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Temas em Psicologia

versão impressa ISSN 1413-389X

Temas psicol. vol.24 no.1 Ribeirão Preto mar. 2016

https://doi.org/10.9788/TP2016.1-22 

ARTIGOS

 

Conflito conjugal e estratégias de resolução: uma revisão sistemática da literatura

 

Marital conflict and resolution strategies: a systematic literature review

 

Conflicto marital y estrategias de resolución: una revisión sistemática de la literatura

 

 

Crístofer Batista da CostaI; Cláudia Mara Boseto CenciII; Clarisse Pereira MosmannIII

IPrograma de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, RS, Brasil
IICurso de Psicologia da Faculdade Meridional IMED, Passo Fundo, RS, Brasil
IIIPrograma de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, RS, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Os conflitos conjugais e as estratégias de resolução são pesquisados na literatura internacional há mais de duas décadas. Nesse sentido, analisar a literatura nacional e internacional acerca do conflito conjugal e das estratégias de resolução de conflito empregadas pelos cônjuges, foi o objetivo deste estudo. Trata-se de uma revisão sistemática qualitativa entre o período de 2004/2013. O estudo foi realizado em dez bases de dados através dos descritores conflito conjugal AND casamento e resolução de problemas AND casamento e submetidos aos procedimentos de análise de conteúdo. Na primeira etapa foram selecionados 567 artigos e, destes, 30 compõem esta revisão por atenderem aos critérios de exclusão e inclusão definidos a priori. Os resultados dos estudos apontaram que as pesquisas sobre as estratégias de resolução se sobressaíram em detrimento dos motivos dos conflitos conjugais. Identificou-se que as variáveis sexo, características individuais, tempo de união e processos interacionais estão associadas à utilização dos tipos de estratégias, construtivas e destrutivas. Estudos sobre o poder de predição dessas variáveis sobre as estratégias de resolução precisam ser mais explorados, especialmente, no contexto brasileiro, em que há escassez de pesquisas sobre a temática.

Palavras-chave: Conflito conjugal, casamento, resolução de problemas.


ABSTRACT

Marital conflicts and resolution strategies are studied in the literature for over two decades. Accordingly, the purpose of this article was to analyze the national and international literature on marital conflict and resolution strategies employed by the spouses. This is a qualitative systematic review of the period between 2004/2013. The study was conducted in nine databases through descriptors marital conflict AND marriage and problem resolution AND marriage subjected to content analysis procedures. In the first step, 567 articles were selected. 30 of these are part of this systematic review compose since they obey the operational exclusion and inclusion criteria defined a priori. The studies point out that research on resolution strategies stood out over the grounds of marital conflict. It was identified that the gender, individual characteristics, time of unity and interaction processes are associated with the use of the types of strategies, constructive and destructive. Studies on the predictive power of these variables on the resolution strategies need further exploration, especially in the Brazilian context, where there are few investigations on the subject.

Keywords: Marital conflict, marriage, problem solving.


RESUMEN

Conflictos maritales y sus estrategias de resolución son estudiados en la literatura por más de dos décadas. En este sentido, el objetivo de este artículo fue analizar la literatura nacional e internacional y las estrategias de resolución de conflictos maritales. Se trata de una revisión sistemática cualitativa entre el período de 2004/2013. El estudio se realizó en nueve bases de datos por medio de descriptores conflicto marital y matrimonio y resolución de problemas y matrimonio sometidos al análisis de contenido cualitativo. En el primer paso fueron seleccionados 567 artículos y, de éstos, 30 componen esta revisión sistemática de la literatura por cumplir con los criterios de exclusión y inclusión establecidos a priori. Los resultados de los estudios enseñan que las investigaciones acerca de las estrategias de resolución sobresalen las de razones de los conflictos maritales. Se identificó que las variables sexo, características individuales, tiempo de unión y procesos interacciónales están asociadas a utilización de los tipos de estrategias, constructivas e destructivas. Estudios acerca del poder predictivo de esas variables en las estrategias de resolución necesitan mayor explotación, en especial, en el contexto brasileño, en lo cual hay escasez de investigaciones sobre el tema.

Palabras clave: Conflicto marital, matrimonio, resolución de problemas.


