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Psicologia Ensino & Formação

versão impressa ISSN 2177-2061

Psicol. Ensino & Form. vol.4 no.1 Brasília  2013

 

RELATOS DE EXPERIÊNCIA

O cuidado clínico com adolescentes em ambiente escolar

 

Clinical care of adolescents in the school environment

 

 

Daniella Machado de Oliveira

Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Mestre em Psicologia Clínica. dnpsi@yahoo.com.br

 

 


RESUMO

Este relato de experiência tem por objetivo apresentar algumas das contribuições de Winnicott sobre a fase da adolescência, com vistas, especialmente, ao trabalho dos educadores de adolescentes. O autor enfatiza a adolescência como um período em que o jovem é, essencialmente, imaturo, um ser isolado, que não aceita falsas soluções e que procura sentir-se real, buscando experiências para isso. Apoiadas na sua teoria do amadurecimento afetivo, mostram-se tanto as dinâmicas presentes no amadurecimento do adolescente quanto quais as funções que se espera que um ambiente adequado (familiar, escolar, cultural) deva desempenhar para sustentar esse amadurecimento. São essas formulações, dirigidas à adolescência, dentre outras, que serão explicadas neste relato, esperando-se contribuir, por meio desse recorte da obra de Winnicott, para a compreensão dos adolescentes, seja para eles mesmos, seja para pais, professores, para todos aqueles que lidam com eles e para as atribuições de um profissional de Psicologia que almeja atuar nesse campo.

Palavras-chave: Adolescência; Identidade; Ambiente; Educação.


ABSTRACT

This narrative account aims to present some of Winnicott's contributions regarding the stage of adolescence, especially aiming at the work of those who educate adolescents. Winnicott stresses that adolescence is a period in which the young individual is essentially immature, an isolated being that rejects false solutions and seeks to feel real, looking for experiences that will propitiate that feeling. Based on his theory of emotional maturity, the narrative portrays both the dynamics present in the maturing adolescent and what functions as a suitable environment (family, school, cultural) should perform to sustain this maturation. The Winnicotian ideas on adolescence explored here are aimed at gaining a better understanding of adolescents, on the part of adolescents themselves, their parents, their teachers and all who have dealt with them, including psychologists, whose interest lies in this area.

Keywords: Adolescence, Identity, Environment,Education.


 

 

Quem somos nós, quem é cada um de nós senão uma combinatória de experiências, de informações, de leituras, de imaginações? Tudo pode ser continuamente remexido e cada vida é uma enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de estilos reordenados de todas as maneiras possíveis (CALVINO, 1990, p. 138).

Esse relato de experiência é resultado de motivações pessoais derivadas de observações da minha experiência como professora de adolescentes e das dificuldades surgidas durante o trabalho com eles, que envolvem principalmente o relacionamento interpessoal. Houve necessidade, então, de ampliar meus conhecimentos sobre essa fase de desenvolvimento humano, sobretudo, de compreender como pensa, age e sente o adolescente e de saber lidar, mesmo que parcialmente, com seus conflitos, dúvidas, medos, rebeldia, ironia e confrontação.

Trabalhei em um colégio particular e confessional de 2006 a 2008, com alunos entre 10 a 15 anos, de ambos os sexos. Nossos encontros se davam uma vez por semana, em sala de aula, com duração de 50 minutos. Por se tratar de um colégio confessional, havia uma diferenciação quanto ao que as famílias buscavam e esperavam para seus filhos, do ponto de vista de valores, pois muitos pais acreditam que um colégio religioso possua uma formação ética, baseada no desenvolvimento de valores e virtudes.

Outro dado interessante era a classe social das famílias, que revelava muita oscilação e variedade da condição socioeconômica: alunos bolsistas, filhos de funcionários, grande parte do corpo discente pertencente à classe média e uma pequena parcela, à classe alta. Isso favorecia uma interação e convivência entre os diversos níveis sociais. Entretanto, grande parcela dos alunos do colégio possuía uma vida socioeconômica confortável, com atividades extraescolares como esportes, idiomas, viagens no mês de julho e no final do ano letivo.

Como psicóloga, não estava no colégio nessa função, mas como professora. Os alunos tinham conhecimento da minha formação, e diversas vezes fui abordada para conversas particulares, desabafos que envolviam desilusões amorosas, conflitos familiares, reclamações ou descontentamentos com professores e dúvidas, medos e angústias como: "Não sei o que quero da vida", "Estou confuso(a)", "Ninguém me entende", "Sinto-me estranho(a)", "Parece que nada dá certo". No entanto, todos sabiam diferenciar e reconhecer a professora que estava ali para trocar experiências, ouvir, ensinar, da psicóloga.

Como percebi que estavam em uma fase de busca de identidade, de questionamentos, rompimentos com tradições e busca de novas ideologias, introduzia ética e cidadania, Filosofia e Psicologia através de dinâmicas e vivências. Uma das dificuldades do professor com essa faixa etária é tolerar as reações rebeldes dos alunos adolescentes, a rejeição às atividades propostas e as provocações. Na prática, são atitudes penosas que podem desestabilizar o equilíbrio do professor. O fundamental é procurar entender que mensagem implícita está por trás desses comportamentos.

É óbvio que o ensino não é perfeito, sendo necessária uma reformulação constante de conceitos pelo professor, de novas estratégias, de rearranjos a serem feitos. O mais difícil para um professor aceitar é que, muitas vezes, um bom conteúdo, um jogo interativo é rejeitado pelos alunos. Então, ele tem que compreender a situação, elaborá-la e devolvê-la de modo a adaptá-la ao grupo. E nem sempre isso é possível no dia a dia.

