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Revista Brasileira de Psicanálise

versão impressa ISSN 0486-641X

Rev. bras. psicanál vol.47 no.2 São Paulo abr./jun. 2013

 

ARTIGOS TEMÁTICOS: O PENSAMENTO CLÍNICO E O CONTEMPORÂNEO

 

O trabalho entre banalização do mal e emancipação

 

The work between the banalization of evil and emancipation

 

El trabajo entre la banalización del mal y la emancipación

 

 

Christophe DejoursI; Tradução Claudia Berliner

IMembro da Association Psychanalytique de France APF, professor titular da cadeira Psychanalyse-Santé-Travail no Conservatoire National des Arts et Métiers/Paris, autor de O corpo entre a biologia e a psicanálise (1988) e Trabalho vivo (2012)

Correspondência

 

 


RESUMO

O artigo retoma as questões levantadas por Freud em "O mal-estar na civilização" (1930/1994) para reuni-las em torno da clínica do trabalho contemporâneo. Se o trabalho pode gerar o que há de melhor em termos de sublimação e de autorrealização, pode também gerar o pior, qual seja: a banalização do sofrimento infligido ao outro, que leva alguns indivíduos a não encontrar outra saída senão o suicídio no local de trabalho. Será que os novos métodos de organização do trabalho favorecem o consentimento com práticas que, no entanto, condenamos moralmente?

Palavras-chave: trabalho; sublimação; sofrimento ético; banalidade do mal; solidão; clivagem; autonomia moral.


ABSTRACT

The article picks up on matters brought to light by Freud in "Civilization and Its Discontents", in order to gather them around the clinic of contemporary work. If work can generate the best in terms of sublimation and self-realization, it can also generate the worst: the banalization of suffering inflicted on others, which leads certain individuals to find no way out other than committing suicide at their work places. Could it be that the new methods of work organization favor consent towards practices which, on the other hand, we morally condemn?

Keywords: work; sublimation; ethical suffering; banality of evil; loneliness; division; moral autonomy.

 


RESUMEN

El artículo retoma las cuestiones levantadas por Freud en “El malestar en la cultura” para reunirlas en torno a la clínica del trabajo contemporáneo. Si el trabajo puede generar lo mejor en términos de sublimación y autorrealización, puede generar también lo peor, ya sea: la banalización del sufrimiento infligido al otro, que lleva a algunos individuos a no encontrar otra salida que no sea el suicidio en los locales de trabajo. ¿Será que los nuevos métodos de organización del trabajo favorecen el consentimiento con prácticas que, sin embargo, condenamos moralmente?

Palabras clave: trabajo; sublimación; sufrimiento ético; banalidad del mal; soledad; división; autonomía moral.


 

 

Introdução

A aptidão para a violência pode ser encontrada em quase todos os seres humanos, o que não é novidade alguma. Problemático é apenas o gigantismo que a violência humana pode atingir se comparada ao que se observa no resto do reino animal. Em outras palavras, contrariamente ao que sugerem vários textos filosóficos, o refinamento e a monstruosidade da violência humana não provêm dos resíduos de animalidade depositados no homem pela filogênese, mas, ao contrário, do que nele há de mais humano: o sexual.

É a erotização que permite ao homem multiplicar ao infinito sua violência e sua brutalidade. Se, como não faltam motivos para crer, o sexual humano não é o instinto de reprodução, mas extrapola este último por todos os lados pelo simples fato de pertencer à ordem da fantasia, entende-se que a erotização da violência, ou seja, o sadismo, possa gerar formas infinitamente renovadas de monstruosidade, como só a fantasia é capaz de fazer. É por isso que, em sua análise da violência, Jean Laplanche introduz o conceito de "pulsão sexual de morte" (Laplanche, 1997).

Agora, se ampliarmos o problema para o da formação da violência de massa ou da violência organizada em sistema, as coisas se complicam singularmente, mas não é algo de que a psicanálise possa dar conta. Com efeito, não é da natureza, e sim da cultura, que os povos extraem a capacidade de aumentar cada vez mais sua violência e seu poder de massacrar: a guerra, bem como o totalitarismo, são produções culturais! Em nenhum outro lugar do reino vivo encontra-se configuração análoga. Mas o estudo dessa questão compete às ciências sociais, e não à psicanálise

Do homem, não se pode ter uma concepção irenista. Seja qual for a abordagem disciplinar adotada, verifica-se que o homem tem uma profunda inclinação para a violência na esfera privada, e para a guerra na esfera social.

Aceitas essas premissas, o problema teórico mais importante certamente não é o da aptidão para a violência, mas aquele que deste se deduz por meio de uma inversão: de que recursos psíquicos um sujeito precisa para poder resistir ao apelo da violência quando tudo o impele a ceder?

