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Arquivos Brasileiros de Psicologia

versão On-line ISSN 1809-5267

Arq. bras. psicol. v.60 n.2 Rio de Janeiro jun. 2008

 

ARTIGO

 

Psicologia positiva em ambientes militares: bem-estar subjetivo entre cadetes do Exército Brasileiro

 

Positive psychology at a military environment: subjective well-being among Brazilian Army cadets

 

 

Francisco Heitor RosaI; Claudio Simon HutzII

IUniversidade Estadual de Londrina (UEL), Londrina, PR, Brasil
IIUniversidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Rio Grande do Sul, RS, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A psicologia positiva é uma corrente de pensamento psicológico que visa o estudo de características humanas que propiciem o seu desenvolvimento ótimo. O bem-estar subjetivo é uma destas características, associada à felicidade. A psicologia militar é um microcosmo da psicologia, definido pela atuação em ambientes militares. Ambientes militares são, freqüentemente, estressantes e perigosos. A adaptação de instrumentos aos ambientes militares é uma necessidade atual. Neste estudo, 373 cadetes da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN) e 73 acadêmicos universitários sem qualquer experiência militar responderam a questionários demográficos e à Escala de Satisfação de Vida. Os resultados não indicaram diferenças significativas entre as amostras civil e militar quanto à satisfação de vida. Contudo, filhos de militares mostraram-se mais satisfeitos com suas vidas do que aqueles que não eram filhos de militares. A consistência interna da escala mostrou-se elevada, tanto na amostra total (0,85) como na militar (0,86), indicando a utilidade do instrumento no ambiente militar.

Palavras-chave: Psicologia positiva; Psicologia militar; Bem-estar subjetivo.


ABSTRACT

Positive psychology is the scientific study of optimal human functioning. Subjective well-being is a psychological characteristic commonly associated with happiness. military psychology is a psychology’s microcosm, defined by activity at a military environment. Military environments are, frequently, dangerous and stressing. Thus, tests adapted to a military environment are necessary for several different purposes. In this survey, 373 military academy cadets and 73 college students answered a socio-demographic questionnaire and the Life-Satisfaction Scale. No significant differences were found between these groups. However, cadets whose fathers were in the military were more pleased with their lives than other cadets. The scale internal consistency was adequate for the total sample (0,85) and for the military sample (0,86), pointing to its usefulness at military environments.

Keywords: Positive Psychology; Military psychology; Subjective well-being.


 

 

O desenvolvimento de instrumentos psicológicos válidos e precisos é uma preocupação atual dos psicólogos brasileiros. Alguns ambientes especializados necessitam, com urgência, de instrumentos confiáveis para avaliação psicológica. Com o histórico recente de missões de paz atribuídas pela ONU ao Exército Brasileiro, aumentou a demanda desta instituição por instrumentos adaptados à realidade militar. Este estudo, entre outras contribuições, apresenta as características psicométricas da Escala de Satisfação de Vida (ESV) (HUTZ; GIACOMONI, 1998) quando aplicada a ambientes militares.

 

Psicologia Positiva

No final da década de 1990, Martin Seligman, então presidente da Associação Psicológica Americana (em inglês, American Psychological Association (APA)), produziu uma série de editoriais e artigos exortando a comunidade psicológica a atuar com maior foco nos aspectos positivos do desenvolvimento humano e suas potencialidades. Fenômenos como felicidade, otimismo, altruísmo, esperança, alegria, satisfação, entre outros, deveriam ser tratados com a mesma importância que a ansiedade, a depressão, a angústia ou a agressividade. A esta postura, que não nega os problemas humanos, mas concentra-se nos seus aspectos “virtuosos” e no desenvolvimento ótimo, deu-se o nome de psicologia positiva (LINLEY et al., 2006).

A força deste movimento, que, entre outras questões, estuda o bem-estar subjetivo, pode ser avaliada pela fundação, em 2006, do primeiro periódico especializado no tema, The Journal of Positive Psychology (primeira edição em janeiro de 2006). Linley et al. (2006) observam que a produção de artigos, números especiais e debates sobre o tema vem aumentando neste começo de século.

Yunes (2003) destaca o papel da resiliência no desenvolvimento saudável. Harris e Thoresen (2006), por sua vez, apontam o papel regulador da auto-eficácia e do perdão em ambientes de tratamento de saúde, como hospitais, clínicas e ambulatórios. Shogren et al. (2006) indicam a relação entre esperança e otimismo com a Escala de Satisfação de Vida (DIENER et al., 1985). A Escala de Satisfação de Vida avalia o bem-estar subjetivo dos respondentes, e foi adaptada para o Brasil por Hutz e Giacomoni (1998).

 

Bem-estar Subjetivo

A noção de bem-estar subjetivo aparece em diversos termos aplicados em pesquisa, tais como felicidade, satisfação, afeto positivo e estado de espírito. Pode-se dizer, de forma ampla, que seria como as pessoas avaliam suas vidas (DIENER, 1996). Mais precisamente, este construto diz respeito a como e por que as pessoas experienciam suas vidas positivamente.