Notei que meus alunos adolescentes acabavam transportando para a situação escolar dúvidas, incertezas, vontades e intenções que faziam parte do caráter de cada um: distorções emocionais, verdades a serem checadas, testadas, pois sempre estavam esperando encontrar algum suporte, experimentações. A tarefa exige do professor, nessas situações, suportar os desafios a que estará exposto.

Presenciei, em muitos momentos na sala dos professores, em reuniões de equipe, o descontentamento, a falta de motivação e a resistência às mudanças por parte dos professores que estavam perto de se aposentar. Em Psicologia e Educação, há o seguinte comentário:

Há também aqueles que neste período do seu trabalho se apegam de tal forma que não admitem nenhuma mudança em seus hábitos e tornam-se bastante refratários a qualquer tipo de inovação; são os essencialmente conservadores. Por se sentirem acomodados, tornam-se muito arraigados à sua maneira de ser e não se conformam com o que vêem em relação a mudanças (WITTER, 2004, p. 25).

Assim, enquanto procurava textos novos, maneiras diferentes de conduzir a aula, esses docentes permaneciam lecionando a mesma aula, o mesmo material durante 25, 30 anos, e muitos diziam: "Na minha época, era bom", "Eu já fui mais feliz", "Não sei o que acontece com fulano, dou lista de exercício e ele não faz, e, quando faz, traz tudo errado. Eu fiz a minha parte". É essa a realidade atual de ensino, de relacionamento e de gestão omissa na educação brasileira.

Sabe-se que a escola é um campo em que tanto a criança como o adolescente ampliam suas relações e atuam de forma a fortalecer seus papéis em um novo ambiente. "Trata-se de um lugar de diversidades (...). Nele, a criança amplia suas referências, antes apenas familiares, conhecendo e tendo maneiras diferentes de ser (...) de sua família. (...) É muito comum que apareçam questões na escola que não surgem em casa, pois é lá que elas têm a possibilidade de experimentar" (SANCHES, 2005, p.160).

Com toda a contribuição de vários pedagogos, filósofos, psicanalistas, que abriram caminho para vários estudos e questionamentos, situo este relato a partir de uma psicanálise que justifica os primeiros cuidados como um terreno sólido para um psiquismo saudável. Os demais estudiosos focalizaram a adolescência no instante em que ela chega, sem apoiar-se no papel da mãe, em um ambiente sustentador que possibilite que as principais necessidades sejam reconhecidas e atendidas.

Para que a adolescência seja estudada, um longo caminho no desenvolvimento humano deve ser percorrido, ou seja, uma linha da vida deve ser estudada. Ao focar minha atenção sobre Winnicott (1896-1971), destaco que esse pediatra inglês, que se tornou psicanalista, iniciou seus trabalhos e o aprofundamento em psicanálise analisando bebês e suas mães. Winnicott tem sido considerado, atualmente, um clássico da teoria psicanalítica, e sua obra tem apontado aspectos que não haviam até então sido considerados, aspectos que não dizem respeito à sexualidade. Winnicott apresenta uma teoria dos cuidados, de um ambiente satisfatório e preventivo na etiologia de transtornos mentais.

Além disso, alguns autores têm considerado que a obra de Winnicott reformulou profundamente a psicanálise (LOPARIC, 2001, 2006; DIAS, 2003; ABRAM, 2008), apresentando uma teoria do amadurecimento afetivo que é mais ampla que a teoria da sexualidade. Dias afirma:

Ela [a teoria do amadurecimento pessoal] serve, portanto, de guia prático para a compreensão da saúde, assim como para a detecção precoce de dificuldades emocionais, podendo ser útil não só para os psicanalistas e psicoterapeutas, mas também para as mães e pais preocupados em facilitar o amadurecimento pessoal de seus filhos, para os profissionais cujo trabalho afeta, em algum nível, o desenvolvimento emocional de bebês, crianças, adolescentes e adultos e, igualmente, para todos os que foram alertados para a necessidade de se pensar em atividades e políticas de prevenção na área de saúde psíquica (DIAS, 2003, p.14).

A psicanálise winnicottiana é pouco conhecida no campo da educação, e os espaços de formação incluem a prática pedagógica e o desempenho do aluno, sendo que muito pouco é estudado e discutido sobre a Psicologia no ambiente escolar/acadêmico; sua obra apresenta uma compreensão sobre infância, adolescência e maturidade sem a fixação na sexualidade como única raiz na compreensão da origem de perturbações emocionais.

Winnicott tem algo diferente a dizer, com um estudo objetivo da natureza humana que contribuiu para a prevenção de diversas doenças mentais, um verdadeiro acréscimo para a família e a sociedade (OUTEIRAL; HISATA; GABRIADES, 2001, p. 325).

Pretendo, então, comentar algumas das principais contribuições de Winnicott para a compreensão das dinâmicas psicoafetivas que ocorrem nessa fase do amadurecimento, especialmente as que podem ajudar os educadores e o ambiente escolar no cuidado com os adolescentes, bem como enfatizar a importância da Psicologia no contexto educacional e de que modo os cursos de graduação podem preparar um profissional para essa área. Para tanto, dediquei-me a interpretar o que vivenciei em minha experiência como pano de fundo, no contato com meus alunos adolescentes, fazendo uma leitura crítica dos fatos observados e vivenciados.

Creio que este relato de experiência possa promover o debate, um novo olhar para observar, pensar, refletir e tentar compreender adolescentes e possibilitar construir outros modos de relacionamento no ambiente escolar, estratégias diferentes para os educadores, novas indagações e descobertas, repensando a escola como ambiente no cenário atual.

As proposições de Winnicott parecem abranger não somente a psicanálise praticada nos consultórios particulares mas também nas mais diversas práticas institucionais, como escolas, abrigos, centros comunitários, centros de saúde, no atendimento de crianças, adolescentes, adultos, idosos e famílias.

