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Jornal de Psicanálise

versão impressa ISSN 0103-5835

J. psicanal. vol.57 no.107 São Paulo  2024  Epub 20-Jan-2025

https://doi.org/10.5935/0103-5835.v57n107.13 

Artigo

Um psicanalista nas redes, enredado está?

Un psicoanalista en las redes sociales, ¿esto está enredado?

A psychoanalyst on social media, is he trapped?

Un psychanalyste sur les réseaux sociaux, êtes-vous pris au piège?

Juliana Lang Lima1 

Membro titular da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre (SBpdePA)

1Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre (SBpdePA). Porto Alegre


Resumo

Em um mundo no qual a virtualidade faz parte do cotidiano de todos nós, a Internet e as redes sociais também passaram a integrar o ofício dos analistas. Tal fato colabora para a possibilidade de transmissão e de democratização da psicanálise, mas também traz alguns riscos no que diz respeito a uma demasiada assimilação às leis dos algoritmos e dos likes. Com base em uma pesquisa sobre incursões de psicanalistas em temas da cultura e nas mídias, a autora discute a presença dos analistas de hoje nas redes sociais.

Palavras-chave: mídias; redes sociais; democratização da psicanálise; ética psicanalítica

Resumen

En un mundo en el que la virtualidad forma parte de nuestro día a día, Internet y las redes sociales también han pasado a formar parte del trabajo de los analistas. Este hecho contribuye a la posibilidad de transmi-sión y democratización del psicoanálisis, pero también trae algunos riesgos en cuanto a una demasiada asimilación a las leyes de los algoritmos y los gustos. A partir de una investigación sobre las incursiones de los psicoana-listas en temas culturales y mediáticos, la autora analiza la presencia de los analistas actuales en las redes sociales.

Palabras Clave: medios de comunicación; redes sociales; democratización del psicoanálisis; ética psicoanalítica

Abstract

In a world in which virtuality is part of our daily lives, the Internet and social networks have also become part of the analysts’ work. This fact contributes to the possibility of transmission and democratization of psychoanalysis, but it also brings some risks with regard to too much assimilation to the laws of algorithms and likes. Based on research into psychoanalysts’ incursions into cultural and media topics, the author discusses the presence of today’s analysts on social media.

Keywords: media; social media; democratization of psychoanalysis; psychoanalytic ethics

Résumé

Dans un monde où la virtualité fait partie de notre quotidien, Internet et les réseaux sociaux font également partie du travail des analystes. Ce fait contribue à la possibilité de transmission et de démocratisation de la psychanalyse, mais il comporte aussi certains risques en ce qui concerne une trop grande assimilation des lois des algorithmes et des likes. À partir de recherches sur les incursions des psychanalystes dans des sujets culturels et médiatiques, l’auteur discute de la présence des analystes d’aujourd’hui sur les réseaux sociaux.

Mots-clés: médias; réseaux sociaux; démocratisation de la psychanalyse; éthique psychanalytique

Se não existissem ferrovias que superassem as distâncias, o filho nunca teria deixado a cidade paterna; e não precisaríamos de telefone para ouvir sua voz.

(Freud, “O mal-estar na cultura”)

Quando tive acesso à Carta-convite do Jornal de Psicanálise, senti como se ela houvesse provocado um interessante efeito convocatório, pois há algum tempo venho me inquietando com os impactos de um movimento que se convencionou chamar de “democratização da psicanálise”. É um fato notável que nos últimos anos a psicanálise vem passando por significativas ampliações a partir da entrada da tecnologia em nossas vidas e em nossos ofícios. Talvez seja possível fazer um recorte ainda mais específico e situar esse movimento temporalmente, concomitantemente com o advento da pandemia. Isso não significa dizer que antes disso psicanalistas não realizassem atendimentos de forma remota ou usassem outros dispositivos oriundos do espaço virtual, como redes sociais e reuniões, seminários e grupos de estudos on-line, mas é um fato notável que a pandemia pulverizou essas ocorrências, que passaram a acontecer de forma quase instintiva, com pouca instrumentalização e grandes chances de tropeços.

