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Revista Brasileira de Psicanálise

versão impressa ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.55 no.1 São Paulo jan./mar. 2021

 

REFLEXÕES TEÓRICO-CLÍNICAS

 

Estudo controverso permitiu a Freud pensar a psicanálise com Da Vinci: psicanálise aplicada, psicanálise implicada1

 

Controversial study allowed Freud to think about Psychoanalysis with Da Vinci: applied psychoanalysis, implied psychoanalysis

 

Un estudio polémico permitió a Freud elaborar el psicoanálisis con Da Vinci: psicoanálisis aplicado, psicoanálisis implicado

 

Une étude controversée a permis à Freud d'élaborer la psychanalyse avec Da Vinci : psychanalyse appliquée, psychanalyse impliquée

 

 

João A. Frayze-Pereira

Membro efetivo, docente e analista didata da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP). Professor livre-docente do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP) e do Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte (USP). São Paulo / joaofrayze@yahoo.com.br

 

 


RESUMO

No ensaio "Leonardo da Vinci e uma lembrança da sua infância", Freud abriu um campo de implicações entre psicanálise, arte e estética da recepção, evidenciando uma maneira de trabalhar e pensar que permite interrogar o método psicanalítico nos estudos dedicados à arte, assim como na clínica.

Palavras-chave: estética, arte, clínica, psicanálise aplicada, psicanálise implicada


ABSTRACT

In the essay on "Leonardo da Vinci and a memory of his childhood", Freud opened a field of implications between psychoanalysis, art and aesthetics of reception, showing a way of working and thinking that allows for question on the psychoanalytical method in studies dedicated to art, as well as in the clinic.

Keywords: Aesthetics, Art, Clinic, Applied Psychoanalysis, Implied Psychoanalysis


RESUMEN

En el ensayo "Un recuerdo infantil de Leonardo da Vinci", Freud abrió un campo de implicaciones entre el psicoanálisis, el arte y la estética de la recepción, mostrando una forma de trabajar y pensar que permite cuestionar el método psicoanalítico en los estudios dedicados al arte, así como en la clínica.

Palabras clave: estética, arte, clínica, psicoanálisis aplicado, psicoanálisis implicado


RÉSUMÉ

Dans l'essai sur « Un souvenir d>enfance de Léonard de Vinci » (1910), Freud a ouvert une voie d'implications entre la psychanalyse, l'art et l'esthétique de la réception, démontrant une manière de travailler et de penser qui permet d'interroger la méthode psychanalytique dans les études consacrées à l'art, bien que dans la clinique.

Mots-clés: esthétique, art, clinique, psychanalyse appliquée, psychanalyse impliquée


 

 

"Leonardo da Vinci e uma lembrança da sua infância" é um estudo controverso. Escrito e publicado por Freud em 1910, foi duramente criticado por historiadores da arte, filósofos e, também, psicanalistas. Apesar disso, 10 anos após a edição, Freud escreve a Ferenczi: "Foi a única coisa bela que escrevi" (citado por Pontalis, 1987, p. 9). Freud podia estar ciente das qualidades de seu estudo, entretanto não chegou a ver o reconhecimento desse belo trabalho, posteriormente integrado ao conjunto de obras clássicas da literatura alemã. Dada a controvérsia, fica a pergunta: quais seriam os motivos dessa contundente recepção crítica?

 

Considerações preliminares

Quando uma obra de arte é tema de um comentário psicanalítico, seja qual for a teoria em que se baseia o comentador, em geral o resultado é um trabalho que interpreta aspectos da obra que, frequentemente, são associados a episódios da vida do artista, ilustrando os conceitos teóricos subjacentes à interpretação. Tal maneira de trabalhar, como se sabe, denomina-se psicanálise aplicada à arte. Mas o que nem sempre é sabido é que ela retoma uma temática antiga na história da arte, conhecida como a questão da biografia artística, considerada pela primeira vez no século xvi, quando Vasari escreveu Le vite de'più eccellentipittori, scultori e architettori (1550/2018), obra extensa, que chegou a ser publicada em 10 volumes. Essa obra se tornou célebre por apresentar, pela primeira vez, a biografia de diversos artistas, mas também por propor uma problemática estética: é a vida do artista que determina o nascimento da obra de arte?

É importante destacar, conforme explicitado em livros de história da arte, que a criatividade dos artistas, na época em que viveu Leonardo, era relacionada a um dom divino, e não à sua vida ou subjetividade, concepção que só surgiria no final do século xviii, mantendo-se ao longo do século xix, com o romantismo, poética que propõe a arte como atividade expressiva (Argan & Fagiollo, 1994). Com efeito, em pleno Renascimento, Giorgio Vasari, cuja obra é considerada um marco inaugural na história da arte, esclarece que a arte deve ser concebida como atividade intelectual, e não como atividade executiva. Esta poderia ser realizada por um aprendiz, e não necessariamente pelo artista que assinava a obra como o autor genial que a concebeu, graças à intervenção divina.