 

 

Os conflitos conjugais vêm sendo estudados no contexto internacional há pelo menos duas décadas. Trata-se de um fenômeno multidimensional, envolvendo a frequência com que ocorre, a intensidade das discussões, o conteúdo que fez emergir a situação conflituosa, o reconhecimento dos cônjuges sobre a existência ou não de problemas, e as estratégias utilizadas para resolvê-los (Benetti, 2006; Cummings, 1998).

Situações de conflito na conjugalidade acontecem devido ao processo de adaptação, sincronia e amadurecimento da relação ao longo do tempo (Bertoni & Bodenmann, 2010). No entanto, os conflitos poderão caracterizar-se, predominantemente, por interações de desacordo e invalidação ou por tentativas de reparar os problemas e validar os sentimentos e os pensamentos do cônjuge. Desse modo, o tipo de interação mais frequente entre os parceiros durante o conflito, indicará se ele será mais negativo e conflituoso ou positivo e facilitador à resolução dos problemas (Gottman, 1998).

Os desacordos conjugais ocorrem por diferentes motivos e podem estar relacionados às divergências sobre a educação dos filhos, o tempo que os parceiros ficam juntos, as finanças, a divisão das tarefas domésticas, as questões legais, entre outros motivos (Bolze, Schmidt, Crepaldi, & Vieira, 2011). Os problemas podem envolver também a consistência do contrato conjugal (Tavora, 2009), a forma de se comunicar (Torossian, Heleno, & Vizzotto, 2009), as características individuais como temperamento e autoestima, e os padrões de interação entre os cônjuges (Silva & Vandenberghe, 2009).

Além disso, os contextos sociais e a cultura são fundamentais à compreensão dos conflitos no casamento (Garcia & Tassara, 2001) visto que interferem na percepção e no papel de homens e mulheres na conjugalidade (Benetti, 2006; Giddens, 1993). Os reflexos dessas mudanças foram apontadas recentemente por Dush e Taylor (2012). De acordo com os pesquisadores, os casais que tomam as decisões em conjunto e compartilham as responsabilidades da vida conjugal e familiar apresentam menores níveis de conflito e maiores níveis de satisfação conjugal. Mostra-se importante analisar e discutir as mudanças socioculturais nos contextos em que os conflitos ocorrem, sob a premissa de que influenciam a forma de pensar das pessoas, as expectativas em torno da conjugalidade e a postura que os parceiros íntimos assumem em suas relações amorosas (Benetti, 2006; Dush & Taylor, 2012; Garcia & Tassara, 2001; Giddens, 1993).

Um estudo realizado em Santa Catarina, em 2013, objetivou caracterizar os relacionamentos conjugais e as estratégias de resolução de confli-to de 200 casais de classe média. Os resultados indicaram altos níveis de satisfação conjugal e utilização de estratégias de negociação frente aos conflitos, mas também, emprego de estratégias de esquiva, agressão psicológica menor e contextos de reciprocidade negativa (Bolze, Schmidt, Crepaldi, & Vieira, 2013). O estudo encontrou correlação entre as dimensões, o que suscita a hipótese de que estratégias construtivas e destrutivas e padrões de interação positivos e negativos podem coexistir dentro de um relacionamento conjugal.

Estes achados confirmam a compreensão de outros autores (Bertoni & Bodenmann, 2010; Féres-Carneiro, 1998) de que os conflitos conjugais ocorrem, naturalmente, como fruto da interação de pessoas que almejam construir um projeto de vida em conjunto e, para tanto, precisarão discutir e negociar sobre pontos de vista divergentes e tentar chegar a um acordo. Consequentemente, adiando a resolução dos problemas pode haver um acúmulo de impasses que eclodirão com mais força e carga negativa do que se fossem resolvidos no contexto em que emergiram (Zordan, Wagner, & Mosmann, 2012).

Nesse sentido, as estratégias de resolução dos conflitos conjugais são muito importantes. Possuem um caráter interacional e são definidas na literatura como os comportamentos dirigidos ao cônjuge na tentativa de gerenciar o problema e dar um desfecho para a situação. Idealmente, o conflito deve ser identificado com clareza pelos cônjuges, a fim de que estes possam dedicar-se ativamente à sua resolução (Carlson & Dinkmeyer, 1987; Fincham, 2009; Garcia & Tassara, 2001).