Atrapalhados ficamos todos naquele tempo em que a única certeza era que deveríamos permanecer em casa, como forma de cuidado consigo e de respeito ao pacto social. Eis que as sessões de análise, os encontros de supervisão e todas as atividades de ensino e convívio institucional passaram a ser mediadas por uma tela e por apetrechos com os quais a maioria de nós, e me incluo aqui, não tinha grande intimidade. Não à toa tantas gafes foram cometidas logo de início, tendo como alegoria os microfones abertos que deixavam vazar o que deveria ter permanecido nos bastidores, tal como um inconsciente que deixa seus derivativos escaparem ao recalcamento e fazerem-se conhecer em pequenas doses mediante sonhos, atos falhos, sintomas.

Mas, se o tempo da pandemia passou, as conexões virtuais só fizeram aumentar, e nos últimos anos tem sido bastante recorrente encontrar profissionais da área fazendo uso das redes sociais para divulgar seu trabalho, suas produções, propostas de estudo ou mesmo dialogar com o grande público. Sabemos que muitos ainda se mostram resistentes ou mesmo incomodados diante dessa forma de posicionamento, e sabemos também que o terreno arenoso da Internet possui armadilhas que fazem necessária uma vigilância permanente.

Todavia, esse mesmo instrumento que traz o risco de uma certa imersão narcísica também tem sido responsável por retirar a psicanálise do signo da inacessibilidade, devolvendo a ela um lugar de ampla circulação na cultura, de forma que hoje, a presença dos psicanalistas na mídia não parece mais um fenômeno que possa ser detido, cabendo-nos, portanto, compreendê-lo. Para ajudar a pensar em possibilidades para o futuro, esse que tem se apresentado de forma bastante pessimista aos olhos da maioria, intencionei inicialmente a uma visita ao passado, começando por Freud, mas passando também por outros psicanalistas que se propuseram a realizar aberturas importantes no sentido do diálogo com a cultura. A partir dessas iniciativas, e nem todas bem-sucedidas, como veremos a seguir, busco trilhar um caminho para compreender as manifestações atuais desse termo tão dilatado e complexo que é a democracia no interior da psicanálise.

Temporada 1: Viena & Freud

A obra freudiana é marcada por um profundo entrelaçamento com a cultura, como é possível entrever desde seus inícios. Foram as manifestações mais corriqueiras e usuais, como os sonhos e a psicopatologia da vida cotidiana, que auxiliaram Freud a defender a universalidade de seus conceitos, como o Complexo de Édipo e o Inconsciente. Nessa época, os livros de psicanálise eram lidos não somente pela comunidade psicanalítica, constituindo algo de interesse mais amplo, em especial, pelos temas relacionados à sexualidade (Jones, 1979; Roudinesco, 2016). Chama atenção, também, a onipresença da arte ao longo dos escritos freudianos. Desde a escultura até a literatura, muitos são os exemplos citados por Freud, em geral sem grandes contextualizações ou explicações, tomando tais expressões artísticas como patrimônio universal, um legado a ser transmitido de geração em geração, e que faria parte do capital cultural de cada analista.

Sobre as incursões de Freud em temas além da clínica, temos, tradicionalmente, categorizado a chamada seção de textos sociais de Freud, escritos principalmente da metade para o fim de sua obra, nos quais ele se dedica a contemplar fenômenos culturais em sua intersecção com a psicanálise. Tal separação acontece, em geral, nos cursos de formação, para fins didáticos e de organização de seminários, embora possamos afirmar que a obra de Freud é atravessada pelo social a todo momento. Nesse sentido, Mezan (2019) assinala a preocupação de Freud em não reduzir sua disciplina a uma ferramenta terapêutica, estendendo a investigação psicanalítica às manifestações culturais.

Desde os primeiros textos da obra, nota-se uma permanente interrogação quanto às concepções morais e sua vinculação estreita com a sexualidade, sendo a moralidade instaurada via educação e se expressando sobretudo no espectro da coerção e da punição. Em “Moral sexual civilizada e doença nervosa moderna” (1908/1996a), Freud aponta para a repressão social e cultural como fatores importantes na etiologia das neuroses, além de falar da hipocrisia com que as pessoas lidam com suas questões sexuais. É claro que todos aqueles habituados ao estudo da obra freudiana vão reconhecer esses conceitos já presentes desde os “Estudos sobre a histeria” (1893); no entanto, o que faz destacar esse artigo dos demais é o fato de ter sido publicado em um periódico (ou seja, uma literatura ordinária, e não uma especializada) e de tratar-se do primeiro ensaio dedicado inteiramente ao antagonismo entre exigências pulsionais e culturais - um tema que viria a ser amplamente explorado em formulações posteriores.