Ernst Kris e Otto Kurz (1987) aprofundam esse tema. No ensaio sobre o mito do artista, cuja origem se encontra na tendência especificamente romântica de atribuir o talento artístico a certas experiências ocorridas na infância do artista, que o predestinam à arte, verifica-se que é comum encontrar nas biografias artísticas referências ao talento precoce, semelhante ao encontrado nos mitos dos heróis. E é essa forma mítica que aparentemente subjaz ao ensaio de Freud "Leonardo da Vinci e uma lembrança da sua infância" (1910/1970a). Digo aparentemente porque o autor, com algumas de suas interpretações, apresenta o "divino Leonardo" como um homem sujeito às paixões comuns, ou melhor, como se fosse um artista do século xix. De qualquer maneira, ainda hoje, quando o estudioso considera a vida de algum artista com o objetivo de relacioná-la à sua respectiva obra, ele enfrenta uma tarefa bastante difícil, pois não é fácil biografar artistas. Um exemplo paradigmático, nesse sentido, é Max Ernst, autor cuja vida real é tecida com elementos maravilhosos, referidos a uma origem extraordinária. Por exemplo, entre seus inúmeros escritos, Max

Ernst deixou um relato autobiográfico, com um registro de suas lembranças de infância, que começa assim:

Max Ernst teve seu primeiro contato com o mundo sensível no dia 2 de abril de 1891 às 9h45 da manhã, quando saiu do ovo que sua mãe depositara num ninho de águia e que o pássaro chocou durante sete anos. O evento ocorreu em Brühl, ao sul de Colônia. ... Sua infância foi marcada por alguns incidentes dramáticos, mas estes não chegaram a ser particularmente infelizes. (1948/1970, pp. 26-29)

Quer dizer, Ernst, que em vários momentos criticou o mito do "artista criador", apresenta-se, com deliberada ironia, entre o humano e o animal, o terrestre e o aéreo, vindo ao mundo na forma de um novo mito. A relação homem-pássaro, "instaurada em seu pensamento", aparece em várias de suas pinturas, sobretudo na forma de um personagem com o qual voluntariamente se identificou: Loplop, o Superior dos Pássaros.

Ora, se o artista chega a essas imagens por meio da "inspiração", assistindo como um espectador ao nascimento de sua obra, realizando o papel do pintor, que "é o de cercar e projetar aquilo que se vê a si mesmo nele" (Ernst, 1948/1970, p. 3), sua conduta não é a do alucinado, figura vulgar instituída pelo estereótipo moderno da loucura. Ao contrário, no contexto do surrealismo, Max Ernst é um pintor que vive sob certo modo da inspiração segundo o qual ação e paixão são tão pouco discerníveis, que já não se sabe mais quem vê e quem é visto, quem pinta e quem é pintado.

Nesse sentido, aquele que pretender escrever a biografia de um artista como esse, relacionado tão intimamente ao surrealismo - a ponto de não se saber bem quem veio antes, se o surrealismo ou Max Ernst -, não poderá ignorar o enigma. Tratá-lo como ficção, pela chave da fantasia, em oposição à chamada realidade dos fatos, é escamotear a complexidade surreal dessa mesma realidade, desrespeitando a seriedade da própria poética surrealista. Ora, a ideia básica subjacente aos escritos de Max Ernst é que a escrita sobre a vida de um artista, plástico ou não, surrealista ou não, sempre deve levar em conta a dinâmica interna de sua obra. Seus temas, materiais, técnicas, tendências estilísticas e compromissos críticos, sócio-históricos e estéticos devem assumir a posição de fio condutor. Portanto, deve ser a obra o principal fundamento para se pensar um artista, e não o contrário. Devem ser as suas invenções plásticas os instrumentos privilegiados para se compreender, por exemplo, um pintor. E isso porque o sentido de uma obra de arte não é explicável pela vida do artista, uma vez que vida e obra não são fatos ou acontecimentos externos uns aos outros, mas mediações "de uma única aventura" (Merleau-Ponty, 1966, p. 34). Ou seja, se a vida do artista exprime sua obra, isso não quer dizer que a primeira seja causa da segunda, mas um motivo, e também não significa que o intercâmbio vida-obra possa ser visto como uma relação do tipo função-variáveis, mas como uma articulação de natureza impressiva-expressiva. Nessa medida, se nos parece que a vida de um autor é a antecipação de sua obra, é porque conhecemos sua obra antes e vemos através dela as circunstâncias da vida. Assim, para falar de um autor, delinear sua identidade ou escrever uma biografia, é da obra que o comentador necessariamente deve partir para chegar às questões relativas ao próprio autor, ou ao sentido da vida na qual essa obra se encrava, por mais fantasioso e ficcional que esse sentido possa parecer. E, nesse caso, é a percepção do leitor, expressa em sua narrativa, que faz o trabalho de articulação entre a obra e o autor por ela pressuposto.