As estratégias de resolução de conflito mais efetivas envolvem controle emocional, orientação para a solução, confronto não ostensivo (Wheeler, Updegraff, & Thayer, 2010), comunicação respeitosa, capacidade de escuta mútua e percepção do casamento como uma vivência que possui limitações (Hahlweg & Richter, 2010; Tavora, 2009). As estratégias de resolução menos eficazes estão associadas aos comportamentos de racionalização excessiva e de negação, à percepção negativa do parceiro e da relação (Whiting, 2008) e ao pessimismo frente à resolução dos problemas conjugais (Rasera & Guanaes, 2010).

Além disso, utilizar estratégias construtivas reverbera positivamente no relacionamento ao longo do tempo (Sierau & Herzberg, 2012) e minimiza a possibilidade de separação e divórcio entre os casais que se propõem a desenvolver, por exemplo, habilidades comunicacionais como falar e ouvir (Hahlweg & Richter, 2010). Segundo Anderson e Johnson (2010), o desenvolvimento de um ambiente mais positivo, em que os problemas são resolvidos via estratégias construtivas, reforça a aliança entre os cônjuges e os fortalece diante das situações de estresse no dia a dia.

De acordo com os estudos encontrados, percebe-se escassez de pesquisas sobre os motivos dos conflitos conjugais e sobre as estratégias de resolução no contexto nacional (Bolze et al., 2011, 2013). Na literatura internacional, existe significativa produção científica em tor-no destes temas, de modo que os pesquisadores dedicam-se ao estudo de variáveis específicas, envolvendo os conflitos conjugais e as formas de resolvê-los (Anderson & Johnson, 2010; Bertoni & Bodenmann, 2010; Dush & Taylor, 2012; Graber, Laurenceau, Miga, Chango, & Coan, 2011; Sierau & Herzberg, 2012; Wheeler et al., 2010; Whiting, 2008). Entretanto, por decisões teóricas e metodológicas, os pesquisadores utilizam-se de nomenclaturas distintas para estratégias equivalentes. A heterogeneidade no emprego dos termos interfere na compreensão das estratégias de resolução e das reverberações que provocam na conjugalidade.

Estudos internacionais investigam, há mais de vinte anos, os conflitos conjugais e as suas repercussões na vida dos cônjuges e no ambiente familiar. Tal fato aponta a importância de mapear e sistematizar os resultados de pesquisas, no contexto nacional e internacional e de indicar alternativas de investigação futura de um fenômeno inserido em uma conjuntura social e cultural idiossincrática (Benetti, 2006). Diante dessas considerações, o objetivo deste estudo foi analisar a literatura nacional e internacional sobre os conflitos conjugais e as estratégias de resolução empregadas pelos cônjuges.

 

Método

Delineamento

O presente estudo é uma revisão sistemática qualitativa. As revisões sistemáticas empregam análise crítica e síntese de estudos sobre determinada temática por meio de procedimentos sistemáticos, explícitos e replicáveis, e cujo objetivo principal é integrar os estudos, apontar divergências e convergências e orientar novas investigações (Sampaio & Mancini, 2007). A elaboração desta revisão, com base nos autores citados, foi realizada através das etapas: (a) formulação da questão de pesquisa; (b) considerações acerca do estado da arte do tema investigado; (c) definição de critérios de inclusão e exclusão; (d) análise das características e resultados dos estudos recuperados; (e) apresentação dos resultados e discussão.

Procedimentos de Busca

A pesquisa foi realizada em dez bases de dados: Academic Search Complete, Biblioteca Cochrane, Ibecs (Indice Bibliográfico Español de Ciencias de la Salud), Index Psi, Lilacs (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde), Medline (Medical Literature Analysis and Retrieval System Online), Portal de Evidências, PsycINFO, SciELO (Scientific Electronic Library Online) e Web of Science. Empregou-se descritores das ciências da saúde listados na Biblioteca Virtual em Saúde Decs/BVS e o operador boleano AND para refinar os resultados da primeira etapa da busca. Os descritores e os termos equivalentes em inglês foram: (a) conflito conjugal AND casamento - marital conflict AND marriage e (b) resolução de problemas AND casamento -problem solving AND marriage.