Para isso, apresentarei algumas das principais características da teoria do amadurecimento pessoal do autor. Nessa perspectiva, o amadurecimento segue uma linha que vai da dependência absoluta do início para a independência relativa da maturidade. Esse processo é impulsionado por duas tendências básicas: a necessidade de ser e a tendência inata à integração. O bebê nasce extremamente imaturo, e sua existência depende totalmente do ambiente, seguindo uma série de conquistas ou integrações que o levarão a ser uma pessoa inteira que se relaciona com os outros como pessoas inteiras. Esse ambiente é a mãe, que, inicialmente, deve possuir uma identificação com seu bebê e atendê-lo nas suas necessidades.

Em toda a sua obra, o autor enfatiza o papel de uma mãe suficientemente boa (WINNICOTT, 1990), uma pessoa capaz e preparada para reconhecer a fragilidade e a dependência do seu bebê, segurando, amparando, adaptando-se para sustentar o que ele chamava de "ser em desenvolvimento", nos estágios mais precoces da vida. Esses estágios iniciais são fundamentais para que o bebê se integre e transforme essas integrações em conquistas para o amadurecimento pessoal.

Para o autor, a saúde mental (WINNICOTT, 1990) de um indivíduo é fundada pela mãe em sua experiência de vida e de cuidados com seu bebê, pois ela é o primeiro ambiente que se apresenta a ele. Se o ambiente não for satisfatório, rompese a linha da vida, e as tendências herdadas não podem levar a criança à plenitude pessoal. Toda criança possui uma linha de vida que começa no nascimento, sendo missão de seus cuidadores zelar para que essa linha não se rompa (WINNICOTT, 2005a, p.249).

Linha de vida, aqui, refere-se à continuidade de ser, e tudo o que divide a existência da criança em fragmentos é prejudicial para seu desenvolvimento integrado. Não é preciso ser nenhum especialista para perceber que lares alcoólicos, violência doméstica, abusos, separações ininterruptas, pais com variações de humor, etc, são exemplos de situações que promovem esse rompimento da continuidade de ser.

Ao indicar quais são as fases desse amadurecimento, Winnicott (1990, p.127) relaciona as seguintes fases: a da dependência absoluta (mais ou menos os quatro primeiros meses de vida do bebê), a da dependência relativa (incluindo a fase do desmame, da transicionalidade, do uso do objeto e da conquista do EU SOU), a fase rumo à independência (também denominada fase do concernimento), com a entrada, ao final dessas fases, na fase edípica e no período da latência, seguindose, então, a adolescência, a fase de maturidade e a velhice. Não será o caso aqui de retomar cada uma dessas fases, mas de, tendo essa linha em mente, considerar o que Winnicott afirmou sobre a adolescência com base nessas referências.

Um fator importante será considerar que o adolescente, para Winnicott, retoma todas as dinâmicas que caracterizam as fases anteriores, acrescidas de potências que não estavam presentes na primeira infância: a potência física para agredir e procriar (WINNICOTT, 1971). Com tais referências, será possível compreender as principais afirmações que fez diretamente sobre adolescência, entre elas: que a principal característica do adolescente é a sua imaturidade, que o adolescente é um ser isolado, que deseja ser alguém em algum lugar, que não aceita falsas soluções, que a cura e a superação desse período vêm com o passar do tempo (desde que existam cuidados ambientais adequados), além de algumas indicações sobre como deve ser o ambiente para os adolescentes, sobretudo o ambiente familiar, a escola e outros grupos.

Comentarei o que resulta para os educadores dessas contribuições de Winnicott e como as apliquei em meu trabalho, explicitando o aspecto da sustentação afetiva, as relações pessoal, comunicativa e verdadeira, dos ambientes escolar, familiar e grupal, entre outros, e no trato com os adolescentes.

 

A ADOLESCÊNCIA PARA WINNICOTT

Winnicott considera a adolescência o momento em que esses estágios (WINNICOTT, 2005a) são revividos, são acrescidos de outras dinâmicas visando a alcançar a maturidade, isto é, um recomeço quanto à adaptação do ambiente e aos cuidados da provisão ambiental.

Os estágios do processo de amadurecimento são retomados, mas acrescidos de um poder instintual (força física e sexual) que não existia anteriormente (WINNICOTT,1971).

Seguindo o pensamento winnicottiano, a adolescência (DAVIS; WALLBRIDGE, 1982, p. 95) é um momento de se fazer uma nova adaptação à realidade, e a vulnerabilidade do eu ocasiona uma nova dependência em relação aos cuidados, ao amparo e à sustentação do ambiente, pois o adolescente, por ser imaturo, padece do sentimento de irrealidade, e sua luta indica este caminho: ser alguém e constituir-se em um eu dentro de um grupo, por meio de um ambiente firme, seguro e suficientemente bom.

Juntamente a isso, surgem a astúcia, a arrogância, a hostilidade, a mentira, as ironias e a necessidade de confronto com a sociedade. Dias declara: "O que aponta o fato de que o adolescente repete os padrões dos estágios primitivos é que ele padece do sentimento de irrealidade, e sua principal luta diz respeito a sentir-se real" (DIAS, 2003, p. 293).

E não há como evitar, retardar ou impedir esse processo, já que ele é natural e necessário para se chegar à maturidade. No entanto, é um processo que pode ser interrompido por invasões e intrusões devido à falta de provisão ambiental, ou seja, as pessoas que compõem o ambiente (pais ou substitutos) devem estar sempre presentes, transmitindo preocupação e demonstrando que estarão por ali caso o adolescente precise de ajuda, de amparo, bem como para perceber as suas necessidades. Em relação a esse aspecto, declara o autor: "De fato, existe somente uma cura real para a adolescência: o amadurecimento. Isso e a passagem do tempo resultam, no final, no surgimento da pessoa adulta" (WINNICOTT, 2005a, p.163).

