flexibilidade e uma mobilidade das peças tanto maiores quanto mais estável se tornasse o equilíbrio. (p. 14)

Portanto, apesar de discordarem em alguns aspectos, Vygotsky e Piaget (citados em Rego, 1995) ressaltam a estreita relação entre desenvolvimento e aprendizagem do ser humano: "O desenvolvimento está intimamente relacionado ao contexto sociocultural em que a pessoa se insere e se processa de forma dinâmica (e dialética) através de rupturas e desequilíbrios provocadores de contínuas organizações por parte do indivíduo" (p. 58).

Alguns teóricos - Alícia Fernández, David Ausubel, Paulo Freire, entre outros - citam aspectos importantes para que esse processo se desenvolva e se fortaleça: a relação entre os protagonistas, como o desejo, a motivação, o contexto e aplicação prática do conhecimento, para que o sujeito se torne autônomo e questionador.

Assim, apesar de Piaget (citado em Marchand, 2002) ter definido o estágio operatório formal como terminal, tanto o desenvolvimento como a aprendizagem continuam seu curso além da adolescência, estendendo-se pela maturidade. Trata-se de um período de fechamento em nível estrutural, porém com possibilidades infinitas para aperfeiçoamento e novas aprendizagens numa expansão horizontal. Em virtude das experiências profissionais e sociais do adulto, a cognição prossegue em seu desenvolvimento, tornando-se bem complexa, assumindo características próprias, como Mezirow (1991 citado em Moura, 1999) resume:

O desenvolvimento do adulto é visto como a capacidade progressivamente desenvolvida de validar a aprendizagem anterior através do discurso reflexivo e de agir sobre os resultados obtidos. Tudo o que levar o indivíduo a perspectivas de sentido mais inclusivas, diferenciadas, permeáveis (aberta a outros pontos de vista), a validade do que foi estabelecido através do discurso racional, ajuda o desenvolvimento do adulto. (para. 28)

Outros analisaram e persistem em estudar a cognição adulta, procurando estabelecer suas características. Helena Marchand (2002) enumera alguns desses estudos, dos quais sobressaem o modelo relativista e o dialético que evidenciam a relatividade do conhecimento, as múltiplas facetas da realidade e o autoquestionamento. A concepção relativista, baseada na nova física, tendo como destaque para Jan Sinnott (Marchand, 2002), defende que a cognição do adulto percebe e integra a multiplicidade dos pontos de vista, às vezes contraditórios, mas verdadeiros, subjetivos e relativos, considerando as percepções, as experiências e o contexto de cada indivíduo. Ao passo que no modelo dialético, um modo de operação do pensamento racional, com base na filosofia de Hegel e Riegel, afirma que o desenvolvimento do cognitivo adulto se caracteriza por mudanças contínuas e constantes. Trata-se de um embate de ideias diferentes que podem proporcionar uma ideia nova através do debate, da persuasão e da defesa de pontos de vista diferentes sobre o mesmo tema.

No entanto, apesar da dificuldade do acordo entre diversas abordagens, pode-se destacar três características específicas do pensamento maduro.

A natureza relativista e não absolutista do conhecimento

Este atributo da cognição adulta liga-se de forma bem estreita ao contexto por propiciar maior número de experiências que desenvolvem novas competências e habilidades, provocadas pelos papéis sociais, assim como o desenvolvimento científico e tecnológico imposto pelo meio. Isto facilita a contínua possibilidade de construções criativas experienciais que se constroem e se reconstroem. Marchand (2002) endossa com a seguinte afirmação:

...o conhecimento deriva do contexto e é compreendido em relação a esse contexto. Dado que o contexto está em constante mutação, a maior parte das vezes desordenada, torna-se difícil fazer antecipações quanto às mudanças que ocorrerão e quanto às direcções que essas mudanças irão sofrer. (pp. 194-195)

A "aceitação de sistemas de conhecimento incompatíveis" e "a consciência da natureza subjetiva e arbitrária do conhecimento" são as características mais marcantes do modelo relativista. A primeira se constitui por desenvolver diferentes pontos de vista e com diversos valores, por assumir papéis nem sempre compatíveis e por escolher um caminho dentre diversas possibilidades.

Além do contexto, outros fatores contribuem para a relatividade do conhecimento, como os estímulos do ambiente, a diversidade de pontos de vista, fruto da escolaridade, do nível sócio-econômico-cultural, suas experiências. Cada um observa a realidade sob sua perspectiva, formando, possivelmente, diversas percepções, sendo necessário aceitar as contradições que a realidade oferece - flexibilidade do pensamento.

A seguir, a segunda e terceira características, por tratarem de contradições, serão abordadas de forma conjunta.

