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Revista Brasileira de Orientação Profissional
versão impressa ISSN 1679-3390versão On-line ISSN 1984-7270
Rev. bras. orientac. prof vol.17 no.2 Florianópolis dez. 2016
ARTIGO
Projetos de vida em situações de vulnerabilidade social: uma formação para técnicos
Life projects in situations of social vulnerability: training for technicians
Proyectos de vida en situación de vulnerabilidad social: formación para técnicos
Joana Carneiro Pinto; Helena Rebelo Pinto
Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, Portugal
RESUMO
Apresenta-se um estudo de investigação-ação com técnicos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa-Portugal, que desenvolvem a sua atividade no âmbito da construção de projetos de vida com pessoas em situação de vulnerabilidade social. Descrevem-se as três etapas do estudo: 1. identificação de necessidades, expectativas e problemas dos formandos no exercício das suas funções, 2. desenvolvimento e implementação de uma ação formativa fundamentada, e 3. avaliação de fatores de (in)satisfação associados à sua implementação. Os resultados prévios indicam necessidades de atualização de conhecimentos, e os resultados finais indicam elevada satisfação com a formação recebida. Este estudo traz importantes contributos para o desenvolvimento de diretivas para formação destes técnicos face à especificidade dos destinatários da sua intervenção social e educativa.
Palavras-chave: projeto de vida, vulnerabilidade, competência, programas educacionais
ABSTRACT
A research-action study is presented with technicians from Santa Casa da Misericórdia in Lisbon-Portugal, who develop their activity in the construction of life projects with people in situations of social vulnerability. The three stages of the process are described: 1. identification of participants' needs, expectations and problems in the exercise of their functions, 2. development and implementation of reasoned formative action, and 3. evaluation factors of (in)satisfaction associated with its application. Previous results indicate knowledge updating needs and final results indicate high satisfaction with training. This study provides important contributions to the development of policies for the training of these technicians, given the specificity of the recipients of their social and educational intervention.
Keywords: life projects, vulnerability, social skills, educational programs
RESUMEN
Se presenta un estudio de investigación-acción con técnicos de la Santa Casa da Misericórdia de Lisboa-Portugal, que desarrollan su actividad en el campo de la construcción de proyectos de vida con personas en situación de vulnerabilidad social. Se describen las tres etapas del estudio: 1. identificación de las necesidades, expectativas y problemas de los participantes en el ejercicio de sus funciones, 2. el desarrollo e implementación de una acción formativa fundamentada, y 3. evaluación de factores de (in)satisfacción asociada a su implementación. Los resultados previos indican necesidades de actualización de conocimientos y los resultados finales indican una alta satisfacción con la formación. Este estudio proporciona importantes contribuciones al desarrollo de políticas para la formación de estos técnicos, ante la especificidad de los destinatarios y de su intervención social y educativa.
Palabras clave: proyectos de vida, la vulnerabilidad, las habilidades sociales, programas educativos
Em Portugal foi legislado em 2009 o princípio geral da escolaridade obrigatória para crianças e jovens. Todos os alunos, a partir dos 6 anos de idade devem frequentar instituições de educação e/ou formação até à obtenção de um diploma de curso conferente do nível secundário de educação, ou até à realização de 18 anos de idade (Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto). Segundo publicação do Instituto Nacional de Estatística (INE, 2013), 1.708.083 alunos estão matriculados no sistema de ensino não superior (do 1º ao 12º anos de escolaridade). Destes alunos, espera-se que uma parcela muito significativa prossiga os seus estudos a um nível superior. Em 2015, cerca de 349.658 alunos estavam matriculados em instituições de ensino superior de natureza pública e privada (INE, 2015), e em 2012, no total da população portuguesa, as pessoas com estudos concluídos a nível superior representavam, aproximadamente, 12% da população (INE, 2012).
Apesar das políticas educativas tenderem ao aumento dos níveis de escolaridade da população portuguesa, mantém-se uma larga parcela da população sema certificação académica e/ou profissional necessárias para o ingresso num mercado de trabalho cada vez mais exigente. Números oficiais dos Censos de 2011 (INE, 2012) indicavam 28% da população portuguesa, com mais de 18 anos de idade, com apenas o 1º ciclo de ensino concluído, 12% com o 2º ciclo de ensino, 16% com o 3º ciclo, e 13% com o ensino secundário completo. E, uma percentagem ainda mais preocupante (cerca de 19%) sem ter frequentado/concluído com sucesso qualquer nível de ensino. Este grupo inclui pessoas que, com mais frequência, desempenham funções que se caracterizam por vínculos mais instáveis financeiramente e imprevisíveis temporalmente. Embora não se possa estabelecer uma relação causal direta entre a obtenção de um diploma e a obtenção de um emprego, a evidência tem demonstrado que os jovens que concluem com sucesso os seus estudos de nível superior acedem a percursos profissionais com maior taxa de empregabilidade, mais elevado estatuto social, e maior acessibilidade, estabilidade, e remuneração, por comparação com jovens com níveis de escolaridade mais baixos (Azevedo & Fonseca, 2007). Trata-se, portanto, de um grupo de pessoas que ficam particularmente vulneráveis em termos profissionais e sociais, na maior parte dos casos sem apoio para ultrapassar as dificuldades inerentes a esta situação.
Autores como Nieto, Pérez-González, e Riviero (2011) têm defendido que é um direito de qualquer cidadão, beneficiar de um acesso universal e igualitário a serviços orientação vocacional. Através destes serviços qualquer pessoa pode ser estimulada a delinear e implementar novos rumos para a sua formação académica e/ou profissional, em conjugação com os seus diversos papéis de vida (Andrade, Meira, & Vasconcelos, 2002). Em 2010, Taveira e Rodriguez-Moreno referiram que os dois contextos mais favoráveis ao desenvolvimento de intervenções de carreira são, por um lado, as instituições educativas, que privilegiam intervenções, tais como, a informação e colocação profissional, os seminários de gestão pessoal da carreira, e os sistemas de orientação vocacional e aconselhamento de carreira, e por outro lado, as organizações profissionais, que promovem, preferencialmente, intervenções, tais como, o apoio à criação de planos de crescimento e desenvolvimento profissional, a informação e colocação profissional, o coaching, e o apoio à formação (Taveira & Rodriguez-Moreno, 2010). No entanto, o que se constata é que ficam sistematicamente excluídas as pessoas designadas na literatura como "socialmente vulneráveis", por estarem fora dos circuitos académicos e/ou profissionais habituais, perpetuando-se, assim, o seu ciclo de vulnerabilidade e, frequentemente, de pobreza.