Este construto, que só começou a ser tratado por cientistas sociais e do comportamento a partir da década de 1970, tem suas definições agrupadas em três categorias, de acordo com Diener (1984). A primeira é baseada em critérios externos, tais como santidade ou virtude, sendo chamada de definição normativa – porque define o que é desejável –, e a felicidade não é pensada como um estado subjetivo, mas antes como a posse de uma qualidade desejável.

A segunda categoria de definição de bem-estar, formulada por cientistas sociais, investiga os questionamentos sobre o que leva as pessoas a avaliar suas vidas em termos positivos. É chamada de satisfação de vida e utiliza os padrões dos respondentes para determinar o que é a vida feliz.

A terceira definição considera a preponderância do afeto positivo sobre o negativo, conforme propõe Bradburn (1969). Enfatiza a experiência emocional de satisfação ou prazer. Aponta o quanto a pessoa está experienciando emoções positivas ou negativas durante um período específico da vida, ou o quanto a pessoa está predisposta a essas emoções.

O bem-estar subjetivo é uma atitude e possui, pelo menos, dois componentes básicos: afeto e cognição (OSTROM, 1969). O componente afetivo envolve os componentes emocionais, enquanto o cognitivo se refere aos aspectos racionais e intelectuais. Esta distinção auxilia o entendimento e a medida do construto, além de permitir que se divida o componente afetivo em positivo e negativo. Assim, bem-estar subjetivo é a avaliação emocional e cognitiva que a própria pessoa faz sobre como sua vida está transcorrendo.

Diener e Lucas (2000) indicam que as pessoas avaliam as condições de vida de forma diferente, de acordo com suas expectativas, valores e experiências anteriores. Outra característica intrínseca aos estudos sobre bem-estar subjetivo é que também focalizam os estados de longo prazo e não somente os humores momentâneos. O interesse está nos humores das pessoas ao longo do tempo, ainda que esses humores estejam sujeitos a alterações à medida que novos eventos aconteçam (DIENER et al., 1997). Observam-se, assim, tanto as características individuais como as influências ambientais nas transformações do bem-estar subjetivo.

Diversos trabalhos estudaram as relações entre o ambiente militar e a qualidade de vida, ou, sob diferentes aspectos, o bem-estar subjetivo de militares. O’Donnell (2000) observou que, em longo prazo, ter prestado serviço militar não é por si só fator determinante de maior ou menor risco para a saúde mental em idade avançada. Griffith (2002) aponta que os soldados se sentem mais confortáveis quando experienciam uma liderança mais apoiadora e relações cooperativas entre os colegas de farda, tanto individualmente como em grupo, constroem uma boa identificação com a unidade em que servem – independentemente se desejam ou não continuar no exército – e percebem-se como mais preparados para o combate. Ser destacado para missões militares é um fator importante na percepção de qualidade de vida de militares. Ser “destacado” significa ser enviado para cumprir uma missão em local afastado de seu quartel de origem. McNulty (2005), após avaliar militares em períodos pré, durante e pós-destacamento para serviço no Iraque, constatou diversos fatores que contribuem para o aumento do estresse e redução do bem-estar dos militares: idade abaixo dos 25 anos, não ter filhos, não ter religião, ter até um único destacamento anterior, não ter educação superior e estar em acompanhamento psicológico. Além disso, militares nas condições estudadas apresentam alarmantes índices de ideação suicida (entre 2,4% e 4,9%). Adler et al. (2005) avaliaram o efeito de longos tempos de destacamento para missões e do primeiro destacamento para missões em homens e mulheres do exército norte-americano. Concluíram que tanto longos destacamentos como o primeiro destacamento afetam os níveis de estresse do pessoal envolvido. Contudo, apenas os homens são afetados por destacamentos mais prolongados. Schok e de Vries (2005) observaram que problemas de saúde afetam a qualidade de vida e a saúde geral relatada por veteranos holandeses, além de seu nível de independência, relações sociais, saúde psicológica e fatores ambientais. De maneira geral, estes decréscimos diminuem ainda mais a qualidade de vida dos participantes do estudo.

 

Psicologia Militar

A psicologia tem uma longa relação com as Forças Armadas de diferentes países, especialmente nos Estados Unidos. Historicamente, marcos importantes da avaliação psicológica estão ligados a questões militares. Os testes Army Alpha e Army Beta, além de uma série de outros estudos sobre medida de moral da tropa, avaliação de estabilidade emocional, performance humana, avaliação de habilidades, entre outros, são bons exemplos desta relação (APA, 2004; DRISKELL; OLMSTEAD, 1989). Psicólogos como Edwin G. Boring, James McKeen Cattell, G. Stanley Hall, Walter Dill Scott, Carl E. Seashore, Edward K. Strong, Lewis M. Terman, Edward L. Thorndike, John B. Watson, e Robert S. Woodworth contribuíram para estes desenvolvimentos.