Aceitação da contradição, enquanto parte da realidade/Integração da contradição em sistemas abrangentes, isto é, num todo dialético

Enquanto a contradição relativista se fundamenta na multiplicidade e complexidade de contextos, a dialética "ocorre de modo sistemático (e não aleatório), resulta da resolução dos conflitos ... e conduz a uma maior unidade e coerência" (Marchand, 2002, p. 195). O adulto se permite aceitar e integrar verdades diferentes sem a necessidade de encontrar uma só verdade, o que o leva ao pensamento criativo para a resolução de problemas que tem a flexibilidade cognitiva como característica do pensamento operatório formal.

Por constantemente levantar questões sobre si mesmo e sobre a vida, atividade particular do pensamento do adulto, valores, normas e comportamentos são questionados, ou seja, a reflexão crítica torna-se um atributo da vida adulta.

O pensamento dialéctico que caracteriza a maturidade consiste ... em viver com as contradições, aceitando-as como tal. É a interacção dialéctica entre equilíbrio e desequilíbrio que torna o desenvolvimento possível. (Marchand, 2002, p. 192)

Segundo Piaget (citado em Marchand, 2002), o pensamento formal é o fechamento do desenvolvimento cognitivo em nível estrutural, porém proporciona abertura ilimitada para as possibilidades de construção e aprimoramento de novos conhecimentos, da criação ao real concreto e ao real possível.

Labouvie-Vief (citado em Marchand, 2002) cita, ainda, a importância da integração do pensamento do adulto com a emoção, com o subjetivo e o objetivo, o individual e o coletivo, o eu e o outro, como característica do pensamento adulto, à qual se pode acrescentar:

capacidade de lidar com as adversidades, diferenças, frustrações e momentos de crise;

tomada de decisões com amplitude do olhar;

equilibração no uso da assimilação e acomodação;

adaptação ao meio;

capacidade de síntese;

criticidade;

flexibilidade de pensamento; e

ampliação das competências e aprimoramento das potencialidades.

Também muito exigidas na vida adulta são as funções executivas. Caso não se encontrem em pleno funcionamento, torna-se necessária sua otimização.

As Funções Executivas (FE) são um conjunto de habilidades complexas que nos permitem direcionar o nosso comportamento para metas e objetivos, flexibilizar estratégias e pensamentos, assim como autorregular-se, controlar os impulsos, tomar decisões, realizar planos e solucionar problemas, sempre tendo em monitoramento nosso progresso. Conjunto de processos cognitivos e metacognitivos que estão envolvidos no controle e direcionamento do comportamento, responsáveis por orientarem e gerenciarem funções cognitivas, comportamentais e emocionais (Dias & Seabra, 2013; Dias, 2013; Malloydiniz et al., 2008; Malloydiniz et al., 2010 citados em Carvalho & Abreu, 2014).

As funções executivas, iniciadas em torno dos sete anos, são consideradas como aspecto essencial do capital mental2 de Lok Sang-Ho (citado em Andrade, 2001), adquirido pelo indivíduo ao longo da vida. Na idade madura, as funções executivas e o capital mental são favorecidos pelos recursos cognitivos e emocionais, auxiliando o desempenho do adulto no seu cotidiano, usando, principalmente, a flexibilização e a resiliência. Dela também fazem parte os componentes cognitivos - memória de trabalho, controle inibitório e flexibilidade cognitiva, entre outros - e socioemocionais, como autorregulação da frustração, habilidades necessárias para o relacionamento social, resiliência frente ao estresse e percepção da perspectiva do outro.

A exposição prolongada a fatores de risco - pouca estimulação, estresse, falta de sono, abuso e violência, uso de substâncias nocivas, alguma forma de privação social e/ou cultural - exige um olhar apurado por estarem as funções executivas relacionadas à qualidade de vida.

Não se pode falar em pensamento do adulto sem abordar a metacognição, sendo um de seus precursores nos anos 1970 John Flavell, psicólogo da Universidade de Stanford. Flavell (citado em Vianin, 2013) estudou as formas como o indivíduo pensa sobre seus processos de pensamento, "o pensar sobre o pensamento" (p. 51). Bolívar (2002 citado em Marini, 2006), um dos diversos estudiosos, assim a definiu:

... o conhecimento e o controle que a pessoa tem sobre sua própria cognição e atividades de aprendizagem. Isso implica ter conhecimento sobre seu estilo de pensamento (processos e eventos cognitivos, o conteúdo dos mesmos (estruturas) e, habilidade para controlar esses processos, com o objetivo de organizá-los, revisá-los e modificá-los em função dos resultados obtidos na aprendizagem. (p. 1)

Neste âmbito, notamos que "o conceito de metacognição está relacionado à consciência e ao automonitoramento do ato de aprender; é a aprendizagem sobre o processo de aprendizagem, ou a apropriação e comando dos recursos internos se relacionando com os objetos externos" (Dantas & Rodrigues, 2013, p. 1).