Os serviços de apoio à construção de projetos de vida podem ter um papel crucial na modificação desta realidade social. Mas, a formação académica e profissional dos técnicos que desenvolvem a sua atividade nestas áreas necessita de ser mais diversificada e reforçada (Taveira & Rodriguez-Moreno, 2010). A título de exemplo, num capítulo sobre os sistemas de formação e o desempenho profissional, Pinto (2012) reflete sobre o modo como a formação superior está organizada em Portugal, e o (não) destaque que as unidades curriculares associadas ao apoio, orientação e aconselhamento de carreira (vida) têm nos diversos planos académicos, nomeadamente dos cursos de Psicologia. Considerando a especificidade deste público-alvo, no quadro de uma sociedade cada vez mais globalizada e competitiva, salienta-se a urgência de se repensarem objetivos, modelos teóricos, competências, estratégias e instrumentos de intervenção que assegurem a excelência na prestação deste tipo de serviços (e.g., Cruz & Schultz, 2009; Talavera et al., 2004).
O presente trabalho teve como objetivo apresentaruma investigação-ação relativa a uma formação intitulada "Construção de Projetos de Vida" para técnicos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML)1, que desenvolvem o seu trabalho junto de pessoas em situação de vulnerabilidade social. Considera-se que o desenho deste estudo, partindo de uma criteriosa identificação das necessidades de formação para a construção de um programa adequado a essas necessidades, e finalizando com uma avaliação de (in)satisfação, envolvendo os destinatários da ação de formação (técnicos da SCML), corresponde a uma metodologia de investigação-ação que poderá revelar-se adequada e útil a projetos de melhoria de competências dos profissionais que trabalham com populações específicas. A investigação incluiu três etapas interdependentes, que seguidamente se descrevem: diagnóstico de necessidades de formação, desenvolvimento da ação de formação "Construção de Projetos de Vida", e avaliação de fatores de (in)satisfação com a formação.
Parte I: Diagnóstico de Necessidades de Formação
Objetivo
Na sequência do pedido efetuado pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, acerca do desenvolvimento de uma ação de formação intitulada "A Construção de Projetos de Vida",a primeira parte deste trabalho teve como objetivo aidentificação das características, necessidades, expectativas e problemas dos técnicos no exercício das suas funções neste âmbito. Considerou-se que asua colaboração neste estudo preliminar constituiria um elemento crucial para que o plano da ação de formação se encontrasse devidamente ajustado às suas reais necessidades de formação, contribuindo deste modo para garantir o sucesso da ação (Juste, 2000; Pinto, 2010; Rojo et al., 2002).
Método
Participantes
Participaram 16 técnicos, 13 (81,25%) do sexo feminino, um (6,25%) do sexo masculino, e dois (12,5%) sem indicação, com idades compreendidas entre os 34 e os 62 anos, e uma idade média de 43,31 anos (DP = 7,45). Quanto a formação académica, 14 (87,5%) possuíam licenciatura, um (6,25%) pós-graduação, e um (6,25%) mestrado. Quanto às funções desempenhadas na SCML, sete exerciam a função de Formador(a), nove eram Gestores de Formação, cinco eramTécnicos(as) de acolhimento, diagnóstico, e orientação, e dois eram Assistentes Sociais, sendo de salientar que alguns técnicos desempenhavam mais do que uma função.
Em relação ao público-alvo (usuários) com quem estes técnicos desenvolviam a sua intervenção, eram jovens entre os 15 os 18 anos, e jovens adultos e adultos dos 18 aos 60 anos. Num total de 16 técnicos, dois (12,5%) indicaram trabalhar com jovens, nove (56,25%) com jovens adultos e adultos, e três (18,75%) referiram ter ambos os grupos etários como alvo da sua intervenção social e educativa. Quanto às principais características/problemas que são identificados pelos técnicos no seu público-alvo, foram identificados os seguintes: (a) reduzidas habilitações académicas (n = 11), insucesso escolar (n = 4), e absentismo e abandono escolar (n = 1), (b) ausência de experiência profissional (n = 3), empregos precários e pouco qualificados (n = 3), (c) fracas competências pessoais, sociais e de aprendizagem (n = 4), e dificuldades na integração socioprofissional (n = 4), (d) baixa autoestima (n = 3), desmotivação/descrença (n = 6), e expectativas irrealistas (n = 1), (e) imaturidade (n = 1), e reduzida capacidade de reflexão (n = 1), (f) ausência/fraca definição de objetivos de vida (n = 4), dificuldade no comprometimento (n = 1), ausência de autonomia (n = 1), e ausência de autorresponsabilização (n = 1), e, (g) vulnerabilidade pessoal e socioeconómica (violência doméstica, toxicodependência, pobreza, exclusão social; (n = 6).
Instrumento
Para a colheita de dados relativos às necessidades de formação, foi construído o questionário "Diagnóstico de Necessidade de Formação" onde, para além da informação sobre dados sociodemográficos e profissionais que permitiram a caracterização dos técnicos já apresentadaanteriormente, estes foram solicitados a responder a quatro questões de resposta aberta, relativamente a: (a) entendimento sobre o conceito de "Construção de Projetos de Vida", (b) principais necessidades e problemas sentidos na realização do seu trabalho, (c) expectativas em termos de temas/ conteúdos/ atividades, e (d) principais motivações para frequentar a ação de formação.