 

A banalização do mal

O mundo todo sabe que a relação subjetiva com o trabalho conheceu, no final do século XX, uma rápida degradação. Ao mesmo tempo em que a produção, a produtividade e o enriquecimento crescem sem parar em nossos países, entramos em uma regressão que faz surgir o espectro de uma destruição organizada tanto da subjetividade quanto da possibilidade de convivermos. Esta regressão já se traduz pelo aumento significativo das patologias mentais ligadas ao trabalho e pelo incremento da violência, primeiro entre aqueles privados de trabalho, mas também na cidade toda.

Embora essa evolução não seja similar àquela que precedeu o nazismo, é uma fase no processo de condutas humanas voltadas contra a civilização e de destruição da Kultur, é uma etapa na progressão de uma forma de barbárie que talvez desemboque no totalitarismo, talvez não. No trabalho, hoje, a pretexto de obter maior eficácia e competitividade, convocare uma massa de funcionários para colaborar com as estratégias da empresa, mesmo que com isso se inflija sofrimento e injustiça aos outros. Desses outros, consegue-se que sofram a injustiça sem lutar. E aqueles que restam são transformados em testemunhas que não prestam socorro às vítimas, testemunhas que não testemunham.

Na análise do processo em questão, a referência ao totalitarismo não ajuda, pois a colaboração da maioria dos agentes da empresa em atos que, no entanto, muitos deles reprovam é obtida sem exercício da violência: em caso de recusa a colaborar ou a se calar, ninguém é preso, ninguém sofre tortura, as famílias não são deportadas e não há campo de concentração.

Ao contrário do que dizem os slogans de nossos políticos e de nossos patrões, a guerra econômica não existe. O imaginário social - poderosamente orquestrado, é verdade - faz a metáfora passar por realidade, e a concorrência desenfreada, por uma guerra. Se fosse guerra, todos os abusos seriam, se não permitidos, ao menos desculpáveis. Mas não sendo guerra, os colaboradores são responsáveis pelo sofrimento que provocam ou ao qual não se opõem.

Ora, não há guerra, apenas um avanço exponencial da concorrência entre capitalistas. É algo totalmente diferente; não é guerra, é até o contrário: nos países do norte, gozamos de uma prosperidade, de um conforto e de uma riqueza nunca vistos desde o começo da História. E ao mesmo tempo, graças à colaboração das pessoas de bem, assistimos ao surgimento de uma nova pobreza e de um aumento da violência na cidade.

 

O exemplo do assédio moral

É conhecida a fortuna do livro de Marie-France Hirigoyen (1998) sobre o "assédio moral" no trabalho. Nele, ela descreve detalhadamente o gozo do perverso que humilha, insulta, desestabiliza e leva sua vítima à descompensação psicopatológica. E sua descrição é correta. Mas, como indicamos no começo desta exposição, explicar o gozo de fazer o outro sofrer não oferece dificuldade alguma e não traz algum mistério para o psicanalista. A questão é que esse livro passa ao largo do problema de fundo que o assédio moral levanta. O perverso que age na esfera privada não pode continuar com seu joguinho sem o consentimento de sua vítima. Esse consentimento pode provir do masoquismo, mas não necessariamente. De fato, existem outras fontes de submissão psicológica que não provêm do masoquismo, como a dependência afetiva ou as relações sociais de gênero e de dominação. O que falta no livro é precisamente o fato de que o assédio no trabalho ocorre em público, à vista e com o conhecimento da maioria, se não de todos. Considerando-se todos os meios de controle e de vigilância de que dispõem as instâncias de gerência, será possível que a hierarquia, como a autora tantas vezes afirma, não esteja a par dos abusos de um de seus funcionários?

A força do assédio decorre, ao contrário, justamente de seu caráter público. É isso, aliás, que faz dela um método, uma técnica até, e não um desregramento isolado: nada menos que um método de governo das empresas. O assédio é exercido contra uma vítima, sob o olhar dos outros que sabem, que veem e que se calam.

Mas por que é que eles não reagem? Por que não socorrem os perseguidos? Por que, quando a vítima procura seus colegas, ela percebe que eles se desviam, evitam-na até, fazem de conta que não sabem de nada, chegam a simular incredulidade? Por que, tratando-se de um colega de quem gostam, eles se recusam a dar o depoimento por escrito de que o inspetor do Ministério do Trabalho precisa para instruir seu processo?

 

O assédio: qual é a novidade?

É muito claro que o assédio descrito nas empresas não é novo nem recente. Sempre foi praticado no mundo do trabalho, desde a escravidão até as linhas de montagem de automóveis das fábricas Simca Chrysler, de sinistra memória. O que há de novo hoje é o desaparecimento da solidariedade. Se em outros tempos nem todos os assediados adoeciam, era porque havia um senso de justiça compartilhado em uma comunidade de sensibilidade e de indignação. Se hoje o assédio provoca tamanha devastação psicopatológica é porque se trata, sobretudo, de uma patologia da solidão ou, melhor ainda, da desolação, no sentido que Hannah Arendt dá a esse termo (Arendt, 1951/1972). Em Origens do totalitarismo, Arendt introduz a noção de desolação para distingui-la do isolamento e da solidão (que pode, às vezes, ser uma necessidade para pensar, deliberar e agir). "O que chamamos de isolamento na esfera política denomina-se desolação na esfera das relações humanas" (p. 225). A desolação remete à palavra "solo", "de-sol-ação", supressão, retirada do solo que serve de fundamento para a vida nas relações humanas.