Nesse sentido, dado que "uma obra só existe para ser percebida" (Argan & Fagiollo, 1994), deve-se reconhecer que o leitor, espectador ou receptor é um componente essencial do processo artístico, componente sem o qual as obras não seriam registradas na história da arte, nem teriam lugar nas instituições que as consagram, como os museus e as galerias. No entanto, dependendo da qualidade da leitura, a obra lida pode ser esquecida, desaparecendo da memória cultural, assim como a própria leitura pode ser ignorada (Hadjinicolaou, 1979). Nessa medida, cabe perguntar: se a leitura de Freud centrada em Da Vinci foi tão duramente criticada, por que ela ainda merece a atenção de especialistas no campo dos estudos dedicados às artes? Por que motivos ela ainda pede reflexão? Quais seriam as razões da recepção crítica negativa que ela suscitou?

 

Leonardo e Freud: arte e vida

Em primeiro lugar, observa-se que a própria natureza do ensaio foi posta em questão. Entendido como um estudo de psicanálise aplicada à arte, ele foi criticado por revelar mais a teoria pressuposta pelo intérprete do que a singularidade do objeto analisado, operação considerada um mau uso da psicanálise (Green, 1994; Ricoeur, 1977). Em segundo lugar, ousando temati-zar explicitamente a psicossexualidade de Leonardo, Freud subverte a imagem consagrada do artista. No entanto, os comentários de que o texto seria mera aplicação da psicanálise à arte são eles mesmos controversos, pois como poderia ocorrer essa operação se, no momento da escrita, as teorias e os conceitos freudianos estavam em processo de formação e, portanto, não passíveis de aplicação? Tal impossibilidade, contudo, não impediu que, durante a elaboração do texto, brotassem temas de estreita relação com a psicanálise: a teoria sexual das crianças, a dupla filiação (pai, mãe biológica e mãe adotiva), a homossexualidade do artista, o interesse no estudo do corpo humano, a paixão pelos pássaros, os paralelos mitológicos. Eles surgiram articulados a uma bibliografia considerável, desde o estudo clássico de Vasari e os vários escritos do próprio artista até os realizados por autores modernos, sobretudo a biografia de Da Vinci publicada em 1900, inteiramente romanceada, pelo russo Dmitri Merejkowski, obra pela qual Freud tinha particular apreço (Pontalis, 1987; Roudinesco, 2016, 2019).

No entanto, é a partir da ideia de conversão da sexualidade em pulsão de saber que o conceito de sublimação é instaurado por Freud. Quer dizer, o artista inspira o psicanalista a elaborar teoricamente a transformação da pulsão sexual de que resulta a capacidade humana de fazer obras de arte e de experimentar certa satisfação, a chamada fruição. As realizações de Da Vinci, nessa medida, forneceram a Freud material para avançar em seu próprio campo, criando conceitualmente uma nova temática (sublimação) e introduzindo outra (narcisismo). E se, por um lado, esse movimento é criticado, por outro, constitui uma possibilidade admissível de relação entre obra de arte e psicanálise: aquela é encontrada por esta como objeto evocativo (Bollas, 2009), fonte de muitas interpelações que podem desenvolver o pensamento do intérprete, assim como as teorias psicanalíticas.

Além disso, é preciso notar que o criador da Mona Lisa é para Freud um personagem com o qual ele se identifica, dado certo investimento excessivo comum a ambos: a ânsia por conhecimento. Da Vinci foi pintor, escultor, músico, engenheiro, cientista, arquiteto, inventor. Resumindo, um contumaz observador da natureza, um ser humano muito sensível ao sensível, aspecto que o artista não vê como um bem, pois, segundo ele próprio, "quanto maior a sensibilidade, maior o martírio - um grande martírio"; mais ainda, "todos os nossos conhecimentos decorrem do que se sente", e o artista "treina os seus sentidos como um esportista desenvolve os seus músculos" e "arma o seu espírito, inculcando-lhe uma disciplina, abrindo-o à mais vasta cultura, como se prepara e equipa um exército". Leonardo sabia, contrariando o ideário de seu tempo, que a erudição e a cultura não são frutos da graça divina, mas resultado de muito trabalho, uma árdua conquista na qual estão simultaneamente presentes "prazer e dor". Os que pensam o contrário são movidos pelo "dogmatismo ou pela preguiça" (Bramly, 1989, pp. 103 e ss., 140 e ss.). E, nesse sentido, por serem muito avançados em seus respectivos tempos, ao privilegiarem a ideia de trabalho, no tocante à arte e ao sonho, Da Vinci e Freud podem ser percebidos como modernos.