Mas não basta apenas esperar o tempo passar, pois o ambiente deve substituir os cuidados característicos análogos aos das fases primitivas do desenvolvimento por meio da provisão ambiental, da presença e da demonstração de preocupação, de afeto por parte dos pais. Winnicott faz comentários sobre esse aspecto:

Não devemos tentar curar adolescentes como se estivessem sofrendo de alguma doença psiquiátrica. Utilizei a frase 'tédios de adolescente' para descrever os poucos anos em que cada indivíduo não tem outra saída a não ser esperar, e ainda assim fazê-lo sem ter consciência do que está acontecendo (WINNICOTT, 2005b, p. 221).

Winnicott afirma que a principal característica do adolescente é a sua imaturidade: "A imaturidade é uma parte preciosa da adolescência" (WINNICOTT, 1971, p.198). Essa imaturidade aparece tanto na oscilação entre ser e não ser dependente quanto na falta de compreensão do ambiente como um todo. A imaturidade também torna possível que muitas experiências e muitas propostas mais criativas possam ser feitas, e Winnicott considera que essa possibilidade é algo que pode contribuir para o próprio desenvolvimento da sociedade: "Nela [na imaturidade do adolescente] estão contidos os aspectos mais excitantes do pensamento criativo, sentimentos novos e diferentes, idéias de um novo viver. A sociedade precisa ser abalada pelas aspirações daqueles que não são responsáveis" (WINNICOTT, 1971, p.198).

O autor também declara que "o menino ou a menina adolescentes não querem ser entendidos, pois essa é uma fase que precisa ser efetivamente vivida e é essencialmente uma fase de descoberta pessoal. Cada ser humano vê-se engajado numa experiência viva, num problema de existir" (WINNICOTT, 2005a, p.115). Os adolescentes estão se adaptando a um novo modo de estar no mundo, não só a um novo corpo, em virtude das transformações biológicas, mas a um novo modo de estabelecer relações, e precisam de provisões ambientais quanto às suas necessidades instintuais, relacionais, ideológicas, etc.

O autor cita em suas obras as principais necessidades dos adolescentes: a necessidade de evitar a falsa solução (WINNICOTT, 2005a, p.123), a necessidade de sentir-se real, a necessidade de ser rebelde em um contexto que, confiadamente, acolha também a dependência e a necessidade de aguilhoar repetidamente a sociedade (WINNICOTT, 2005a, p.123). Para tanto, necessita de ambiente confiável, estável, seguro, que saiba reconhecer as suas necessidades.

No entanto, apesar de toda essa vontade do jovem de conhecer e explorar situações, o adolescente é por si só um ser isolado: "O adolescente é essencialmente um isolado. Todo relacionamento entre indivíduos e, em última instância, toda socialização, parte de uma posição de isolamento" (WINNICOTT, 2005a, p. 118). Trata-se de um tipo de solidão que visa a encontrar a si mesmo. Winnicott expõe: "Essa preservação do isolamento é parte da procura de uma identidade e para o estabelecimento de uma técnica pessoal de comunicação que não leva à violação do self central" (WINNICOTT, 2005b, p.173). O autor comenta:

São as relações individuais, uma por uma, que levam finalmente à socialização. O adolescente está repetindo uma fase essencial na infância, pois o bebê também é um isolado, pelo menos até que seja capaz de estabelecer a capacidade de relacionamento com objetos que estão fora de seu controle mágico (WINNICOTT, 2005a, p. 165).

Os grupos de adolescentes são, para o autor, mais um aglomerado do que um grupo com identidade conjunta bem determinada: "Os grupos de adolescentes jovens são ajuntamentos de indivíduos isolados que procuram formar um agregado por meio de identidade de gostos" (WINNICOTT, 2005a, p.118).

Esclarecendo, os grupos de adolescentes podem ser comparados a um aglomerado de sujeitos isolados que desejam formar um agregado de seres por meio da similaridade de gostos, afinidades, ideias, modos de viver e de vestir comuns.

A base para a formação de grupos é a vida em família, e, sobre isso, o autor faz o seguinte comentário:

A base para a vida em grupo é a vida em família, e sabemos o quanto é conveniente para o adolescente que o lar original continue a existir, de modo que ele possa rebelar-se contra o mesmo tanto quanto utilizá-lo, de modo que possam ser feitas experiências com grupos diferentes e mais amplos sem a perda do grupo original [...] (WINNICOTT, 2005c, p.173).

Assim, para que essas ampliações de grupo ocorram e se estendam de modo saudável, o filho deve sentir segurança e apoio no grupo familiar. Sem essa confiabilidade mínima, o crescimento pessoal não ocorre de forma integral, mas com distorções.

O autor considera que o amadurecimento seja um tipo de expansão da vida e do ambiente familiar:

A criança precisa sair do colo da mãe, mas não daí para o espaço sideral; esse afastamento deve dar-se em direção a uma área maior, mas ainda sujeita a controle: algo que simbolize o colo que a criança abandonou. Uma criança mais velha foge de casa, mas só até a cerca do jardim. A cerca simboliza agora aquele aspecto do holding mais estreito que acabou de ser rompido: a casa, digamos. Mais tarde, a criança elabora tudo isso quando vai à escola e entra em relação com grupos fora do lar. Cada um desses grupos representa uma fuga de casa; mas, ao mesmo tempo, todos simbolizam esse lar que foi deixado para trás e, na fantasia, destruído (WINNICOTT, 2005c, p. 132).