A metacognição já faz parte do desenvolvimento cognitivo da criança, visto que a autoria/autonomia começa na infância. Alguns autores afirmam que, por volta dos sete anos, ela se inicia, desenvolvendo-se de forma consistente e contínua durante a adolescência, ou seja, no período formal adquire a capacidade de pensar sobre seu próprio pensamento e também sobre o pensamento do outro.

Fazem parte das competências cognitivas compreender a finalidade da tarefa, planificar a sua realização, aplicar e alterar conscientemente estratégias de estudo e avaliar o próprio processo de execução.

Sabendo compreender e bem empregar as estratégias metacognitivas citadas por Dreher e Portilho (2012) - tomada de consciência, autorregulação e, mais recentemente, a autopoiese (os significados construídos a partir das próprias experiências) -, a atividade cognitiva e motivacional pode ser favorecida, assim como a aprendizagem pode ser potencializada.

Desta forma, entende-se que "para aprender é preciso aprender como fazer para aprender, que não basta fazer e saber, mas é preciso saber como se faz para saber e como se faz para fazer" (Ribeiro, 2003, p. 115).

Esta citação pode ser comprovada pela afirmação de Libâneo (1998 citado em Portilho, 2011) acerca do tipo de auxílio ao aprendiz: "a transformar-se num sujeito pensante, de modo que aprenda a utilizar seu potencial de pensamento por meios cognitivos, habilidades, atitudes, valores" (p. 185).

Necessário, ainda, abordar a neuroplasticidade, ou plasticidade neuronal, advinda dos estudos da neurociência, ciência interdisciplinar, relativamente nova, que estuda os comandos do cérebro e de suas funções, dependentes das experiências vividas pelo indivíduo.

Durante muito tempo, acreditou-se que o sistema nervoso central (SNC) era uma estrutura rígida, sem modificações estruturais e funcionais. Hoje, com a neuroplasticidade, foi possível ter uma percepção ampliada do cérebro, mesmo no adulto, como um órgão dinâmico, adaptativo, capaz de se reestruturar conforme as demandas ambientais, tornando possível novos conhecimentos e novas aprendizagens. Segundo Sales e Konkiewitz (2010), podemos entender a neuroplasticidade, ou plasticidade neural, como:

... a capacidade do sistema nervoso modificar sua estrutura e função em decorrência dos padrões de experiência, e a mesma, pode ser concebida e avaliada a partir de uma perspectiva estrutural (configuração sináptica) ou funcional (modificação do comportamento). (p. 105)

Ao se abordar o pensamento adulto, falar de autoria e autonomia torna-se indispensável. Como a aprendizagem está presente em todos os momentos de nossa vida, ser autor de seus pensamentos e, por sua vez de suas ações, é reconhecer-se como capaz de aprender, de expandir esse aprendizado e desenvolver sua criatividade. Para tanto, Alícia Fernández (2001a) assim define autoria de pensamento como "o processo e o ato de produção de sentidos e de reconhecimento de si mesmo como protagonista ou participante de tal ... aceitar um pensamento próprio que me distingue do outro, e que seja possível modificar-se em um ato/ação" (p. 90).

Tal citação pode ser reforçada por Nádia Bossa (2017) ao definir o sujeito autor como "aquele que constrói seu pensamento e se faz presente através de um 'corpo' que sente, existe, ama e proclama sua liberdade de ser, de estar e viver no eterno presente, no eterno agora" (para. 3).

Esta construção se inicia no brincar da criança, ao exercitar sua autoria, sem a demanda do outro, nem a exigência da necessidade, constituindo-se num adulto autor, influenciado pelo meio que o cerca - familiar, social... - que pode favorecer ou dificultar esse processo. E, ao longo da vida adulta, período mais extenso da existência, muitos fatos e transições acontecem, exigindo do sujeito novas aprendizagens permeadas por flexibilidade, criatividade, autoria de pensamento e autonomia de ações, permitindo mudanças significativas. Dessa forma, os processos de aprendizagem desempenham papel importante no desenvolvimento da autoria de pensamento, visto que ao aprender o sujeito se constrói, isto é, "aprender é reconhecer-se, crer no que creio e criar o que creio" (Fernández, 2001a, p. 36).