Ora, no livro Arte e conhecimento em Leonardo da Vinci (2019), Alfredo Bosi faz uma análise magistral desses aspectos na trajetória do artista. Mostra a singularidade de seu pensamento, para o qual o conhecimento principia com o "desejo de conhecer" (p. 18), e a concepção de natureza como "totalidade orgânica generosa" em contínua transformação (pp. 60 e ss.). Mostra também, como comenta Lorenzo Mamm'i na quarta capa do livro, o seu profundo interesse pela instabilidade do ser, que o leva a buscar "uma nova relação entre experiência, imaginação e fazer", segundo a qual conhecer a natureza é também desejar recriá-la, no pensamento e na obra. Ou seja, "olhar para saber, saber para desenhar, desenhar para pintar, pintar para criar. ... O desejo do conhecimento acende o conhecimento e estimula a fantasia plástica " (p. 23).

Nesse sentido, a pintura de Da Vinci - "coisa mental", "filha da natureza e, mediante esse parentesco, quase neta de Deus", segundo ele mesmo - está autorizada a inventar um novo modo de contornar as figuras, diferente da forma consagrada no primeiro Renascimento, privilegiando a transição gradual entre atmosfera e corpos, uma implicação daquela concepção. O sfumato, por exemplo, técnica artística desenvolvida por Da Vinci que permite gerar suaves gradientes entre as tonalidades, é uma decorrência plástica dessa transformação, assim como o notável inacabamento das pinturas (Bosi, 2019, pp. 43-44 e 60).

Assim como Leonardo, Freud é autor de uma obra interminável, continuada pelos pósteros (Bollas, 2008). Além disso, o respeito à mãe natureza também está presente em ambos. E o próprio estudo sobre o pintor, segundo as belas palavras de Marthe Robert, pode ser visto como "um ato de piedade e de amor para com a mãe que, como a natureza, a quem Freud presta homenagem em sua obra, ao mesmo tempo salva e perde os filhos preferidos" (1991, p. 238).

Cabe, então, perguntar: como Freud percebe Da Vinci, quem é esse outro que faz o psicanalista pensar? Em poucas palavras, não é um personagem do Renascimento, mas um artista oitocentista. E como o filósofo e crítico de arte Leon Kossovitch argumentou, num encontro que tivemos no Museu de Arte de São Paulo (Masp) em 2000, foram os próprios historiadores da arte que auxiliaram Freud a tomar o caminho que seguiu. Quer dizer, Freud estava comprometido com a historiografia do século xix e com autores da nascente ciência da arte, no tocante à sua articulação estilística e psicológica. A questão se verifica tanto nos equívocos de tradução do italiano para o alemão, apontados pelos críticos, quanto no desconhecimento de noções básicas do modo de pensar normativo, vigente na época, regulador das ciências e das artes, que vinculava, sobretudo a partir dos estudos da perspectiva no século xiv, investigação matemático-física e estudos retórico-poéticos, aos quais Da Vinci não era alheio. É assim que, orientado por autores do século xix que ignoravam a história como gênero discursivo, Freud procura traço psicológico num escrito preceptivo - no qual se faz o elogio da arte -, quando busca caracterizar a personalidade do artista ao reter de seu texto a comparação entre a pintura e a escultura, atribuindo à primeira uma plenitude que falta à outra. No entanto, esse elogio da pintura, por ser de ordem retórica, mostra um valor, uma virtude, e não um traço psíquico, uma personalidade, pois não é possível encontrar psiquismo onde não há psicologia. Daí a dificuldade para definir o estatuto da memória infantil - lembrança, fantasia, sonho...

Em suma, pode-se dizer que, se há equívoco no ensaio de Freud, não é o de ter confundido abutre com milhafre, ave de rapina que figura na lembrança infantil do artista, confusão apontada por Schapiro (1956), mas sim o Da Vinci que viveu no Quattrocento com o artista do Ottocento, concebido nos termos de uma psicologia expressiva que nem existia na época em que viveu o pintor. O erro histórico e epistemológico que resulta da ilusão retrospectiva está presente no ensaio, porém baseado em historiadores da arte que positivaram e idealizaram os séculos do Renascimento.

Posto isso, surge mais uma pergunta: teria sido possível ocorrer de outro modo, tratando-se de um autor com a erudição de Freud? Mais ainda: seria possível fazermos uma leitura crítica do Da Vinci de Freud sem o suporte da filosofia contemporânea e das ciências humanas que inventaram as noções de estrutura e genealogia, legitimando a aproximação a certos fenômenos históricos de longa duração, como as mentalidades, que expressam as maneiras de ser criadas por certa formação histórica?