Avançando alguns anos, encontramos um analista que não se mostra indiferente aos efeitos da Primeira Guerra Mundial, como podemos verificar em sua correspondência e também no artigo “Reflexões para os tempos de guerra e morte” (Freud, 1915/2006), que apresenta as primeiras impressões sobre a guerra, quando esta já estava em andamento. Nesse período de recessão na Europa, que deixava efeitos importantes sobre a clínica, era impositivo pensar sobre a precariedade dos códigos coletivos, incapazes de conter a destrutividade humana e, em última instância, a morte.

Também nesse contexto aconteceu o V Congresso Internacional de Psicanálise, sediado em Budapeste, no ano de 1918 - um encontro que ficou conhecido como o momento em que Freud convocou os analistas a pensarem de que forma a psicanálise poderia figurar como uma alternativa de atendimento presente nos sistemas públicos. O texto que carrega parte desse discurso, proferido diante de membros dos governos da Áustria e da Alemanha, é considerado o mais político da obra de Freud, com um tom veemente e propositivo (Freud, 1919/2017a). A partir de então, diversas clínicas públicas entram em funcionamento em países europeus, com destaque para o Ambulatório de Viena e a Policlínica de Berlim. É importante salientar que tais iniciativas aconteceram em um contexto de empobrecimento da população em função dos anos de guerra, o que dificultava o acesso à psicanálise por motivos financeiros, ao mesmo tempo em que o tornava ainda mais necessário (Danto, 2000).

Na esteira das produções críticas, é imperioso relembrar “Psicologia das massas e análise do Eu” (1921/2020c), que surgiu logo após a Primeira Guerra, com uma posição bastante reflexiva em relação aos regimes autoritários, em especial, ao fascismo e ao fascínio que a figura do líder desperta, comparando seus efeitos com os da hipnose e estados de enamoramento. Alguns anos mais tarde, apareceu um escrito que talvez não seja tão estudado por nós, mas cujo valor é cada vez mais atual, em tempos de renovadas tentativas de regulamentação da psicanálise. Assim, “A questão da análise leiga” (1926/2017b) tem raízes no próprio movimento psicanalítico, que sempre se pretendeu laico, leigo e plural, e defendia, há quase cem anos, que a psicanálise não fosse uma exclusividade do meio médico.

Voltando ao campo da cultura, precisamos citar “O futuro de uma ilusão” (1927/2020a), obra na qual Freud discute o valor e a amplitude das ideias religiosas, defendendo o pensamento científico em oposição à religião; “O mal-estar na cultura” (1930/2020b), no qual reflete sobre a permanente insatisfação humana diante do processo de aculturamento, com ênfase para o sentimento de culpa; e “Por que a guerra?” (1933), fruto de diálogos com Einstein sobre a guerra, em um novo momento de avanço da extrema direita na Europa. Do ponto de vista teórico, também é possível compreender o interesse de Freud em todos esses fenômenos, uma vez que na reta final de sua obra estava intensamente envolvido com o conceito de pulsão de morte, utilizado para pensar a destrutividade inerente ao homem, em uma comprovação inequívoca de que os diálogos com a cultura se nutrem da clínica, e vice-versa.

Temporada 2: Londres & Winnicott

Donald Winnicott (1896-1971) foi um pediatra e psicanalista com bastante influência nos estudos sobre desenvolvimento psicológico e relações de objeto, tendo construído uma clínica considerada muito viva e diversa. Dentre suas publicações, destacam-se as temáticas materno-infantis, desde questões acerca da gravidez e da transformação da mulher em mãe, passando pela interação entre mãe e bebê, e chegando até a criança e seu universo, suas formas de brincar, desenhar.