Enquanto o isolamento diz apenas respeito ao terreno político da vida, a desolação diz respeito à vida humana como um todo... O que torna a desolação tão intolerável é a perda do eu, que, todavia, só pode ser confirmado em sua identidade pela presença confiável e digna de fé de meus iguais (pp. 226, 229).

As solidariedades não se dissolvem espontaneamente, e sim sob o efeito de estratégias precisas. Por falta de espaço, não explicitarei os métodos administrativos utilizados para quebrar as solidariedades - os mais poderosos já foram identificados faz alguns anos: em particular, a avaliação individualizada de desempenho (Dejours, 2010). O próprio estudo do assédio fornece um bom número de chaves. Basta o assédio de uma vítima ser oferecido à vista dos outros para que gere toda uma série de efeitos em cascata: o assédio, claro, não visa apenas à vítima; visa também às testemunhas.

Podemos invocar duas interpretações psicanalíticas para a submissão das testemunhas:

♦ a primeira consiste em fazer referência ao gozo: gozo provocado ou imposto, como nos filmes pornográficos, ao espectador, que é pego na armadilha de seu próprio gozo ante o sofrimento do outro. E ele se torna cúmplice;

♦ a segunda hipótese não vai tão longe: o consentimento não seria obtido por meio do gozo perante o sofrimento da vítima e da fascinação perante o sadismo do agressor, mas pelo medo que essa demonstração de poder suscita. Intimamente, o medo gera outra satisfação, a de escapar dessa situação temida. Em troca disso, as pessoas de bem se tornam testemunhas que não testemunham.

Se olharmos para o terceiro ator da cena, ou seja, para o agressor, a análise tampouco poupa as pessoas de bem. Com efeito, se todos os assediadores fossem perversos, não haveria nenhum mistério no recrutamento dos canalhas. Logicamente, porém, essa interpretação pelo gozo do perverso é insuficiente. Muitos funcionários da empresa recebem formações específicas, tanto para o assédio quanto para o manejo dos planos de demissão, tanto para os meios de contornar a legislação trabalhista quanto para não serem pegos pelos inspetores do Ministério do Trabalho. E entre eles não há apenas perversos. Muito pelo contrário! Há também boa gente. Quando você é empregado, tem de se mostrar realista, eficaz e, sobretudo, "corajoso". Chegamos aqui ao cúmulo da inversão da razão moral, quando a coragem consiste em mostrar aptidão para infligir sofrimento a outrem, sendo este outro inocente e indefeso.

Se temos de formular estes comentários sobre o assédio no trabalho não é porque a colaboração com o que se reprova seja misteriosa, mas porque levanta problemas psicanalíti-cos. Posso reprovar a prostituição e o comércio sexual com crianças e, no entanto, ir ao bordel ou ao Bois de Boulogne1. Posso reprovar o assédio e, no entanto, deixar que ele aconteça diante dos meus olhos sem me opor. Em outras palavras, posso clivar meu funcionamento psíquico em duas partes. Se sou perverso, apenas faço uso de meu modo de funcionamento habitual. E se não sou, esse pode ser um funcionamento ocasional, obtido por meio do medo e das defesas contra o medo. É o que alguns autores, na esteira de G. Pankow (1992), caracterizam com o termo de "clivagem forçada".

 

O problema do senso moral

O problema é que neste último caso, que não é o dos perversos, mas o das pessoas de bem designadas pelo nome de "colaboradores", há um resto. Diferentemente do perverso, as pessoas comuns têm um senso moral. E você não faz o que quiser com seu senso moral.

O resíduo da clivagem forçada é substancial. Consiste na descoberta de que não sou senhor de meus atos, de que sou um traidor de mim mesmo e de meus ideais. Travo, assim, conhecimento com minha covardia. Denominamos o sofrimento resultante dessa experiência da covardia e da submissão de sofrimento ético, para distingui-lo do sofrimento moral - esta última expressão fazendo parte, há séculos, da terminologia psicopatológica, sinônimo de sofrimento psíquico. O sofrimento ético é grave porque atinge em cheio a questão da identidade, da ipseidade e do narcisismo, que provisoriamente consideraremos como um todo.

O risco implicado no sofrimento ético é nada mais nada menos que a perda do amor de si, com todas as consequências psicopatológicas desastrosas disto. É o que há de mais grave, se concordarmos não só que o amor de si é o esqueleto da saúde mental, mas também, como afirma Jean-Jacques Rousseau - e como o comenta Paul Audi (1997) na perspectiva de Michel Henry -, que o amor de si é a condição sine qua non do amor pelo outro (a compaixão, no léxico de Jean-Jacques Rousseau): "quem se basta a si mesmo não quer prejudicar ninguém" (1959, p. 790, itálico do autor)2.