A proposta de definição do campo da psicologia militar feita por Driskell e Olmstead (1989, p. 43) como sendo “definido não por um conjunto comum de técnicas (como é a psicologia experimental) nem por um conjunto de problemas (como é a psicologia do desenvolvimento), mas sim pela área de aplicação – a militar” é uma das mais correntemente aceitas. A psicologia militar é um microcosmo de todas as áreas de atuação psicológicas e, conseqüentemente, oferece oportunidade para psicólogos de todas as linhas, incluindo, mas não limitado a estes, psicólogos que desejam passar suas carreiras ou parte delas em um uniforme militar (APA, 2004; DRISKELL; OLMSTEAD, 1989).

É interessante observar que a psicologia militar, sob este ponto de vista, é uma oportunidade para fazer uma diferença significativa na vida de muitos indivíduos, na operação de grandes organizações e na estabilidade da nação. Algumas contribuições que podem ser feitas pelo psicólogo militar (APA, 2004) são trabalhar com saúde mental ou terapia familiar para melhorar a vida do pessoal em serviço e suas famílias, pesquisar para selecionar e indicar recrutas para possíveis trabalhos, analisar missões humanitárias e de paz para determinar procedimentos que podem salvar vidas militares e civis. Destes exemplos, destacamos o último, por já ter sido implementado no Brasil (SCHINCARIOL; VASCONCELLOS, 2002).

Embora o berço da psicologia militar possa ser identificado nos Estados Unidos, diversos países da Europa e da Ásia têm avançado no campo. Estudos recentes podem ser apontados na Suécia (LARSSON; HAYWARD, 2001; THUNHOLM, 2001; LARSSON et al., 2000), Alemanha (LENGWILER, 2003; MELTER et al., 2002; BRUNNER, 2000; MAYER; ROTTE, 1999), Reino Unido (WESSELY, 2003; Bourke, 2001; McCORMACK; MELLOR, 2002; LEACH, 2002; OORDT, 2001; LEGGATT; NOYES, 2000; BRIDGER, 2000), França (DORNA, 1998), Israel (DEKEL et al., 2003; BAR-JOSEPH; KRUGLANSKI, 2003; DVIR et al., 2002; SHULMAN et al., 2000; SHAMIR et al., 2000b; SHAMIR et al., 2000a; VERTZBERGER, 1998), Dinamarca (HANSEN-SCHWARTZ et al., 2002), Japão (SHIGEMURA; NOMURA, 2002; KODAMA et al., 2000), Noruega (LARSEN, 2001; SANDAL et al., 1999; SANDAL et al., 1998) e Turquia (SUEMER et al., 2001). Os temas abordados vão desde a performance em situações reais de operação até acompanhamento clínico pós-combate, passando ainda por questões históricas da psicologia militar da região. Os trabalhos realizados na Europa e na Ásia assemelham-se em conteúdo aos realizados nos Estados Unidos. De fato, podemos agrupá-los nas mesmas classificações gerais dos trabalhos norte-americanos: seleção e classificação, treinamento, ergonomia, estressores ambientais, liderança e efetividade de equipe, comportamento individual e de grupo, clínica psicológica, entrevistas e pesquisa, e situações e sujeitos especiais (APA, 2004).

A exposição a situações de risco tem motivado o desenvolvimento de diversos estudos, especialmente para grupos que atuaram ou atuarão em missões de paz. Kodama et al. (2000) estudaram o efeito do processo seletivo e de treinamento em candidatos japoneses ao serviço em missões de paz. Os dispensados apresentavam mais sintomas de ansiedade e estresse; contudo, os designados para a missão também apresentavam sintomas de estresse, mas mais prevalentemente sintomas somáticos. Shigemura e Nomura (2002) apontam para a necessidade de maiores desenvolvimentos na área, uma vez que, até o fim da Guerra Fria (período de relações beligerantes não declarado entre Estados Unidos e a extinta União Soviética), pouca importância se deu às missões de paz e seus efeitos sobre a saúde dos militares envolvidos. Os autores observam que soldados que participaram de missões de paz enfrentaram um grande número de eventos estressores e desenvolveram problemas físicos e psíquicos. Apontam, também, que não existe consenso sobre as formas de intervenção para estes casos. Schincariol e Vasconcellos (2002) trabalharam no suporte aos parentes de militares brasileiros deslocados em missão de paz. Naquele momento, ainda não havia suporte sistematizado às forças de paz brasileiras, que veio a ser implantado posteriormente e ainda está em processo de avaliação. Percebemos este suporte como necessário, uma vez que Hansen-Schwartz et al. (2002) observam que a incidência de suicídios entre militares dinamarqueses após participação em missões de paz é superior ao padrão nacional, em um período de apenas um ano após o desligamento do serviço.