Uma de suas formulações mais conhecidas diz que “não existe essa coisa chamada bebê” (Winnicott, 1978, p. 47), o que significa afirmar que não é possível pensar o bebê separado da mãe e do contexto mais amplo em que ela se insere. Em linhas gerais, podemos situar o desenvolvimento do psiquismo a partir do estado de dependência absoluta, depois do qual haverá um caminho a ser percorrido até a conquista da autonomia, sendo esse percurso realizado em estado de maior confiabilidade e criatividade, a depender do ambiente.

Evidente que nem sempre as condições são das mais favoráveis, e desencontros entre bebê e cuidadores frequentemente deixam a necessidade de auxílio, em buscas que poderão ser realizadas nos consultórios psicanalíticos ou de maneiras menos formais. Com essa ideia em mente, Winnicott participou de programas de rádio na BBC entre 1939 e 1962, em espaços direcionados especialmente para mães. Prestemos atenção ao fato de que ele começou essas transmissões no ano de início da Segunda Guerra Mundial, oferecendo pelas ondas do rádio um diálogo seguro, em tempos de grande apreensão.

Sua fala clara e acessível atingiu um enorme público, sem receio de abordar questões cotidianas e, se possível, transmitir noções psicanalíticas.

Winnicott foi, ainda, o primeiro analista a aparecer na televisão (Malzyner, 2024), além de outras contribuições que deu no campo social, como palestras em instituições médicas e escolares, em uma atitude coerente com suas proposições teóricas, de que o individual e o ambiente formam uma mescla, sem que haja oposição. De forma geral, sua atuação para além do consultório é bastante respeitada e tomada como referência no que se refere à prática da psicanálise extramuros.

Temporada 3: Paris & Dolto

Françoise Dolto (1908-1988) foi uma psicanalista com grande influência sobre a educação de crianças de seu tempo. Desde o princípio de seus estudos na medicina, afirmava que se dedicaria à pediatria e que desejava se tornar uma “médica da educação”. A partir de sua análise com René Laforgue, Dolto se voltou para a psicanálise, conservando entre suas aspirações curar e prevenir (Kupfer, 2006).

Entre os anos de 1976 e 1978, quando já era uma conhecida analista de crianças e adolescentes, participou diariamente de um programa de rádio no qual respondia a cartas de ouvintes que encontravam dificuldade na educação de seus filhos. Com tranquilidade e respeito, chegava mesmo a orientar condutas, acreditando que poderia auxiliar a esmaecer um tanto da culpa que se abatia sobre pais e mães, promovendo reflexões e mudanças. Durante um período, Dolto se propôs também a responder às correspondências enviadas por leitoras de revistas femininas.

A decisão de se deslocar de seu consultório e se expor na grande mídia foi considerada por Dolto como “a mais difícil de sua vida”, e não passou impunemente pela comunidade psicanalítica. Enquanto alguns saudaram a iniciativa como uma forma interessante de disseminação da psicanálise e dos direitos das crianças,2 outros consideraram leviana a forma com que Dolto expunha suas ideias, assim como inapropriado o espaço escolhido para isso, o que acarretaria um desserviço à causa (Cordeiro, 2017).

Entre críticas e posições favoráveis, a passagem de Dolto pelas mídias parece ter deixado um saldo positivo, assim como a experiência anteriormente relatada, conduzida por Winnicott. Nos dias atuais, ambas as atuações são lembradas como precursoras de uma atuação voltada para a comunidade, fazendo uso de conceitos psicanalíticos travestidos por uma linguagem mais acessível, passível de ser assimilada mesmo por pessoas sem intimidade com o pensamento psicanalítico.

Um exemplo com desfecho menos auspicioso foi a vivência de Serge Leclaire, também em Paris. Em 1983, o analisando de Lacan já era um analista com grande circulação na França, autor de diversos livros e reconhecido como alguém sensível, inteligente e culto, quando aceitou integrar um programa de auditório com transmissão pela televisão chamado Psy Show. Ali, participava como psicanalista em meio a uma espécie de psicodrama, desvendando dificuldades de relações de casal.