Pois o acesso ao outro como sujeito sofredor, isto é, o amor pelo outro, só pode se dar pelo que, no amor de si, o excede e o extrapola, ou seja, pelo que tem a ver com a superabundância do amor de si.

O preço a pagar pelo sofrimento ético - como se nota com frequência nos últimos anos no mundo do trabalho - é o ódio de si, o desespero. É por isso que, nos últimos quinze anos, apareceram tentativas de suicídio e mesmo suicídios consumados até nos locais de trabalho. Com o ódio de si vem também a erosão da "compaixão" rousseauniana e, no mesmo movimento, na sequência, inevitavelmente, o desmoronamento da solidariedade.

 

O problema da clivagem

Como fazem os outros, aqueles que não descompensam, para manter a clivagem e conter o sofrimento ético dentro de proporções compatíveis com a vida?

O único caminho que conseguimos identificar passa pelo entorpecimento intencional do pensamento para impedir o acesso do sofrimento ético à consciência: isolar-se de uma parte de si para se anestesiar. É algo possível de se fazer e várias estratégias já foram descritas. Uma delas consiste em se atarefar, em sobrecarregar o aparelho psíquico por meio de um ativismo profissional frenético, por meio do zelo no cumprimento da tarefa. Para não pensar mais, a pessoa se embrutece pelo excesso de atividade; mas ela não pode parar. É uma estratégia custosa e pouco sutil, que se resume a uma espécie de esgotamento voluntário.

A outra estratégia foi analisada pela psicologia cognitiva e social experimental com o nome de "dissonância cognitiva" (Festinger, 1957; Joule & Beauvois, 2002). No lugar de seu próprio pensamento, o sujeito recorre a um pensamento emprestado, isto é, a um conjunto de pensamentos prontos para o uso, fornecidos de fora, pelo imaginário social, pelos meios de comunicação, pela opinião pública: "É a guerra econômica" (Édith Cresson, Jean-Pierre Chevènement); "É o fim do trabalho" (André Gorz, Dominique Méda, M. Rocard, J. Rifkin); "É a globalização do mercado", "Os empregados são preguiçosos e rentistas", "O estado de bem-estar social está ultrapassado", "Os desempregados são uns aproveitadores", "Foi-se o tempo de gente folgada", "É preciso selecionar", "O excesso de gordura tem de ser cortado" (Alain Juppé); "Eliminar a gordura do mamute" (Claude Allègre)... Todos estes são estereótipos para racionalizar e acalmar a dissonância cognitiva.

 

O tribunal da subjetividade

O problema que gostaria de discutir é o dos recursos psíquicos que aquele que começou a colaborar tem de mobilizar para poder continuar pensando. É evidente que não se pode exigir de todo sujeito moral que ele reconstitua, por seus próprios meios, na solidão, todos os elos intermediários de uma crítica racional ou científica dos estereótipos com que nossos dirigentes e nossos meios de comunicação nos entopem. E, cumpre destacar, a noção de "narcisismo ético" de Freud certamente não sugere uma solução cognitiva para o conflito intrapsíquico.

Um dos caminhos possíveis consistiria no seguinte: o sujeito, mesmo quando as circunstâncias o levam a isso, se recusaria a se afastar de sua própria subjetividade e a negar seu sofrimento ético. Não que se deva, a pretexto de manter-se fiel à própria subjetividade, confiar cegamente nesta. Seria algo, evidentemente, insustentável. O inconsciente é astuto demais para que se possa, seja na circunstância que for, acreditar-se senhor em sua própria casa e fazer dos sinais afetivos da subjetividade a base de uma certeza sobre a verdade. O inconsciente indica tanto a via do gozo e da covardia, ou da perversão, quanto a do gozo do poder e da dominação, o que Derrida (2003), em particular, estudou em um capítulo sobre a Bemüchtigungstrieb (pulsão de poder ou pulsão de dominação).

Não! O que cabe destacar aqui é a recusa resoluta a aderir a uma interpretação do mundo ou das circunstâncias que venha dada de fora, ainda que martelada incessantemente pela mídia e pelas empresas, enquanto ela não tiver sido submetida ao tribunal da subjetividade. Claro que há nisso um paradoxo em relação à tradição filosófica. Como, mesmo sendo psicanalista, um autor ousa apelar a um tribunal da subjetividade, quando toda a filosofia está resolutamente orientada em sentido contrário, qual seja: submeter as intuições sensíveis ao tribunal do conceito? Porque a subjetividade é a vida. Mas a vida a que nos referimos não é a vida dos órgãos nem a vida biológica. Interessa-nos a vida absoluta.

