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SMAD. Revista eletrônica saúde mental álcool e drogas
versão On-line ISSN 1806-6976
SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. port.) vol.17 no.1 Ribeirão Preto jan./mar. 2021
https://doi.org/10.11606/issn.1806-6976.smad.2021.000143
EDITORIAL
Promoção da diversidade, da inclusão e da participação no processo de reabilitação
Christoph KäpplerI; Fabiana FaleirosII
IFaculdade de Ciências da Reabilitação da Universidade de Dortmund, Alemanha
IIUniversidade de São Paulo, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Centro Colaborador da OPAS/OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Ribeirão Preto, SP, Brasil
Em 1993, discursando sobre diversidade, o então presidente da República Federal da Alemanha, Richard von Weizsäcker, fez uma declaração: "É normal ser diferente". Isso é verdade, todos nós somos diferentes. No entanto, se por um lado estamos de acordo com esse fato indubitável e queremos ser diversos, únicos com o mesmo valor e perfil característico de cada um. Por outro lado, concomitantemente, temos a tendência de querermos ser iguais; fato que pode ser observado, por exemplo, em adolescentes que tem o desejo de ser ou se parecer como os membros do mesmo grupo social (faixa etária, gênero, etc. ) e, especialmente, com os modelos preferidos da própria geração. Nesse sentido podemos constatar uma das ambivalências da vida do ser humano.
Diante disso, surge o desafio de garantir, a cada ser humano, viver a própria vida, como oportunidade única, de acordo com as próprias perspectivas, visões, desejos e necessidades (especiais). Os termos igualdade de oportunidades, equidade, superação de barreiras, acessibilidade e não discriminação, resumem-se como participação e inclusão na sociedade. Essas são bases inerentes aos direitos humanos e representam aspectos do respeito e da valorização da diversidade humana(1). Considerando como meta final da reabilitação conquistar e reter o maior nível possível de autonomia para a participação social(2).
Em relação a reabilitação o foco está mudando de uma perspectiva biomédica para uma perspectiva centrada na pessoa, o qual encontra-se incluída e participante em uma sociedade. Essa mudança da compreensão de perspectiva para o seu entendimento enquanto desigualdade social reforça a ideia da diferença, não como atributo individual, mas como resultado de uma sociedade ainda despreparada para a diversidade humana(1-3). Assim, a promoção da autonomia e da participação são, ao mesmo tempo, critérios fundamentais e objetivos centrais da reabilitação. As concepções de autonomia variam entre os indivíduos e as culturas, mas uma distinção pode ser feita entre a autonomia decisória (capacidade de tomar decisões sem interferência externa) e a autonomia de execução (capacidade de agir conforme quiser). A autonomia de decisão pode aumentar ao longo da vida, mesmo enquanto a autonomia de execução possa estar em declínio. Enquanto a independência representa a capacidade da pessoa de realizar uma atividade sem auxílio, a autonomia se refere-se à capacidade de pensar, de escolher e decidir. Para que exista uma participação autêntica é imprescindível garantir como pré-requisito, autonomia de execução o suficiente para comunicar, e autonomia de decisão o suficiente para ser um comunicador autêntico(2).
Em 2004, a Reabilitação Baseada na Comunidade (RBC) foi definida e adotada pelas principais instituições internacionais de educação e saúde, entre elas a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, a Organização Mundial da Saúde e a Organização Internacional do Trabalho. A RBC é realizada por meio de esforços combinados das próprias pessoas, suas famílias e a comunidades, e dos correspondentes serviços de saúde, educação, sociais e de trabalho(3). Constitui-se como uma estratégia de desenvolvimento comunitário para a reabilitação, equalização de oportunidades e inclusão social(3). Embora o conceito de reabilitação seja amplo, na prática nem sempre engloba as ações necessárias no âmbito social. Exemplificando, iniciativas para remover barreiras no âmbito social, como adaptações visando a acessibilidade em instituições públicas, muitas vezes não são consideradas como parte da reabilitação, no entanto são essenciais para o seu sucesso.
Adicionalmente aos aspectos socioculturais, os aspectos emocionais e a capacidade de adaptação do indivíduo, a resiliência, devem ser considerados como parte do processo de reabilitação. Nesse contexto, resiliência pode ser compreendida como um processo de adaptação que envolve um conjunto de pensamentos, emoções e ações que podem ser aprendidos e desenvolvidos, ao longo do tempo, em resposta a eventos críticos ou ate traumáticos na vida, favorecendo a superação, a preservação e a adaptação do indivíduo.
Outro aspecto fundamental para o sucesso da reabilitação é a inclusão da pessoa, além do sistema da educação(4), no mercado de trabalho. Apesar da relevância do retorno laboral, tanto para as condições financeiras, quanto para o bem-estar emocional, observa-se que nem sempre as equipes de reabilitação capacitam para o retorno ao mercado de trabalho. Nessa direção, algumas metodologias, como a do emprego apoiado (EA) visa promover a inserção no mercado de pessoas com deficiência, vítimas de violência doméstica, doenças mentais, ex-tóxicodependentes e pessoas desempregadas de longa duração. O EA rompe as barreiras criadas pelos modelos tradicionais, que concebiam essas pessoas diferentes como seres incapazes, dependentes e inaptas para o mercado de trabalho. Assegura que elas tenham condições de participar e contribuir ativamente na sociedade. Promove o acesso aos direitos de emprego competitivo, educação, lazer, no âmbito de esporte e cultura, utilização de transportes e participação social(1-3,5).
Diante do exposto, reforçamos que o processo de reabilitação deve ser iniciado o mais precocemente possível, gradativamente, de acordo com o contexto biopsicossocial e familiar individual, buscando a promoção da autonomia para que ocorra uma participação autêntica na sociedade.
Referências
1. Lei nº 13.146, 06 de julho de 2015 (BR). Institui a Lei brasileira de inclusão da pessoa com deficiência (estatuto da pessoa com deficiência). Brasília; 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm. [ Links ]
2. Andrade VS de, Faleiros F, Balestrero LM, Romeiro V, Santos CB dos. Social participation and personal autonomy of individuals with spinal cord injury. Rev Bras Enferm. 2019 Feb;72(1):241-7. doi: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0020. [ Links ]
3. Organização Mundial da Saúde. Community Based Rehabilitation: CBR Guidelines. Bruxelas; 2010. [ Links ]
4. Käppler C, Eisenberg R, Eisenberg U, Faleiros F. Auf dem Weg in eine inklusive Lebenswelt. In: Deutsch-Brasilianische Industrie- und Handelskammer São Paulo. Diversität in Brasilien / Diversidade no Brasil. São Paulo: AHK; 2019. p. 92-5. [ Links ]
5. Timm T, Anders W, Eisenberg R, Käppler C. Primeiro Guia Brasil-Alemanha de Inclusão - Viver Diversidade. São Paulo: AHK; 2016. 160 p. [ Links ]
Autor correpondente:
Fabiana Faleiros
E-mail: fabifaleiros@eerp.usp.br