O envolvimento de Leclaire (1983) em uma trama complexa como essa despertou incredulidade entre os membros da comunidade psicanalítica, assustados com a exposição de duas pessoas leigas diante de uma audiência de milhares de curiosos, rompendo as fronteiras entre público e privado. Como o enquadre do programa e as intervenções do psicanalista se aproximavam do modelo de um atendimento de casal, muitos consideraram que Leclaire sucumbiu ao apelo narcísico midiático, o que teve como efeito colateral oferecer um material vivo aos voyeuristas de plantão. Esse exemplo multifacetado figura como um alerta para os psicanalistas contemporâneos, mais expostos a toda sorte de convites para aparições públicas, que podem oferecer situações ainda mais arriscadas em tempos de redes sociais.

Temporada 4: Brasil & Dunker

Em junho de 2014, o psicanalista Christian Dunker se aventurou em uma nova modalidade de transmissão da psicanálise, através de um canal no YouTube no qual respondia a e-mails de pessoas que acompanhavam seu trabalho, tratando de temáticas diversas pela ótica psicanalítica. Com larga experiência clínica e acadêmica, Dunker logo “viralizou”, para usar um termo oriundo da Internet quando queremos nos referir a algo que atinge muito alcance em curto espaço de tempo.

Seguindo o caminho natural de toda novidade, os vídeos de Dunker despertaram reações discrepantes, alternando entre o espanto e a admiração. Dez anos após essa aparição e com tantas transformações ocorridas durante essa década, fica até complexo dimensionar a amplitude do gesto de um psicanalista reconhecido tomar o YouTube como um local para efetuar a transmissão psicanalítica, mas o fato é que tal atitude foi deveras polêmica, ainda que tenha se efetivado como uma contribuição bastante revolucionária para o movimento de expansão da psicanálise.

Em um movimento complementar, logo entrou no ar uma série de pod-casts com o intuito de transmitir a psicanálise de forma mais coloquial e menos formal. Tais iniciativas partiram de pessoas físicas ou projetos de coletivos, mas logo ganharam também o campo institucional, de tal modo que a IPA e a FEBRAPSI mantêm seus podcasts com episódios atualizados regularmente.

Um novo passo nesse sentido se deu em 2017, quando psicanalistas de São Paulo e de Brasília se reuniram em coletivos e passaram a oferecer escutas gratuitas em espaços públicos. Anos depois, iniciativas semelhantes passaram a acontecer em outras capitais, como Rio de Janeiro e Porto Alegre, e a ideia de um acesso mais facilitado à psicanálise passou a ser contemplada em eixos distintos.

Inicialmente, percebe-se que o movimento buscava proporcionar atendimentos gratuitos ou mesmo flexibilização de honorários para garantir maior alcance da população, em uma reação às críticas apontando a elitização da psicanálise. Para além da via da análise pessoal, contudo, a noção de democratização da psicanálise busca também adentrar na discussão dos modelos de formação psicanalítica, seus altos custos e a quase ausência de colegas negros e indígenas entre nós.

Nesse sentido, Andrade (2023) denuncia o perfil elitista das “Sociedades de Psicanálise” (entre aspas, conforme o texto original), sugerindo que o rompimento do pacto que monopoliza tais espaços passaria por uma virada decolonial, em que o foco da psicanálise não fosse mais eurocentrado, mas efetivamente aberto à cultura brasileira. Quando tensiona o fato de a psicanálise não estar presente somente na Zona Sul do Rio de Janeiro, nos Jardins em São Paulo (e, complemento aqui, nos Moinhos de Porto Alegre), cutuca a ferida aberta também pela Internet, que põe em condição de certa horizontalidade aqueles dispostos a dialogar em favor da psicanálise.

De forma prática, podemos celebrar uma conquista importante, consequência desse tensionamento advindo de fontes diversas: o oferecimento de bolsas destinadas a colegas negros e indígenas em diversas instituições do país. No que se refere mais especificamente às Sociedades vinculadas à IPA, destacam-se o Projeto Ubuntu, da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre, e o oferecimento de bolsas a negros, indígenas e refugiados na Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro.

As cotas vêm possibilitando acesso à formação para aqueles que por muito tempo se mantiveram distantes dela, como se a psicanálise fosse inacessível para essa população. Nesse sentido, contemplamos as intervenções extramuros como ações fundamentais, das quais depende a sobrevivência da psicanálise, em especial no contexto brasileiro, um cenário sabidamente tão diverso e afetado por desigualdades sociais.