Procedimento
O questionário foi submetido à avaliação e aprovação da coordenação da SCML e posteriormente distribuído aos técnicos, solicitando o seu preenchimento no prazo máximo de duas semanas. Foram salientados os objetivos do presente estudo, bem como esclarecidos os cuidados éticos na recolha, tratamento e divulgação dos dados obtidos, tendo sido recebidas dezasseis respostas. O conteúdo das respostas às quatro últimas questões acima referidas foram submetidas aos procedimentos da análise de conteúdo sugeridos por Bardin (2004): (a) a pré-análise; (b) a exploração do material; e, (c) o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação. O preenchimento destas quatro questões pelos 16 formandos originou um total de 64 respostas (16 formandos, 4 questões cada), que se traduzem em 108 unidades de análise (ideias contidas nas respostas).
Resultados
Apresentam-se seguidamente os resultados obtidos por cada uma dasquatro questões apresentadas, com indicação das dimensões identificadas acompanhadas de exemplos ilustrativos.
Questão 1: A "Construção de Projetos de Vida" para mim significa…
Os técnicos consideram, em termos gerais,que a "Construção de Projetos de Vida" é um processo que deve ocorrer ao longo ciclo de vida dos indivíduos, tendo em vista a promoção de trajetórias pessoais, profissionais e sociais, saudáveis e satisfatórias. Assim, como tarefas-chave para a resolução de problemas e a tomada de decisões relativas à construção de projetos de vida foram identificadas seis dimensões:
1. Proatividade/ Autonomia (n = 5), que dizia respeito à capacidade das pessoas assumirem um papel ativo, responsável e autónomo na sua vida (e.g., P42. (…) que cada individuo seja protagonista do seu processo de desenvolvimento pessoal e de (re)inserçãosocio-profissional para a (re)construção do seu futuro; P13. O indivíduo ser o seu próprio arquiteto… ser o construtor do seu projeto de vida),
2. Autoconhecimento (n = 3), centrado na exploração de atuais interesses, competências, valores, e dificuldades (e.g., P10. Trabalho de auto-conhecimento/reflexão (…) com o objetivo de se identificar interesses, potencialidades, dificuldades, áreas/estratégias de melhoria),
3. Reflexão sobre a História de Vida (n = 4), isto é, a revisão e análise da história de vida passada, nomeadamente, as experiências e as aprendizagens (e.g., P5. É necessário que o candidato "olhe para o passado" e "se projete no futuro"),
4. Exploração do Meio (n = 2), que implicava o conhecimento do contexto socioeconómico, político, histórico, cultural, familiar da pessoa, bem como das oportunidades formativas/profissionais disponíveis (e.g., P5. (…) construir com os candidatos um caminho (…) de acordo com perfil e oferta formativa existente (…) tendo sempre em consideraçãoa situação económico-social),
5. Definição de Objetivos (n = 9), que consistiana necessidade de exploração e definição de metas/objetivos a alcançar a curto, médio, e longo prazo (e.g., P1. (…)desenhar projetos exequíveis e com objetivos muito concretos, monitorizáveis e nunca demasiado ambiciosos; P10. (…) com vista à definição e (re)construção de objetivos sustentáveis/realistas em termos pessoais, formativos ou profissionais), e,
6. Definição e Implementação de um Plano de Ação (n = 6), que incidia sobre a necessidade de desenvolvimento de um conjunto de medidas e ações cuja implementação visa contribuir para a concretização de objetivos previamente estabelecidos (e.g., P9. (…) definindo os caminhos que devemos percorrer para atingi-los (aos objetivos); P16. (…) remete-nos para o delineamento de um conjunto de ações a desenvolver num futuro a curto, médio e/ou a longo prazo).
Questão 2: As principais necessidades e problemas sentidos na realização do meu trabalho ao nível do apoio à Construção de Projetos de Vida são…
A partir das necessidades e problemas identificados pelos técnicos na realização do seu trabalho, organizou-se as seguintes categorias e subcategorias:
1. Contexto Social, onde foram identificadas áreas e principais barreiras/resistências encontradas a um nível macro e meso social, designadamente: (a) família/grupo de pares (n = 2; e.g., P1. Pressão familiar e do "bairro" onde residem), (b) serviços (n = 2; e.g., P1. Melhorar a articulação entre serviços seria fundamental; P8. Falta/desconhecimento de respostas externas (…) para apoio à construção/ (re)construção de projetos de vida.), e (c) economia (n = 5); e.g., P6. Perante um mercado de trabalho escasso, mas cada vez mais exigente; P10. Reduzida absorção destes públicos por parte dos agentes empregadores),
2. Contexto SCML, onde foram identificadas as limitações associadas à organização do serviço prestados aos seus usuários, e também as limitações sentidas pelos técnicos na realização do seu trabalho, no que concerne os instrumentos, conhecimentos e competências, designadamente: (a) atendimentos (n = 6; e.g., P10. Pouca articulação com as respetivas assistentes sociais na construção de projetos de vida), e (b) técnicos e seus recursos (n = 8; e.g., P9. Atividades e material de apoio à construção do projeto de vida; P11. (…) e necessidade de novos instrumentos ajustados ao público-alvo) e,
3. Contexto Individual,isto é, as variáveis dos próprios usuários que muitas vezes interferiam/dificultavam o trabalho realizado pelos técnicos no sentido do apoio à construção de projetos de vida(n = 12; e.g., P5. Imagem "pouco real" que os candidatos têm sobre si; P7 (…) ao nível da escolaridade ( baixa)e da experiência profissional, na maior parte dos casos pouco especializada ou praticamente inexistente).