Assim, tudo o que traz em si essa maravilhosa propriedade de se sentir é vivo, ao passo que tudo o que está desprovido dela é tão-somente a morte. A pedra, por exemplo, não se experimenta a si própria, dizemos que é uma "coisa". A terra, o mar, as estrelas são coisas. As plantas, as árvores, os vegetais em geral também são coisas, a menos que se faça aparecer neles uma sensibilidade no sentido transcendental, isto é, essa capacidade de experimentar-se a si próprio e de se sentir, que é, justamente, o que faria deles seres vivos. Já não no sentido da biologia, mas no sentido de uma vida verdadeira, que é a vida fenomenológica absoluta, cuja essência consiste no próprio fato de se sentir ou de experimentar a si próprio e em nada mais - o que também chamaremos de uma subjetividade (Henry, 1987, p. 11, itálicos do autor).

Quando se apela ao tribunal da subjetividade é para dizer que, ao negar a angústia que o espetáculo do sofrimento alheio faz nascer em mim, modalidade afetiva da subjetividade por excelência, nego ao mesmo tempo essa manifestação da vida em mim. Pensar com a subjetividade própria ou dar direito à subjetividade no pensamento é a condição sine qua non para que um pensamento honre a vida, a começar pela própria. Ao faltar com o que a escuta de minha subjetividade implica, largo a corda que poderia me impedir de cair para o lado da barbárie.

Por exemplo, considero correta uma proposição à qual adiro: "a guerra econômica e a luta pela competitividade justificam os cortes de pessoal". Logo, seria irracional eu me subtrair à injunção, mesmo que ela seja penosa, de organizar um plano de demissões para minha empresa. Sei perfeitamente que, do ponto de vista da vida e do respeito pelo outro, esse plano será profundamente injusto; que, para ter alguma chance de ser aplicado sem provocar crises, ele precisará ser ardiloso e hábil, manejando sucessivamente a mentira, a retenção de informações, os falsos boatos, a eliminação prioritária dos mais fracos etc. Contudo, se não me furto ao espetáculo do sofrimento que inflijo a assalariados para proteger minha clivagem e a racionalização, é inevitável que a angústia apareça, pois a angústia é, então, a modalidade sob a qual minha subjetividade se revela a mim.

Portanto, onde começa a autonomia moral? Precisamente ali onde, recusando-me a ceder a um procedimento calmante - a racionalização da clivagem sob a forma: "de todo modo não se pode fazer nada" -, decido soberanamente não me afastar de minha subjetividade e de mim mesmo; assumir essa angústia e só considerar justa a exigência de trabalho que essa angústia impõe ao meu psiquismo, mesmo se não entrevejo alguma solução. Pode-se até ir mais longe: assumir a angústia de pensar, mesmo sabendo, pertinentemente, que esse pensamento não oferece saída alguma no campo da ação.

Surge aqui o problema mais difícil do ponto de vista psicanalítico. Será ilegítimo defender-se da angústia? Pois é disso que se trata: mesmo que essa angústia não possa se apaziguar por alguma ação, porque essa ação é impossível, eu deveria, para continuar a pensar, decidir manter minha angústia e me privar do direito de me acalmar recorrendo à clivagem? Pensar com a própria subjetividade implica "assumir o risco de ser infeliz e de sofrer. Sofrer não é a finalidade da atividade de pensamento, é o risco da atividade de pensamento" (Derrida, 2003). Se me livro dessa angústia pela clivagem, na melhor das hipóteses deixo cometerem o mal; na pior, gozo com isso. Em ambos os casos, a clivagem é uma porta aberta para a manifestação da pulsão de morte. Inversamente, lutar contra a pulsão de morte passa necessariamente pela transformação da angústia em exigência de trabalho para o psiquismo: aquela que consiste na elaboração da clivagem. A ideia que procuro defender concerne à metapsicologia da pulsão de morte: a pulsão de morte não seria resultante da ativação direta de um suposto instinto animal residual no homem. A pulsão de morte seria a consequência indireta de uma capitulação do pensamento subjetivo - capitulação visando a restabelecer o conforto psíquico pela clivagem (com o bônus, ainda, de um direito ao gozo), quando este está ameaçado por uma angústia específica: a angústia que suscita em mim o encontro com o sofrimento do outro. Resta saber de onde procede o desejo dessa angústia, preferida ao conforto da clivagem.

Resta saber se, e em que condições, esse risco de sofrer pode se tornar uma chance, uma oportunidade para a autorrealização. Será que o fato de se sentir um pouco mais livre graças ao pensamento pode, por um lado, se transformar em prazer tornando-se... autodescoberta [e, acrescento eu, amor de si]? (Molinier, 1998, p. 68)3.

É o que sugere "FAE", a divisa de Joseph Joachim, violinista e compositor, amigo de Mendelssohn, Schumann e Brahms, FAE: "Frei Aber Einsam" ("livre, mas só").

Dito isso, mesmo que reconhecer a voz da subjetividade em si, ante o sofrimento alheio, seja um fardo, mesmo que a voz da subjetividade em si seja uma corda de salvamento, ela, por si só, não basta para orientar nossa ação. Poderá fazê-lo se, e somente se, virar exigência de trabalho para o psiquismo, exigência de se transformar para buscar as respostas ao desafio de uma situação simultaneamente psíquica e política, ambígua.