Freud não leu Erwin Panofsky, mas Jacob Burckhardt, e isso faz toda a diferença, o que nos leva a outra pergunta: em que medida uma leitura da arte do Renascimento que supõe estudos de iconologia não é tão contemporânea de nós quanto o foi a interpretação de Freud dos seus? Ora, sabemos que a psicanálise, desde Freud, se apresenta como uma teoria sobre o psiquismo individual e, ao mesmo tempo, como uma teoria sobre as maneiras pelas quais tal psiquismo é aculturado (Mezan, 1990). Portanto, a possibilidade de uma psicanálise dos objetos de arte para além da diferença histórica não poderia se justificar.

O que torna suspeito o estudo feito por Freud é que, ao analisar a obra SantAna, a Virgem e o Menino, ele parece ir muito além das analogias estruturais que apenas uma análise da composição autorizaria, chegando a destacar a temática pulsional que a obra recobre. Não diz Freud, em resumo, que a lembrança da primeira mãe e de seu carinho excessivo é transferida para a fantasia da cauda do pássaro na boca da criança, à tendência homossexual do artista e ao sorriso da Mona Lisa? Porém, mais do que isso, o que Freud chega a mostrar é que "o pincel de Da Vinci não recria a lembrança da mãe, ele a cria como obra de arte". E é nesse sentido que Freud pode afirmar que "Da Vinci negou e transcendeu, pela arte, a infelicidade de sua vida erótica nas figuras que ele criou" (Ricoeur, 1977, pp. 149-150). Ou seja, a lembrança da infância de Leonardo da Vinci é justamente aquilo a que remete o sorriso da Gioconda.

 

 

Ao descrever esse sorriso em termos de uma psicologia expressiva, Freud deixa de lado o enigma colocado pelos sorrisos leonardescos para se interessar pelo sorriso vivo da(o) modelo que o teria fascinado. Cabe lembrar que esse sorriso se faz presente na Gioconda, mas também nas Madonas, nos anjos e no notável São João Batista, cujo modelo, sabe-se hoje, sempre foi Salai, um dos dois jovens companheiros de Leonardo, descrito por Giorgio Vasari, em pleno século xvi, como um gracioso e bonito rapaz com um belo cabelo ondulado (Isaacson, 2017). E Freud, sem estar ciente desse fato, supõe que esse sorriso enigmático teria despertado no pintor alguma coisa adormecida há muito tempo em seu íntimo. Esse algo seria aquilo a que o sorriso remete, mas que só existiria como ausência simbolizável, situada, por exemplo, no rosto da Mona Lisa. Nessa medida, não é algo conhecido pelo artista que explicaria o enigma dessa obra, mas alguma evocação que, longe de dissipá-lo, reforça o mistério inicial.

 

 

Quanto a isso, a análise não conduz o espectador do menos ao mais conhecido no campo artístico. Pouco importa, contudo. Afinal, o propósito desse estudo de Freud não é interrogar a arte (o que acontece num ensaio posterior, publicado em 1914). Quer dizer, embora certa estética esteja pressuposta, Leonardo não é tratado como divino, como era designado no Renascimento, mas como homem comum, conforme Freud esclarece no último capítulo do seu estudo, dizendo que, "como qualquer ser humano, ele corresponde a uma dessas inúmeras tentativas por meio das quais as ragioni da natureza são compelidas à experiência" (1910/1970a, p. 124). Ou seja, não é a arte a temática interrogada por Freud, mas a problemática da vida, apontando para a troca contínua entre passado e futuro, mostrando que cada vida sonha enigmas cujo sentido final não se encontra fixado em parte alguma e que "a psicanálise não torna impossível a liberdade, ao contrário, ela nos ensina a concebê-la concretamente como retomada criativa de nós mesmos" (Merleau-Ponty, 1966, p. 43).

 

 

Assim, pode-se concluir que a arte sobre a qual Freud pensa com Da Vinci é a da vida, cuja dinâmica, marcada por dores e alegrias, ilusões e desilusões, às vezes é conhecida, mas nem sempre é pensada. É, portanto, um equívoco considerar esse trabalho um estudo psicanalítico das artes plásticas. Ele é, mais precisamente, um ensaio sobre a vida como arte (Kofman, 1970), contestando o falado conservadorismo de Freud, que não nega a genialidade do artista, mas percebe-a enraizada em sua vida. Ao tratar um gênio clássico (divino, assexuado) como um homem comum (perverso polimorfo, erotizado), o psicanalista afirma a vocação da psicanálise para a subversão do instituído. E talvez esteja nessa tendência do ensaio o principal motivo da sua rejeição. Nesse sentido, é o modo negativo da recepção que se mostra conservador, pois aderido ao discurso consagrado sobre a arte dos gênios renascentistas. E a psicanálise, em contrapartida, desde Freud, se apresenta como uma perspectiva crítico-criativa sobre a cultura. Afinal, afirmando-se como um modo de trabalhar que busca transcender a banalidade dos discursos com interpretações, a psicanálise problematiza as formas instituídas da sensibilidade e do pensamento, abrindo-as à liberdade criativa do leitor, exigida pelos objetos culturais, para que destes ele possa ter experiência. Cabe ressaltar, entretanto, que o exercício dessa perspectiva, livre de preconcepções, varia de indivíduo para indivíduo, dependendo das suas respectivas sensibilidades e da frequentação que tiverem do campo constituído pelas diferentes manifestações culturais, do popular ao erudito. Ou seja, não se é criativo evitando o contato com a cultura. Ao contrário, quanto mais intensa for a frequentação cultural, maior será o repertório acumulado para o fluxo da associação livre e o rigoroso exercício da criatividade, como mostram artistas e escritores das mais diversas extrações, assim como os próprios psicanalistas, desde Freud, com seus escritos. Entretanto, antes de finalizar este escrito, cabe dizer algumas palavras sobre a particularidade da aproximação psicanalítica às artes.