Questão 3:O que eu espero de uma ação de formação intitulada "A Construção de projetos de Vida" é que esta aborde temas/conteúdos/atividades, tais como…
Os técnicos esperavam que a presente formação abordasse, por um lado,
1. Conteúdos Generalistas (n = 14), no sentido de apoiar a revisão e atualização de conhecimentos teóricos e de métodos e técnicas de atuação no sentido do apoio à construção dos projetos de vida dos usuáriosda SCML(e.g., P3. Metodologias inovadoras nesta área de intervenção e instrumentos/estratégias de aplicabilidade no dia-a-dia de forma a capacitarem e autonomizarem o jovem/adulto na construção do seu projeto de vida; P7. Espero que sejam discutidos temas/ conteúdos, realizadas atividades práticas e discutidos casos concretos que me permitam poder transferir os conhecimentos adquiridos, para a minha atividade profissional); e, por outro lado,
2. Conteúdos Específicos, no que respeita (a) as condições base que os usuários deveriam reunir para estar aptos a um processo de apoio à construção dos seus projetos de vida (n = 3; e.g., P1. Gestão de expectativas (…); P1. (…) Técnicas de motivação e mobilização; P13. Formas de promover e trabalhar a autonomia e responsabilidade nos jovens) e, (b) competências de construção de projetos de vida que os próprios técnicos gostariam de rever/adquirir/atualizar (n = 3; e.g., P1. Técnicas de desenho de projetos a curto, médio e longo prazo; P8. Estratégias para desocultação de interesses e necessidades dos públicos com quem estamos a trabalhar).
3. É também de salientar a expectativa de que esta ação de formação se constituísse como um espaço de reflexão entre técnicos com diferentes conhecimentos e experiências (n = 1 e.g., P16. Essencialmente, tenho como expetativa que o plano de formação tenha naturalmente presente que os destinatários (desta formação) correspondem a indivíduos que trabalham nesta área há algum tempo e, consequentemente, capitalizam um conjunto de competências e frustrações).
Questão 4:As minhas motivações para frequentar uma ação de formação intitulada "A Construção de Projetos de Vida" são…
Os técnicos tinham, essencialmente, duas grandes motivações para a frequência desta ação de formação:
1. Aquisição/Atualização de Conhecimentos e Competências (n = 13; e.g., P9. Conhecer instrumentos de trabalho e estratégias para apoio à definição e/ou (re)construção de projetos de vida, nomeadamente a nível da formação/profissão, adequados e estruturantes para o tipo de público com quem trabalho; P10. Reforçar competências no sentido de poder contribuir com um apoio mais eficaz na orientação dos projetos de vida dos adultos com os quais trabalho) e,
2. Reflexão e Partilha de Experiências e Saberes (n = 6; e.g., P11. Conhecer "boas práticas em rede", para efeitos de apoio à (re)construção de projetos de vida, que sejam adequadas ao público; P15. (…) debater o assunto e partilhar experiências com colegas na mesma área de atividade).
Discussão
No âmbito do "Diagnóstico de Necessidade de Formação", foram identificados dois tipos de resultados.Por um lado, foi possível, a partir da percepção dos técnicos, a obtenção de informação acerca dos principais problemas que caracterizam o público-alvo da sua intervenção. De uma forma geral, estas pessoas apresentam dificuldades numa ou mais áreas de vida: (a) pessoal (e.g., baixa autoestima, imaturidade, ausência de autonomia), (b) académica (e.g., reduzidas habilitações académicas, e insucesso, absentismo e abandono escolar), (c) profissional (e.g., ausência de experiência profissional, empregos precários e pouco qualificados), e (d) social (e.g., violência doméstica, toxicodependência, pobreza, exclusão). Uma vez que os atuais modelos de apoio à construção de projetos de vida defendem uma visão holística das pessoas, estas diferentes áreas devem ser consideradas aquando da construção de projetos de vida (Hansen, 2001; Watts, 2001). Até porque, tal como identificado por estes técnicos, as dificuldades que as pessoas apresentam nestas áreas de vida constituem-se, na maior parte dos casos, como obstáculos que interferem e dificultam o trabalho realizado no sentido do apoio à construção de projetos de vida. Neste sentido, é importante que o trabalho realizado pelos técnicos nesta área se fundamentem num conhecimento objetivo das circunstâncias de vida dos destinatários da sua intervenção (Watts, 2001).
Por outro lado, foi possível a obtenção de informação acerca das necessidades sentidas por estes técnicos e que poderão estar a limitar a sua ação no âmbito da construção de projetos de vida. Assim, constata-se que os técnicos da SCML sentem necessidade de uma revisão e atualização de conhecimentos teóricos, apesar de conceberem a noção de "construção de projetos de vida", enquanto um processo para a resolução de problemas e a tomada de decisões que requer competências de exploração, focadas no autoconhecimento e no conhecimento do meio, a definição de objetivos, e a definição e implementação de um plano de ação, sempre numa postura de proatividade e autonomia. Esta perspetiva é próxima dasconcepçõesatuais de carreira (no sentido de vida), integrando, por um lado, toda a sequência de acontecimentos que a pessoa experiencia desde que nasce até que morre e, por outro lado, todos os contextos/ palcos em que estes acontecimentos se desenrolam, ao longo de um processo de construção e de gestão pela qual cada pessoa deve assumir total responsabilidade (Pinto 2010; Pinto, Taveira & Llanes, 2015; Savickas, 2005). Além disso, constata-se que os técnicos da SCML sentem necessidade de rever, adquirir, treinar, e desenvolver um conjunto diversificado de competências centrais e especializadas de apoio à construção de projetos de vida. Apesar da formação académica/profissionalvisar a preparaçãodos futuros técnicos para um desempenho eficaz da profissão, tal como referido por Oliveira (1999), "é como se formássemos [profissionais] para um mundo que não existe e não os preparássemos para o que existe" (p. 81). Por este motivo, estes técnicos da SCML, pretendem realizar uma atualização dos seus conhecimentos, de acordo com o princípio de aprendizagem ao longo da vida (Jenschke, 2003).
Parte II: Desenvolvimento da ação de formação "A Construção de Projetos de Vida"
A avaliação de necessidades permitiu explorar e aprofundar as características, expectativas, motivações e reais necessidades de formação, favorecendo deste modo desenho e planeamento de uma ação de formação à medida. Para o efeito, procurou-se determinar aspetos como a fundamentação teórica, os objetivos, os conteúdos, as atividades, e os materiais, a planificação temporal, e as estratégias de avaliação da ação de formação, de modo a assegurar o desenvolvimento de uma intervenção formativa fundamentada (Pinto, 2010, p. 115; Rojo, et al., 2002).