Temporada 5: A rede & todos nós

Chegamos aos dias atuais permeados por essa grande rede, que oferece tantas promessas narcísicas, que merece sejam expostas algumas palavras sobre ela. Quando David Fincher (2010) lançou A rede social, obra que funcionou como um mito de origem sobre o Facebook, muitos consideraram pessimista o tom nela adotado. Ao adentrar os meandros da fundação dessa instituição virtual que influenciou toda uma geração, o filme apontava para alguns efeitos nefastos da disseminação desse modelo de conexão, como a possibilidade de manipulação dos dados dos usuários e as transformações nos laços afetivos, com o crescimento do individualismo e a consequente solidão advinda daí.

Menos de quinze anos depois, podemos afirmar que Fincher (2010) foi, no mínimo, bastante realista, ainda que fosse quase impossível prever que, em tão pouco tempo, as coisas mudariam tanto, e tão velozmente. Nesse ponto, ainda mais sagazes foram os produtores de Black mirror (Brooker, 2011), série britânica que pode ser categorizada em um espaço entre ficção científica e distopia, na qual a sociedade moderna é retratada em seu aspecto mais doentio, padecendo com o lado obscuro das novas tecnologias. Temos aí dois exemplos de como a arte cumpre seu papel de provocar perguntas e tensionamentos, além de antecipar questões coletivas.

Nos últimos anos, as discussões em torno dos impactos da tecnologia têm-se intensificado e ganhado olhares diversos. Profissionais da saúde e das humanas vêm alertando para os efeitos da hiperconectividade, em especial em relação às novas gerações e aos modelos de relacionamento e subjetivação impostos pela virtualidade. Em uma publicação recente, o jornalista Max Fisher (2023) se dedica a decifrar essa “máquina do caos”, como denomina as redes sociais, por meio de entrevistas com profissionais que trabalham no funcionamento dos algoritmos, usuários do submundo das redes3 e vítimas de ações criminosas nessas mesmas plataformas.

Ao começar a pesquisar o impacto das redes sociais em nossas vidas, Fisher (2023) pensava que, na pior das hipóteses, estas consistiam em uma espécie de tubulação passiva por onde passavam os problemas já conhecidos, como um novo meio de transmissão para aquilo que já existia. Todavia, tão logo adentrou nos pormenores do funcionamento das mídias, pôde atentar para estranhas coincidências relacionadas a seu uso, em geral associadas a excesso e também alguma dose de conspirações.

No estudo da cultura da rede mundial de computadores, Fisher (2023) abre detalhes do funcionamento de empresas que hoje fazem parte da vida de todos nós, como Google, YouTube, Facebook, Instagram, LinkedIn, Airbnb, Pay Pal, entre outras, além de transitar pelas profundezas dos personagens dessas paragens, gamers, hackers, influencers. Com isso, faz notar as transformações pelas quais as redes sociais passaram quando deixaram de ter seu acesso restrito àqueles que usavam computadores de mesa e passaram a ser mediadas por um aparelho nada inofensivo, que, com muita dificuldade, conseguimos fazer desgrudar de nossas mãos. Com base na altíssima adesão às redes sociais verificada hoje em qualquer recanto do mundo, Fisher afirma, com convicção, que todos os usuários estão, ao mesmo tempo, tanto conduzindo quanto sendo participantes de um experimento psicológico sem fim.

Como psicanalistas, temos um termo bastante apropriado para tratar desses impactos, assumindo que o celular e o acesso às redes constituam uma boa fatia do desconforto experimentado em nossos tempos. Adicções, discursos de ódio, fake news, política do cancelamento, acesso à pedofilia... a Internet é mesmo uma terra (quase) sem lei, por onde corre solto o que há de pior. Afunilando ainda mais essa questão, propomos examinar a figura do analista fazendo uso desses canais para a disseminação da psicanálise e para a divulgação de seu trabalho.4 Seria esse o mal-estar de nosso tempo, a armadilha capaz de forjar analistas demasiado narcísicos, escravos dos algoritmos, absorvidos pela lógica “caça-likes”?