 

A dificuldade de pensar

Ora, esse trabalho do pensamento é difícil por vários motivos, mais afetivos que intelectuais. Explico. A dificuldade psicológica decorre do fato de que, na situação que estou tentando discutir, sou o único que pensa diferente dos outros. Se até as pessoas mais próximas, por ignorância ou por convicção, pensam como a maioria, então, ao optar por uma via diferente da deles, corro o risco de me isolar. Quando todo o nosso meio nos recomenda o realismo e a prudência, persistir pensando sozinho contra os outros provoca brigas familiares que podem pôr em perigo a comunidade de sensibilidade que está na base da família. Alguns pacientes, por não terem cedido à voz do "realismo econômico", tiveram de suportar uma ruptura dos laços de família e de amizade. Entende-se que, sob essa pressão das pessoas próximas, a ambivalência possa atingir tal dimensão que a própria dúvida se torna deletéria e desencadeia uma descompensação.

Se, na esfera do trabalho, o sujeito exprime perante os colegas as dúvidas com as quais se debate, ele ativa, quando ele existe, o sofrimento ético nestes últimos. Em outras palavras, ele problematiza inevitavelmente a estratégia de defesa coletiva que é a racionalização pelo realismo econômico. Nesse caso, fica ameaçado de ostracismo ou até da abertura de um processo de assédio contra a sua pessoa. O maior risco que aquele que continua a pensar por conta própria corre ao buscar um interlocutor é a alienação social, isto é, um processo que levará à doença mental. O conceito de alienação social foi introduzido por François Sigaut (1990) para distinguir o processo em jogo na situação de trabalho do processo mais bem conhecido pelos clínicos e que leva à alienação mental.

A alienação mental é, em termos esquemáticos, o estado psicopatológico em que se encontra um sujeito quando perdeu o vínculo com a realidade, por um lado, e por outro, quando o que ele considera verdadeiro não é reconhecido como tal pelos outros. Quando um sujeito rompeu seus vínculos com a realidade e com os outros, estará, mais cedo ou mais tarde, condenado ao hospital psiquiátrico, único local de vida capaz de tolerar os seres humanos que foram parar nessa situação. Dupla ruptura, portanto, com a realidade e com os outros. Pode acontecer, o que é um caso de outra ordem, de eu ter com a realidade um vínculo baseado na verdade, mas esse vínculo, que procuro exprimir e fazer validar pelo outro, não ser reconhecido por ninguém. Logo, ruptura apenas com os outros, mas não com a realidade. Fico, então, em uma situação escabrosa. Como sustentar sozinho um ponto de vista contra todos? Por exemplo, o de que a concorrência desleal entre colegas, a que todos cedemos sob efeito de uma gestão focada na eliminação do excesso de gordura, não é a consequência inevitável da globalização do mercado, à qual seria inútil se furtar, mas resultado de uma estratégia deliberada de dominação criada pela direção da empresa para obter a flexibilização dos trabalhadores (Barbier & Nadel, 2000). Minha convicção desviante me coloca em uma situação comparável à do gênio incompreendido, que pode escolher entre duas saídas:

♦ enuncio minha verdade proclamando que eu me basto a mim mesmo - levado a me instalar na autorreferência, corro o risco de ser taxado pelos outros de paranoico;

♦ ou então acabo vacilando, duvido da veracidade de meu vínculo com a realidade, mas nesse caso também tenho de questionar tudo ou parte do que, até aquele dia, considerei verdadeiro. Pode, então, acontecer de tudo vacilar e eu acabar duvidando de mim mesmo e me deixando tomar pela autocrítica, pela autodesvalorização e, finalmente, pela depressão.

Nesse caso, pela sua recusa coletiva da verdade, os outros conseguiram me fazer perder o rumo e fazer de mim um doente. Lembro, porém, que em ambas as patologias, paranoia ou depressão, quem tem razão sou eu, diferentemente do louco que delira, daquele que sofre de uma alienação mental.

O problema é que quando, sob o efeito da falta de reconhecimento pelo outro da validade de minha relação com a realidade, fico paranoico ou suicida, o interlocutor externo não tem condições, se ele desconhecer a situação de trabalho, de distinguir entre alienação mental e alienação social, pois do ponto de vista sintomático, as duas configurações são parecidas; o que varia é apenas a etiologia.

Esse risco de alienação social ameaça inevitavelmente todo aquele que se esforça para pensar sozinho, de maneira autônoma.

 

Autonomia moral subjetiva

Há aqueles que conseguem, sem vacilar e sem fraquejar, pensar sozinhos contra todos, sem por isso serem paranoicos. Onde é que encontram os recursos para o que chamarei agora de "autonomia moral subjetiva", parafraseando a expressão introduzida por Patrick Pharo (1996)? A autonomia moral subjetiva não tem nada a ver com a ação do supereu, que não foi citado neste percurso4. O conflito entre o eu e o supereu se traduz pela culpa, que apenas remete o sujeito à sua neurose infantil e à sua alienação neurótica, ao passo que a exigência de trabalho do pensamento subjetivo para lutar contra a clivagem está voltada para a emancipação, inclusive quando esta pode levar a posições morais que rompem com as dos adultos amados ou idealizados da infância.