Enquanto a autoria se caracteriza por um processo predominantemente interno, a autonomia se desenvolve gradativamente por fatores internos e externos, permitindo ao adulto ser livre e autônomo, e, como tal, tomar decisões, fazer escolhas, direcionar ações, traçar objetivos. Isto significa que autoria e autonomia são indissociáveis, como atesta Fernández (2001a): "A autoria de pensamento é condição para autonomia da pessoa e, por sua vez, a autonomia favorece a autoria de pensar. À medida que alguém se torna autor, poderá conseguir o mínimo de autonomia" (p. 91).

 

O adulto na Psicopedagogia

Na juventude, aprendemos;

na maturidade, compreendemos.

- Marie Von Ebner-Eschenbach

A função do psicopedagogo e o que é Psicopedagogia

A Psicopedagogia vem sendo pensada por autores de diversas abordagens, das quais destacamos:

A Psicopedagogia é um campo de atuação em Educação e Saúde que se ocupa do processo de aprendizagem considerando o sujeito, a família, a escola, a sociedade e o contexto sócio-histórico, utilizando procedimentos próprios, fundamentados em diferentes referenciais teóricos. (Associação Brasileira de Psicopedagogia, 2011, Artigo 1º)

A Psicopedagogia, como disciplina que estuda e trabalha com as aprendizagens humanas, oferece um campo de intervenção, cujos limites são amplos. O próprio processo humano de aprendizagem é um fenômeno complexo, que envolve múltiplos fatores e desafia qualquer tentativa de explicação a partir de um discurso científico único. (A. M. R. Muñiz et al., comunicação pessoal, 1992)

A Psicopedagogia busca entender o sujeito aprendente, o ser cognoscente, a sua relação com a aprendizagem por meio da investigação, observação e intervenção, da avaliação com vistas ao diagnóstico e, em consequência ao tratamento. (Pereira, 2009, p. 265)

A psicopedagogia é um campo do conhecimento que tem por objeto o ser cognoscente e por objetivo fundamental facilitar a construção da individuação e da autonomia do eu cognoscente identificando e clarificando os obstáculos que impedem que essa construção se faça. (Silva, 2010, p. 59, grifos do autor)

De acordo com estas definições, a Psicopedagogia, área interdisciplinar e transdisciplinar, estuda como o conhecimento é construído, utilizando o apoio teórico de outras áreas, a fim de atender às diversas especificidades do sujeito. Tem por objetivo o desenvolvimento da aprendizagem do indivíduo, identificando impedimentos e competências, estimulando sua autoria e autonomia num processo contínuo de aprendizagens, incluindo suas várias dimensões constitutivas. Ou seja, como princípio, a Psicopedagogia compreende a integração entre a construção do conhecimento pelo sujeito e a construção do sujeito pelo conhecimento por percebê-lo de forma pluridimensional, uma vez que é um ser integrado orgânico, cognitivo, afetivo, social. Portanto, a construção desse sujeito-autor acontece desde o nascimento, acompanha-o por toda a sua existência em todas as etapas da vida. Assim, segundo Maria Cecília Almeida e Silva (2010), não se deve contemplar o "sujeito como uma totalidade acabada" (p. 31), mas "um ser em processo de construção do conhecimento" (p. 31), o ser cognoscente: "aquele que aprende, não apenas aquele que adquire conhecimento" (p. 67).

Seja com criança, adolescente ou adulto, o psicopedagogo, o facilitador de aprendizagens, deve traçar uma intervenção adequada com a disponibilização de recursos para potencializar o aprendente, despertando seu desejo de aprender, conforme suas necessidades e singularidades. Cabe a este profissional investigar as causas, as fraturas, apontar caminhos, novas estratégias de ensinar e aprender, permitindo o novo, o criativo, a autoria.

O psicopedagogo, então, precisa conhecer bem seu objeto de atuação, o sujeito aprendente, conhecer seu modo de aprender, de que recursos dispõe e os que o impossibilitam, a fim de que, através da mediação do terapeuta, o sujeito reencontre sua autoria e autonomia de pensamento, objetivo maior da atuação psicopedagógica.

Na atuação do psicopedagogo, a troca de saberes se fortalece pelo vínculo entre o sujeito que aprende, o que ensina e seu objeto de estudo, mediante um olhar e uma escuta apurados que permitem uma percepção mais ampliada. O vínculo afetivo estabelecido desde criança com as suas relações determina o nível e tipo de comprometimento com o conhecimento e, consequentemente, com a aprendizagem. Desta forma, o vínculo proporciona que o indivíduo seja olhado pelas suas competências com respeito e confiança, dando-lhe a oportunidade de otimizar sua autonomia e autoria.

O adulto que procura atendimento psicopedagógico

O adulto que procura atendimento psicopedagógico, possivelmente, após um longo período de reflexão e resistência, em sua maioria, vem preocupado em buscar ajuda de profissional que atenda a seus questionamentos, ou a um desejo interno e/ou a uma demanda externa.