Sobre essa intensa assimilação às facilidades oferecidas pela virtualidade, a psicanalista Lia Pitliuk (2022) lembra que seus colegas, na grande maioria, se mostravam reticentes diante da possibilidade de atendimentos on-line e da presença nas mídias - esta, em geral, considerada um exercício de vaidade, com altos riscos de fazer uma transmissão superficial. Ainda assim, tão logo o advento da pandemia tornou insustentável a continuação dos atendimentos presenciais, os analistas rapidamente incorporaram essa modalidade, e de maneira demasiado informal, com pouca instrumentalização.

A denúncia dessa colega tem muita pertinência, e revela aquilo de que pouco falamos em nossos meios: quão cômodo foi atender exclusivamente de forma remota. Passado o primeiro tempo de desconforto quanto a isso, a grande maioria de nós aproveitou as facilidades do mundo on-line, desfrutando de mais tempo com a família, evitando longos e morosos deslocamentos, migrando para residências litorâneas ou permanecendo no calor de suas casas em dias chuvosos e de frio. Não há mal nenhum em confessar que também gozamos de alguns benefícios dessa modalidade, contanto que possamos conservar em nosso horizonte que psicanálise combina mais com tradição do que com conforto.

Mas cuidemos de não ler “tradição” como conservadorismo. Nesse sentido, manter o legado freudiano se assemelha à proposta de Iannini (2024), de que a psicanálise se deixe fecundar pelas questões abertas pelo século 21, arriscando ir hoje um tantinho mais longe do que ontem, abrindo a janela para receber os ventos de liberdade que surgem de fora de nossa disciplina. Isso não implica que se perca o rigor teórico e técnico; ao contrário, ao propor um novo retorno a Freud, tendo em vista os desafios da contemporaneidade, Iannini (2024) desdobra inúmeras rotas possíveis, que contemplem aspectos de gênero, raça, sexualidade, política.

Nesse ponto, podemos direcionar nossa argumentação em favor das redes sociais, que poderiam figurar como um terreno no qual se torne possível estabelecer novos diálogos, sem os vícios tão estruturados em nossa comunidade psicanalítica. Esse é um viés indubitavelmente otimista sobre a presença do analista nas redes: de que este se deixe arejar por novos sotaques, inquietar com outras perguntas e atravessar por leituras inéditas, vindas de colegas com trajetórias bastante diversas. Além disso, com o alcance das conexões virtuais, ficam disponíveis documentos, conferências, seminários, entrevistas e outros tantos materiais valiosos, que podem ser acessados de forma simples, rápida e fácil. Sob o viés da clínica, aquele que sofre pode ter a chance de encontrar um bom analista por meio de uma postagem em rede social, da mesma forma que outrora poderia fazer essa busca de forma aleatória pela lista telefônica.

Existem, todavia, os aspectos menos nobres no ato supostamente generoso de ofertar um formato de transmissão via redes sociais. Nesse movimento, um analista que opta por ingressar nessa complexa trama pode se tornar muitíssimo mais popular do que o seria se fizesse um caminho mais tradicional, que o faria conhecido primeiramente em sua cidade, quiçá em seu estado e muito mais dificilmente em nível nacional. Tal apelo pode ser particularmente sedutor para alguns, que desejem expandir os limites de sua influência, ou almejem ganhos de altas somas.5

Ocupado em denunciar os excessos narcísicos daqueles que denomina “analistas youtubers”, Maurício Maliska (2022) tensiona o argumento de que o psicanalista deva estar na cultura de todas as formas - e, nesse caso, integrando os dispositivos de nossos dias e absorvendo os signos destes tempos. Para esse autor, há uma responsabilidade inerente ao lugar de analista, que nos faria observar com parcimônia o ato de se pôr nas redes, privilegiando uma avaliação minuciosa dos caminhos pelos quais seguir, em detrimento do resultado, tomando a noção de transferência como guia e medida ética. Se os seguidores das redes sociais buscam o mestre, aquele que vai apontar o caminho e influenciá-los, ao analista cabe sustentar o lugar da ignorância, daquele que faz perguntas ao invés de ofertar respostas.