 

Psicanálise, arte e estética da recepção: uma questão de método

É preciso lembrar, em primeiro lugar, que a interpretação psicanalítica se submete a princípios definidos: "Ela não é psicanalítica porque emprega o vocabulário e os conceitos freudianos a fim de ilustrar pela enésima vez a fecundidade e a verdade das teses já conhecidas" (Mezan, 1990, p. 72). Mais do que isso, repetir infinitamente o que sabemos pela aplicação de uma teoria a uma obra, como chave interpretativa, é reduzir a singularidade dessa obra, destruir o enigma que nos propõe, dissolver a sua inquietante estranheza. Proceder assim será nada mais nada menos do que converter a obra analisada num sintoma da teoria, o que é um absurdo epistemológico. E o objeto artístico, dada a sua essencial singularidade, tem o poder de tornar evidente, mais do que qualquer outro objeto, esse perigo das reduções. Mas também não cabe, diante de uma obra, colocá-la entre parênteses e recorrer à livre associação. Nesse caso, o intérprete, preguiçoso, estaria procedendo como se estivesse diante de um objeto sem história e sem contexto, convertendo-o em mera manifestação da sua subjetividade, operação cujo resultado, do ponto de vista da obra, costuma ser puro nonsense.

Ora, uma interpretação é psicanalítica porque retoma o modo de pensar inventado por Freud. Trata-se de uma "maneira de pensar" que, segundo observa Mezan, se define "pela percepção dos efeitos do inconsciente tanto no objeto a analisar quanto na atividade do analista, o que faz da interpretação não apenas reconstrução do sentido, mas sobretudo construção dele". Uma interpretação só se poderá dizer psicanalítica obedecendo ao princípio freudiano fundamental, isto é, como "interpretação do singular pelo singular nas condições definidas - porém não preenchidas a priori - pelos parâmetros reguladores da teoria". O instrumento de trabalho do analista "não é o Vocabulário da psicanálise, mas seu próprio inconsciente", e assim "é abusiva qualquer pretensão de 'objetividade' no sentido comumente admitido desse termo. A interpretação psicanalítica do que quer que seja implica o intérprete na sua formulação mesma" (Mezan, 1990, pp. 71-72). É, portanto, sem sentido pretender que essa maneira de trabalhar possa ser reduzida aos termos formais de um método aplicável, indiferentemente, a qualquer objeto. Fato é que a condição de que se tenha tido a experiência da psicanálise para praticá-la, no tocante a textos ou quadros, delimita a especificidade da interpretação psicanalítica. Trata-se de uma interpretação que não é exaustiva e que é posta à prova ao ser comunicada, pois nessa comunicação o analista "revela abertamente as falhas de sua leitura e os limites de sua autoanálise" (Green, 1983, p. 215). Ou seja, comprometendo pessoalmente o intérprete, a prática psicanalítica com as obras (assim como com os pacientes) não se pode fazer do exterior, por aqueles que só conhecem a psicanálise através dos livros. Como observa Julia Kristeva, cada situação analítica é um "microcosmo específico", e "cada tratamento torna-se um idioleto, uma obra de arte", que requer um trabalho criativo "no interior do continente freudiano" (1993, p. 61). Ou seja, "para cada paciente, para cada sessão, deve-se ter a interpretação adequada àquela sessão e àquele momento da análise" (Green, 1990, p. 154). Da situação em que o intérprete distraidamente se deixa guiar por uma obra ou pelo fluxo associativo do paciente resultará uma construção discursiva também singular, simultaneamente ilusória e verdadeira, isto é, válida para a dupla em questão. E, dessa maneira, cada psicanálise escapa de ser uma repetição ao infinito daquilo que teoricamente já se sabe, dada a atualidade ecumênica das doutrinas (freudiana, kleiniana, bioniana, winnicottiana etc.).