A era digital em que vivemos e o momento socioeconômico determinam o imediatismo e maiores exigências de performance, sem falar na corrida contra o tempo (será que estamos sob os efeitos da Ressonância de Shumann?). Se ampliarmos nosso olhar para as ações do cotidiano, nos deparamos com um ritmo acelerado de estímulos, trazendo-nos uma diversidade de informações, exigindo uma rapidez cognitiva de demandas. No âmbito profissional as pressões acontecem de diversas naturezas, seja pela competitividade com seus pares, seja pela faixa etária, seja pela necessidade de atualização e escalada na carreira. Tais fatores podem facilitar sintomas de depressão, ansiedade, medos, tensões, resultando em baixa autoestima, insegurança, paralisação frente às demandas, com rendimentos inferiores no campo profissional, social e acadêmico.

Pode ocorrer que certos adultos, por não se sentirem capazes de atender às novas demandas, o trabalho se torne fonte de tensão, frustração, buscando compensação em outra área, porém sem saberem como identificá-la e/ou buscá-la. Existem também aqueles que desejam se desenvolver profissionalmente, mas não se sentem aptos a desempenhar com proficiência sua atividade, assim como aqueles que desejam ascender na carreira. Cabe, então, ao psicopedagogo auxiliá-los a descobrir o que de fato querem para se recapacitar com as demandas profissionais ou para buscar atividades que lhes resgatem o desejo de novas aquisições. É possível que anseiem trabalhar em projetos sociais, hobbies, ou que se lancem em novas áreas, como, por exemplo, empreendedorismo, assessorias, etc. No entanto o mais importante é resgatar o prazer em aprender, auxiliá-los a descobrir estratégias para isto e, em decorrência, otimizar a autoestima.

Para que avaliar?

Para que serve a avaliação no atendimento psicopedagógico? Qual a sua finalidade e importância? Seu objetivo não se trata de aprisionar o sujeito em um rótulo: não se deve conceber avaliação como um processo aprisionante, mas flexível em função não só da queixa que o sujeito traz, mas também de suas especificidades, que proporcione um panorama amplo nos informando seus diferentes papéis, suas competências, seus recursos, sua modalidade de aprendizagem.

Sua função é nortear o trabalho para que o profissional estabeleça diretrizes baseadas nas hipóteses levantadas. Deve partir da queixa inicial, dos relatos do indivíduo e/ou de sua família, construindo-se, assim, um processo de construção e ampliação das hipóteses.

Muito importante nesse momento é proporcionar um espaço de acolhimento e escuta da história do indivíduo, observando seu contexto e a circularidade das narrativas, mas também criar um vínculo de confiança, acrescentando-se a importância do olhar sobre a relação do indivíduo com a aprendizagem e sua capacidade para aprender através de narrativas, situações cognitivas, lúdicas entre outras.

Ao final do processo avaliativo, é possível que o profissional não chegue a um resultado conclusivo, seja obstáculo epistêmico ou epistemofílico, como conceitua Jorge Visca (1991). Este processo, conforme Sánchez-Cano & Bonals (2008) nos orientam, ao destacar que não devemos unicamente atentar para as dificuldades do sujeito, mas sim incluir suas competências, seja de alunos, seja de adultos, conforme o objeto deste trabalho: "Desse modo, não falamos de deficiências nem de dificuldades, mas sim de necessidades educativas dos alunos que, necessariamente, devem ser traduzidas em situações passíveis de melhora e na concretização de auxílio e suporte" (Sánchez-Cano & Bonals, 2008, p. 15).

Tomando por empréstimo um trecho de Alícia Fernández (1990), em que "todo o processo terapêutico é também diagnóstico" (p. 44), reciprocamente podemos considerar o diagnóstico de grande relevância terapêutica. A fronteira entre avaliação e intervenção é muito tênue, e ambas são interdependentes: durante esta etapa, podem ocorrer alterações devido à melhor compreensão do sujeito no seu processo de aprendizagem e à sua relação com o conhecimento. Devemos considerar, portanto, que o diagnóstico não deve se restringir ao momento inicial, mas com prosseguimento na intervenção, ampliando, otimizando as hipóteses levantadas e podendo, até, redirecionar a intervenção conforme suas respostas a ela, ou seja, o diagnóstico se caracteriza por ser investigatório, interventivo e contínuo.

Intervenção

Consideramos o momento interventivo como um processo que depende do ritmo do sujeito, como os fatores de aceitação, comprometimento, momento atual, projeto de vida, entre outros. Como se trata de um processo, deve ser flexível, adaptado no seu decorrer às necessidades do momento, às que forem surgindo no desenvolvimento do planejamento traçado em cocriação entre profissional e sujeito.