Os critérios de inclusão marcados nos campos de busca das bases de dados foram: unitermos e suas combinações presentes nas palavras-chave, artigo científico de pesquisa empírica da área da psicologia, sem restrição de idioma ou país, disponível em texto completo nas bases entre janeiro de 2004 e dezembro de 2013, período delimitado devido ao número expressivo de pesquisas, especialmente na literatura internacional. A especificidade temática - estudos que investigaram os conflitos conjugais e estratégias de resolução, foi avaliada inicialmente através da leitura dos resumos. Foram critérios de exclusão: pesquisas apresentadas através de capítulo, livro, dissertação de mestrado ou tese de doutorado, estudos disponíveis apenas enquanto resumo, publicações que não passaram pelo critério de avaliação por pares, ano de publicação anterior a 2004 ou posterior a 2013, áreas de estudo que não a psicologia e artigos cujo foco não se restringia ao conflito conjugal e as estratégias de resolução, mas sobre associações e repercussões destes em outras variáveis pessoais, familiares e contextuais.

Análise dos Dados

Os artigos recuperados foram analisados de forma qualitativa por meio de procedimentos de análise de conteúdo (Bauer, 2008), quais sejam:

1. Leitura flutuante, exploração e pré-análise dos artigos. Nesta etapa foi construída uma tabela contendo características do estudo, seus objetivos e resultados;

2. Identificação e descrição dos resultados que responderam aos objetivos da pesquisa;

3. Identificação de unidades de significado e agrupamento destas por semelhança;

4. Elaboração de eixos temáticos a partir dos agrupamentos formados. A elaboração dos eixos temáticos considerou a priori resultados associados aos motivos dos conflitos conjugais e às diferentes estratégias, construtivas e destrutivas, de resolução dos desacordos conjugais.

 

Resultados

Por meio dos descritores e critérios operacionais delimitados nesta revisão sistemática foram recuperados 567 artigos, conforme Figura 1: Academic Search Complete (n=101), Biblioteca Cochrane (n=21), Ibecs (n=1), Index Psi (n=17), Lilacs (n=7), Medline (n=113), Portal de Evidências (n=1), PsycINFO (n=35), SciELO (n=8) e Web of Science (n=263). Destes estudos recuperados (N=567), foram excluídos 426 que investigavam diferentes variáveis associadas aos conflitos conjugais e às estratégias de resolução, quais sejam: consequências na vida dos filhos em diferentes etapas do desenvolvimento - crianças, adolescentes e jovens, questões de parentalidade, de coparentalidade e de família de origem, saúde física e mental como câncer, problemas respiratórios, depressão e, outros, relacionados ao consumo de álcool, à ansiedade, aos cuidados com a saúde, aos contextos de risco e à religião. Foram excluídos 97 artigos duplicados nas bases de dados, quatro pesquisas para validação de instrumentos sobre conflitos conjugais e estratégias de resolução, três artigos indisponíveis na versão completa nas bases pesquisadas, dois estudos de caso, dois artigos teóricos, duas pesquisas com intervenção e um artigo de revisão sistemática da literatura nacional. Desse modo, 30 artigos que investigaram especificamente os conflitos conjugais e as estratégias de resolução no casamento constituem esta revisão sistemática.

Percebe-se, conforme Tabela 1, que entre 2004 e 2013, foi publicado pelo menos um estudo ao ano envolvendo a temática dos conflitos conjugais ou das estratégias de resolução, com destaque para 2010 e 2012, em que houve o maior número de publicações (n=5). Quanto ao delineamento foram encontrados estudos descritivos (n=1), comparativos (n=7), correlacionais (n=7), longitudinais (n=8) e explicativos (n=24). Os países de realização dos estudos foram: Estados Unidos (n=22); Estados Unidos e País de Gales (n=1); Estados Unidos e Canadá (n=1); Bélgica, Turquia, Itália, Taiwan, Brasil e Bolívia, todos com um estudo.

Através da análise de conteúdo, à qual os resultados dos estudos foram submetidos, originaram-se três eixos temáticos, conforme Tabela 2. No eixo I "Conflitos Conjugais" são apresentadas as categorias: (a) Compreensão consensual sobre os conflitos conjugais e (b) Motivos dos conflitos.