A psicologia militar ainda é insipiente na América Latina. Revisando os últimos dez anos de publicações indexadas no PsychINFO <http://www.apa.org/psycinfo/> não foi possível localizar publicações de autores latino-americanos. Isto não significa que não existam pesquisas feitas na área de psicologia militar, mas que estes trabalhos não estão publicados em periódicos indexados. Mais provavelmente, estão publicados em periódicos especializados do meio militar. Mesmo no Brasil, onde se tem notícia do único centro de referência em estudos psicológicos aplicados às Forças Armadas (Centro de Estudos de Pessoal (CEP), Exército Brasileiro) da América Latina, as publicações pertinentes ao campo da psicologia militar estão apresentadas em periódicos de outras áreas.

Estudos em psicologia militar surgiram no Brasil há muito tempo. Emilio Mira y López escreveu, entre outros, Psicologia militar (MIRA Y LÓPEZ, 1949), definindo as práticas psicológicas de seleção e treinamento militar adotadas pelo Exército Brasileiro da época. Convém destacar que Mira y López promoveu a popularização da psicologia, principalmente da psicometria, por meio de suas atividades no Instituto de Seleção e Orientação Profissional (ISOP) na Fundação Getulio Vargas. Sua atuação introduziu a psicologia aplicada nas escolas, empresas e no próprio imaginário nacional (RUSSO, 2002). Mira y López atuou durante muito tempo como assessor do Exército, implementando diversos processos de seleção para a atividade militar. Destaca-se, particularmente, a seleção de pilotos para a Aviação do Exército (que viria a ser a origem da Força Aérea Brasileira) com o uso do PMK (Psicodiagnóstico Miocinético), em uso até os dias atuais.

Alguns estudos atuais na área já são conhecidos (como o de Schincariol e Vasconcellos (2002), tratando sobre preparação de militares para missões de paz e apoio psicossocial aos seus familiares), e existe uma insistente tentativa em sistematizar a área de conhecimento da psicologia militar como legítima área de atuação do psicólogo. Zorzo (2004) desenvolveu estudos sobre aspectos ergonômicos e qualidade de vida em organizações militares. Rosa (2003; 2002) tratou do tema “psicologia militar” em congressos nacionais e latino-americanos.

Este trabalho teve como objetivo avaliar a adequação da Escala de Satisfação de Vida, conforme adaptada por Hutz e Giacomoni (1998), para o ambiente militar. Além disto, pretendeu descrever os níveis de bem-estar subjetivo de cadetes da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), onde são formados os oficiais do Exército Brasileiro, comparando os resultados com os de estudantes universitários, permitindo uma percepção mais apurada dos efeitos ambientais no julgamento de bem-estar subjetivo dos participantes militares.

 

Método

Participantes

Participaram deste estudo 373 cadetes da AMAN e 73 alunos universitários que não prestaram serviço militar, não possuem parentes militares nem estudaram em colégios militares. Os cadetes foram divididos em quatro grupos, com cerca de cem participantes em cada grupo, conforme seu ano de ingresso, obtendo assim amostras do 1º (n = 98), 2º (n = 93), 3º (n = 108) e 4º (n = 74) anos da AMAN. O mesmo procedimento foi adotado com os estudantes universitários (n = 73), dando preferência por alunos do mesmo curso, quando isto era possível. Foram colhidas amostras em dois cursos universitários distintos, engenharia civil e agronomia, de diferentes períodos (semestres) e instituições. Foram excluídos os alunos universitários que tinham parentes próximos que fossem militares e com os quais eles indicassem contato freqüente, os que prestaram serviço militar inicial (serviço militar obrigatório) ou que houvessem estudado em escolas militares. Às estudantes universitárias presentes na aplicação que quiseram participar, foi permitido preencher os instrumentos, mas seus dados não foram considerados para as análises deste estudo. Os participantes de ambientes militares estavam inseridos neste ambiente há, pelo menos, seis meses. Configurou-se, assim, um estudo transeccional, em que pudemos comparar diferenças entre os grupos, militar ou não militar.

Todos os procedimentos éticos relativos à pesquisa com seres humanos, conforme determinado pelo Conselho Nacional de Saúde e Conselho Federal de Psicologia, foram seguidos. O termo de consentimento livre e esclarecido foi obtido dos participantes, ressaltando sua liberdade para participar ou não da pesquisa, sem qualquer ônus. Aos militares, foi dada atenção especial no tocante aos aspectos éticos, visto que o fato de ser militar pode influir na sua opção de participar ou não. Não houve a presença de autoridades militares no momento da aplicação.