A terapia psicopedagógica, sendo dinâmica, oferece ao sujeito um aprimoramento em algumas esferas a fim de facilitar na sua trajetória pessoal e profissional. Para tanto, enunciamos algumas possibilidades de atuação, não esquecendo que outras poderão surgir ao longo da intervenção:

otimizar as funções executivas;

potencializar a flexibilidade cognitiva;

aprimorar o espírito crítico, administrando desafios e novas aprendizagens.

ampliar sua visão de mundo;

conceber novas perspectivas pessoais e profissionais a partir de suas necessidades e possibilidades;

desenvolver e pôr em prática sua criatividade;

rever seu percurso na construção do conhecimento e ressignificá-lo;

perceber e aceitar erros e frustrações como parte da aprendizagem e como desafios a serem superados; e

proporcionar novas experiências necessárias para uma qualidade de vida ao romper possíveis amarras, a fim de abrir seus horizontes, resgatando competências adormecidas e descobrindo novas que ampliarão a sua cognição.

Tendo em vista o objeto deste estudo, aprendizagem do adulto na fase madura, nos deparamos com a relevância de algumas observações sobre esta etapa do processo terapêutico.

Faz-se necessário ter o cuidado de, após o levantamento de hipóteses, ao iniciar a intervenção, estabelecer algumas diretrizes para que seja bem-sucedida. Como nosso sujeito não se trata de adolescente ou criança, o trabalho a ser desenvolvido deve ser diferenciado, visto que o indivíduo traz uma bagagem, com conceitos consolidados e expectativas diversas.

Para tanto, exige do profissional flexibilidade e criatividade a fim de proporcionar situações em que o sujeito se sinta à vontade para afrouxar suas inibições, liberando sua espontaneidade e fortalecendo sua autoestima. Assim como se deve atentar para que a formação e a linha de trabalho permitam que uma sintonia floresça entre as duas trajetórias do profissional e do sujeito à sua frente, a fim de que ambos possam traçar um trabalho em parceria, numa coconstrução.

É importante, inclusive, observar o modo próprio como o sujeito entra em contato com o conhecimento - a modalidade de aprendizagem -, sua funcionalidade, a linha mestra do trabalho do profissional a ser estabelecida. Caso a modalidade se encontre aprisionada, será preciso que seja reconstruída, como nos orienta Alicia Fernández (2001b), em Os idiomas do aprendente:

É um molde móvel, que se transforma com o uso. Precisamente, um dos indicadores de alarme em relação com um possível problema de aprendizagem é uma "modalidade de aprendizagem" que se congela, que se enrijece.

A modalidade opera como uma matriz que está em permanente reconstrução e sobre a qual são incluídas as novas aprendizagens que vão transformando-a. (p. 78)

O ciclo vital do sujeito é outro aspecto a ser considerado no planejamento da mediação, uma vez que cada ciclo interfere no cotidiano, com suas demandas, expectativas e desafios.

Ciclos de vida

O adulto que procura o atendimento psicopedagógico faz parte de um sistema complexo e que se modifica ao longo do tempo: a família, unidade emocional operativa. E é neste primeiro contexto, no decorrer da vida, que formas diferentes e espontâneas de relacionamento entre seus membros acontecem, com interferências mútuas entre os diversos subsistemas, alterando os papéis sociais. Estes vão se transformando, não na dependência exclusiva da faixa etária, mas devido aos conflitos entre as capacidades do indivíduo e as ações determinadas pela sociedade.

Estas transformações, de naturezas diversas e, segundo Carter e McGoldrich (1995) se agrupam em ciclos, conforme a história do sujeito, seu nível cognitivo e cultural e o momento histórico da sociedade. Conhecendo os ciclos, podemos compreender melhor o modo como as famílias atravessam cada fase e suas dificuldades.

Segundo Carter e McGoldrich (1995), os ciclos podem ser assim relacionados:

1. Jovem solteiro: Fase de transição para a vida adulta, ocorrendo a diferenciação do EU em relação à família de origem e mais relacionamentos com adultos iguais. Aparece o trabalho que possa lhe proporcionar independência financeira e novo status, assim como surgem novas experiências em diferentes campos, afastando-se um pouco da família de origem.

2. Um novo casal: Comprometimento com um novo sistema familiar, com realinhamento dos relacionamentos com as famílias ampliadas para incluir o cônjuge e amigos. Com a formação de um novo sistema, há necessidade de ajustes e aceitações das famílias extensas, exigindo flexibilidade do parceiro para acordos. As famílias de origem também se ajustam ao novo sistema.