Quais são, então, os recursos psíquicos do herói, daquele que pensa sozinho? Parece-me que só podemos ter acesso a eles se fizermos uma crítica do valor atribuído à identidade. A identidade, como mostra a psicopatologia geral, é, na maioria das pessoas comuns, pouco garantida, de modo que precisa da confirmação do outro. Desde Sartre e Lacan, na esteira de Hegel - e também encontramos essa ideia em Hannah Arendt, na passagem citada acima sobre a desolação -, aceita-se que raramente nossa identidade depende exclusivamente de nós, e que precisamos da confirmação do olhar do outro. São conhecidas, em psicanálise, as possíveis armadilhas da identificação, quando ela vira alienação ao olhar do outro. Desse ponto de vista, é claro, entende-se que a solidão contra todos e a desolação sejam altamente perigosas. E é sem dúvida por isso que a autonomia de pensamento e a autonomia moral subjetiva são tão raras. Cumpre, então, distinguir a psicodinâmica da identidade, que domina o funcionamento psíquico da maioria das pessoas comuns, da ipseidade, isto é, do que procede de uma relação rigorosamente intrassubjetiva entre si e si, na solidão, precisamente. O herói é aquele que se mantém só na vida, fundamentalmente porque ele permanece o tempo todo na certeza da experiência subjetiva da vida em si, que nada mais é senão o amor de si.

Ainda que a metapsicologia do herói e da autonomia moral subjetiva possa nos dar elementos de conhecimento interessantes, os heróis autênticos são raros e o que convém discutir é, sobretudo, o caso das pessoas comuns.

Quando você não é um herói, não consegue continuar pensando muito tempo na absoluta solidão entre os seus. Resta, então, ao homem solitário um último recurso, que ele vai, afinal, buscar fora de si: são os textos e tudo o que foi depositado pelos pensadores, filósofos e artistas nos livros e nas obras que a cultura ainda nos oferece (pois, no regime neoliberal, não há censura nem auto de fé). Posso, então, seguir o meu caminho, persistir no trabalho de pensamento, desde que eu alcance uma familiaridade com as obras suficientemente consistente para me fornecer os meios de vencer a solidão.

E voltamos ao trabalho. Pois o pensamento subjetivo não pode seguir seu curso sem se submeter à prova de um trabalho, no sentido mais trivial e concreto do termo: já não apenas uma Arbeit, no sentido que essa palavra tem na metapsicologia freudiana, mas uma poiesis, a saber: a própria atividade intelectual, com todas as suas imposições práticas, suas exigências em termos de tempo de leitura, de estudo, de análise, de escrita, de síntese, de memorização, de reflexão..., ou seja, com tudo o que resiste ao controle e passa pela confrontação com a dificuldade da tarefa, com o fracasso, com o desânimo, e que só se obtém graças à obstinação e à resistência. Assim, após a cena do assédio e a cena do plano de demissões, esboça-se uma terceira cena de trabalho: a da reapropriação que, por mais promissora que seja, não exime de um trabalho, também ele suado. Pois, não devemos nos enganar, é também pelo trabalho que passa inevitavelmente a emancipação, nessa prova em que pensamento subjetivo e trabalho concreto se confundem. É aí, aliás, que reside toda a riqueza da clínica do trabalho: se o trabalho pode gerar o pior, pode também produzir o melhor. É este também o desafio político, fundamental, mas maciçamente negado, de nossa época.

Note-se que, embora para o homem comum pensar sozinho seja recusar a clivagem e conjurar a alienação social, os recursos que são necessários mobilizar são de manejo terrivelmente difícil. E vimos, no período recente, quando o desemprego atingiu seu nível mais alto, quando martelavam o tema do fim do trabalho e da guerra econômica, quando todo o mundo se calava na sociedade civil, que somente os artistas, em particular os cineastas, os artistas plásticos e alguns escritores, mas não os universitários nem os cientistas, ergueram a voz contra a injustiça e deram apoio aos desempregados, e acolhida aos imigrantes. O silêncio dos universitários, dos cientistas e dos intelectuais é, na sombra, um acontecimento. Como entender esse acontecimento ou esse antiacontecimento? O acesso à cultura que possibilita uma intimidade e um verdadeiro diálogo com as obras de que se necessita para pensar sozinho sempre foi difícil. Acontece que na época contemporânea e, singularmente, desde a guinada neoliberal, a frequentação da cultura clássica vem se tornando cada vez mais difícil.

Na edição do jornal Le Monde, de 23 de setembro de 2001, foi organizado um debate sobre a reforma do ensino de filosofia no último ano do ensino médio, entre um jornalista, um filósofo, François Dagognet, e um professor de escola, Didier Gaulbert. "Alguns observadores constatam", disse o jornalista, "que atualmente a filosofia está muito na moda. O que os senhores pensam a esse respeito?". E Didier Gaulbert respondeu:

Que moda? Não constato nenhuma moda de filosofia na cidade em que leciono. "Não estamos nem aí pra filô", costumam me dizer meus alunos. No que concerne aos meus alunos, o que talvez coubesse interpretar é por que as obras-mestras do pensamento ocidental os impressionam tão pouco.