No entanto, isso só pode acontecer se o ambiente no qual a criança e o adolescente vivem oferecer as condições de sustentação para tal. É óbvio que lares com representação alcoólica, repletos de intrigas e desavenças, violência doméstica e variações de humor dos pais ou cuidadores provocam essa perturbação e a desconfiança do filho em relação ao ambiente, pois este o desaponta e não o atende nas suas necessidades. Pode-se crer que o que Winnicott fala sobre crianças também se aplica, nesse ponto específico, também aos adolescentes: "O ambiente caótico significa, para a criança, imprevisibilidade. [...] O ambiente frustrador produz confusão mental, e a criança poderá desenvolver-se permanentemente confusa, nunca organizada, no sentido de orientação" (WINNICOTT, 2005a, p.254).

 

A ESCOLA COMO AMBIENTE

Fica evidente, na obra de Winnicott, a importância do ambiente na sustentação psíquica da vida do indivíduo. E um dos ambientes em que os adolescentes vivem boa parte de seu tempo é a escola.

...chego à seguinte conclusão: se aceitarmos como correta a identificação entre saúde e maturidade relativa, devemos ter como certo que o indivíduo só possa atingir sua maturidade emocional num contexto em que a família proporcione um caminho de transição entre o cuidado dos pais (ou da mãe) e a vida social. E deve-se ter presente que a vida social é em muitos aspectos uma extensão das funções da família (WINNICOTT, 2005c, p. 136).

É fato que a escola é um campo em que a criança e o adolescente ampliam suas relações e atuam de forma a fortalecer seu papel em um novo ambiente. Sanches comenta sobre isso:

Trata-se de um lugar da diversidade e diferenças entre as crianças. Nele, a criança amplia suas referências, antes apenas familiares, conhecendo e tendo acesso a formas e maneiras diferentes de ser daquelas da sua própria casa ou família. Exatamente por isso, a escola é um ótimo campo para as crianças experimentarem suas relações. É muito comum que apareçam questões na escola que não surgem em casa, pois é lá que elas têm a possibilidade de experimentar (SANCHES, 2005, p. 160).

Pais, professores, e todos os que fazem parte do ambiente do adolescente podem ser reconhecidos ora como pessoas com as quais se identifica e depende, ora como pessoas das quais ele precisa se afastar e se diferenciar. O importante é saber que o adolescente quer suas próprias respostas como afirmação e busca de si mesmo (WINNICOTT, 2005a, p.122). Torna-se fundamental um ambiente suficientemente bom e acolhedor, que substitua os cuidados característicos dos estágios primitivos de desenvolvimento.

Geraldina Porto Witter, em sua obra Psicologia e Educação, destaca:

Convém notar que dificilmente alguém consegue desenvolver algo que não conseguiu desenvolver em si mesmo, por exemplo, construir significados que não foi capaz de atingir, autonomia que não teve oportunidade de desenvolver e principalmente promover a aprendizagem de conteúdos que não teve chances de captar. Aí reside a importância de se buscar, caso não tenha ocorrido, desenvolver muito bem competências necessárias para bem se posicionar profissionalmente (WITTER, 2004, p.16).

Fica claro que a autora chama a atenção para o professor, principalmente no cenário escolar atual, desenvolver a capacidade de improvisação, de adaptação a situações novas, inesperadas, que exigirão do docente agilidade, praticidade, reflexão e discernimento quanto às decisões que irá tomar e aos objetivos a serem atingidos.

Observando-se atualmente a educação brasileira, nota-se que, principalmente nas escolas municipais e estaduais, o ambiente escola tornou-se um cenário de combate. Alunos de um lado, professores de outro, ambos em times opostos, e diretores e coordenadores no meio, sem saber exatamente de que lado ficam, pois esse ambiente tornou-se um lugar de sintomas, e profissionais da educação estão se sentindo desorientados, desafiados em relação às atitudes dos estudantes e sem expectativas de apoio, de melhorias na condições profissionais e salariais. No caso dos colégios particulares, o professor se sente acuado pelo poder que o aluno pagante exerce. Precisa-se pensar o que é hoje o ambiente escola.

Winnicott comenta sobre a função da escola:

Uma delas é o fornecimento, durante algumas horas diárias, de uma atmosfera emocional que não é a tão densamente carregada do lar. Isso propicia à criança uma pausa para o desenvolvimento pessoal. [...] A escola, que é um apoio, mas não uma alternativa para o lar, pode fornecer oportunidades para uma profunda relação pessoal com outras pessoas que não os pais (WINNICOTT, 2001, p. 217).

Sendo assim, essas oportunidades surgem com a presença dos professores, funcionários, alunos e com o estabelecimento de uma estrutura ambiental que garanta aos últimos a possibilidade de realização de experiências. Isso significa que a escola (SANCHES, 2005) tem que criar condições para o enriquecimento da capacidade criativa dos alunos, auxiliando-os, propiciando a comunicação, os debates e a convivência. A educação não ocorre somente na sala de aula, mas também na entrada, no intervalo, na biblioteca, nas gincanas, nas festas juninas e na integração escola-família.

Winnicott (2001, p.231) sempre se preocupou em falar para cuidadores em geral, como babás, enfermeiras, assistentes sociais, professores, mães, médicos, pois sabia da importância do suporte afetivo, e sua teoria permite essa abrangência de discussão no ambiente escolar, pois é uma teoria que trata das relações interhumanas, em termos dos seus afetos. Sanches, em Winnicott na Clínica e na Instituição, afirma:

A escola, de fato, está menos 'misturada' com as crianças do que as famílias. Dessa forma, é mais fácil para a instituição enxergar questões que os pais, tão diretamente ligados a elas, não têm possibilidade de ver. É como se a escola entrasse nas famílias como um olhar de fora, mais isento, mais objetivo, menos carregado de fantasmas (SANCHES, 2005, p.60).