Como observa Bollas, é "uma obrigação ética que os psicanalistas façam uma imersão na orientação teórica das maiores escolas de psicanálise", dado que essa imersão visa "aumentar a capacidade perceptiva, expandir a mente, para receber pacientes com uma sabedoria que apenas pode ser obtida pela passagem entre as diferenças" (2008, p. 82). Essa observação vale para a percepção de obras de arte, sendo o denominador comum dessa passagem a maneira de trabalhar inventada por Freud, à qual os analistas são obrigados a se referir, "se pretendem estar fazendo psicanálise" e se pretendem dar conta de uma obra cuja expressão é sempre, do lado do receptor, um trabalho infinito (Kristeva, 1993, p. 46).

Com efeito, esse caráter da prática psicanalítica coloca a psicanálise fora dos limites da mera psicanálise aplicada às obras de arte e também aos pacientes, pois ela não se reduz à verificação dos conceitos psicanalíticos ou ao uso da livre associação, por parte do intérprete, que lhe faculta projetar sobre a obra seus sentimentos, fantasias e emoções, nem ainda à aplicação de um método que, por definição, é anterior e exterior ao objeto sobre o qual se aplica. Ao contrário, essa compreensão não reducionista da prática psicanalítica propõe um modo de trabalhar muito peculiar que passei a designar, precisamente, psicanálise implicada (Frayze-Pereira, 2004), expressão que me foi proposta pelo filósofo Alain Grosrichard, em 1990, e que designa um manejo do objeto cuja realização podemos acompanhar no ensaio "O Moisés de Michelangelo" (Freud, 1914/1970b).

Assim, com Da Vinci, se Freud já tentava operar a partir do cruzamento entre dois pontos de vista, o endopoiético e o exopoiético - isto é, segundo Green (1994), o ponto de vista que considera os constituintes internos à obra e o que considera os fatores provenientes do contexto que a sustenta -, na análise da escultura de Michelangelo essa maneira de trabalhar fica mais evidente, abrindo o campo compreendido pela estrutura subjetiva do artista posta na obra e que não se confunde com o que diz respeito à biografia do criador. A estrutura subjetiva não é da ordem dos acontecimentos, mas resulta da transformação das relações entre o exterior e o interior. E, nesse sentido, "o investigador que se propõe como finalidade o estudo da estrutura subjetiva não pode excluir de sua pesquisa sua própria estrutura subjetiva" (Green, 1994, p. 100). Além disso, devido à implicação do pesquisador no objeto de sua pesquisa, a interpretação será sempre arriscada, pois o intérprete está livre de um lado exatamente porque ligado ao outro, podendo acontecer que as descobertas resultantes afetem sua relação consigo mesmo. Talvez seja esse o tributo obrigatório a ser pago pela transgressão feita por intermédio de um outro - o universo oculto do artista cuja obra é estudada. E, quando se trabalha com obras de arte, é preciso reconhecer esse risco e aceitá-lo. No entanto, não é fácil manter-se aberto à alteridade que nos interroga, uma vez que as obras, como emblemas do ser, totalidade sensível-sentiente, sempre exigem de nós criação, não apenas para podermos interpretá-las, mas antes para delas termos experiência (Merleau-Ponty, 1964).

Ora, com esses dois trabalhos, quase meio século antes de a crítica de arte ser sacudida com a conhecida tese de Duchamp - são os espectadores que realizam as obras - Freud antecipava com seus próprios passos uma tendência crítica importante. Ou seja, é a atitude receptiva do psicanalista, como espectador, a "questão metodológica" principal nos dois ensaios, um voltado para a vida como arte e o outro centrado numa obra arte, atitude que será privilegiada na chamada estética da recepção, movimento da crítica nascido em 1967 na Universidade de Constança, Alemanha (Jauss, 1978). Nesse sentido, nos dois ensaios, a perspectiva original de Freud é distorcida ao ser entendida como aplicação de teorias ou do chamado método psicanalítico sobre algum objeto. E, não por acaso, aquela perspectiva, que engendra uma singular maneira de trabalhar, não se generalizou na psicanálise; ao contrário, visto que o ensaio de Freud com Da Vinci foi muito criticado, tal maneira tem se realizado de modo discreto, através do exame de obras específicas, deste ou daquele autor particular.