As pesquisas apontam que os desacordos conjugais são inevitáveis, ameaçam a satisfação e a qualidade conjugal ao longo do tempo se intensos e frequentes e que precisam ser gerenciados de alguma forma pelos parceiros ao invés de ignorados ou de a sua resolução ser protelada (Fincham et al., 2007; Mosmann & Falcke, 2011; Tallman & Hsiao, 2004). Na categoria "Motivos dos conflitos", dois estudos abordaram a questão, indicando que os impasses estão relacionados à educação dos filhos, à negociação sobre o tempo que os parceiros passam juntos, à administração do dinheiro, à divisão das tarefas domésticas (Mosmann & Falcke, 2011) e por questões de infidelidade e dinheiro (Stieglitz et al., 2012).

No eixo II "Estratégias de resolução dos conflitos conjugais" são apresentadas as categorias: (a) Estratégias de resolução de conflito construtivas e (b) Estratégias de resolução de conflito destrutivas. Na resolução construtiva, as estratégias encontradas foram: benevolência, cooperação, suporte, validação, autocontrole, comunicação positiva, utilização de pronomes de integração (nós), identificação e abordagem ativa dos problemas, inclinação à mudança de comportamento, bom humor e demonstração de interesse em resolver os desacordos. Na resolução destrutiva, as estratégias encontradas foram: retaliação, autoproteção, ataque, utilização de pronomes de separação (tu), abordagem passiva do problema, comunicação negativa, ocultação de informações do parceiro e esquiva (Bermúdez et al., 2006; Fincham et al., 2004, 2007; Hoppmann & Blanchard-Fields, 2011; Johnson et al., 2005; Leggett et al., 2012; Markman et al., 2010; McNulty et al., 2008; McNulty & Russell, 2010; Paleari et al., 2010; Sanford, 2006; Schoebi et al., 2012; Seider et al., 2009; Simmons et al., 2005; Sullivan et al., 2010; Tallman & Hsiao, 2004; Uysal et al., 2012; Veldorale-Brogan et al., 2013; Verhofstadt, Buysse, Ickes, et al., 2005).

No eixo III "Variáveis associadas aos conflitos conjugais e às estratégias de resolução" são apresentadas as categorias: (a) Sexo, (b) Características individuais, (c) Processos interacionais e (d) Tempo de união. Os estudos apontam que homens e mulheres têm atitudes e utilizam estratégias diferentes durante as situações de conflito, emergindo a categoria "Sexo". Homens têm, predominantemente, comportamentos de retirada, inflexão, esquiva, autoritarismo, crítica excessiva e culpabilização das esposas, escuta superficial, seletiva, defensiva e armada e dificuldades para expressar emoções. Mulheres têm mais comportamentos de demanda e auto revelação, atribuição de maior gravidade ao problema, mudanças acentuadas nos níveis de satisfação com o relacionamento, sentem e expressam emoções intensas com xingamento, mau humor e interrupção da comunicação (Cheng, 2010; Karahan, 2009; McNulty et al., 2008; Paleari et al., 2010; Papp et al., 2007; Rehman et al., 2011; Smith et al., 2009; Uysal et al., 2012; Verhofstadt, Buysse, De Clercq, et al., 2005).

As pesquisas indicam que as "Características individuais" dos cônjuges interferem na resolução dos conflitos conjugais em três momentos: antes do conflito ocorrer, quanto à expectativa positiva ou negativa sobre si, em relação ao parceiro e sobre o desfecho da situação, durante e após o conflito. Além disso, a empatia, a percepção de competência em si mesmo e no cônjuge, a atribuição de gravidade ao problema com base nas concepções de mundo pessoais e a interpretação dos motivos subjacentes ao conflito, são centrais à resolução dos problemas na conjugalidade (Cundiff et al., 2012; Hoppmann & Blanchard-Fields, 2011; Leggett et al., 2012; McNulty et al., 2008; Miller & Rempel, 2004; Paleari et al., 2010; Sanford, 2006; Tallman & Hsiao, 2004; Veldorale-Brogan et al., 2013).