Assim, aparecem fatos e comportamentos na escola que, muitas vezes, não ocorrem no ambiente familiar, e o professor, nesse caso, precisa ter um vínculo, um elo afetivo com seus alunos para perceber um grito de socorro, uma dificuldade, evitando sofrimento tanto para o aluno quanto para a família. Ele é um profissional (WITTER, 2004) que tem em suas mãos a tarefa de promover o desenvolvimento de seus semelhantes.

Desse modo, sabe-se que a atuação do docente (WITTER, 2004) depende de sua história de vida, trajetória escolar, formação acadêmica, autoeficácia, autocontrole e, essencialmente, de sua vida pessoal e familiar. Seu sucesso vai depender da atmosfera de trabalho que cria e na qual está inserido, dentro do sistema educacional. Sendo assim, a aula é um espaço humanitário criado por educador-educando, um momento de convivência, de trocas, de abertura para uma relação.

O autor comenta que há grupos de adolescentes cujos lares são satisfatórios e insatisfatórios (WINNICOTT, 2001, p. 234). O primeiro grupo compreende jovens que usam esses lares para seu desenvolvimento emocional, pois seus pais estão dispostos a identificar e a proporcionar o que necessitam. Nesse caso, a escola, para eles, torna-se um ambiente agradável, que acrescenta algo em suas vidas. Já em relação ao grupo de lares insatisfatórios, o autor declara:

Freqüentam-na com a idéia de que a escola talvez lhes forneça o que o lar não logrou propiciar. Não vão à escola para aprender, mas para encontrar um lar fora do lar. Isso significa que procuram uma situação emocional, um grupo de que gradativamente possam fazer parte, um grupo que possa ser testado por sua capacidade para enfrentar a agressão e tolerar idéias agressivas (WINNICOTT, 2001, p. 234).

Nota-se que os alunos do primeiro grupo necessitam de ensino, instrução e troca de experiências, e buscam isso na escola. Já os alunos privados de lares saudáveis necessitam de uma escola organizada, de regularização das atividades, de disposição de professores e de supervisões, ou seja, precisam de uma direção, algo que seus lares não possuem. Constata-se que, atualmente, grande parcela dos estudantes brasileiros pertence ao segundo grupo, por causa da desagregação familiar, de pais ausentes e despreparados para a função de educar, acompanhar, colocar limites.

Desse modo, a perspectiva winnicottiana coloca o ambiente como um fator de base e de suporte para as relações humanas. Mas isso dependerá muito de a estrutura do colégio estar ou não aberta a outros conhecimentos e estudos, principalmente de outras áreas, e se os vários segmentos do colégio (ensino fundamental I e II, ensino médio) possuem sincronia, se há ou não disputas entre professores, coordenadores e direção, se há participação e envolvimento dos pais em atividades e reuniões. Então, é o ambiente que precisa ser avaliado. A psicanálise winnicottiana pode ser uma perspectiva a mais de estudo e de compreensão para o campo da educação.

Considero fundamental a abertura das escolas para essas reflexões, e a teoria winnicottiana amplia o olhar do leitor no que se refere à sustentação ambiental, ao cuidar, ao manejo, podendo haver, com a sua utilização, um avanço na qualidade do atendimento e na supervisão dos alunos, bem como na melhora nas relações interpessoais com uma atuação mais preventiva de situações conflituosas. Como experiência própria, penso ser importante, algumas vezes, deixar o conteúdo de lado e realizar uma atividade de conversa com a classe, revelar nossos sentimentos, como estamos nos sentindo, o que os alunos têm a dizer, oferecer abertura para sugestões, trazer um tema de destaque social para a sala, usar uma estratégia que tenha a cara da turma e aplicá-la.

Mas, para isso, o professor deve fazer uma boa e criteriosa avaliação diagnóstica da classe, traçar o seu perfil, identificar quais atividades podem ser exploradas e quais não dão certo. Considero que seja um desafio para o docente que, sobrecarregado de horas/aula, de provas a serem corrigidas, de conteúdos a serem atingidos e assimilados, de pressões por parte da diretoria e da coordenação e com muitas turmas, sem saber exatamente o nome de cada aluno, desenvolver essa capacidade de prestar atenção ao jovem, perceber a necessidade de uma classe quanto a uma atividade que pode fazer florescer ideias, trocas e debates. Isso é cuidar, na obra winnicottiana, é saber segurar o aluno, ampará-lo, ter jogo de cintura (manejo) para mudar o foco de uma atividade que não está dando resultado e modificá-la com outra estratégia, de modo que ele possa extrair de si mesmo ou desenvolver seu potencial criativo, apresentar a ele condições para que seu potencial seja expresso.

Ao ingressar no colégio, em 2006, percebi e senti muita indisciplina e hostilidade de algumas classes. Fui, em muitos momentos, desafiada e ridicularizada por alunos adolescentes que agiam individualmente e em grupo. Senti que, se demonstrasse impotência e fraqueza, estaria no domínio do grupo. A teoria de Winnicott me auxiliou a perceber que o ambiente e as pessoas que o compõem (familiares, educadores, amigos, etc.) devem ter um relacionamento pessoal e afetivo. Não se trata de uma técnica (no sentido mecânico) dos cuidados, mas das efetivas relações inter-humanas marcadas pela comunicação e pela proximidade emocional, sem que isso signifique aceitar tudo que o adolescente faz. Mas eu precisava melhorar a qualidade no relacionamento com os alunos e conseguir dar uma aula, pois os próprios coordenadores também estavam perdidos e sem recursos pessoais, profissionais para intervenção.