 

Descrição das amostras

A amostra militar, composta por cadetes da AMAN, apresentou idade média de 21 anos (dp = 1,7, mínimo = 17 (1%) e máximo = 30 anos (0,3%)). Cerca de 98,5% desta amostra tem idade oscilando entre 18 e 24 anos. Da amostra de 373 participantes, 45% ainda não escolheram a arma (especialidade) de formação. Quanto à profissão do pai, 36,1% são militares, enquanto cerca de 12% são profissionais liberais e 10% são funcionários públicos de nível superior. Já as mães são mais freqüentemente profissionais liberais (12,8%), servidoras públicas de nível superior (19,3%) ou possuem outras ocupações, como dona de casa (22,3%). Entre os militares estudados, 44,5% declaram não terem morado em outro estado além dos seus próprios estados de origem, 25% já morou em outro estado e 27,7% já morou em mais de dois estados diferentes do seu próprio estado de nascimento. Observa-se, ainda, que 39,1% dos militares não possuem qualquer grau de parentesco com outros militares, enquanto 41,3% declaram ter dois ou mais parentes militares. Outro dado é que 47,5% dos participantes militares estudaram em colégios militares. A opção pela carreira militar deu-se principalmente por vocação (53,9%) e pela estabilidade que o serviço proporciona (14,8%). Considerando a alta freqüência de filhos de militares na amostra, optamos por montar três subamostras considerando a existência de parentesco direto ou indireto com militares como um possível fator interveniente.

Quando descrevemos apenas os cadetes filhos de militares (N = 133), a idade média é de 20,7 (dp = 1,8), e observamos que as suas mães mais freqüentemente possuem ocupações diversas (33%), não possuem qualquer ocupação profissional (25%) ou são servidoras públicas de nível superior (14%). Estes participantes já moraram em dois ou mais estados (57,7%), e 75% deles estudou em colégios militares. É comum entre eles ter outro parente militar além do pai (50%), e apontar a escolha profissional como vocacionada (66,2%).

Cadetes que não são filhos de militares, mas possuem algum parente militar (N = 96), têm idade média de 21,1 anos (dp = 1,4), e pais que trabalham no serviço público de nível superior (12,5%) ou médio (19,8%), como empregados da iniciativa privada (19,8%), comerciantes (11,5%) ou prestadores de serviços (10,4%). Suas mães são servidoras públicas de nível superior (22,9%) ou médio (14,6%), profissionais liberais (12,5%) ou têm outras ocupações (14,6%). Cerca de 15,6% delas não tem qualquer ocupação. Mais da metade (52,1%) nunca morou em outro estado antes, e cerca de um terço (33%) residiu em apenas um estado diferente. Cerca de um terço (31,2%) estudou em colégios militares antes de ingressar na AMAN.

Os cadetes que não têm qualquer parente militar (N = 138) apresentam idade média de 21,1 anos (dp = 1,7) e pais atuando principalmente como profissionais liberais (23,1%), servidor público de nível superior (14,5%), servidor público de nível médio, prestador de serviços ou empregado da iniciativa privada (cerca de 10% em cada profissão). As mães destes cadetes são, geralmente, servidoras públicas de nível superior (21,7%), profissionais liberais (18,1%) ou possuem outras ocupações (17,4%). A maioria destes cadetes não morou em outros estados além do seu estado de nascimento (66,7%), enquanto 22,4% morou em um estado diferente e 10,9% morou em dois ou mais estados diferentes. A maioria deles também não estudou em colégios militares (59,4%), embora cerca de 38% tenha estudado em colégio militar ou prestado serviço militar.

A amostra universitária teve média de idade de 20,2 anos (dp = 3,4, mínimo = 17 (6%) e máximo = 36 anos (1,4%)). Cerca de 81% da amostra universitária tinha idade oscilando entre 18 e 24 anos. Dos 73 casos avaliados, verificou-se que 90% nasceu no próprio estado e todos não possuem algum parente militar. Os participantes foram encontrados em uma universidade pública (com unidades nos municípios de Cascavel e Toledo) e uma faculdade privada (município de Cascavel) do oeste paranaense. Os cursos escolhidos pelos participantes universitários eram engenharia civil ou agronomia. A escolha destes cursos se deu em função de serem cursos tipicamente freqüentados por pessoas do sexo masculino. Cerca de 70% nunca morou em outro estado, enquanto 21,7% já morou em um único estado diferente. Os pais são, em geral, produtores rurais (50%) ou profissionais liberais (11%). As mães são produtoras rurais (30%), profissionais liberais (21%) ou possuem outras ocupações, como dona de casa (21,4%).

Deve-se levar em conta, para avaliação do número de participantes na amostra universitária (73), que diversos casos foram excluídos da análise por declararem ter parentes próximos e com os quais mantêm contato freqüente que são militares, por terem prestado serviço militar inicial ou terem estudado anteriormente em colégios militares. Participantes do sexo feminino também foram excluídos. Estes critérios fizeram com que, dos cerca de trezentos universitários que responderam corretamente ao questionário e à Escala de Satisfação de Vida, aproximadamente 240 fossem eliminados das análises deste estudo. Atribui-se esta inesperada proximidade com militares e ambiente militar ao fato de Cascavel sediar um Comando de Brigada do Exército Brasileiro e um Comando Regional de Polícia Militar. Ao todo, constatou-se a existência de cinco unidades militares apenas no município de Cascavel.