A ação de formação, que incluiu três cursos (12h cada), apresentou como principais objetivos: (a) definir o conceito, os mecanismos e as condições do processo de desenvolvimento de projetos de vida, (b) identificar e descrever os pressupostos, as tarefas desenvolvimentais, e os comportamentos característicos de cada fase do desenvolvimento ao longo do ciclo de vida, com particular ênfase na identificação de preocupações e problemas ao longo da adolescência e da vida adulta, (c) discutir princípios gerais de intervenção na construção de projetos de vida, e proporcionar contacto com materiais adequados a essa intervenção, (d) conhecer, analisar criticamente, e transpor para a prática modelos de apoio à construção de projetos de vida, e (e) problematizar e definir o papel dos diferentes técnicos no desenvolvimento do potencial humano. Trata-se de um conjunto de objetivos que correspondem às linhas de força delineadas pelos técnicos, e que foram descritas na Parte I deste texto, nomeadamente quanto à atualização teórica e técnica, ao conhecimento dos contextos sociais e pessoais dos destinatários, e à especificidade das metodologias e instrumentos de intervenção.
Mais especificamente, o curso 1, "A Construção de Projetos de Vida", visoua transmissão de conhecimentos teóricos e empíricos atualizados sobre desenvolvimento de projetos de vida que fomentem o bem-estar pessoal e social, os fatores pessoais e contextuais que estimulam ou inibem a transição e adaptação às mudanças no ciclo de vida, e as finalidades, tipos, fases, e competências associadas a um processo de apoio neste âmbito.
O curso 2, "Orientação e desenvolvimento de projetos de vida em adolescentes e jovens adultos", pretendeu apresentar os principais marcos que pautam o desenvolvimento na adolescência e início da idade adulta, e as principais etapas que caracterizam um processo de apoio à construção de projetos de vida com jovens nestas idades, nomeadamente, a tomada de consciência da necessidade de decidir, a exploração de informações sobre si próprio, bem como sobre as várias opções que se colocam face ao futuro, e a conjugação de toda a informação reunida para a tomada de decisão. Foram também analisadas competências académicas que previnem o abandono escolar e favorecem o sucesso educativo e a concretização dos projetos de vida.
O curso 3, "Orientação e desenvolvimento de projetos de vida em adultos", incidiusobre os principais marcos do desenvolvimento na idade adulta, e as principais etapas que caracterizam um processo de apoio à construção de projetos de vida com adultos, nomeadamente, a capacitação para explorar informação relativa a si e ao mundo, para definir objetivos concretos e realistas, para delinear e implementar estratégias e planos de ação, e para avaliar e procurar feedback, no sentido de resolver problemas, tomar decisões e ser empreendedor no domínio da carreira. Foi também incluído o estudo de competências que potenciam as oportunidades de trabalho(e.g., adaptabilidade e flexibilidade).
No decorrer destes cursos foi privilegiada uma abordagem expositiva, interrogativa e dinâmica com recurso à utilização de meios audiovisuais, visando a transmissão de conhecimentos científicos sobre os principais pontos do programa. Foram ainda realizados exercícios de discussão de grupo favorecendo uma postura ativa e um posicionamento crítico dos participantes.
Esta ação de formação foi proposta à Direção da SCML, tendo sido recomendado que o primeiro curso fosse frequentado por todos os formandos, e que os cursos 2 e 3 fossem frequentados pelos formandos em função do público-alvo preferencial da sua intervenção (jovens dos 15 aos 18 anos, e jovens adultos e adultos dos 18 aos 60 anos). Foi também estabelecido que, em virtude do elevado número de formandos que frequentariam o curso 1 (total de 34 participantes), este se desenrolaria em duas ações. A ação de formação decorreu ao longo de quatro semanas, nas instalações da SCML.
Parte III: Avaliação de (In)Satisfação com a Formação
Objetivo
A Parte III deste estudo teve por objetivo a identificação de fatores de (in)satisfaçãoassociados à implementação da ação de formação. Considerou-se que esta colaboração dos formandos seria um elemento crucial para avaliar se através das atividades realizadas foram alcançados os objetivos a que o programa se propôs e, por conseguinte, colmatadas as necessidades previamente identificadas nos formandos (Pinto, 2010). São apresentados os resultados da avaliação qualitativa (n = 15).
Método
Participantes
Participaram 15 técnicos, todos do sexo feminino, com idades compreendidas entre os 31 e os 62 anos, e uma idade média de 45,93 anos (DP = 9,55). No que respeita as formações académicas, 14 participantes (93,33%) possuem licenciatura, e um (6,67%) possui mestrado, em áreas de formação como Psicologia (n = 7, 46,66%), Serviço Social (n = 6, 40%) Política Social (n = 1, 6,67%), e Economia (n = 1, 6,67%).
Instrumento
Para a colheita de dados relativos aos fatores de (in) satisfação com a formação, foi construído o questionário "Avaliação de Satisfação com a Formação" onde, para além da informação sobre dados sociodemográficos, os participantes foram solicitados a responder a cinco questões de resposta aberta, relativamente a: (a) novos entendimentos sobre o conceito "construção de projetos de vida", (b) (in)satisfação das necessidades e problemas sentidos na realização do seu trabalho, (c) (in)satisfação com os temas/ conteúdos/ atividades abordados, (d) contributos para a melhoria do seu desempenho profissional, e (e) satisfação global com a formação, incluindo recomendações para futuras edições. As questões incluíram a avaliação do nível de satisfação global e específica, e a identificação dos fatores que contribuíram para essa avaliação.A questão 5, para além das recomendações para edições futuras, inclui ainda um item Likert em 5 pontos relativo à Satisfação global com a formação.