A questão que se coloca ao ambiente é a de sustentar o adolescente no seu amadurecimento, reconhecendo sua condição de imaturidade, de necessidade de enfrentamento, de agrupamento e poder, nessa experiência de comunicação verdadeira, de colocar-se no lugar em que ele precisa, seja para fornecer colo, seja na dependência, seja para oferecer um enfrentamento firme e afetivo.

Ao mostrar-me firme, presente, pude reconhecer exatamente o que aqueles alunos precisavam em termos de atividades, de formas de relacionamento, porque essa atitude de testar o professor é, na verdade, uma afirmação de si mesmo. O que estava em jogo era a nossa relação, e disso somente nós (os alunos e eu) poderíamos cuidar. Ao final de dois anos, nosso relacionamento interpessoal melhorou significativamente, com resgate do respeito a minha pessoa, bem como com a participação dos alunos nas aulas. Tive que adquirir uma versatilidade, uma plasticidade em termos de pensamentos, atitudes, posturas, estratégias e dinâmicas vivenciais que me conferiram significados e me trouxeram transformações pessoais e também na qualidade das minhas aulas. É evidente que há casos isolados e que requerem intervenções e encaminhamentos para profissionais especializados, mas senti que eles reconheceram que eu estava lá para entendê-los, para relacionar-me, para ter uma relação autêntica, para trocar experiências e aprender também a ouvi-los.

 

A PSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO

Em todos os aspectos citados até o momento, fica evidente o valor da Psicologia para o contexto educacional, pois ela permite melhor instrumentalização do profissional envolvido para conseguir desenvolver um trabalho de melhor qualidade técnica e humana, superando os obstáculos que fazem parte desse campo.

Geraldina Witter destaca os sinais impressos da Psicologia na educação:

Claramente, observa-se que os pressupostos do desenvolvimento da aprendizagem, do comportamento e da personalidade humana oferecem o embasamento necessário para, com segurança, orientar a elaboração de metodologias de ensino mais eficientes, efetivas e relevantes, que viabilizam o professor desenvolver um trabalho de melhor qualidade, ou seja, que satisfaça todos os que dele estejam a participar (WITTER, 2004, p.28).

Destaca-se então a promoção da aprendizagem como principal tarefa do professor. Esse é um aspecto que deve ser considerado pelo profissional de Psicologia que tem a intenção de atuar nesse campo, pois a aprendizagem constitui um dos temas centrais da Psicologia educacional, e esta, como ciência, pode oferecer a oportunidade de melhor visualizar e solucionar os problemas que permeiam a sua atividade.

Lima (2001) destaca que essa ciência oferece o apoio necessário aos profissionais da área quanto às atitudes que possam contribuir para a melhoria do desenvolvimento psicossocial do aluno, além dos imensos desafios que fazem parte do cotidiano escolar, como famílias desestruturadas, pobreza, desemprego, miséria, violência doméstica, alcoolismo, alienação e omissão dos pais quanto à escola e à vida escolar dos filhos, gravidez na adolescência, delinquência e assim por diante.

Assim, a escola preenche uma fase essencial na vida de uma criança; sua função é favorecer seu desenvolvimento integral, e isso se faz com relacionamentos saudáveis do aluno com os profissionais e com as demais pessoas que o acompanham nessa fase.

Para tanto, o preparo dos profissionais deve ocorrer desde a graduação, explicitando, esclarecendo os desafios, as conquistas e a reflexão sobre a atuação nesse ambiente. Nas graduações atuais do curso de Pedagogia, muito pouco é esclarecido sobre a atuação do profissional de Psicologia, por se tratar de um meio que ainda oferece muita resistência em relação à presença do psicólogo. Profissionais da área sentem uma ansiedade persecutória diante de um psicólogo, pois consideram que serão julgados em suas estratégias, atitudes, modos de condução da aula e relacionamento interpessoal. No entanto, há colégios da rede particular que permitem uma troca entre professores e Psicologia, através de palestras para pais, professores e alunos, oficinas, cursos. Há uma grande luta para que a Psicologia retorne ao ensino médio, oferecendo mais reflexão, senso crítico, debates aos alunos.

O enfoque dado à Psicologia da Educação nos cursos de graduação possui unanimidade quanto às disciplinas: behaviorismo (Skinner, Pavlov e outros), psicogenética, de Piaget, abordagem socio- interacionista, de Vygotsky, e Wallon. A seguir, passa-se rapidamente pela teoria humanista de Carl Rogers, pela teoria da Gestalt (teoria de campo de Kurt Lewin), pela teoria das necessidades humanas, de Maslow, pela didática, pela história da educação e pela filosofia da educação.

Esses são os aspectos teóricos da área, mas o principal seria enfatizar para os alunos uma qualidade fundamental para quem deseja enveredar para o campo da educação: a curiosidade. Um professor, psicólogo educacional ou orientador educacional não podem ser acomodados, presos às estratégias antigas e defasadas, pois, ao se deparar com o aluno, o professor precisa pensar porque irá enfocar esse ou aquele assunto, se alcançou ou não seus objetivos e, se necessário, ter muita flexibilidade para perceber se a turma está respondendo ou não. Um psicólogo precisa conhecer a história pessoal desse aluno, buscar proximidade com a família, e isso exige paciência devido ao fato de as tentativas serem, na maior parte dos casos, evitadas ou frustradas pela indiferença e pela falta de participação e de envolvimento dos pais.

Bzuneck (1999) destaca:

...professor reflexivo é aquele que pensa sobre o seu trabalho, analisa suas soluções, inventa e é intelectualmente curioso, o que, de resto, supõe que ele seja socialmente comprometido e até apaixonado pela sua função e que não se contente com soluções pré-programadas (BZUNECK, 1999, p. 51).