 

Instrumentos
Questionário de Dados Demográficos

Com a finalidade de identificar dados demográficos e evitar que sujeitos que tiveram qualquer contato com o ambiente militar em seu desenvolvimento continuado participassem da amostra, foram criados questionários de dados demográficos para as diferentes amostras.

 

Escala de Satisfação de Vida

Originalmente criada por Diener et al. (1985), encontra-se adaptada por Hutz e Giacomoni (1998) para a população brasileira. Trata-se de uma escala com afirmações em ordem direta sobre sentimentos em relação à satisfação de vida do indivíduo, com respostas ancoradas em uma escala tipo Likert de sete pontos. A escala utilizada neste trabalho tem sido utilizada em estudos brasileiros, como o de Antoniazzi (2000).

Os itens da ESV são:

1 - A minha vida está próxima do meu ideal (a minha vida está próxima daquilo que eu gostaria que ela fosse).

2 - Minhas condições de vida são excelentes (o jeito que eu vivo é excelente).

3 - Estou satisfeito com a minha vida.

4 - Até agora eu tenho conseguido as coisas importantes que eu quero na vida.

5 - Se eu pudesse viver a minha vida de novo, eu não mudaria quase nada.

 

Procedimentos

Os participantes foram convidados a participar da pesquisa em seus locais de estudo, especificamente nos estados do Paraná (Cascavel e Toledo) e Rio de Janeiro. O critério de escolha das localidades foi a conveniência de acesso para a aplicação, exceto no caso da AMAN, cuja localização é no município de Resende (RJ).

Foram executados todos os procedimentos anteriores à aplicação dos testes e inventários, no que diz respeito ao consentimento livre e esclarecido, autorização de pais (no caso de participantes menores de idade, foram autorizados a preencher os formulários na sessão conjunta, desde que trouxessem a autorização assinada pelos pais no dia seguinte, condição sem a qual não incluiríamos os dados na pesquisa e que foi atendida por oito participantes) e procedimentos éticos. Nestes aspectos, foram seguidas as orientações do Conselho Nacional de Saúde (CNS) presentes na Resolução CNS 196/96 (Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos) e do Conselho Federal de Psicologia (CFP) presentes na Resolução CFP 016/2000.

O procedimento de aplicação com os participantes que estavam inseridos em ambientes militares foi diferenciado, visando cumprir as instruções do CNS. Assim, o aplicador ficou a sós com os participantes, sem a presença de figuras de autoridade na sala de aplicação, e ressaltou o direito de não participar do processo. Aos que desejaram não participar, foi orientado que permanecessem sentados e aguardassem a conclusão do processo pelos presentes, evitando assim qualquer tipo de identificação ou possibilidade de coação para a participação na pesquisa. Os militares menores de idade solicitaram a autorização, conforme descrito anteriormente, ao seu responsável (todo cadete menor de idade tem um militar responsável por ele, na própria AMAN, na ausência dos pais).

Os instrumentos foram aplicados em uma bateria única, coletivamente, pelo próprio autor e/ou por aplicadores previamente treinados, nos ambientes originais de cada amostra, após rapport adequado sobre a pesquisa e suas aplicações práticas. As respostas foram marcadas diretamente no formulário de leitura ótica, eliminando a possibilidade de erros de digitação e restringindo a ação do autor à correção de respostas duplicadas. Nestes casos, foi orientado aos participantes que marcassem a resposta errada, permitindo a correção do dado inconsistente.

Na aplicação em ambientes universitários, quando foi o caso de encontrarmos presenças femininas nas salas de aula, não foi feita recomendação especial para que as participantes mulheres não respondessem aos questionários. Todos os acadêmicos responderam ao questionário e à Escala de Satisfação de Vida. Contudo, universitários com parentes militares, com os quais mantivessem contato, ou do sexo feminino, tiveram seus dados descartados das análises. Os dados obtidos foram tabulados e mantidos em um banco de dados separado, para que as devoluções pertinentes pudessem ser feitas quando requisitadas. Desta forma, apenas 73 universitários, todos do sexo masculino e sem qualquer vínculo com o ambiente militar, fizeram parte da amostra comparativa.

 

RESULTADOS

Características Psicométricas do Instrumento

Foram realizadas análises de consistência interna no instrumento utilizado para a coleta de dados. A Escala de Satisfação de Vida apresentou um Alfa de Cronbach de 0,85 (N = 446, m = 24,3, dp = 6,2). Estudos de validação (GIACOMONI, 2002) da Escala de Satisfação de Vida apresentam Alfa semelhante para a escala de sete itens (0,83). Estudos internacionais (SHOGREN et al., 2006) encontraram valores semelhantes (0,86) para a escala de cinco itens. Para efeito de comparação, foi feita a mesma análise, porém somente com a amostra militar. O resultado foi semelhante, obtendo-se um Alfa de Cronbach de 0,86 (N = 373, m = 24,1, dp = 6,34).