Se essa asserção for correta, indica uma verdadeira ameaça. Que muitos de nossos concidadãos zombem do pensamento ocidental não é novidade. Mas a falta de respeito por essas obras-mestras, a sua perda muito profunda de prestígio são radicalmente novos em uma sociedade democrática, e afetam atualmente a própria intelligentsia. Com efeito, hoje em dia o pensador é objeto de desprezo por parte das instituições que são, supostamente, o lugar por excelência onde se destila, se conserva, se renova e se transmite a cultura. A começar pela universidade. É grave! Os professores da universidade são instados a virar comunicadores, a se transformar em bestas de imprensa e de televisão, em jet-professores técnico-comerciais, em produtores de publicações em série, em ideais da excelência, em inventores de certificados, em redatores de relatórios de atividades submetidos à sacrossanta avaliação, em propagandistas de propostas pedagógicas, sem contar a massa cada vez maior de cargos administrativos que lhes botam nas costas. E eles aceitam!

Nessas condições, o pensador perde a possibilidade de pensar, pois o pensamento que se empenha em medir forças não só com o tribunal do conceito mas com o tribunal da subjetividade precisa de tempo, de serenidade, de recuo. Precisa de tempo para meditar, para refletir, em um tempo em que toda exigência de produção fica suspensa.

Eu mesmo sou um dos que é impedido de pensar. Isto mesmo: impedido de pensar. Somos promovidos a especialistas e, em seguida, obrigam-nos a dar respostas sobre qualquer coisa, inclusive sobre questões ineptas recortadas pela mídia, sem nos dar tempo de formular questões. O pensador é convocado apenas para dar respostas, não mais para formular questões, ou seja, é chamado para provocar sono nos outros e impedi-los de pensar.

Impedem-nos de pensar, de ler os clássicos, de refletir e de meditar. Ninguém proíbe nada disso! É fundamental marcar essa diferença. O sistema neoliberal de governo das empresas, com seus objetivos de gestão e de rentabilidade, já fez sua escolha: os hospitais, os ambulatórios, os centros de saúde e as universidades. Esse sistema não proíbe pensar, ele nos impede de pensar esgotando-nos metodicamente por meio de cadências infernais.

Entre proibir e impedir há uma diferença essencial: aquela que separa a ditadura do neoliberalismo. No longo prazo, contudo, até onde pode levar esse impedimento de pensar? O especialista da clínica do trabalho tem o dever de exprimir um ponto de vista: a universidade já não sabe honrar a vida. E, afinal, é nas sociedades de psicanálise que ainda podemos pensar, isto é, trabalhar - Arbeiten - com a subjetividade.

Longe de nos parabenizarmos por isso, poderiamos ficar horrorizados, pois ameaça-nos o risco da solidão e, quem sabe, em breve, o espectro da desolação, ou seja, já não sermos compreendidos pelos outros.

 

Referências

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Correspondência:
Christophe Dejours
39 Rue de la Clef
75005 Paris
Tel.: (33 1) 5543-9690
chdejours@free.fr

Recebido em 17.2.2013
Aceito em 12.3.2013

 

 

1 NT: parque parisiense conhecido como local de prostituição à noite.
2 NT: no original: "quiconque se suffit à lui-même ne veut nuire à qui que ce soit"
3 Curiosamente, é em Carl von Clausewitz que encontramos a primeira concepção psicológica da coragem, que ele define como "resolução": "Não a coragem ante o perigo físico, mas a coragem perante responsabilidades, ou seja, de certo modo, perante o perigo moral. É o que também se chama courage de l'esprit. A coragem não é um ato da inteligência, é um sentimento, tal como o medo: a primeira está relacionada com a preservação moral, este último com a preservação física" (Clausewitz, 1827/1955, pp. 87 e 131, citado por Hamraoui, 2001, p. 183, itálico do autor, negritos nossos).
4 O "sofrimento ético" não se situa nesse campo. Quando Freud analisa as chamadas "instâncias morais", entre as quais coloca em primeiro lugar o supereu, visa, na verdade, à análise dos "sentimentos morais", que são a culpa e a necessidade de castigo, relacionada com o medo da perda do amor dos pais (ver, em particular, o final de "O mal-estar na civilização") ou com a perda do objeto (como na melancolia). Nesses casos, contudo, estamos muito longe do senso ético stricto sensu, que tem especificamente a ver com a celebração da
subjetividade e da vida. Se a interpretação proposta por Freud fosse verdadeira - a da obediência aos interditos parentais para não perder seu amor -, estaríamos muito mais do lado da dependência e da alienação do que da liberdade. A autonomia moral se manifesta justamente quando o sujeito ousa pensar por conta própria, inclusive contra os pais, correndo o risco de perder seu amor.

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