Assim, esclarecer que a escola, atualmente, tornou- se um local de depósito de insatisfações por parte do corpo docente e dos gestores, de trocas de acusações entre professores e pais, de hostilidade entre alunos e professores, e um psicólogo presente nesse contexto aumentaria as chances de contenção, de localização e de reflexão sobre esses conflitos. Para tanto, políticas educacionais deveriam atentar para essa urgência, para a saúde mental e coletiva dos grupos citados, para a qualidade dos relacionamentos e, em consequência, para melhor aprendizagem, já que, como se sabe, afetividade e aprendizagem caminham juntas.

Desse modo, espera-se que o profissional dessa área atue de modo a transcender seus limites, e são muitos os alunos com os quais irá relacionar-se no dia a dia, cada um carregando consigo seus interesses, motivações, afetividade, personalidade, níveis de estresse, distúrbios psicológicos e vivências diversas, ficando clara a necessidade de saber identificar esses fatos, a importância de se dar a eles o tratamento adequado. A Psicologia pode auxiliar o profissional que se preocupa com essa realidade ao detectar os problemas, defini-los, compreendê-los e buscar instrumentos para as soluções práticas.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A teoria do amadurecimento pessoal, de Winnicott, revela que, quanto mais precoce a resposta do ambiente a dificuldades, maiores as possibilidades de evitar que estas se solidifiquem em estruturas somáticas, tornando a escola o contexto propício para o reconhecimento das necessidades e das dificuldades, abrindo espaço e caminho para o ajuste das respostas ambientais às necessidades dos alunos.

Pode-se dizer que Winnicott possui uma teoria da adolescência que serve de guia e de orientação para os educadores e constitui uma contribuição ao campo social. Seus estudos e observações referem-se a um tipo de experiência da natureza humana que pode ser encontrada em todo indivíduo, independentemente da cultura na qual está inserido, pois são questões que fazem parte da constituição psíquica do ser, das experiências de sentir-se real, da continuidade de ser, ou seja, constitui a provisão ambiental que lança e solidifica essas bases.

Posso dizer que aprendi na função docente, no confronto de ideias e ações, experimentando, acertando, errando e consertando, estudando e aplicando novas estratégias, clareando, assim, fatos e situações, exercitando a minha prática e testando-a no relacionamento com meus alunos. No entanto, essa aprendizagem implica ter a experiência como ponto de partida e chegada pelo fato de que aprender envolve uma apreensão de fatos cognitivos e afetivos e tem que fazer sentido para o professor, mobilizando interesses, expectativas e motivação, pois, caso contrário, seria um acúmulo de conteúdo sem efeito, e só fica o que tem significado.

Aprender, como afirmam Placco e Souza (2006),

...supõe aceitar que não se sabe tudo, ou que se sabe de modo incompleto ou impreciso ou mesmo errado, o que é doloroso; de outro, relaciona-se ao prazer de descobrir, de criar, de inventar e de encontrar respostas para o que se está procurando, para a conquista de novos saberes, de ideias e valores (PLACCO; SOUZA, 2006, p.20).

Ser confrontado por um adolescente exige firmeza do adulto em estar preparado para ver e ouvir insultos, para ser testado na sua autoridade (WINNICOTT, 1971). O desafio do confronto, a rebeldia, a ironia, o inconformismo do adolescente citados em O Brincar e a Realidade vão sempre existir, uma vez que esse é um momento de amadurecimento e de encontro consigo mesmo. Para ilustrar, o autor afirma: "A confrontação tem de ser pessoal. Se é que os adolescentes querem ter a vida e vitalidade, os adultos são necessários. A confrontação é própria da contenção que não é retaliatória, nem vindicativa, mas possui sua própria força" (WINNICOTT, 1971, p. 202).

É um desafio para os professores de adolescentes estarem prontos e firmes para receberem esse confronto, elaborá-lo e devolvê-lo sem retaliação. A indisciplina é não só um pedido do jovem para a imposição de limites e a contenção mas também o encontro e a autoafirmação (WINNI-COTT, 2001).

Se a família não pode sustentar psiquicamente e acolher esse adolescente, a escola pode e deve realizar esse trabalho, já que é nesse ambiente que o jovem irá testar toda a sua potencialidade e exercer seu papel social de estudante.

Ler e estudar Winnicott auxiliou-me a ampliar, a reconhecer e a atuar de forma preventiva nos relacionamentos, e ajudou tanto professores, coordenadores e, principalmente, os alunos, em uma perspectiva que valoriza a figura do adolescente e suas necessidades, melhorando, assim, a qualidade do nosso relacionamento e a participação nas aulas.

A escola é um contexto rico para o reconhecimento das necessidades e das dificuldades dos alunos, e deve abrir espaço para discussão, estudo e caminho para ajustes e reflexões, mesmo que parciais, para o acolhimento das respostas ambientais às necessidades dos adolescentes.

Assim como a relação mãe-bebê é de reciprocidade, de atendimento e suprimento, a relação educador-educando deve ter um vínculo afetivo que proporcione uma ampliação da escola como um ambiente de suporte, de experiências, de trocas, de interações que possibilitem aos adolescentes a expressão do ser em si mesmo, por meio do gesto de criação, do potencial criativo, do modo como pensam e sentem.

Creio que este relato de experiência possa abrir caminhos para modificar o que já é estudado, conhecido e vivenciado, possibilitando uma atuação mais preventiva e afetiva dos educadores, pois é assim que progredimos, na interação, na experiência e no desencadeamento de ações, motivados por um desejo: o de aprender, e gostar de aprender é querer se transformar.

 

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Recebido em: 13/07/2010
Aceito em: 09/08/2012

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