 

Características das Amostras Estudadas

A Escala de Satisfação de Vida (HUTZ; GIACOMONI, 1998), utilizada como indicador de bem-estar subjetivo, não apontou diferença entre os militares e os universitários avaliados (ver Tabela 1). O Teste t comparando as médias dos dois grupos (respectivamente, 24,1 e 25,0) não apontou diferença significativa entre as médias (t = -1,04, gl = 443, p < 0,29). Observando-se os itens da Escala de Satisfação de Vida, verificou-se diferença significativa apenas no item 2 (Minhas condições de vida são excelentes), no qual militares e civis obtiveram, respectivamente, média 4,4 e 5,0 (t = -2,87, gl = 443, p < 0,01).

Tabela 1: Teste t Realizado entre as Médias das Amostras Militar e Civil, por Item e Total

        Amostra militar              Amostra Civil                     t       gl         p <
                     Média                           Média
Item 1                4,67                            5,0                 -1,69    443      0,09
Item 2                4,4                              5,0                 -2,87    443      0,01
Item 3                5,1                              5,4                 -1,56    443      0,12
Item 4                5,9                              5,2                 1,50     443      0,13
Item 5                4,5                              4,3                 0,48     443      0,63
Total                24,1                            25,0                 -1,05    443      0,29


Contudo, na amostra militar foi possível perceber diferenças entre os subgrupos, sendo que os filhos de militares obtiveram média (25,1) significativamente mais alta que cadetes com parentes militares (m = 23,3, t = 2,08, gl = 208, p < 0,04) e sem parentes militares (m = 23,5, t = 1,98, gl = 239, p < 0,05). A Tabela 2 apresenta esta comparação. Quando comparados, considerando-se apenas se o pai é militar ou não, a diferença persiste, pois os militares sem pai militar apresentam média de 23,6 (t = 2,28, gl = 366, p < 0,03). Nesta análise, os itens 1, 2 e 3 foram fontes de variação significativa entre as amostras (ver Tabela 3).

Tabela 2: Teste t Realizado entre as Médias de Cadetes Filhos de Pais Militares e Cadetes com Parentes Militares

 

Ser filho de militar

Ter parentes
militares

t

gl

p

Item 1

4,9

4,5

1,81

208

0,07

Item 2

4,6

4,2

2,16

208

0,03

Item 3

5,3

4,9

2,03

208

0,04

Item 4

5,5

5,4

0,32

208

0,75

Item 5

4,6

4,1

1,83

208

0,07

Total

25,1

23,3

2,08

208

0,04

 

Tabela 3: Teste t Realizado entre as Médias de Cadetes Filhos de Pais Militares e Cadetes não-Filhos de Pais Militares

 

Filho de pai militar

Não-filho de pai militar

t

gl

p

Item 1

4,9

4,5

2,07

366

0,04

Item 2

4,6

4,2

2,37

366

0,02

Item 3

5,4

5,0

2,16

366

0,03

Item 4

5,5

5,4

0,70

366

0,48

Item 5

4,7

4,4

1,77

366

0,08

Total

25,2

23,6

2,28

366

0,02

Considerando-se esta última diferença, testamos também a diferença entre o grupo de cadetes filhos de militares e o conjunto total de participantes que não possuem parentes militares. O resultado foi que o grupo que não tem pai militar apresentou média significativamente inferior (m = 23,9, t = 1,97, gl = 437, p < 0,05) que os cadetes filhos de pais militares. Comparados apenas com os universitários (m = 25,0), não foi constatada diferença significativa entre os grupos (t = 0,20, gl = 204, p < 0,85). A comparação pode ser observada na Tabela 4.

 

Tabela 4: Teste t Realizado entre as Médias de Cadetes Filhos de Pais Militares e Cadetes sem Parentes Militares

 

Filho de pai militar

Sem parente
militar

t

gl

p

Item 1

4,9

4,5

2,22

239

0,03

Item 2

4,7

4,2

2,13

239

0,03

Item 3

5,4

5,0

1,92

239

0,06

Item 4

5,5

5,4

0,64

239

0,52

Item 5

4,7

4,4

1,07

239

0,29

Total

25,1

23,5

1,98

239

0,05

Ter tido uma experiência militar (como freqüentar um colégio militar ou ter prestado serviço militar) anterior ao estudo não influenciou no bem-estar subjetivo das amostras estudadas, observando-se militares e civis (m1 = 24,7, m2 = 24,1, t = 1,02, gl = 434, p < 0,32) e somente a amostra militar (m1 – com experiência anterior = 24,7, m2 – sem experiência anterior = 23,6, t = 1,60, gl = 361, p < 0,12). Contudo, o item 2 mostrou-se novamente fonte de diferença entre os subgrupos militares, indicado média superior no grupo com experiência militar anterior (m1 = 4,56, m2 = 4,20, t = 2,20, gl = 361, p < 0,03).