Em "Processos interacionais" são discutidas a influência mútua de positividade e negatividade entre os cônjuges e os padrões de interação conjugal. Os resultados dos estudos apontam que por meio das características de cada cônjuge se estabelece um contexto relacional único do par conjugal em que ambos estão implicados e pelo qual são corresponsáveis (Cundiff et al., 2012; Johnson et al., 2005; Madhyastha et al., 2011).

Na categoria sobre o "Tempo de união", as pesquisas encontradas apontam que parceiros em casamentos de longa duração, mais de vinte anos, apresentam menores níveis de ansiedade, de submissão, de negatividade, têm maiores níveis de controle e de positividade e usam estratégias de colaboração durante os conflitos conjugais, quando comparados aos casais mais jovens, casados a menos de cinco anos (Hoppmann & Blanchard-Fields, 2011; Smith et al., 2009; Stieglitz et al., 2012).

 

Discussão

Os anos de publicação dos estudos revisados revelam que a temática está sendo investigada no meio científico, embora não se possa afirmar que houve aumento no número de publicações, apenas que a produção se concentrou em período mais recente, 2010 e 2012. Uma característica interessante desses estudos refere-se aos delineamentos empregados. A maior parte das investigações utilizou delineamento longitudinal e explicativo, o que sugere uma preocupação dos pesquisadores em qualificar suas pesquisas por meio de delineamentos mais sofisticados do ponto de vista metodológico, visando aperfeiçoar os estudos e avançar no conhecimento científico sobre a temática investigada.

Quanto aos países de realização destas pesquisas, os Estados Unidos se destacam expressivamente em relação aos demais. Esse dado indica, inevitavelmente, que os resultados dos estudos fornecerão informações associadas à realidade norte americana e às idiossincrasias próprias dessa cultura e, portanto, que generalizações e associações a outros contextos devem ser feitas com cautela. Além disso, esses achados indicam a carência de estudos no contexto brasileiro, onde foi encontrado apenas um artigo.

Na primeira categoria do Eixo I, intitulada "Compreensão consensual sobre os conflitos conjugais" identificou-se que os atritos entre os cônjuges são inevitáveis e fazem parte da conjugalidade, mas necessitam de resolução pois há o risco de ameaçar a satisfação e a qualidade conjugal e aumentar em intensidade e frequência ao longo do tempo de casamento. Este achado pode indicar que o acúmulo de situações pendentes, dentro de um relacionamento, torna cada vez mais difícil a sua resolução, repercute negativamente nos parceiros e complexifica o problema que será associado a outros eventos não resolvidos no passado. Pode-se perder o foco do real motivo de conflito, tornando-o maior do que realmente é e, gerando repercussões emocionais como mágoa, raiva e desinteresse pelo relacionamento.

Quanto aos "Motivos dos conflitos", emergiu um número escasso de pesquisas. No estudo de Mosmann e Falcke (2011) foram apontados os desacordos entre os parceiros quanto à educação dos filhos, ao tempo que passam juntos, ao dinheiro e às tarefas domésticas. No estudo de Stieglitz et al. (2012) foram encontrados o dinheiro e a infidelidade como motivo de conflito. Nas duas pesquisas o dinheiro foi tema gerador de discórdia, talvez porque as finanças de um casal sejam mais difíceis de gerir do que outras questões. Um entendimento para este resultado é que os casais aprenderam a nominar de dificuldades financeiras seus principais conflitos relacionais, sem conseguir distinguir questões subjacentes como problemas de comunicação, por exemplo. Podem ter encontrado na questão financeira, terreno fértil para dar um sentido palpável à outras angústias e desencontros conjugais.

No eixo II "Estratégias de resolução dos conflitos conjugais" são apresentadas as categorias: (a) Estratégias de resolução de conflito construtivas e (b) Estratégias de resolução de conflito destrutivas. As estratégias encontradas nos artigos revisados (Hahlweg & Richter, 2010; Rasera & Guanaes, 2010; Tavora, 2009; Wheeler et al., 2010; Whiting, 2008) se equiparam, quase que em sua totalidade, e constituem um corpus de conhecimento significativo sobre a temática, especialmente, na literatura internacional.