Mas é possível que toda essa argumentação não desfaça a oposição entre aqueles que acreditam no poder das redes trabalhando em favor da psicanálise e aqueles que as entendem como uma armadilha capaz de banalizar nosso método. De minha parte, não pretendo solucionar tais imprecisões, mesmo porque integro ambos os times, alternando entre entusiasmo quanto ao impacto das redes e reserva quanto à vulgarização que são capazes de propiciar. Em que pese essa não ser uma posição definitiva, e sim válida para este momento, acabo pendendo mais para o lado da exibição do que da retração. Ainda que também me sinta inquieta diante de tantos sujeitos questionáveis, apropriando-se de conceitos da psicanálise de forma irrefletida ou até fútil, considero que esse seja mais um motivo para que profissionais sérios e comprometidos também ocupem espaços.

Seguindo uma linha semelhante, Pitliuk (2022) sustenta que evitemos a postura de demonização dos recursos eletrônicos, lembrando que estes se encontram inseridos em uma imensa rede de invenções e novidades que se desdobram também em novas formas de sentir e pensar na contemporaneidade - o que levaria, até mesmo, a aventar mutações nas maneiras de subjetivação. Nesse cenário, resistir aos dispositivos da cultura atual, situando-se em oposição a eles, seria uma luta contra os inimigos errados, tendo como efeito o afastamento do sujeito contemporâneo, que já não se aparta da tecnologia.

Talvez pudéssemos então, ainda que correndo o risco de ser um bocado óbvios, estabelecer alguns critérios mínimos para o bom uso das mídias, inspirados em Thomas Ogden (2010) e seu texto “Do que eu não abriria mão”. De forma muito resumida, diria que material clínico não pode sair da sala de análise, seja desenho de paciente infantil, mensagem de agradecimento de analisando adulto, foto de presente recebido. Aquilo que se produz na sala de análise é fruto de um encontro raro, e precisa ser tratado como tal.

De forma um pouco mais ampla, urge pensar que o analista é um indivíduo como outro qualquer, por vezes assaltado pelo próprio desamparo e sem dúvida sujeito aos efeitos nocivos e viciantes que o celular e todos os seus aplicativos são capazes de ofertar. Na teia narcísica em que todos vivemos atualmente, estar atento para o risco de enredar-se é fundamental, recusando, ao menos em alguma medida, o que Freud (1930/2020b) chamava de “prazer barato”, uma via demasiado curta na obtenção de satisfação.

A respeito disso, a psicanalista Berta Azevedo lançou um chiste, certa vez: “essa história de psicanalista com fãs tem dois problemas: o fã e o psicanalista”.6 Estamos de acordo com o estranhamento que causa ver um analista, aquele sujeito que outrora era tido como calado e taciturno, segundo o imaginário popular, em meio a um cortejo, cercado de pessoas desejosas de uma foto para posterior compartilhamento nas redes. Por isso mesmo, cabe fazer uma diferenciação entre ambas as posições: que o fã se ponha no lugar de súdito, tocado por todas as tonalidades apaixonadas que a transferência é capaz de incitar, é algo prenunciado (e até manejável). Mas, de um analista, espera-se que seja capaz de renunciar ao desejo de ser famoso e de gozar de prestígio por curar alguém, suportando um alto grau de supressão narcísica, atuando nos bastidores. Viver não cabe no Instagram. Que possamos observar com cuidado os recortes que levamos para lá.

1Membro titular da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre (SBPdePA).

2Lembremos que a década de 1970, assim como as anteriores, foi marcada por um forte autoritarismo de parte dos pais, o que tinha como consequência uma educação baseada em práticas coercitivas, além de relegar o lugar da criança a uma posição de submissão dentro dos lares, com pouca abertura para pensar sobre seus direitos, suas manifestações emocionais, distúrbios de aprendizagem etc.

3Fóruns obscuros que constituem a verdadeira terra sem lei da Internet, como Deepweb e Darkweb.

4Acredito ser pertinente deixar uma pequena anotação pessoal a respeito desse uso, pois, como alguém que tem se aventurado por esses meios, utilizando o Instagram de maneira profissional, sinto-me bastante confortável para tecer críticas sem o receio de parecer moralista ou demasiadamente conservadora.

5Nesse ponto, há que se fazer um contraponto à ideia de que isso seja exclusivo de nossos tempos. Basta lembrar a figura de alguns analistas didatas que dispõem de uma comitiva de analisandos e supervisionandos sob sua influência.

6Comunicação oral (2023).

Referências

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Recebido: 06 de Agosto de 2024; Aceito: 17 de Setembro de 2024

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