Procedimento
O questionário foi submetido à avaliação e aprovação da coordenação da SCML e posteriormente distribuído aos futuros formandos, solicitando o seu preenchimento no prazo máximo de duas semanas. Foram salientados os objetivos do presente estudo, bem como esclarecidos os cuidados éticos na recolha, tratamento e divulgação dos dados obtidos, tendo sido recebidas quinze respostas. O conteúdo das respostas às cinco últimas questões acima referidas foram submetidas aos procedimentos da análise de conteúdo sugeridos por Bardin (2004). O preenchimento destas cinco questões pelos 15 formandos originou um total de 61 respostas (15 formandos, 5 questões cada; algumas ausências de resposta), que se traduzem em 161 unidades de análise(ideias contidas nas respostas).A questão 5, em formato Likert, foi tratada através de estatística descritiva.
Resultados
Apresentam-se seguidamente os resultados obtidos por cada uma das cinco questões apresentadas, com indicação das dimensões identificadas acompanhadas de exemplos ilustrativos.
Questão 1: Após ter frequentado esta ação de formação, considero que a "Construção de Projetos de Vida" para mim significa…
Os formandos consideraram que a "Construção de Projetos de Vida" é um processo que deve ocorrer ao longo ciclo de vida dos indivíduos (caráter longitudinal), tendo em vista a promoção de trajetórias pessoais, profissionais e sociais (caráter latitudinal) saudáveis e satisfatórias. Assim, como tarefas-chave para a resolução de problemas e a tomada de decisões relativas à construção de projetos de vida foram identificadas oito dimensões (cinco das quais já previamente referidas no questionário de avaliação de necessidades):
1. Proatividade/Autonomia/Responsabilização (n = 6), que dizia respeito à capacidade das pessoas assumirem um papel ativo, responsável e autónomo na construção dos seus próprios projetos de vida, ainda que com o apoio dos técnicos (e.g., P6. (…) é importante que os candidatos sintam os projetos como deles e se envolvam para a sua concretização; P11. (…) de forma a potenciar escolhas autónomas e assertivas),
2. Autoconhecimento (n = 9), centrado na exploração de atuais interesses, competências, valores, e dificuldades (e.g., P6.Características/potencialidades/fragilidades do próprio candidato; P9. (…) para que eles desenvolvam o autoconhecimento),
3. Exploração do Meio (n = 6), que implicava o conhecimento do contexto socioeconómico, político, histórico, cultural, familiar da pessoa, bem como as oportunidades formativas/profissionais disponíveis (e.g., P6. Conhecimento de oportunidades e ameaças do mercado em termos formativos, profissionais; P13. Explorar (…) possibilidades de evolução futura pessoal, profissional, social),
4. Definição de Objetivos (n = 8), que consistiana necessidade de exploração e definição de objetivos a alcançar a curto, médio, e longo prazo (e.g., P3. (…) processo de orientação para uma definição/concretização de objetivos; P12. (…) que permitam a concretização de objetivos previamente fixados),
5. Definição e Implementação de um Plano de Ação (n = 6), que incidia sobre a necessidade de desenvolvimento de um conjunto de medidas e ações cuja implementação visa contribuir para a concretização de objetivos previamente estabelecidos (e.g., P3. (…) monitorizando, ajustando ou recriando metas e estratégias ao longo do percurso; P15 (…) definindo os caminhos que devemos percorrer para atingi-los),
6. Desenvolvimento Longitudinal (n = 10), isto é, a ideia de que a construção de projetos de vida acompanha o próprio ciclo de vida (e.g., P4. Um processo contínuo, que se desenvolve ao longo do ciclo de vida do indivíduo; P4. (…) influenciado pelos diferentes estádios de vida e idades),
7. Desenvolvimento Latitudinal (n = 9), onde se considerava que os projetos de vida não podem ser focados apenas nos papéis académico e/ou profissional, devendo ter em consideração os restantes palcos de vida em que a pessoa atua (e.g., P3. (…) nas diferentes esferas da vida, pessoal, familiar, e/ou profissional; P7. (…) nos diferentes níveis/papéis de vida) e,
8. Apoio (n = 9), onde foi referido o tipo de apoios que os técnicos podem proporcionar a pessoas em situação de vulnerabilidade social (e.g., P9. Um tempo de trabalho de reflexão e pesquisa por parte dos jovens e famílias; P9. Um momento de intervenção técnica de grande sensibilidade).
Questão 2: Após ter frequentado esta ação de formação, considero que as principais necessidades e problemas sentidos na realização do meu trabalho ao nível do apoio à Construção de Projetos de Vida foram satisfeitos/ não satisfeitos; 2a) Quais necessidades e problemas? Porque considera que foram satisfeitos/ não-satisfeitos?
A análise das respostasindicou que 14 (93,33%) formandosestão satisfeitos com a frequência da ação de formação, e 1 (6,67%) está insatisfeito, sendo que:
1. Os principais motivos de satisfação prenderam-se com o processo e com os conteúdos da formação (n = 29). Em termos do processo,indicaram que a formação foi cuidada, rigorosa e profunda na abordagem aos diversos tópicos que a contemplavam, sempre em clara ligação com a prática (e.g., P1. (…) questões foram abordadas de forma bastante eficaz durante a formação; P4. A formadora conseguiu fazer a ponte entre a teoria e a prática). Por outro lado, e em termos dos conteúdos, indicaram ter tido a possibilidade de realizar uma revisão dos seus conhecimentos teóricos, uma atualização dos seus instrumentos de avaliação/intervenção, e uma reflexão crítica sobre os atuais recursos, tendo em vista a introdução de melhorias (e.g., P5. O enquadramento teórico servir-me-á de suporte para uma melhor compreensão das problemáticas no contexto da formação profissional; P6. Ter conhecimento de outras estratégias/instrumentos interessantes que poderão ser adaptados e aplicados ao nosso público).
2. Quanto aos motivos de insatisfação (n = 7) foi salientada a percepção de alguma desadequação dos modelos teóricos e instrumentos de avaliação/intervenção face à singularidade da população a quem se dirigem (e.g., P10. (…) a população com quem trabalhamos necessita de estratégias ainda não suficientemente estudadas; P10. Os trabalhos que existem, as teorias de suporte, bem como as metodologias de intervenção dirigem-se a uma população dita "normal").
