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Revista Psicologia Organizações e Trabalho
versão On-line ISSN 1984-6657
Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.16 no.2 Brasília jun. 2016
https://doi.org/10.17652/rpot/2016.2.editorial
EDITORIAL
Pedro F. BendassolliI; Ana Carolina de Aguiar RodriguesII; Maria do Carmo Fernandes MartinsIII; Mary Sandra CarlottoIV
IEditor-Chefe - Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
IIEditora Associada - Universidade de São Paulo (FEA-USP)
IIIEditora Associada - Universidade Metodista de São Paulo (UMESP)
IVEditora Associada - Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS)
Este número de nossa revista é dedicado à análise das transformações no mundo do trabalho, em particular à reforma proposta em 2015 pelo Congresso Nacional, concernente às regras sobre terceirização no trabalho.
O fenômeno da terceirização ganha seu impulso nos anos de 1990. Naquela ocasião, uma nova filosofia de gestão trouxe às organizações o imperativo de centrar seus esforços em competências centrais, transferindo todas as atividades e serviços que não dissessem respeito diretamente à sua missão para agentes externos. Para muitos críticos, tal processo implica, na prática, em precarização das relações de trabalho.
Precarização, pois as empresas não se ocupariam mais de assegurar antigos postos de trabalho, voltando-se à manutenção de apenas um seleto grupo profissional cujas habilidades e desempenho contribuíssem para o alcance de sua missão estratégia. Assim, orbitando ao redor das organizações haveria uma miríade de "prestadores de serviços", cujos vínculos, frágeis e incertos, dependeriam do sucesso global do empreendimento - sujeito a intempéries do mercado e das demais forças que agem sobre a ecologia organizacional.
Tal configuração trabalhista, em contexto nacional, implicava em choque frontal em relação ao modelo de trabalho formal, estável e contínuo, instituído pelas leis trabalhistas. Qualquer formato alternativo a esse arranjo configuraria perda de direitos adquiridos e porta aberta à fragilização dos vínculos trabalhistas.
Ao longo das últimas décadas, diversas lutas sociais tentaram manter, sob fino equilíbrio, o interesse das organizações e dos trabalhadores. O movimento que, aparentemente, ajudou a desequilibrar esse conjunto de forças foi dado pelo Congresso Nacional, em abril do ano passado, com o avanço do antigo projeto de Lei 4330/04, que, entre outras coisas, permite a terceirização das atividades-fim da organização.
Imerso em polêmicas, tal projeto reabriu o debate sobre o mito da onerosa carga tributária e da rígida legislação trabalhista existente no Brasil, fruto de intensas e históricas conquistas dos trabalhadores, e inscrita por Getúlio Vargas no que conhecemos como a "CLT" (Consolidação das Leis Trabalhistas). Em cena, se reatualiza o fantasma da erosão das relações trabalhistas baseadas em direitos estáveis dos trabalhadores.
Em resposta às mutações promovidas por essa discussão das leis trabalhistas no Brasil, a rPOT lança este número inteiramente dedicado à questão. Em seu centro, a pergunta: o que a psicologia tem a dizer sobre esse estado de coisas? Como se sabe, a POT tem, há décadas, se voltado à discussão das mutações e metamorfoses do mundo do trabalho. Na atualidade, e dada as características emblemáticas da realidade social brasileira, o tema emerge com força ainda maior. Quais as consequências, para os trabalhadores, de uma nova investida contra as garantias trabalhistas mínimas? O que podemos esperar em termos de vínculos do Indivíduo com o trabalho e as organizações? Seria possível antever possíveis consequências psicossociais danosas às pessoas? E o que fazer diante desse cenário?
Em linhas gerais, é isto que o leitor encontrará neste número. Esperamos que os artigos aqui divulgados contribuam para o desenvolvimento de uma massa crítica capaz de fomentar o debate crítico a respeito dos rumos e dos destinos das formas de trabalho no Brasil contemporâneo, em particular em uma sociedade emblemática como a nossa, na qual direitos são amiúde confundidos como "custos", e, portanto, como alvo de racionalizações por vezes questionáveis.