Visando legitimar essa perspectiva no campo da psicanálise, há dois autores que merecem destaque: o inglês Peter Fuller e o suíço Jean Starobinski. À sua maneira, Fuller (1981), notável crítico de arte com formação marxista, que se interessou por psicanálise a partir da sua análise pessoal com Hanna Segal, observa que a postura crítico-psicanalítica surge quando se adere não a uma conceituação específica, mas ao específico da atitude psicanalítica. Ou seja, antes de qualquer opção conceitual, a ser orientada mais pela obra do que pela subjetividade do intérprete, por intermédio da sua livre associação, dos seus pré-conceitos, é a prudência de Freud que deve ser positivamente apreciada. E, nesse caso, o próprio crítico lembra, considerando o estudo sobre o Moisés de Michelangelo, que a Vênus de Milo (analisada brilhantemente por ele) é uma obra em relação à qual as ideias kleinianas sobre ataque e reparação (articuladas por ele às teorias do fragmento e do restauro, vigentes no século xix, século das grandes escavações arqueológicas, quando a Vênus foi encontrada e, depois de muita disputa, levada para o Louvre) têm um significado especial, ao passo que muitas outras ideias, para a análise dessa obra, parecem sem sentido e menos importantes. Em outras palavras, é a especificidade da obra, que supõe um processo criativo e certo contexto que lhe deram origem, um aspecto norteador da atividade do espectador. É a experiência deste com a obra que solicitará as teorias que lhe correspondem, na psicanálise ou para além dela.

Nesse sentido, Starobinski - médico psiquiatra, historiador e grande crítico da literatura e das artes - fundamenta filosoficamente uma perspectiva clínico-crítica, tal como a desenvolvida por Fuller. Com base na sua prática, Starobinski (1970) pensa que, tanto na relação com o paciente como no exame de uma obra de arte, há que se ter um primeiro tempo - o tempo da experiência -, no qual o olhar vai ao encontro da realidade sensível que se oferece a ele sem reconhecer nela estruturas fixas. Seguindo o princípio da atenção flutuante, o analista vê desenhar-se, pouco a pouco, a recorrência de certos temas, estruturados pelos recursos literários, plásticos ou discursivos empregados pelo escritor, pelo artista ou pelo paciente. Assim, de acordo com esse princípio, o que estaria em jogo seria a apreensão de um sentido que, ultrapassando os limites de cada obra de um artista específico (ou de cada sessão com um paciente particular), emergiria entre ela e o receptor, na forma de articulações insuspeitadas que vão se tornando evidentes gradualmente. Mas como definir a experiência?

Inspirando-me no próprio Starobinski (1970) e na última formulação filosófica de Merleau-Ponty (1964), posso dizer que a experiência é o que nos abre para o que não é nós, isto é, para a alteridade, uma realidade poliédrica, simultaneamente visível e invisível, objetiva e subjetiva, marcada por ambiguidade e transcendência, como acontece com o símbolo, ou seja, como aquilo que exige de nós interpretação para dele podermos ter experiência. Ora, se ambiguidade e transcendência são características essenciais dos símbolos, o intérprete, com a sua interpretação, coparticipará das formas simbólicas. E, com esse reconhecimento, cria-se a possibilidade de a interpretação vir a ser implicada na e com a forma. Quer dizer, torna-se possível a uma obra expressar uma experiência atual do intérprete, e ao olhar do espectador-analista faculta-se a possibilidade de a sua leitura pertencer às formas que se oferecerem a ele no plano do visível.

Em suma, a visão clínico-crítica não será nem a que visa a totalidade (como procede o olhar dominante, constituído com base numa posição teórico-conceitual predefinida, que sobrevoa os objetos), nem a que visa a intimidade (como opera a intuição identificadora a partir da associação selva-gemente livre de ideias e imagens); ela supõe um olhar que sabe exigir alternadamente a distância e a proximidade, considerando-se que a verdade não está nem em uma nem em outra alternativa, mas no movimento entre uma e outra (Starobinski, 1961). Em outras palavras, esquecendo-se de si para deixar-se surpreender, o receptor perceberá surgirem no objeto outras interrogações que se colocarão a ele mesmo como seu destinatário. E assim, na condição de intérprete, o analista emprestará sua voz à potência que o interpela, respeitando a psicanálise e, sem redução ou idealização, a particularidade da arte. Nesse sentido, pode-se reconhecer que foi essa tendência que se constituiu como própria do modo psicanalítico de trabalhar no ensaio em que Freud pensou a psicanálise com o seu outro - Leonardo da Vinci. É um modo que, válido para o trabalho clínico, como "trabalho lúdico" (Bollas, 1998, p. 30), possibilitará ao analisando desenvolver seu idioma pessoal, elaborar a lógica de sua vida psíquica e tornar-se personagem de sua história.

 

Referências

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Recebido em 16/11/2020
Aceito em 30/11/2020

 

 

1 Este artigo é uma versão ampliada do texto que escrevi a convite de Iliana Warchavchik da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP), a quem agradeço, tendo em vista as comemorações dos 500 anos de Da Vinci, em 2019, publicado na Folha de S. Paulo. A presente versão foi apresentada em reunião científica no dia 24 de setembro de 2020, tendo por comentador Elias Mallet da Rocha Barros e por coordenadora Norma Lottenberg Semer, ambos da SBPSP, aos quais também agradeço.

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