Questão 3: Considero que os temas/conteúdos/atividades que eu esperava desta ação de formação foram abordados/ não-abordados; 3a) Quais temas/conteúdos/atividades? Porque considera que foram abordados/ não-abordados?
Em relação aos temas/conteúdos/atividades que esperavam desta ação de formação, todos os formandosconsideraram que estes foram abordados.Em particular, indicaram queestes incidiram sobre:
1. Prática da Construção dos Projetos de Vida (n = 10), tendo sido abordados instrumentos, estratégias e técnicas concretas de intervenção com a população-alvo (e.g., P1. Instrumentos para a construção de um projeto de vida; P1. (…) propostas de adaptação ao nosso contexto de trabalho; P8. Casos práticos tendo em conta o nosso público), e
2. Teoria da Construção dos Projetos de Vida (n = 17), tendo sido feito um enquadramento teórico amplo que versou sobre conteúdos como a carreira, as transições e a adaptação, as características do processo de ajuda, as fases e tarefas desenvolvimentais dos adolescentes, jovens adultos e adultos, entre outros (e.g., P5. Os conceitos de desenvolvimento de projeto de vida e de carreira; P5. Os comportamentos em cada fase de desenvolvimento vocacional, ao longo da adolescência e vida adulta; P5. Transição e adaptação à mudança no ciclo de vida; P8. Promoção de competências académicas que previnem o abandono escolar e favorecem o sucesso educativo).
Questão 4: Após ter frequentado esta ação de formação, considero que retirei alguns contributos que me permitirão modificar alguns dos aspetos relacionados com a realização do meu trabalho - sim/ não; 4a) Quais contributos? Porque considera que irá/ não-irá modificar alguns aspetos relacionados com a realização do seu trabalho?
Todos os formandosconsideraram ter retirado contributos que lhes permitirão modificar alguns dos aspetos relacionados com a realização do seu trabalho. Assim constatou-se que os formandos indicaram que a frequência da ação de formação permitiu:
1. Mudanças no Conhecimento Teórico (n = 7), no sentido de uma revisão, atualização, aquisição de bases teóricas sólidas que permitirão uma maior confiança na sua intervenção (e.g., P2. Maior confiança técnica face ao enquadramento teórico das matérias abordadas que permitem a validação das práticas adotadas; P5. Aquisição e desenvolvimento de mais competências com vista ao processo de ajuda e acompanhamento, na concretização de projetos e vida),
2. Mudanças na Intervenção (n = 10), nomeadamente no que respeita as informações a recolher nas diversas fases do processo, bem como, as estratégias/instrumentos a utilizar em cada momento (e.g., P4 (…) adaptar as diferentes ferramentas/instrumentos aos diferentes públicos, idades e estádios de vida; P8. (…) permitem uma abordagem mais dinâmica por parte do técnico e uma atuação mais ativa e reflexiva por parte do jovem), e,
3. Mudanças gerais na atuação da equipa (n = 4), tendo em vista o delineamento de uma estratégia comum/integrada entre os técnicos que apoiam os jovens e adultos nas diferentes fases do processo de construção de projetos de vida (e.g., P8. Será possível à equipa utilizar os conhecimentos, metodologias e os instrumentos da formação, para melhor orientar e apoiar os formandos na definição de objetivos e consequentemente vir a promover o sucesso pessoal; P10. Pensamos realizar reunião de equipa em breve a fim de poder reavaliar as nossas estratégias e melhorar).
Questão 5:Recomendações para futuras edições
Em relação à análise do item "Satisfação global com a formação", os resultados obtidos indicaram uma média global de 4,4 pontos, em que 1 (6,67%) formando indicou "muito insatisfeito/a", 5 (33,33%) indicaram "satisfeito/a", e 9 (60%) indicaram "muito satisfeito/a" em relação à frequência da ação de formação.
Quanto à solicitação de recomendações para futuras edições (n = 9), estas podem organizar-se em:
1. Conteúdos da Formação (n = 6), tais como, apresentação de mais instrumentos de intervenção, realização de simulações ou role-playing, e discussão de casos práticos(e.g., P6. Instrumentos específicos mais adaptados ao nosso público; P9. Eventuais simulações de entrevista para análise e discussão; P10. Algumas atividades de natureza mais prática),
2. Organização (n = 3), nomeadamente na distribuição dos formandos pelos grupos e mais tempo para a realização das atividades práticas (e.g., P6. (…) recomendaria que a formação fosse dividida por área de intervenção (por exemplo… equipa de diagnóstico/mediadores/formadores…) para que houvesse um investimento na reflexão das práticas já efetuadas e possíveis melhorias; P5. (…) gostaria que houvesse mais informação/partilha de experiências por parte das equipas de diagnóstico e orientação),
3. Follow-up (n = 3), para verificação da apreensão e aplicação dos conteúdos adquiridos na formação (e.g., P1. Acho que seria bastante interessante fazer um follow-up desta formação; P1. (…) se estamos a aplicar os conhecimentos na prática e o que alteramos na nossa intervenção; P13. (…) que possa ser feita uma próxima edição/reciclagem com periodicidade a definir (2 em 2 anos por exemplo),
4. Supervisão (n = 2), tendo em vista uma prática acompanhada (e.g., P3. Acompanhamento e supervisão técnica/pedagógica; P4. Supervisão) e
5. Espaço físico (n = 1), alterações no espaço/equipamento físico da formação (e.g., P11. Cadeiras ergonómicas).
Discussão
No seu conjunto, os resultados permitemverificar que os formandos ficaram, em geral, muito satisfeitos com a ação de formação recebida, confirmando assim a importância da relação entre a avaliação de necessidades, e os procedimentos implementados para a sua satisfação através do desenvolvimento da ação de formação (Bakeret al., 2000).