Por meio deste resultado, identifica-se que as estratégias de resolução construtivas apontam a importância de postura mais flexível e tolerante diante dos problemas conjugais e limitações do cônjuge, da percepção otimista dos conflitos e de assumir que a sua ocorrência e resolução envolvem responsabilidade mútua. As estratégias que reverberam destrutivamente na conjugalidade estão relacionadas aos comportamentos individualizados frente às questões conjugais e às dificuldades em flexibilizar pensamentos e se conectar com o que a relação e o parceiro têm de positivo. Remetem a um sentido de competição em que há dois objetivos: atacar ou se proteger. É preciso comprovar que o outro é o responsável pelos problemas ou se defender das possíveis acusações que ele(a) fará. Quando o princípio da estratégia pressupõe a competição, cria a expectativa nos cônjuges de que haverá somente um vencedor da disputa afetiva. Tal crença retroalimenta o investimento constante de ataque e de proteção de ambos os cônjuges. Eles acreditam que o problema da relação conjugal é o comportamento do parceiro e não percebem o quanto cada um contribui para a relação continuar sendo motivo de sofrimento e de investimento nocivo para a dinâmica relacional conjugal.

No eixo III "Variáveis associadas aos conflitos conjugais e às estratégias de resolução" são apresentadas as categorias: (a) Sexo, (b) Características individuais, (c) Processos interacionais e (d) Tempo de união. Na categoria, "Sexo", estudos apontam diferenças significativas entre homens e mulheres quanto à percepção dos conflitos conjugais e das estratégias de resolução adotadas. Os resultados podem indicar que as dificuldades para resolver os conflitos estão associadas às diferentes percepções, expectativas e comportamentos que homens e mulheres têm diante dos problemas conjugais, das relações amorosas e do jeito de expressar tais questões, corroborando o que apontam outras pesquisas (Dush & Taylor, 2012; Garcia & Tassara, 2001; Giddens, 1993).

Refletir dessa forma é reconhecer mais um elemento que interfere na tentativa construtiva ou destrutiva de resolver os desacordos conjugais. As diferenças entre maridos e esposas dentro do casamento têm como consequência, segundo os resultados das pesquisas, distintos métodos de resolver os conflitos e de reagir frente a eles. Essas diferenças impactam nos níveis de satisfação com a relação por estarem associadas, teoricamente, ao investimento emocional feminino, à dificuldade masculina de lidar com os sentimentos e à forma como ambos os cônjuges tendem a tratar os assuntos conjugais.

Na categoria sobre as "Características individuais" os estudos apontam que o processo pessoal de cada cônjuge interfere diretamente na resolução dos problemas conjugais antes, durante e após o conflito ocorrer. Esses resultados provocam reflexões quanto à perspectiva relacional do conflito e fazem emergir a hipótese de que os desacordos estariam associados, mais fortemente, às características individuais (Silva & Vandenberghe, 2009) do que aos processos interacionais.

Nesse entendimento, os parceiros trazem preconcepções que funcionariam como profecias autorrealizadoras do desfecho do conflito (Sanford, 2006), remetendo para processos anteriores à constituição do vínculo conjugal. Esses resultados podem indicar que o relacionamento marital é influenciado, mais fortemente, pelo reflexo do micro nível do conflito conjugal no indivíduo, efeito ator e, também, pela inércia emocional, dificuldade de mudar e/ou flexibilizar pensamentos e comportamentos, característicos do funcionamento de cada cônjuge, desde os anos iniciais do casamento e, até mesmo, anteriores a constituição do vínculo amoroso.

Por outro lado, na categoria "Processos interacionais" foram encontrados dois estudos sobre a influência mútua de positividade e negatividade que cada parceiro traz para a interação (Cundiff et al., 2012; Madhyastha et al., 2011). Compreende-se, por meio desses resultados, que o par conjugal, ao decidir pela convivência, constitui um universo intersubjetivo que se mantém em constante atualização e que exigirá dos cônjuges postura para tomar decisões que, a partir da união matrimonial, favorecerão a conjugalidade e não apenas as individualidades.