3. Família com filhos pequenos: Período de aceitação de novos membros no sistema familiar, sendo necessário criar espaço para a entrada do filho, reajustar o funcionamento como casal e o relacionamento com outros das famílias. Ocorre ainda a união nos novos papéis, incluindo as tarefas, responsabilidades em relação aos filhos e observando as questões de gênero quanto às funções de cada um no sistema. Os papéis de pais e avós nos relacionamentos também são realinhados.

4. Família com adolescentes: As questões familiares e profissionais são encaradas sob novo foco, com o aumento da flexibilidade das fronteiras familiares em que os papéis são redefinidos: filhos almejam mais liberdade e novas experiências, com questionamentos de valores, regras familiares, surgindo novos acordos. Pais questionam a vida profissional, reveem posições, fazendo reformulações e pensando também no futuro, podendo acontecer renegociação do casamento. Início de um olhar sobre o cuidado com a geração mais velha: a fragilidade dos avós.

5. Lançando os filhos e seguindo em frente: Momento de realinhamento dos relacionamentos para incluir parentes por afinidade e netos; lidar com incapacidade e morte dos pais (avós). Várias saídas e entradas de membros no sistema familiar: o sistema conjugal é renegociado e se preparam para serem avós. É a fase mais longa e com mais necessidade de adaptações. Aparecem questões: Como fica o casal? Qual o espaço para as necessidades individuais e conjugais? Momento de refletir sobre a aposentadoria e encarar esse momento como uma nova oportunidade para explorar novas realizações. Parentes são incluídos no sistema e relacionamento com seus pais é renovado. Surgem as incapacitações.

6. Família no estágio tardio da vida: Período da aposentadoria e retorno a uma vida a dois pelo casal. Etapa de revisão e reorganização da vida, como procurar aceitar a inversão de papéis geracionais, aceitar ajuda, lidar com as perdas e manter o funcionamento e os interesses em si mesmos e no casal, diante das mudanças físicas e emocionais da idade. Apoiar o papel da geração do meio. Momento de possível perda do cônjuge, irmãos e outros. Revisão e integração da vida.

Desta forma, na terapia psicopedagógica, é importante uma leitura sobre a fase da vida em que se encontra o adulto, uma vez que cada estágio traz desafios e a necessidade de adaptações e concessões. Alguns indivíduos passam por essas situações de uma maneira tranquila, outros não conseguem a flexibilidade necessária.

A Psicopedagogia pode atuar nesses processos pelos quais todos passamos, visto que em cada fase acontecem mudanças nos papéis sociais e nas relações interpessoais, impondo novas aprendizagens. Cada mudança no sistema faz com que ocorram transformações nas relações entre seus componentes, assim como na dinâmica de ordem prática.

Para o trabalho psicopedagógico com adultos de várias idades, as informações sobre seu ciclo vital são importantes para entendermos e trabalharmos suas aprendizagens nos desafios em cada nova etapa e para facilitar as mudanças necessárias ou possíveis.

Instrumentos

Terminada a avaliação e elaborado um planejamento, serão estabelecidos os instrumentos e/ou atividades a serem utilizados. Porém, conforme a evolução do paciente e sua aceitação ao trabalho (ritmo, interesse, envolvimento com o processo), alguns serão acrescentados ou excluídos.

Dentre eles, destacam-se:

Propósitos de vida para um determinado período (ano, meses...): várias áreas são contempladas, como saúde, finanças, família, trabalho, lazer, etc., especificando o que deseja mudar, aperfeiçoar e/ou continuar.

Projetos: de acordo com o interesse e necessidade do sujeito, projetos são criados e desenvolvidos trabalhando áreas, como funções executivas (memória, atenção...), novas aprendizagens. Ex.: fotografia, esporte, gastronomia...

Autoconhecimento: nesta categoria se encaixam a autobiografia, o autorretrato, o significado do próprio nome, linha da vida, genograma; redes sociais.

Atividades cognitivas propriamente ditas: jogos para trabalhar atenção, memória, raciocínio lógico; construções livres; sequências, associações e relações; resolução de problemas.

Comunicação: diálogos, mímica, desenhos, códigos.

Leitura, compreensão e criticidade: produção e leitura de textos de estilos diversos, de origem e de diferentes mídias, abordando, inclusive, atualidades que provoquem reflexões.

Compreensão de linguagem ambígua ou de duplo sentido: piadas, textos publicitários, provérbios, ditos populares, charadas.

Meus espaços: desenho da casa, do ambiente de trabalho, da rua onde mora; da primeira casa onde morou.

Atividades lúdicas: despertar o brincar adormecido e liberar a espontaneidade através de variadas brincadeiras, como: adivinhações, imitações, mímicas, dramatizações...