Os principais fatores referidos para a satisfação foram: (a) a correspondência do plano formativo às suas necessidades e expectativas (b) o cumprimento dos objetivos a que a ação de formação se propôs, nomeadamente a abordagem à teoria e à prática da construção dos projetos de vida, (c) a disponibilização de documentaçãofidedigna e atualizada, (d) a utilização de métodos pedagógicos adequados, que favoreceram momentos de aprendizagem, experimentação, discussão, e partilha de informação entre todos os intervenientes, (e) a obtenção de contributos para modificar alguns dos aspetos relacionados com a realização da atividade profissional, (f) o planeamento e a apresentação aprofundadados diversos tópicos, (g) a disponibilidade da formadora para responder a dúvidas e a clareza na sua exposição, e (h) a exploração da possibilidade de se promover futuramente um grupo de supervisão/ momentos de follow-up. Trata-se de um conjunto de resultados que pode vir a ter utilidade na definição linhas orientadoras e de programas para futuras ações de formação junto de atuais e futuros profissionais que trabalham no apoio à construção de projetos de vida de populações vulneráveis (Lassance, Melo-Silva, Bardagi, & Paradiso, 2007; Moreno, 2006).
Quanto aos motivos de insatisfação, foi salientada a perceção de alguma desadequação dos modelos teóricos e instrumentos face às especificidades da população-alvo a quem se dirigem. Tal situação reforça a pertinência e urgência de se investir no desenvolvimento ou na adaptação dos modelos teóricos e paradigmas em Psicologia Vocacional, bem como, das metodologias e estratégias de intervenção neste âmbito, para diferentes contextos, populações e problemáticas (Pinto, 2012). Finalmente, estes resultados reforçam a importância de se articular uma formação teórica sólida com a capacitação para a prática através do foco nas competências para um exercício competente da profissão (Cruz &Schultz, 2009; Joly, 2000; Müller, 1999).
Considerações finais
Nos últimos anos, algumas instituições como a Associação Internacional de Orientação Escolar e Profissional (IAEVG 2003), e o NationalSteeringCommittee for CareerDevelopmentGuidelinesand Standards (2004), têm-se dedicado aodesenvolvimento de documentos com diretrizes para a prestação de um serviço de orientação com qualidade, onde especificam, além dos conhecimentos teóricos adquiridos no percurso formativo, um conjunto de modelos de competências centrais e competências especializadas que favorecem a utilização adequada desses mesmos conhecimentos em contextos aplicados (Cruz & Schultz, 2009; Pinto, 2012; Plant, 2004). À semelhança desses trabalhos, os resultados obtidos neste estudo trazem importantes contributos para o desenvolvimento de diretivas acerca de uma formação teórica e prática de qualidade, dos profissionais que atuam no domínio do apoio à construção de projetos de vida, em particular com populações em situação de vulnerabilidade (Lassanceet al., 2007; Melo-Silva, 2003).
Importa considerar que o desenvolvimento deste estudo teve subjacentes algumas limitações. Salienta-se uma amostra reduzida de participantes nas partes I e III, em comparação com o número de técnicos envolvidos na formação (Parte II), e o facto de os instrumentos de levantamento de necessidades e de fatores de (in)satisfação, por incluírem várias perguntas de resposta aberta, poderem ter suscitado a não adesão à resposta por parte dos restantes técnicos. Outro aspeto a considerar é o facto de todo este projeto ter sido desenvolvido por uma equipa que, embora bastante experiente no desenho, desenvolvimento e avaliação de programas de formação/intervenção, pode ter tido algum viés nas análises e conclusões em razão do envolvimento com o trabalho realizado.
Para a continuidade deste projeto prevê-se o desenvolvimento de ações de follow-up com a finalidade apoiar os técnicos da SCML a transpor para a sua prática profissional os conteúdos programáticos abordados na formação, nomeadamente: (a) Analisar as mudanças introduzidas no processo de construção de projetos de vida das pessoas que recorrem à SCML, discutindo para cada momento/ instrumento/ estratégia de intervenção as mais-valias e dificuldades identificadas; (b) Promover uma melhor adaptação dos instrumentos/ estratégias de intervenção decorrentes da experiência dos técnicos, ultrapassando as dificuldades sentidas e introduzindo pontualmente novos instrumentos/ estratégias que favoreçam a obtenção dos seus objetivos de intervenção junto da população-alvo; e, (c) Discutir alguns casos de intervenção, e a utilidade/ dificuldade dos modelos teóricos/ instrumentos/ estratégias nesses casos. Pretende-se deste modo contribuir para maximizar o investimento realizado ao longo do processo de formação.
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Endereço para correspondência:
Joana Carneiro Pinto
Faculdade de Ciências Humanas, Universidade Católica Portuguesa
Palma de Cima, 1649-023
Lisboa, Portugal
E-mail: joanacarneiropinto@fch.lisboa.ucp.pt
Recebido: 22/01/2016
1ª reformulação: 19/10/2016
Aceite final: 17/03/2017
Sobre as autoras
Joana Carneiro Pinto é professora auxiliar convidada da FCH-UCP e coordenadora do Master in Psychology in Business and Economics. Licenciou-se e doutorou-se em Psicologia, especialização em Psicologia Vocacional. Investigadora em projetos relacionados com o bem-estar e os projetos de vida, a avaliação de necessidades e da eficácia das intervenções psicológicas, e as metodologias de investigação científica.
Helena Rebelo Pinto é professora catedrática convidada da FCH-UCP e coordenadora da licenciatura em Psicologia, do Instituto de Ciências da Família, e do Mestrado em Ciências da Família. Licenciada, doutorada e agregada em Psicologia pela Universidade de Lisboa, com formação especializada em Psicologia Vocacional, Psicologia da Educação, e Avaliação Psicológica.
1 As autoras agradecem à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa todo o acolhimento e apoio ao desenvolvimento deste estudo.
2 Refere-se ao número de identificação do técnico, aleatoriamente atribuído aquando da recepção do seu questionário devidamente preenchido; os números dos técnicos apresentados na Parte I e na Parte III não estão relacionados; tendo em conta a confidencialidade no processo de recolha de dados não foi possível assegurar que o P1 (participante 1) na parte I deste trabalho é o mesmo P1 na parte III deste trabalho.