Ter estudado ou não em colégio militar parece não ter influenciado no bem-estar subjetivo, quando comparamos o conjunto total de dados (respectivamente, m1 = 24,6, m2 = 24,1, t = 0,85, gl = 434, p < 0,40). Mesmo considerando somente a amostra militar, não são observadas diferenças (m1 = 24,6, m2 = 23,8, t = 1,28, gl = 361, p < 0,21).

 

Outras Análises

Ter estudado em colégio militar influenciou na escolha da profissão. Uma análise de correspondência mostrou relação (χ2 = 21,7, gl = 9, p < 0,01) entre ter estudado ou não em colégio militar e ter escolhido a profissão militar por vocação (65% contra 44%, respectivamente) ou pela estabilidade (19,1% contra 10,7%, respectivamente).

Outra análise de correspondência indicou que ser filho de militar indica que sua escolha mais freqüentemente é vocacionada do que naqueles cadetes que não possuem algum parente militar (χ2 = 30,9, gl = 9, p < 0,01). Não há diferença significativa entre os cadetes filhos de militares e os cadetes com parentes militares (χ2 = 13,7, gl = 9, p < 0,14).

 

DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se observar, pelos resultados encontrados, que o instrumento utilizado para avaliar bem-estar subjetivo em populações militares é útil e estável. Os valores de Alfa (0,85 e 0,86) encontrados são bons indicadores da consistência interna da escala e do poder de cada item. A simplicidade do instrumento, constituído de apenas cinco itens, não prejudica sua característica psicométrica. Na prática, quando comparada com a escala de sete itens (GIACOMONI, 2002), demonstra ter, no mínimo, a mesma fidedignidade. Os estudos de validação original (DIENER et al., 1985) apresentam valores semelhantes (0,86).

As diferenças encontradas, especialmente as relativas ao item 2 e ao fato de ser ou não filho de militar, merecem uma reflexão cuidadosa. Primeiramente, convém observar que filhos de militares mais freqüentemente ingressam em colégios militares (embora ter ingressado em um colégio militar ou ter prestado serviço militar, isoladamente, não tenha afetado o bem-estar subjetivo dos participantes). Segundo, estes costumam ter outros parentes militares. Por fim, destacadamente, mais freqüentemente se deslocam de residência, tendo morado em dois ou mais estados da União. Molina (2006) observou que cadetes filhos de militares tendem a descrever a experiência de ter um pai militar como fonte de conhecimento e identificação com a carreira militar. Observamos, neste estudo, a mesma tendência, uma vez que os filhos de militares (64,7%) indicam mais freqüentemente que sua escolha pela carreira foi vocacionada, comparados com cadetes que possuem (55,2%) ou não (48,6%) parentes militares. A AMAN funciona como um quartel, onde os cadetes moram e estudam. Este conjunto de variáveis, possivelmente, está ligado à forma como os cadetes percebem o modo como vivem (suas condições de vida).

Na verdade, a diferença nos níveis de satisfação de vida entre os cadetes não deve influir em seus desempenhos, se considerarmos que a realidade argentina é compatível com a nossa. Solano e Casullo (2002) observaram que o bem-estar subjetivo não é preditor de desempenho acadêmico entre os cadetes argentinos.

A ausência de diferenças significativas entre cadetes e universitários é um bom indicativo das condições de vida dos cadetes. Conforme observamos em diversos estudos (ADLER et al., 2005; GRIFFITH, 2002; McNULTY, 2005; O’DONNELL, 2000; SCHOK; DE VRIES, 2005), o ambiente militar é capaz de influenciar, para pior, o bem-estar das pessoas expostas a ele. Contudo, a realidade dos cadetes ainda não é igual à realidade dos militares aquartelados e prontos para o combate – ou operações de paz, o que está mais próximo da nossa realidade atual. A participação nestas operações está associada a altos índices de suicídio (HANSEN-SCHWARTZ et al., 2002), e a avaliação de bem-estar subjetivo por meio de um instrumento rápido e confiável pode demonstrar-se recurso inestimável na prevenção e intervenção clínica.

O estudo suscita a necessidade de desenvolvermos mais pesquisas na área. Particularmente, a criação de tabelas específicas para populações militares parece ser uma necessidade urgente, especialmente para seleção, acompanhamento e avaliação de saúde de tropas destacadas para missões de paz. O desenvolvimento de linhas de pesquisa similares às internacionais também produzirá efeitos positivos na vida de nossos militares. Todavia, fica claro que o uso da Escala de Satisfação de Vida é apropriado para ambientes militares e pode servir de indicador de qualidade de vida para os militares, estejam eles aquartelados ou aguardando destacamento para missões.

 

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Endereço para correspondência

Francisco Heitor Rosa
E-mail:rosafh@ig.com.br

Claudio Simon Hutz
E-mail:claudio_hutz@terra.com.br

 

 

Recebido em: 25/09/2007
Aprovado em: 25/08/2008
Revisado em: 22/09/2008

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