Em suma, elaboradas as hipóteses diagnósticas, isto é, a radiografia definida, a intervenção direcionada a adultos deve ser pautada não só por uma abordagem flexível, como também o profissional precisa lançar mão de criações e adaptações de material já existente. A criatividade, presente no cotidiano terapêutico, auxilia na abordagem mais ampla que ultrapassa o âmbito acadêmico. Para tanto, a postura do profissional deve ser cooperativa, numa relação horizontal, atendendo a uma demanda mais pontual e possivelmente mais breve. Portanto, o psicopedagogo se encontra diante de um novo público alvo, ou seja, trata-se de um desafio instigante, muito próprio da Psicopedagogia.

 

Considerações

A resposta certa, não importa nada: o essencial é que as perguntas estejam certas

- Mário Quintana, Caderno H.

Por fim, é hora de algumas considerações acerca deste estudo que nos proporcionou prazer e aprendizagens. Foram vários desafios a serem vencidos: a pouca bibliografia existente sobre o tema, a organização do processo de trabalho, a conciliação de horários e compromissos do cotidiano e do setor profissional.

A partir de uma relação coparticipativa, firmada pela troca espontânea de reflexões e pela disponibilidade em ouvirmos, por vezes, opiniões diferentes, estabelecemos como premissa a busca e a construção de um conteúdo teórico de qualidade. Por sua vez, a harmonia ocorreu apesar dos distintos estilos de escrita, que fomos adaptando aos poucos, uma complementando e enriquecendo o campo de visão da outra, de forma a refletir com clareza as experiências e o pensamento de ambas as autoras.

Ao nos lançarmos nesta aventura literária, sabíamos que tínhamos pela frente não apenas o nosso processo conjunto de escrita, como também a análise sobre o tema escolhido e a condução do nosso relacionamento. Felizmente, a sinergia se fez presente e tornou possível o alcance do nosso objetivo: o compartilhamento de um saber que não se limite a nós e que possa atingir a todos que percebem a aprendizagem como um valor significativo na constituição de um indivíduo saudável.

Para tanto, a autoestima e a autonomia se evidenciaram como protagonistas no cenário da maturidade, como figuras de grande valor no processo de ensino-aprendizagem, cujo obstáculo deve receber luz através da mediação do psicopedagogo, ressignificando a situação considerada como dificuldade e proporcionando a expansão do bem-estar biopsicossocial.

Houve uma preocupação em não nos determos em uma única abordagem, mas buscar autores com diferentes linhas de pensamento que ampliassem o panorama da aprendizagem do adulto. Durante o processo de pesquisa de autores e teorias, conversas, trocas, dúvidas foram suscitadas, promovendo a expansão do olhar sobre as questões próprias dos adultos e de sua família, pertencentes a várias ordens, profissionais, relacionais, afetivas.

Em vista disso, sugerimos algumas reflexões sobre nossa prática psicopedagógica que podem ser ainda motivo de futuras conversas e de aprofundamento sobre a temática:

Qual será a influência da era digital no aprimoramento das funções cerebrais?

Quais serão, então, os desafios da Psicopedagogia diante dos avanços das ciências, transformando nosso dia a dia?

Tomando por empréstimo conceitos de Morin (2009), poderíamos nos perguntar até que ponto a nossa prática psicopedagógica continuará contribuindo para religar as "duas culturas da ciência e das humanidades" (p. 79), numa reforma constante do pensamento a fim de "formar cidadãos capazes de enfrentar os problemas de seu tempo" (p. 26) a cada dia mais complexos?

Em suma, foi uma trajetória de muitas descobertas seja do universo do pensamento adulto, seja de nossa parceria pessoal. Um grande aprendizado para nós regado a café, risadas, confidências, fortalecendo uma amizade e o prazer de vermos, no resultado final, o reflexo de nosso comprometimento pela prática profissional.

 

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Endereço para correspondência:
Maria Rosa de Oliveira Roque
R. Visconde de Stª Isabel, 625/ 302 - Grajaú - Rio de Janeiro, RJ, Brasil - CEP 20560-121
Email: mariarosaoliv@hotmail.com

Maria Katiana Veluk Gutierrez
Cel: (21) 98877-1729
E-mail: mkvgutierrez@hotmail.com

Artigo recebido: 18/8/2022
Aprovado: 25/9/2022

 

 

Conflito de interesses: As autoras declaram não haver.
1 Alguns autores empregam a palavra estádio, porém neste trabalho usaremos o termo estágio, exceto nas citações.
2 O termo capital mental é definido por Lok Sang-Ho (citado em Andrade, 2001) como "capacidade de reflexão e do grau de eficiência com a qual o indivíduo resolve os problemas e as restrições da vida cotidiana" (p. 24).

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