Os cônjuges precisam ter consciência de que pertencem a um contexto sócio-econômico-cultural-espiritual único, mas que torna-se compartilhado ao se casar. Durante o exercício da conjugalidade e da vivência das diferentes etapas do ciclo de vida conjugal emergirão demandas em que devem estar contemplados valores, desejos e necessidades individuais e conjugais. Para que isso aconteça o diálogo e a flexibilidade são necessários ao processo de tomada de decisão que só poderá ser nominada, sentida e vivida por aquele par marital. O casal estabelece um padrão de funcionamento que guia suas decisões no transcorrer do casamento em que ambos partilham, retroalimentam e reproduzem dinâmicas relacionais aprendidas na sua vivência com as famílias de origem.

O "Tempo de união" emergiu como uma variável que provoca alterações na dinâmica conjugal. Os estudos apontaram diferenças com relação ao comportamento e aos estilos de resolução dos conflitos entre casamentos de longa duração e casamentos de curta duração. Esse achado pode indicar que, com o passar do tempo de união, acontece um processo de amadurecimento natural das percepções, necessidades, expectativas e comportamentos diante dos conflitos conjugais. As estratégias estariam sujeitas à interferência do momento do ciclo vital individual, conjugal e familiar dos parceiros.

Nos primeiros anos de casamento, os conflitos podem ser mais intensos, frequentes e difíceis de resolver por ser um período de adaptação entre os cônjuges. O casal precisará gerenciar demandas cotidianas como, divisão das tarefas domésticas, partilha dos gastos, alinhamento dos projetos de vida pessoal, profissional e conjugal, nascimento de filhos, entre outros. Tal período, demandaria maior esforço, investimento e apoio entre os parceiros. Passada a etapa inicial do casamento é possível que os cônjuges compreendam que a vida conjugal e familiar exige investimento mútuo e constante e que certas situações não serão resolvidas dentro das suas expectativas. Perceberiam que as diferenças e os desacordos conjugais são naturais, importantes para o desenvolvimento da conjugalidade e sempre existirão, apesar de gerar, muitas vezes, desconforto, mágoa e culminar em separação.

 

Considerações Finais

Por meio dos estudos revisados, identificou-se que os motivos dos conflitos não têm sido foco expressivo de investigação, possivelmente, por se compreender que são fatores secundários à resolução dos problemas. Nessa perspectiva, variáveis como sexo, características individuais, tempo de união e processos interacionais estiveram associadas às situações de conflito e às estratégias de resolução.

Quanto à variável tempo de união, analisar as diferentes fases do ciclo vital conjugal pode ser um tema de investigação relevante e oportuno. A avaliação dessa variável pode fornecer indicativos de como planejar intervenções que possam prevenir certas expressões de conflito e dificuldades no início do relacionamento amoroso.

Percebe-se, através destes resultados, que os conflitos conjugais e as estratégias de resolução não encerram em si a compreensão das dinâmicas conjugais. A inter-relação entre as características pessoais dos cônjuges e a qualidade do processo interacional, influenciado por questões individuais e pelo movimento antecipado ou tardio de resolução dos conflitos, culminará em um ambiente conjugal mais positivo ou mais negativo. O desenvolvimento de modelos explicativos poderia integrar as variáveis encontradas e apontar outras possíveis compreensões sobre a temática investigada.

Por decisões metodológicas, não foi possível discutir os dados das pesquisas de forma quantitativa. Estudos de revisão sistemática podem analisar os artigos encontrados noutra perspectiva, propondo diferentes discussões e reflexões sobre os conflitos conjugais e as estratégias de resolução. Ressalta-se que apenas um estudo nacional compõe esta revisão, indicando a necessidade premente de pesquisas dentro desse contexto, para que clínicos e outros pesquisadores tenham evidências empíricas que subsidiem a teoria e a prática profissional com base em resultados ajustados às idiossincrasias da cultura brasileira.

 

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Endereço para correspondência:
Crístofer Batista da Costa
Rua Coronel Corte Real, 913/204
Petrópolis, Porto Alegre, RS, Brasil 90630-080
E-mail: cristoferbatistadacosta@gmail.com, claudia.cenci@imed.edu.br e clarissemosmann@gmail.com

Recebido: 18/09/2014
1ª revisão: 03/02/2015
2ª revisão: 04/04/2015
Aceite final: 15/04/2015

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